Um Blog destinado a discutir assuntos de ordem institucional, política, ética, longe do inferno definido nas supostas redes sociais, onde a covardia, a irresponsabilidade, o ressentimento e todas as paixões baixas se manifestam. Aqui, procuro pensar, sem ferir ou humilhar ninguém. Na internet, sobretudo nas mentirosas páginas "sociais", encontramos a besta fera descrita por Platão (Rep.. 588c): θηρίου ποικίλου καὶ πολυκεφάλου. Lúcido Platão!
Peritos concluem que Neruda não morreu de câncer e teoria sobre envenenamento ganha força
Relatório realizado por especialistas estrangeiros foi divulgado na noite desta sexta-feira, 20
O Estado de S. Paulo
21 Outubro 2017 | 13h49
Um grupo de 16 especialistas internacionais convocados pela
justiça chilena concluiu, nesta sexta-feira, que o poeta e prêmio Nobel
de Literatura Pablo Neruda não morreu devido a um câncer, como consta em
sua certidão de óbito, pouco depois do golpe militar de 1973.
"É rotundamente e 100% certo que a certidão (de óbito)
não reflete a realidade do falecimento", afirmou o médico Aurelio Luna
em coletiva de imprensa.
O comitê de
peritos médicos entregou nesta sexta-feira, 20, o relatório sobre a
análise da causa de morte do poeta Pablo Neruda, que poderia ter sido
envenenado pela ditadura chilena. O poeta faleceu numa clínica de
Santiago em 23 de setembro de 1973, apenas 12 dias depois da tomada pelo
poder do ditador Augusto Pinochet.
A
certidão de óbito consta que Neruda morreu devido ao agravamento de seu
câncer de próstata, às vésperas da viagem que consolidaria seu exílio
no México. Especialistas do Canadá, Dinamarca, Estados Unidos, Espanha e
Chile foram convocados para averiguar se o poeta teria sofrido alguma
espécie de intoxicação através da administração de germes ou toxinas
bacterianas."Os especialistas estão trabalhando arduamente e achamos
que vai ser um bom relatório que vai ter coisas inéditas", disse
Rodolfo Reyes, sobrinho do escritor em entrevista à AFP, antes da
conclusão ser divulgada. Ainda que tenha levantado suspeitas à época, os rumores
de envenenamento só vieram à tona em 2011, com a publicação de
declarações do motorista e assistente pessoal de Neruda, Manuel Araya,
que afirmou que o poeta piorou depois que lhe aplicaram uma injeção no
abdome. "É preciso ser muito prudentes e pensar que estamos
analisando amostras degradadas com uma antiguidade significativa, e que
isso sempre vai significar uma limitação às possíveis conclusões
obtidas" disse Aurelio Luna Maldonado, especialista da Universidade de
Murcia, que estima haver entre 20% e 25% de chances da resolução do
mistério sobre as circunstâncias da morte do escritor.Perícias de 2013 foram inconclusivas sobre o
envenenamento de Neruda, entretanto com o prosseguimento dos testes
foram encontrados rastros de estafilococo dourado (Staphylococcus
aureus) nos restos mortais, uma bactéria altamente infecciosa e letal. A
clínica Santa María, onde o poeta faleceu, conta ainda com outra morte
duvidosa, a do ex-presidente Eduardo Frei Montalva, que teria sido
envenenado por agentes da ditadura em 1982.Neruda era um dos principais políticos comunistas do
país e contava com grande apoio popular, podendo se tratar de um grande
empecílio à ditadura chilena.
Reginaldo Carmello Corrêa de Moraes
é professor aposentado, colaborador na pós-graduação em Ciência
Política do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas (IFCH) da Unicamp.
É também coordenador de Difusão do Instituto Nacional de Ciência e
Tecnologia para Estudos sobre Estados Unidos (INCT-Ineu). Seus livros
mais recentes são: “O Peso do Estado na Pátria do Mercado – Estados
Unidos como país em desenvolvimento” (2014) e “Educação Superior nos
Estados Unidos – História e Estrutura” (2015), ambos pela Editora da
Unesp.
Em 1729, Jonathan Swift publicava sua Modesta Proposta Para Evitar Que As Crianças Da Irlanda Sejam Um Fardo Para Os Seus Pais Ou Para Seu País.
Faz alguns anos, a Editora Unesp me convidou a escrever um prefácio à
edição brasileira do livrinho, uma peça imperdível do escritor irlandês.
A “solução” de Swift é conhecida, um humor
macabro, agressivo. A ideia de transformar as crianças pobres em
alimento é de chocar as boas almas. Parafraseando a frase de Marx sobre a
religião, é um grito do espírito em um mundo sem espírito.
Volta e meia nos damos conta de que nos
faltam alguns Swifts. Ou, então, que nem mesmo com milhares de Switfs
conseguiríamos dar conta do que nos oferecem as propostas nada fictícias
geradas por mentes criativas como a do alcaide paulistano. A última
invenção do jovem sexagenário é a comida de astronauta produzida a
partir de alimentos em vésperas de virar lixo. Sim, a ideia é “agregar”
alimentos de supermercados, com data de validade em cima da risca. E
desse agregado produzir pacotes de granulados a servir como ração para
os famintos da grande cidade, incluindo os estudantes, com merenda
escolar “reforçada” pelo preparado. Os protótipos de alimento foram
fornecidos para teste por uma empresa um tanto estranha, que não tem
fábrica nem parece ter condições de ter – ela própria “agrega” serviços
de outros fabricantes. Uma outra invenção, quem sabe candidata à
inserção no cadastro de fornecedores da prefeitura. Analisada a forma de
implementação da política, chega-se à conclusão de que será, de fato,
um grande negócio. Os fornecedores dos alimentos “quase invendíveis”
deixariam de perder esse saldo. E, mais ainda, teriam incentivos
fiscais. Ganham em dobro. Um achado.
A ideia parece original – talvez seja. Não
quer dizer que mereça um prêmio por isso. Mas devemos reconhecer que é
criativa. Não me refiro à criatividade dos tecnólogos que inventaram o
produto e o processo, a tal farinata. Talvez sejam, mesmo, engenhosos.
Talvez alguns deles tenham a melhor das intenções. Sempre existe a
tentação de utilizar a ciência e a tecnologia como um atalho ou
alternativa ao enfrentamento de problemas sociais que buscamos abafar. E
aí os inventos excêntricos se multiplicam. Às vezes de modo sofisticado
e “sério”, claro.
O
que a proposta evidencia, de modo bem criativo, é um modo de encarar a
existência dos “carentes” aos quais se destinaria o engenho. Eles não
comem, eles são supridos de fontes energéticas. Melhor isso do que nada,
diz o secretário do prefeito, com certa lógica. Mais clara ainda foi a
frase do próprio alcaide: “Você acha que gente humilde, pobre, miserável vai ter hábito alimentar? Se ele se alimentar, tem que dizer graças a Deus”.
Essa lógica – um modo peculiar de olhar o
andar de baixo da sociedade – tem história, tem seus momentos. Vejamos
alguns, apenas alguns exemplos, que recolhi de minha apresentação ao
texto de Swift.
No século XIX, diante da polêmica sobre o trabalho
infantil, as chamadas classes proprietárias alardeavam, alegando base
científica, que a eliminação dessa prática destruiria a economia
inglesa, física e moralmente. Na mesma época, no Brasil, os donos de
escravos previam o caos se e quando a abolição “rompesse os contratos” e
agredisse seus “direitos adquiridos” quanto a negros, negras e
respectivas proles, atuais ou em gestação. No sul dos Estados Unidos,
fazendas negreiras eram montadas, para reproduzir esse insumo
fundamental. Um pouco mais tarde, no esplendor do Terceiro Reich, o
Vorstand (Conselho de Administração) da IG Faberben e as SS discutiam
seriamente como liquidar judeus e eslavos com o menor custo e “esgotar”
os trabalhadores em ritmos adequados à produção.
Será que as mentes criativas não conseguem produzir
solução melhor para a fome? Alguma que, por exemplo, não agrida a
autoestima do chamado público-alvo? Que não reduza a alegria de viver (e
de comer!) à ingestão de energéticos consumidos “até por astronautas”,
como diz o elegante prefeito em sua turnê romana.
De fato, numerosos estudos, em diferentes campos da
ciência, garantem, sim, que as crianças que não recebem calorias e
proteínas necessárias, durante as últimas semanas intra-uterinas e os
primeiros meses após o nascimento, ficarão mentalmente prejudicadas de
forma duradoura: as “pilhas” do cérebro não irão manter o “setup” da
memória e da inteligência. Elas tendem a se transformar em adultos
apáticos. A degradação trará alguma perda para o mundo produtivo –
aceitável desde que sejam peças sobrantes. Mas, por outro lado, talvez
os apáticos um dia esperneiem. Keynes certa vez fez uma profecia
terrível em seu Consequências Econômicas da Paz (1919):.
"A privação econômica avança por fases lentas
e, enquanto os homens a suportam pacientemente, o mundo exterior pouco
se importa. A eficiência física e a resistência à doença diminuem
vagarosamente, mas, de alguma forma, a vida continua até o limite da
resistência humana, até que os conselhos do desespero e da loucura
afastem as vítimas da letargia que precede as crises. Então, o homem se
abala e afrouxam‑se as relações estabelecidas. O poder das ideias
torna‑se soberano e os homens passam a dar ouvidos a quaisquer promessas
transmitidas pelo ar (...)
"nem sempre os homens morrerão em silêncio.
Isto porque, se a fome leva alguns à letargia e ao desânimo
irremediável, ela conduz outros temperamentos à nervosa instabilidade da
histeria e a um louco desespero. Em seu sofrimento, estes podem
derrubar o que resta de organização, e afogar a civilização em suas
desesperadas tentativas de satisfazer as prementes necessidades
individuais."
Nosso poeta João Cabral, descrevia de outro modo o
homem reduzido e abreviado produzido pela fome: ele “está aquém do
homem, ao menos capaz de roer os ossos do ofício; capaz de sangrar na
praça; capaz de gritar se a moenda lhe mastiga o braço, capaz de ter a
vida mastigada e não apenas dissolvida”.
Não é dessa escola que vêm os pensamentos do alcaide. Bons cabritos: não berram – parece ser esse o lema ou expectativa da “farinata” engendrada nos misteriosos laboratórios da empresa.
Recentemente tivemos um caso doloroso e ainda
abafado, o desvio de recursos da merenda infantil. Agora, a cozinha dos
pobres é revisitada por mãos estranhas e ágeis. Já se assemelha a um
padrão, quase um fetiche.
Um dos males deste nosso mundo é que nos
acostumamos rapidamente a um “novo normal” que até ontem era impensável.
Precisamos, de vez em quando, de alguns choques, para pensar pelo
avesso, já que o mundo está direitinho demais para estar certo.
Direitinho como um suéter rosa, jogado sobre os ombros com estudada
indiferença.
Meu trabalho é exaustivo, mas não é escravo, diz Gilmar Mendes
Ministro
do STF admite que não leu nova portaria, mas afirma que assunto,
'polêmico, não deve ser partidarizado nem ideologizado'
Rafael Moraes Moura e
Breno Pires,
O Estado de S.Paulo
19 Outubro 2017 | 10h59
BRASÍLIA - Em meio à polêmica com a publicação de uma portaria que modifica as regras de combate ao trabalho escravo, o presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ministro Gilmar Mendes, disse nesta quinta-feira, 19, que o tema é polêmico, mas que deve ser tratado sem partidarizações ou ideologizações.
João Doria e arcebispo de São Paulo: “Pobre não tem hábito alimentar, pobre tem fome”
Revista ihu on-line
19 Outubro 2017
O prefeito de São Paulo, João Doria (PSDB), voltou a apresentar nesta quarta-feira a farinata,
uma espécie de farinha composta por alimentos próximos de sua data de
validade ou que não seguem os padrões de comercialização, como
carro-chefe de um programa municipal. Dessa vez, o prefeito afirma que
ela será incluída na merenda das crianças em escolas e creches públicas e
nas refeições dos centros de acolhida de moradores em situação de rua.
O objetivo, segundo explicou, é evitar o desperdício de alimentos que
ainda são próprios para o consumo e complementar — e não substituir — os
alimentos in natura.
A reportagem é de Felipe Betim e publicada por El País, 18-10-2017.
O prefeito já havia divulgado, no último dia 8 de outubro, uma espécie de biscoito feito de farinata
que seria usado em um programa para erradicar a fome em São Paulo e
distribuído para famílias de baixa renda. O produto ficou então
conhecido como "ração humana",
foi alvo de críticas de diversos especialistas e nutricionistas e,
devido à discussão gerada, ajudou a viralizar nas redes sociais um vídeo
do prefeito gravado em 2007, época em que ele apresentava o programa de
TV O aprendiz. Nele, Doria afirma que "gente humilde" não possui "hábito alimentar" e "tem que dizer graças a Deus" caso possa comer.
Presente na entrevista coletiva, o cardeal dom Odilo Scherer, arcebispo de São Paulo,
buscou amenizar as palavras do prefeito: "Pobre tem fome. Hábito
alimentar é para quem tem disponibilidade de alimento e quem pode se dar
ao luxo de ter uma alimentação regular, refeições regulares, alimentos
selecionados. O pobre não tem isso (...). Quem se arrasta no chão por fome,
eu vou deixar de atender a fome dele porque ele não está podendo sentar
numa mesa bem posta? A necessidade é socorrer primeiramente a fome do
pobre".
Doria disse não se lembrar do vídeo, mas corroborou a afirmação de Scherer
e voltou a dizer: "Pobre não tem hábito alimentar, pobre tem fome". A
Prefeitura não apresentou qualquer dado sobre quantas pessoas de fato se
encontraram nesta situação na cidade ou quais são as metas de seu
programa de erradicação da fome.
Proprietária da Plataforma Sinergia, que detém a patente da farinata, Rosana Perrotti esclareceu
durante entrevista que seu produto pode ser usado não apenas no
polêmico biscoito, mas também na fabricação de bolos e pães ou para
reforçar sopas. A ideia é que seja utilizada na cozinha de centros de
acolhida e escolas para a fabricação de alimentos. Doria garante que a distribuição na rede de ensino começará ainda em outubro.
Entretanto, a secretária municipal de Direitos Humanos, Eloisa Arruda,
admitiu que ainda precisa fazer estudos sobre as demandas nutricionais
dos alunos e a forma que seria distribuído. "Teremos um diagnóstico das
carências nutricionais da população. Isso será feito de forma paulatina,
quem vai fazer isso é o Observatório de Políticas para o Desenvolvimento Social,
que está alocado na secretaria de Desenvolvimento Social. Quando o
prefeito fala das creches, é possível que alimentos que hoje são
fornecidos, como bolacha ou macarrão, sejam substituídos pela farinata
já disponível. Ao lado dessa introdução na merenda nós desenvolveremos
um estudo sobre as carências nutricionais da população em São Paulo", disse.
Perrotti garante que todos os nutrientes dos
alimentos são preservados — uma afirmação que vem sendo contestada por
diversos nutricionistas — e que sua vida útil pode ser prolongada por
mais dois anos. Isso ocorre após a comida passar por processos como o de
liofilização, ou desidratação, considerado caro e demorado pela
indústria. Mas a proprietária da Sinergia, ligada à Igreja Católica, não soube explicar os custos envolvidos para a fabricação da farinata.
Limitou-se a explicar que o programa seria custeado pelas próprias
empresas — supermercados, produtores, entre outros —, que hoje gastam
muito mais com o descarte de alimentos
e custos de logística. "O processo de descarte custa 750 bilhões de
dólares para a economia global. Nós vamos reduzir esses custos ao
operacionalizar a farinata", explicou. "Vamos colocar tecnologias em
cima de carretas, como já fizemos, para poder processar dentro da
indústria, do armazém, ou fundo de supermercado. E isso vai ser bancado
pela própria empresa, que vai diminuir os custos com logística",
acrescentou. Também disse: "Como vamos conseguir produzir em escala para
acabar com a fome?
Somente através de políticas públicas, somente através de lei. A gente
não pode abrir essa tecnologia para uma, duas, três toneladas. A gente
está falando aqui de muito volume de alimento".
Apesar de não estar claro os custos de todo o processo — não apenas
de produção, mas também de armazenagem e distribuição, por exemplo —,
tanto Doria como Perrotti asseguraram que a Prefeitura não desembolsará recursos próprios e que a farinata será repassada de graça para a administração pública. No entanto, uma lei recentemente sancionada por Doria
prevê isenção de impostos para as empresas que doem seus alimentos
prestes a vencer. Questionado, o prefeito frisou que se trata de uma
recomendação e que sua gestão não abrirá mão do dinheiro arrecadado via
impostos para apoiar as companhias que participem do programa.
Salvação do ex-candidato presidencial, alvo de nove
inquéritos, marca nova fase no embate entre Lava Jato e mundo político,
com o Congresso com a palavra final. "Porteira foi aberta para a
impunidade", diz especialista.
Há cinco meses, Aécio, que recebeu 51 milhões de votos nas eleições de 2014, parecia ter chegado ao fim a linha
Pela segunda vez em menos de três meses, um político brasileiro
influente encrencado com a Justiça foi salvo pelos seus pares. Em
agosto, a Câmara enterrou a primeira denúncia contra o presidente Michel
Temer. Desta vez, coube ao Senado seguir o mesmo caminho ao salvar o
tucano Aécio Neves, alvo de nove inquéritos e contra quem pesava uma
ordem de afastamento determinada pela 1º Turma do Supremo.
Por 44 votos contra 26, a Casa decidiu que o tucano deve reassumir seu mandato. O caso Aécio marca um divisor de águas no embate entre a Operação Lava Jato e o mundo político. O quadro começou a ser desenhado na semana passada,
quando o plenário do Supremo contrariou a decisão da sua turma e
determinou que cabe ao Congresso ter a palavra final sobre a manutenção
do mandato. O evento apontou o fim da possibilidade de novos episódios
como o afastamento do ex-deputado Eduardo Cunha, determinado exclusivamente pela Justiça.
"Ao
recuar dessa maneira, o STF voltou ao papel tradicional de tribunal
político, no pior sentido, tal como ocorreu nos anos 30 e na ditadura. A
porteira foi aberta para a impunidade”, afirma Roberto Romano,
professor de ética da Unicamp.
E, no seu primeiro teste para
decidir se decisões de turmas do STF devem ser ou não acatadas, uma das
Casas do Congresso mostrou o que está disposta a fazer com esse poder,
especialmente quando o político alvo de acusações graves ainda detém
influência. Presidente do PSDB, Aécio foi o principal fiador da entrada
do partido no governo Temer. Nos bastidores, o Planalto trabalhou para
que os senadores do PMDB votassem a favor do tucano.
Inconsistência
O
caso Aécio também contrastou com o do ex-senador Delcídio do Amaral. No
final de 2015, 59 senadores votaram a favor da manutenção da prisão do
então senador, que era filiado ao PT. Desta vez, os membros do Senado
explicitaram que seus votos variam de acordo com a pessoa que está
sofrendo as acusações e suas cores partidárias.
Vinte e nove que
haviam votado contra o petista decidiram na terça se posicionar a favor
de Aécio. Outros seis, todos do PT, que haviam votado pela revogação da
prisão do seu então colega de partido, desta vez votaram pelo
afastamento de Aécio.
"Os senadores estão subvertendo a
instituição, cometendo um crime continuado, foi a mais deslavada
operação para legislar em causa própria”, diz Romano.
Entre os
senadores que votaram para salvar Aécio, 17 figuras estão na mira da
Lava Jato, como Romero Jucá (PMDB-RR) e Fernando Collor (PTC-AL). Ao
todo 28 senadores alvos de inquéritos no STF votaram a favor do tucano.
"O
corporativismo instalado estabelece como regra a defesa dos seus
integrantes e não a defesa da instituição. Aqui mora o corporativismo",
lamentou o senador Alvaro Dias (Podemos-PR), que votou pelo afastamento
de Aécio.
Impunidade
Com a decisão do
Senado, resta aos adversários de Aécio apresentarem um pedido de
cassação por quebra de decoro. Mas é improvável que esse caminho seja
bem-sucedido. Entre os senadores que votaram a favor de Aécio estava
João Alberto Souza (PMDB-MA), justamente o presidente do Conselho de
Ética do Senado.
Assistir ao vídeo01:39
Os países mais corruptos do mundo
Como
chefe da comissão, cabe exclusivamente a Alberto determinar se alguma
representação deve ser submetida ao conselho. Em junho, no auge do
escândalo dos grampos da JBS, ele decidiu de maneira solitária indeferir
um pedido de cassação contra Aécio apresentado pelo PSOL e pela Rede.
"A
tendência é só piorar. Vai ser praticamente impossível o STF recuperar
sua influência. Casos como o de Aécio tendem a se repetir em todos os
três níveis, do vereador ao deputado federal”, disse Romano.
Em
outra frente, o governo vem atuando para influenciar o STF a rever a
decisão que determinou o início do cumprimento de pena em regime fechado
para condenados em segunda instância. Tomada em outubro de 2016, a
decisão do Supremo foi encarada pelos membros da Lava Jato como um das
conquistas da operação.
O ministro Gilmar Mendes, por exemplo, já
indicou que deve mudar seu entendimento sobre a decisão, invertendo o
placar de 6 a 5 pela execução das penas após a segunda instância.
"Se
o STF modificar o entendimento atual (...) nem Lula nem Cunha irão
presos. Esta é a atual batalha que a Lava Jato enfrenta, e talvez a
maior de todas", disse o procurador Carlos Fernando Dos Santos Lima,
membro da força-tarefa da Lava Jato em Curitiba.
Renascido das cinzas
Há
cinco meses, Aécio, que recebeu 51 milhões de votos nas eleições
presidenciais de 2014, parecia ter chegado ao fim a linha. Em maio,
gravações divulgadas por Joesley Batista revelaram que o senador pediu
dois milhões de reais ao empresário, mesmo depois das revelações do caso
Odebrecht. Aécio também afirmou que estava "trabalhando como um louco"
para aprovar uma anistia ao caixa dois no Congresso.
As gravações
também revelaram outros aspectos sobre o caráter do senador. Autor do
pedido de anulação da chapa Dilma-Temer nas eleições em 2014, que
contribuiu para o clima de confronto do Congresso, Aécio foi flagrado
nos grampos afirmando que a representação foi feita apenas para "encher o
saco".
No dia seguinte, agentes da Polícia Federal reviraram
várias propriedades do Senador. Andrea Neves, irmã e colaboradora
política do senador, acabou sendo presa. Um primo também foi detido. A
Procuradoria-Geral da República pediu ao STF a prisão do tucano, mas o
ministro Edson Fachin, relator da Lava Jato, entendeu que ele só poderia
ser detido em flagrante, e se limitou a afastar o tucano das suas
funções.
A partir daí, começou a costura para salvar Aécio. No
final de maio, o ministro Marco Aurélio decidiu devolver o mandato do
tucano. Em junho, foi a vez de o Conselho de Ética do Senado arquivar o
pedido de cassação. No mesmo período, um dos inquéritos contra o Senador
foi sorteado para o ministro Gilmar Mendes, a quem Aécio pediu ajuda
para influenciar na aprovação de um projeto contra abuso de autoridade
que mirava na atuação de juízes e procuradores.
Em setembro, um
revés temporário: a 1º turma do STF aceitou um novo pedido de
afastamento e determinou que o senador tivesse que ficar em recolhimento
noturno em sua casa. Dias depois, o plenário do STF deu novo fôlego ao
tucano ao determinar que seu futuro fosse decidido pelos seus colegas no
Senado.
Capítulos do desgaste político do governo
Relator recomenda rejeição da 2ª denúncia
10/10:
O deputado Bonifácio de Andrada (PSDB), relator da segunda denúncia
envolvendo Temer, recomendeu em seu parecer o arquivamento da acusação,
que ainda envolve os ministros Moreira Franco (foto) e Eliseu Padilha. O
relatório segue para votação na Comissão de Constituição e Justiça
(CCJ) da Câmara e, depois, para o plenário. O relator alegou falta de
credibilidade das delações.
Peter Schulz foi professor do Instituto de Física "Gleb Wataghin"
(IFGW) da Unicamp durante 20 anos. Atualmente é professor titular da
Faculdade de Ciências Aplicadas (FCA) da Unicamp, em Limeira. Além de
artigos em periódicos especializados em Física e Cienciometria,
dedica-se à divulgação científica e ao estudo de aspectos da
interdisciplinaridade. Publicou o livro “A encruzilhada da
nanotecnologia – inovação, tecnologia e riscos” (Vieira & Lent,
2009) e foi curador da exposição “Tão longe, tão perto – as
telecomunicações e a sociedade”, no Museu de Arte Brasileira – FAAP, São
Paulo (2010).
No
começo dos anos 1990, passeando pela seção de painéis de um encontro de
física, chamou a minha atenção um trabalho sobre estatística de
distribuição níveis de energia em um cristal. Bem, não é importante aqui
o assunto, não se preocupem, o tema é outro. Perguntei ao colega que
estava apresentando o painel sobre essa estatística e a resposta foi que
ele fizera os cálculos dos níveis de energia, não sabia interpretá-los e
quem poderia responder a minha pergunta era o outro autor, que não
estava presente. Conheci tempos depois esse colega e aprendi com ele
sobre essa estatística de níveis, que acabei usando em alguns trabalhos
já nesse século. Mas não foi por isso que nunca esqueci o episódio e sim
pela questão que era inescapável: o que significava ser autor de um
trabalho sem ter autoridade sobre todo o seu conteúdo? (É preciso dizer
que os dois neste "causo" tornaram-se bons cientistas). Lembro aqui que autor e autoridade são palavras com
a mesma origem. Na época o desconforto que a questão suscitou foi
aplacado pela lembrança de uma prática internalizada na comunidade
científica a qual pertencia. Experimentos importantes são realizados por
diferentes grupos utilizando amostras sofisticadas obtidas em poucos
laboratórios. O uso dessas amostras configura um tipo de colaboração
comum e os artigos resultantes dessas colaborações sempre têm o produtor
das amostras como autor. Faz parte do paradigma da comunidade a
percepção clara da função específica daquele autor na lista de autores.
A autoridade dele é sobre a amostra e não sobre a pesquisa resultante
em si. Então, inicialmente: o que é um autor? Olhando a ciência a
partir das bases de dados, autor é todo aquele que assina um artigo
indexado. Hoje
a maioria dos artigos são multiautorais, muitos com dez, quinze ou mais
autores em várias áreas das ciências naturais. Nas bases de dados todos
eles recebem automaticamente uma citação a mais, quando o artigo em
questão é citado. Mas qual é a função de cada um dos autores? Será que a
função (contribuição) de um dado autor merece a citação que ele
automaticamente recebe? O problema passou a ser parcialmente abordado
por algumas revistas, que pedem a descrição do papel de cada autor no
artigo publicado. Mas a coisa foi se complicando. Jason Osborne e
Abigail Holland abordam a questão em um artigo com o interessante título
“O que é autoria e o que deveria ser?” [I],
começando pela enunciação de dois extremos. Por um lado mencionam um
artigo relatando um estudo clínico internacional com mais de 900
autores. Relativamente poucos, perto da outra menção: os quase 3000
autores que assinam um artigo sobre a detecção do bóson de Higgs (a tal
partícula de deus). Por outro lado, lembram o inventário de autores
impossivelmente produtivos com 32 ou mais artigos por ano: um artigo a
cada semana e meia. Meu antigo supervisor de pós-doutorado é um prêmio
Nobel e, vasculhando outro dia seu currículo, descobri que seu recorde
era (na virada do século) assinar 10 artigos científicos por ano, mesmo
tendo um departamento inteiro à sua disposição (não só
administrativamente, mas academicamente). Em um exercício de etnografia
por memória posso dizer que ele tinha autoridade sobre a construção do
conteúdo, a articulação e consistência das várias partes desse conteúdo
e, finalmente, sua textualização: ele assinava e era de fato o autor com
autoridade sobre o artigo como um todo. Desconfio da possibilidade de
autorias com essas características para uma produtividade anual muito
acima disso. A percepção é de que as diretrizes de avaliação acadêmica
incentivam essa hiperautoria, bem como antecipam no tempo os autores. Há
50 anos esperava-se que um físico começasse a ser autor no final do
doutorado. Na virada do século passou a ser quase mandatório que o
mestrando assinasse um artigo científico. Hoje é comum que alunos de
graduação sejam autores. O que tal precocidade acarreta? “O que é um autor?” é o nome de uma conferência de
Michel Foucault de 1969, mas o filósofo francês não estava considerando a
autoria científica, mas que nessas últimas décadas passou a ter
relevância crescente. Um sintoma dessa relevância, além das perguntas
que coloco acima, é o final do título do artigo de Osborne e Holland,
que menciono acima: “um levantamento de orientações proeminentes para
determinar a autoria em publicações científicas”. De um ponto de vista
mais denso, recomendo o livro “Autoria científica – crédito e
propriedade intelectual na ciência”, organizado por Mario Biagioli e
Peter Galison [II].
O livro divide-se em três partes: a emergência da autoria, os limites
da autoria e a fragmentação da autoria. Anuncia-se assim o que, pensando
bem, não seria inesperado: se o artigo científico foi se modificando
com o tempo, por que não o próprio significado de sua autoria? A
emergência refere-se à delimitação ainda no período moderno de quem
poderia ser considerado um autor científico, ou seja, um cientista. Os
limites da autoria referem-se a questões mais contemporâneas como a
relação do autor científico com outros atores não acadêmicos. O exemplo
mais simples, ainda que não tão instigante, é o conflito entre o
interesse do cientista em publicar e a exigência de sigilo por questões
de propriedade intelectual de quem financia a pesquisa. Outro é a
relação entre o cânone do conhecimento científico e conhecimentos
nativos. A fragmentação da autoria é dedicada em grande parte à
multiautoria, com a qual me ocupei no início dessa coluna. Um dos
capítulos, de Peter Galison, é de acesso livre: “O autor coletivo” [III].
Esse autor coletivo é a “colaboração” em si, que envolve, por exemplo,
os quase 3000 autores do trabalho mencionado por Osborne e Holland. Essa
imensa lista de autores é como um abaixo-assinado que valida a
reivindicação de conhecimento obtido pela “colaboração” declarada no
artigo. É parte de uma institucionalização da ciência característica de
um clube pequeno de instituições como o CERN (Centro Europeu de Pesquisa
Nuclear), cuja história fica para outra hora. Por agora interessam as
questões levantadas por Galison na construção de seus argumentos e que
se aplicam às multiautorias menos numerosas. Novamente: em uma
multiautoria qual é a função de cada autor? Se cada autor tem uma função
diferente, quem tem visão geral do trabalho e pode responder pela
consistência do artigo e o conhecimento que este reivindica (como o meu
antigo supervisor no exemplo mais acima)? Ou seja, de todos os autores
que levam crédito igualmente nas citações registradas nas bases de
dados, quem constrói de fato uma apercepção acerca do artigo que assina?
A apercepção é um ingrediente fundamental na formação e na prática do
cientista e não pode ser acelerada.
Última pergunta dado o andar da carruagem: que ciência estamos fazendo e que cientistas estamos formando?
[I] ‘What
is authorship, and what should it be? A survey of prominent guidelines
for determining authorship in scientific publications. Jason W. Osborne and Abigail Holland, Practical Assessment, Research & Evaluation, Vol 14, No 15