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sábado, 4 de janeiro de 2020

A Nova Democracia.


Trevosas togas

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Fiel a sua história, que tem como ato mais importante a entrega de uma mulher grávida à Alemanha nazista, o Supremo Tribunal Federal (STF) fez o Brasil dar mais um passo no caminho das trevas ao legitimar, no julgamento da ADI 4439 (Ação Direta de Inconstitucionalidade), o ensino confessional na escola pública, previsto na concordata de 2009 com o Vaticano.
Charge: Vini Oliveira
O fez com maior resistência (6 a 5) e menor margem de escolha (decidia a constitucionalidade, não a assinatura do tratado) que o governo de Luiz Inácio, que o firmou, e o Congresso, que o aprovou contra escassos votos de deputados evangélicos e do Psol – que, no Senado, mudou de posição e seguiu o relator, Fernando Collor. As responsabilidades de Lula e Dilma Rousseff abrangem, ainda, as indicações de Edson Fachin, Ricardo Lewandowski, José Antonio Dias Toffoli e Cármen Lúcia para o STF. Junto a Gilmar Mendes, nomeado por F. H. Cardoso, e Alexandre de Moraes, por Michel Temer, eles compuseram a maioria que abençoou juridicamente a ingerência religiosa no espaço escolar. Com ateus como FHC, agnósticos como Dilma, maçons como Temer e praticantes de “magia negra” como Collor, é um milagre que a Igreja Católica Romana ainda não tenha conseguido abolir, no Brasil, o divórcio, os direitos dos filhos extraconjugais e a contracepção.

A Constituição declara laico o Estado, proibindo-lhe “estabelecer cultos religiosos ou igrejas, subvencioná-los, embaraçar-lhes o funcionamento ou manter com eles ou seus representantes relações de dependência ou aliança” (art. 19, I). A assembleia que a elaborou cedeu a Roma ao dispor, no art. 210 § 1º da mesma Constituição, que “o ensino religioso, de matrícula facultativa, constituirá disciplina dos horários normais das escolas públicas de ensino fundamental”. Mas ao Judiciário, cabe se ater, em regra, ao que está escrito, não ao que os constituintes desejaram. Assim, o art. 210 § 1º deve ser aplicado à luz do 19, I, cabendo às escolas públicas ensinar sobre religiões sem pregá-las nem submeter professores ao crivo das igrejas. Assim votaram Luis Roberto Barroso, Luiz Fux, Rosa Weber, Marco Aurélio e Celso de Melo. O próprio Congresso, em 1997, deixara “vedadas quaisquer formas de proselitismo” em aula (art. 33 da Lei de Diretrizes e Bases da Educação).

Escalada obscurantista

O STF legitimou o ensino religioso “católico e de outras confissões” na escola pública (art. 11 § 1º da concordata) com as falácias e contorcionismos do seminário “O Estado laico e a liberdade religiosa”, promovido pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) em 2011.

Idealizado pelo então presidente do STF e do CNJ, Cezar Peluso, e organizado pelo atual presidente do Tribunal Superior do Trabalho, Ives Gandra Martins Filho, o evento teve oito conferencistas. Destes, quatro são membros do Opus Dei (Gandra Filho, o padre Rafael Stanziona de Moraes, o procurador da República José Bonifácio Borges de Andrada e o jurista português Jorge Miranda) e um da Aliança Católica, sucursal italiana da TFP (Massimo Introvigne, que vê na secularização a fonte de todos os males da Europa, atribui a um complô contra Roma o volume e repercussão das denúncias de violência sexual de padres contra crianças e considera vítimas de conspirações difamatórias seitas como Moon, Cientologia e, claro, o Opus, em cujo favor escreveu dois livros de pretensa refutação aos romances de Dan Brown).

Essa bizarra instância intelectual e seus participantes são citados nos votos de Moraes, Fachin e Toffoli. Os dois últimos e a advogada geral da União, Grace Mendonça, recorreram à sofismática distinção enunciada por Gandra Filho (e, antes, Gandra pai) entre uma laicidade reduzida à proibição de oficializar ou banir religiões e o “laicismo”, que abrangeria qualquer coisa além disso e seria uma distorção autoritária. Essa laicidade desidratada não impediria sequer o favoritismo da religião majoritária (católica), defendido por Lewandowski e Mendes.

Colocar o outro como fonte de todos os erros parece ruim para os debates democráticos, diz Romano

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Colocar o outro como fonte de todos os erros parece ruim para os debates democráticos, diz Romano

O professor de Ética e Filosofia Política da UNICAMP analisa no De Volta ‘Pra’ Casa o comentário do presidente do PT no Rio de Janeiro
Juliana Meneses Política
02/03/15 19:21 - Atualizado em 03/03/15 13:28
O cientista político Roberto Romano comenta a situação política brasileira. (Foto: Paulo Pinto/Estadão Conteúdo)
Manifestantes contra o governo Dilma e outros que realizavam um ato em defesa da Petrobrás entraram em confronto no Rio de Janeiro, o caso gerou o comentário do líder do PT no Rio de Janeiro fez um comentário negativo sobre o assunto em sua rede social. O cientista político e professor de Ética e Filosofia Política da UNICAMP, Roberto Romano, comenta no De Volta 'Pra' Casa questões da política nacional brasileira.

“Expectativa de comportamento é aquilo que permite a vida em sociedade, no estado e em suas instituições, você sabe que o outro não quer que você permaneça no poder, mas você sabe também que não pode romper com os princípios da civilidade. Você tem que respeitar no outro, a opinião e o povo que está atrás dele. Então o que ocorre hoje no Brasil, é a perda total dessa expectativa de comportamento”, ressalta Romano. Ouça a entrevista completa!

Querem um amontoado de ‘fake news’ mais terrível do que a propaganda elucidativa e informativa dos governos?

Querem um amontoado de ‘fake news’ mais terrível do que a propaganda elucidativa e informativa dos governos?

Jornal Pires Rural – Edição 207 | CAMPINAS, Dezembro de 2017 | Ano XII
A Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária, Embrapa e Unicamp realizaram o 4º Encontro Mídia e Pesquisa. Com o objetivo de discutir a importância da ética na divulgação científica para as organizações de pesquisa e o papel do jornalismo científico na era da “pós-verdade”, incentivando o debate crítico da ética na cultura científica vigente. O filósofo da Unicamp Roberto Romano trouxe o tema “Fake news ou sofística? Uma ‘descoberta’ de algo antigo”.

O conceito de má-fé, concebido por Jean Paul Sartre, permite buscar um caminho em direção a uma filosofia moral da existência. Tomando-se as premissas sobre o modo de ser do Para-si- para-outro, a liberdade é uma condenação existencial. Essa condição pode ser assumida na angústia ou encoberta na má-fé. Ao assumir a angústia, a consciência assume a sua liberdade em situação. Ao mascará-la, a consciência faz um esforço para ser o que se mostra na situação, coloca como fim a liberdade em situação frente ao outro. Justamente porque a má-fé tem consequências morais que a autenticidade deve ser preferida e buscada por meio da conversão moral.

Segundo o filósofo Romano, a má-fé se distingue fundamentalmente da mentira, o mentiroso que mente ao seu interlocutor, o indivíduo de má-fé mente para si. “Eis um paradoxo, aquele a quem se mente e aquele que mente são uma só e, mesma pessoa. O que significa que devo saber como enganador, a verdade, que é mascarada para mim enquanto sou enganado. Mas, sinteticamente devo saber essa verdade para escondê-la de mim. Me parece que esse é um dos pontos mais profundos e dos mais importantes em termos de ética individual e coletivo. Existe a má-fé individual e existe a má-fé coletivo. Eu diria que 90 por cento desse debate que fazemos do fake news / pós-verdade, se enraíza nesse ponto essencial da má-fé, que é presente praticamente em todos os seres humanos”, afirmou.

A dissimulação são atos e comportamentos que integram o campo da mentira. Na dissimulação honesta, pensa-se que a mentira e a duplicidade aumentam a renda social, a vida social e a mentira.
Há um desvio investido por Jean Jaques Rosseau, muito sério, sobretudo na internet, nas redes sociais, que é a sinceridade, que permite a verdade. “Rosseau inventou essa coisa chamada sinceridade. Quando digo tudo que sou e digo tudo o que penso dos outros, sou sincero. No livro de Rosseau, as “Confissões” (roubado de Santo Agostinho, o título), a sinceridade assim praticada é uma das piores desonestidades e agressões. Então, temos a desonestidade do sincero. Quando digo ao outro tudo o que dele penso eu mato a sua alma e não apenas o seu corpo. Quando você vai a uma reunião social seja o último a sair porque a cada vez que um sai, tudo sobre ele aparece, se estraçalha sua reputação, essas são as delícias da vida em sociedade. A violência saiu da garra e passou para a língua”, destacou Romano.

Esse lugar da não-verdade, da má -fé, foi bastante investigado e discutido e combatido por Platão. “Como sofista, essa fala persuasiva que não tem um lugar, que não é de algum lugar, é a aparência, você não trabalha com o ser, você trabalha com o que parece ser. E, aí você tem capacidade de persuadir e de decidir os destinos políticos e sociais. Essa capacidade de mentir, diz Platão, e aí começamos o problema do combate à mentira, diz ele, é preciso proibir esse tipo de prática. É preciso impedir essa prática. Pra quem vamos permitir a mentira? Apenas para o especialista em Estado. O especialista como o médico tem o direito de mentir para o bem do doente – a nobre mentira platônica. Os homens nasceram em tal e tal origem – temos que convencê-los de que eles têm uma origem comum. O dr. pergunta, ninguém vai acreditar nessa bobagem, né! Sófocles diz, na primeira vez, talvez não, na segunda também não mas, na terceira vez já começam a acreditar”, explicitou Romano.
Sempre que se espalha algo via internet, a mentira, apela-se para o democrático. Romano lembra que já na instalação da democracia grega, estava em debate e foi motivo de proibição a livre expressão. “Eu posso falar o que eu quero. Eu posso ser sincero, porque eu tenho o direito de ser livre e dane-se aquela pessoa que foi destruída pela minha fala. Em cima desse direito e dessa curiosidade sobre a vida alheia universal e essa destruição do outro, o gosto e o prazer pervertido de fazer o mal, que está presente em todos os seres humanos; só deles são livres os hipócritas. Em cima dessa situação você tem os diagnósticos sobre a opinião pública. O povo não tem maturidade para o verdadeiro. Para exercer a palavra com peso, portanto, só lhe cabe a persuasão – não tem nenhuma condição de se dirigir ao outro a não ser persuasivamente”, disse.

Romano continua definindo a capacidade do povo para a verdade destacando – o que muitas vezes o mesmo é definido como um elemento infantil, curioso, falador, perigoso; e essa definição nutriu o pensamento totalitário do século XX. “Hitler dizia que o ser feminino que são as massas só podem ter acesso a condução e persuasão. Em cima dessa tese tão espalhada, um dos juristas mais importantes do Reich (Terceiro) Carl Schimitt – aí vem a minha preocupação particular, porque hoje é louvado e encantado por setores da esquerda mundial e brasileira – isso é um paradoxo porque ele faz uma crítica do sistema parlamentar e por isso ele seria legal. Mas esse sr. sabia o que estava falando. Na era da comunicação de massa, na era da tecnologia da comunicação de massa ele já estava pensando em rádio e televisão. Cabe ao governo o controle absoluto dessa comunicação. Cabe ao governo, efetivamente, não permitir liberalismos. É necessário utilizar a comunicação como um instrumento de persuasão e de imposição de Estado. A partir daí, nós temos uma fábrica de fake news muito bem examinado por exemplo, Víctor Klemperer (na linguagem do terceiro Reich), o mesmo criou uma série de linguagens. inclusive do ponto de vista gráfico, algo que é muito comum na imprensa brasileira hoje, quando se trata de atacar o inimigo, o uso das aspas. O fulano é filósofo entrega aspas, democrata entre aspas. Esses usos dessas linguagens de imposição e de destruição do outro se torna monopólio de Estado”, pontuou.

Romano, vai além na sua explanação e nos traz à consciência a propaganda enganosa que o Estado produz com o dinheiro público. “Eu não exageraria ao lembrar aos senhores que o Brasil tem uma fábrica, que vem de longa data, de produção de fake news, de propaganda persuasiva e de imposição de força através da propaganda. E, foram retomados pelo governo de 1964 e que estão presentes até hoje. Me perdoem, mas querem um amontoado de fake news mais terrível do que a propaganda elucidativa e informativa dos governos? Basta ver a televisão e o jornal, a notícia de interesse público. Na verdade nós temos aí uma intervenção cotidiana com bilhões aplicados para a imposição de mentiras e essas mentiras dão muito dinheiro e dão muito poder”, afirmou Romano.

Para Romano o conceito de fake news, pós-verdade, vêm de três mil e quinhentos anos de história e de debate sobre logos e pseudos, ou seja, aquilo que você fala pra enganar e aquilo que você fala pra tentar dizer o verdadeiro. “Eu terminaria a minha fala com um autor que foi muito utilizado pelos nazistas mas, que em certos momentos toca no vivo da questão política, da questão ética e da questão epistemológica do problema da verdade. Por que eu digo isso? Porque mal surgiu esse conceito do pós-verdade, mal surgiu essa palavra do fake news e imediatamente aquele Estado brasileiro que desde o império tem técnicas de controle e de imposição está preparando uma comissão para impedir as fakes news nas redes sociais durante as eleições de 2018. Está tudo pronto para que a Abin e todas as marcas de repressão do Estado brasileira estão presentes, Forças Armadas, com certeza a Polícia Civil, a Polícia Técnica – todo um sistema que já existe que vai estar presente para produzir e reproduzir a fake news no Estado brasileiro. As eleições, será toda ela um conjunto de fake news. E vai ganhar independentemente quem tiver o apoio desse grande instrumento de mentira”, revelou.