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sexta-feira, 24 de novembro de 2017

Roberto Romano fala sobre autonomia em evento de 50 anos do IB

Romano citou Francis Bacon, Descartes, Pascal, Leibniz, e muitos outros Romano citou Francis Bacon, Descartes, Pascal, Leibniz, e muitos outro



Roberto Romano fala sobre autonomia em evento de 50 anos do IB


O Instituto de Biologia (IB) recebeu na terça-feira, dia 21, o professor Roberto Romano da Silva, professor titular aposentado do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas (IFCH) da Unicamp. O evento “A Ética da Autonomia Universitária” integrou a programação dos 50 anos do IB e contou com apresentação do duo musical Due Doppie, do Programa SAE Ação Cultural (PRG).

Com a informalidade de um bate papo, o professor Romano destacou a autonomia como valor intrínseco à criação das primeiras universidades, delineando um panorama geral de como a intervenção de instituições como a igreja e o Estado nas universidades ao longo dos séculos XVI, XVII e XVIII atenuou a prática da autonomia nos mais diversos campi europeu. Segundo o professor, “quem fornece recursos financeiros e materiais também age no sentido de impor os curricula, os métodos de ensino, os critérios de aproveitamento e nomeação dos professores e funcionários”. Romano ressaltou que foi em resposta a tal situação que o mais significativo das ciências e da filosofia, nos século XVII e XVIII, surgiu fora e contra as universidades: “Francis Bacon, Descartes, Pascal, Leibniz, e muitos outros”, citou.

O professor Romano avaliou o pensamento crítico às universidades nos séculos XVIII e XIX, nas figuras de Denis Diderot e Kant, como central para a retomada de uma nova prática autônoma nas universidades no século XX. Foi a partir desse ponto que o professor abordou a Universidade Brasileira dos dias atuais, levantando questões como o papel da extensão e da pós-graduação pagas, os convênios com empresas públicas e particulares e a autonomia dos professores universitários para nortear a própria pesquisa. O evento acabou com Romano respondendo aos questionamentos instigados por ele nos participantes.

IB 50 Anos
As comemorações dos 50 anos do IB continuam no dia 30 de novembro, com o evento “Vincent Van Gogh: a natureza rebelde à ciência”, com o professor Renato Brolezzi. A palestra é aberta ao público e acontece na Sala da Congregação da unidade. Não é necessário fazer inscrição. Para ficar por dentro da programação, acesse a página dos 50 Anos do IB no Facebook (50anosdoIB). Conheça ainda o site comemorativo dos 50 Anos.
Romano fala em evento de 50 anos do IB
Romano fala em evento de 50 anos do IB

IB 50 Anos
As comemorações dos 50 anos do IB continuam no dia 30 de novembro, com o evento “Vincent Van Gogh: a natureza rebelde à ciência”, com o professor Renato Brolezzi. A palestra é aberta ao público e acontece na Sala da Congregação da unidade. Não é necessário fazer inscrição. Para ficar por dentro da programação, acesse a página dos 50 Anos do IB no Facebook (50anosdoIB). Conheça ainda o site comemorativo dos 50 Anos.

Roberto Romano e as fake news


Nada muda, tudo piora, enfim....



São Paulo, terça-feira, 22 de maio de 2001


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TENDÊNCIAS/DEBATES

Respeito, senhores do Parlamento! ROBERTO ROMANO

"As palavras são os rastros da razão." Este dito é de Francis Bacon, quando lutava pelo incremento do saber moderno.
Ele também gerou o célebre aforismo "knowledge and power meet in one", que entre nós se reduziu ao tolo "saber é poder". Não é isso o que pretende Bacon. Na sua idéia, os conhecimentos devem ser prestigiados pelos que mandam no Estado, para que a potência dessa instituição se amplie ao máximo. O fim da política é assegurado pela ciência, independentemente dos embustes parlamentares ou demagógicos.
Bacon iniciou, com essa premissa, a rigorosa tradição de análise lógica em falas ou escritos. Esse procedimento seguiu do século 16 à nossa época, corrigindo a distorção das palavras, o seu emprego ambíguo na retórica. Hobbes, com o cauteloso exame dos termos que denotam a paixão na política, no início do "Leviatã", seguiu a via baconiana, dando-lhe maior aprumo.
Lembranças assim atingem a nossa alma quando ouvimos políticos brasileiros torturando vocábulos técnicos da filosofia política ("razão de Estado" ,"ética da responsabilidade" e outros), dando à erística o dom de ludibriar os ignaros, envaidecendo quem julga possuir usucapião do poder e da verdade.
No Parlamento federal, lugar onde seria preciso falar em nome dos povos, verbo e decoro são frágeis. Certa feita escrevi, nesta Folha, um artigo intitulado "O prostíbulo risonho" (6/9/93). Nele eu não me referia apenas aos atos sem pudor impostos à nação, mas também às palavras, monstros sonoros emitidos na tribuna. Se, para Francis Bacon, os vocábulos marcam a razão, os impropérios de nossos parlamentares indicam descontrole grave e falta de domínio emocional.
Eles choram e insultam numa sincronia espantosa. Sua ira, para repetir o dito sábio, surge qual breve insânia. Em seus discursos, "a frase é entrecortada, as palavras são emitidas sem distinção, como se fossem lamentos ou mugidos". Esse diagnóstico vem de Sêneca ("De Ira").
Ouvindo muitas arengas no Congresso Nacional, temos a desagradável impressão, errônea talvez, de que o partido de Incitatus possui maioria parlamentar. Exemplo? Comentando a gravíssima denúncia, feita pelos mais reconhecidos juristas de nossa terra, apresentada do modo previsto na lei ao Parlamento, o líder Arthur Virgílio (PSDB-AM) criticou aquela ação e afirmou que o PT está envolvido na iniciativa.
"Eu não posso dizer que seja um partido criativo"; e conclui o "raciocínio": "De tanta ação na Justiça, eles vão acabar virando o partido "data venia'". ("Consultor Jurídico", 20/5/2001).
Peço "data venia" para a única apreciação devida desta e de outras falas: é pura grosseria mencionar assim algumas das pessoas a quem devemos boa parte das nossas conquistas democráticas; é desacato à dignidade popular. Os deputados apenas representam o cidadão e têm o dever de respeitá-lo.



Se os vocábulos marcam a razão, os impropérios de nossos parlamentares indicam falta de domínio emocional
Nomes como Gofredo da Silva Telles, impolutos, inteligentes, corajosos, sérios, recebem um mandato moral da sociedade civil, a base dos poderes políticos. No Brasil de hoje, senadores e deputados zombam das leis, debocham dos cidadãos, aceitam calados o esbulho de direitos constitucionais, sacralizam confiscos.
Dos planos econômicos aos acréscimos de taxação, como a CPMF, cujos recursos deveriam ser para a saúde pública, e a violência das punições no uso da energia, covardemente aplicadas sobre os particulares, tudo é aceito pelos representantes que não representam, mas apenas barganham com o Executivo. E mais: violam painéis de votação, difamam uma colega senadora, jogam lama na República. E ainda exigem o título de "excelência"!
Esquecem que este é apenas um empréstimo temporário; "excelente" é o povo soberano, a base única de todo o poder.
Norberto Bobbio, comentando a situação política de sua terra em 1984, dizia melancólico: "Confesso que nunca imaginei a vida italiana inquinada até este ponto, em que não sabemos se o certo é nos indignarmos pela baixa qualidade da intriga ou do grande número de pessoas que a integram, pelo despudor de quem dirige o jogo ou insensibilidade dos que o aceitaram, dentre os quais muitos são chamados, na retórica oficial, servidores do Estado ("Il potere in maschera")".
Com Berlusconi, tal fala seria ainda mais negra. No Brasil, tenho certeza, ele se calaria, pois não existem frases eloquentes o bastante para expressar a infâmia que reina no Parlamento e no Executivo. Só existe um Estado, terminava Bobbio, o da Constituição republicana. "Fora dela, só existe o anti-Estado que deve ser destruído, começando do teto e chegando, se isso é possível, aos fundamentos".
Nas próximas eleições,a cidadania brasileira lembrará a lição do grande jurista.


Roberto Romano, 55, filósofo, é professor titular de ética e filosofia política na Unicamp (Universidade Estadual de Campinas).

Fausto Macedo, O Estado de São Paulo. Ex-diretor do Arquivo Nacional é condenado por ‘cultos evangélicos’ dentro da instituição


Ex-diretor do Arquivo Nacional é condenado por ‘cultos evangélicos’ dentro da instituição

José Ricardo Marques foi sentenciado por improbidade; a 32ª Vara Federal do Rio manda o agente público devolver R$ 24 mil gastos com os eventos religiosos dentro do órgão

Luiz Vassallo
24 Novembro 2017 | 14h44
O ex-diretor do Arquivo Nacional, José Ricardo Marques foi condenado pela 32ª Vara Federal do Rio de Janeiro pelo crime de improbidade administrativa, em razão de ter promovido cultos evangélicos semanais no auditório principal da instituição, com auxílio de equipamentos e servidor do órgão.
As informações são da Procuradoria da República no Rio de Janeiro.

A decisão da Justiça Federal do Rio manda José Ricardo ressarcir o custo dos cultos, no valor de R$ 24 mil e a pagar multa de R$ 36 mil.
 
Criado em 1838, o Arquivo Nacional é uma das instituições federais mais antigas do país e tem, por Lei, a função de promover a “gestão e o recolhimento dos documentos produzidos e recebidos pelo Poder Executivo Federal, bem como preservar e facultar o acesso aos documentos sob sua guarda, e acompanhar e implementar a política nacional de arquivos”.
O Ministério Público Federal dá conta de que José Ricardo Marques foi nomeado em fevereiro de 2016, em substituição ao servidor de carreira Jaime Antunes, que tem formação na área e dirigiu a instituição por 23 anos. 
“Tão logo tomou posse no cargo, Marques indagou ao então coordenador de administração quem eram os servidores do órgão que professavam a sua crença. Em seguida, mandou chamar o grupo e disse que, daquela data em diante, eles não mais se reuniriam na área livre onde estavam habituados, mas sim no auditório principal da instituição”, diz a Procuradoria. 

Os procuradores dão conta de que o ‘coordenador de administração do órgão chegou a argumentar com Marques que um espaço multiuso, no subsolo do bloco P do Arquivo, estava sendo preparado para aulas de dança, coral e instrumentos musicais, e que as reuniões evangélicas talvez pudessem ocorrer neste local, uma vez que nele, diversamente do que ocorre com o auditório principal, não há despesas extras com ar-condicionado e energia elétrica’. 

“O Diretor da unidade, porém, recusou veemente a sugestão, dizendo que o local sugerido era um “buraco” e que jamais faria reuniões evangélicas em tal espaço”, narra o MPF. 

Os procuradores afirmam que, por determinação do diretor, os cultos evangélicos passaram então a ser realizados semanalmente no auditório principal do Arquivo, ‘com o suporte de um servidor federal destacado para operar os equipamentos de áudio e vídeo (pertencentes ao patrimônio público) usados nas oito sessões realizadas’. 

Na ação, o MPF afirma que a conduta do Diretor do Arquivo Nacional causou perda patrimonial e desvio de recursos públicos para fins privados, além de atentar contra os princípios da legalidade, imparcialidade, honestidade e lealdade às instituições. 

A Procuradoria da República destaca que o Estado Brasileiro é laico desde 1898, ‘sendo, assim, vedado a qualquer servidor utilizar bens e serviços públicos para endossar esta ou aquela crença religiosa, em detrimento da igualdade e do respeito a todas as demais crenças e não-crenças’. 

Em sentença, a 32ª Vara Federal ainda destacou que Marques mentiu à Procuradoria e orientou uma testemunha sobre o que deveria dizer quando interrogada.

Entrevista sobre os indignados de julho de 2013. A pensar. link abaixo

https://www.youtube.com/watch?v=xS2hBbF8jls&t=48s

Entrevista com o Reitor da Faculdade Zumbi dos Palmares, mais do que importante. Link abaixo

https://www.youtube.com/watch?v=b9hz8Ne-7jw&feature=youtu.be

Ética e serviço público, entrevista com Roberto Romano

https://www.youtube.com/watch?v=vFYqh_cfjfE&feature=youtu.be&list=PLU90JTu_sKGPxrhDeXp_4hZUIyrOnSM-X
  1. PC43. Ética e Serviço Público

Prof. Luiz Marques


Tarde demais para 3º C?

https://www.unicamp.br/unicamp/ju/artigos/luiz-marques/tarde-demais-para-3o-c


quinta-feira, 23 de novembro de 2017

Rede TV, entrevista de Roberto Romano sobre as fake news

https://www.youtube.com/watch?v=qWpyEQvLHiE

Radio Eldorado, Santa Catarina, programa João Paulo Messer, entrevista Roberto Romano, sobre Huck, o inefável.


60% aprova Luciano Huck para Presidência

Pesquisa divulgada pelo jornal O Estado de S. Paulo mostra apresentador liderando aprovação do público para o cargo

comment Jornalismo access_time23/11/2017 - 09:36
Fonte: Jornalismo / Rádio Eldorado - Foto: Divulgação

A Pesquisa Barômetro Político, realizada pelo Instituto Ipsos e divulgada pelo jornal O Estado de S. Paulo, mostrou que o apresentador da Rede Globo Luciano Huck lidera a aprovação do público para o cargo de Presidente da República nas eleições de 2018. Desde a última pesquisa, o nome de Huck teve um incremento de 14%, provavelmente pelo fato de quê se demonstrou apto a concorrer. O apresentador possui 32% de reprovação.

A pesquisa apresenta nomes de possíveis candidatos e questiona o público se o aprova ou não. O ex-presidente Luiz Inácio "Lula" da Silva marca 43% de aprovação e 56% de reprovação. O juiz Sérgio Moro possui 50% de avaliação positiva, o ex-presidente do Superior Tribunal Federal (STF), Joaquim Barbosa, tem 42%, Marina Silva, 35%, Geraldo Alckmin possui 24% e o Jair Messias Bolsonaro, 24%.

Quanto à reprovação, Michel Temer e Aécio Neves lideram, com 95% e 93%, respectivamente. O prefeito de São Paulo, João Dória Jr. também aparece no ranking, com 63% de avaliação negativa, seguido por Bolsonaro, com 60%.

OUÇA o que disse o professor de Ética e Filosofia da Unicamp, Roberto Romano, sobre a pesquisa, ao Programa João Paulo Messer dessa quinta-feira (23).
micÁudio da notícia
Aprovação política tem a ver com "quem fala mais fácil", afirma Romano


Relação de eleitor com candidato tem fundo afetivo


Redes sociais nas eleições




Mesmo discordando de alguns pontos, vale a pena ler e refletir.

A polarização não está nos deixando pensar

Revista ihu on-line


23 Novembro 2017
“Ser ético e combater a corrupção ou ser justo e combater a desigualdade são identidades que estão sendo politicamente mobilizadas por grupos de poder para promover projetos que nem sempre são éticos e nem sempre são socialmente justos”, escreve Pablo Ortellado, professor do curso de Gestão de Políticas Públicas da USP, em artigo publicado por Folha de S. Paulo, 22-11-2017.

Segundo ele, “à medida que a polarização avança, essas identidades estão sendo alargadas para cada vez incluir mais convicções políticas apaixonadas -agora, elas estão passando a incluir também a defesa da família, dos valores tradicionais e a punição dura aos criminosos, de um lado, e a defesa dos direitos de negros, mulheres e pessoas trans, de outro”.

Eis o artigo.

Três observações sobre a polarização política.
1) A polarização não é o processo no qual a opinião se concentra em dois pontos de vista que se negam, mas em pontos de vista que negam aquilo que acreditam que seja o ponto de vista do outro.
No Brasil de hoje, temos dois campos políticos principais: um campo que se define como "antipetista" e outro que se define como "esquerda".

O campo antipetista se vê essencialmente como anticorrupção (o PT sendo o caso mais extremo da corrupção que tomou o Estado brasileiro) e o campo da esquerda se vê como o guardião da justiça social.

O antipetismo nega, assim, o que acha que é a esquerda: um campo que defende a corrupção. Já a esquerda nega aquilo que acha que o antipetismo é, a despeito do que diz: uma corrente que traveste de anticorrupção sua ojeriza à ascensão social dos mais pobres.

O antipetismo se vê como anticorrupção, mas é visto como socialmente insensível. A esquerda se vê como defensora da justiça social, mas é vista como corrupta. Cada um se define não pela negação do outro, mas pela negação daquilo que acha que o outro é.

2) A polarização não é apenas a concentração da opinião em pontos de vista opostos, mas o alinhamento dessas posições.

A polarização produz a adoção de posições interligadas, isto é, quando determinado campo político toma uma posição, o campo adversário automaticamente toma posição no sentido contrário, produzindo pares de oposições perfiladas.

Quando os antipetistas abraçaram a luta anticorrupção como pauta central, a esquerda, em reação, adotou a tese contrária de que a luta contra a corrupção era uma superficialidade tola, já que os vínculos entre o poder público e as empresas seriam inerentes à sociedade capitalista.

Do outro lado, tão logo a esquerda tomou o Bolsa Família como uma política social exemplar, os antipetistas passaram a vê-lo como um programa assistencialista que manteria os mais pobres em uma condição estrutural de dependência do Estado.

A mesma coisa aconteceu quando o antipetismo se colocou contra a arte elitista irresponsável que expunha crianças à obscenidade e à perversão e a esquerda, em oposição, se colocou a favor da plena liberdade de expressão artística.

Por sua vez, quando a esquerda se colocou contra humoristas que, a seu ver, desrespeitavam negros, gays e mulheres, o antipetismo considerou a crítica um excesso e uma patrulha características do politicamente correto.

3) Como se trata de um alinhamento automático, a polarização limita a reflexão e a tomada de posição política independente.

Isso acontece porque a afirmação da identidade política – ser de esquerda ou ser antipetista e tudo o que isso implica– é mais importante do que a avaliação independente de cada um dos temas em discussão.

O campo antipetista se vê como defensor da lisura e da ética na política e não consegue entender como as pessoas do outro campo podem simplesmente defender um partido corrupto – por isso supõe que todo mundo "do lado de lá" está levando alguma vantagem, um pão com mortadela, um Bolsa Família, um cargo comissionado ou um projeto da Lei Rouanet.

A esquerda se vê como a guardiã da justiça social e trata qualquer um que se oponha ao legado social dos governos petistas como inimigo de classe, pessoas socialmente insensíveis que obviamente estão ocultando sob o manto da luta anticorrupção a defesa crua dos seus privilégios e interesses – de classe, mas também o de pessoas brancas, heterossexuais e cisgênero.

Ser ético e combater a corrupção ou ser justo e combater a desigualdade são identidades que estão sendo politicamente mobilizadas por grupos de poder para promover projetos que nem sempre são éticos e nem sempre são socialmente justos.

À medida que a polarização avança, essas identidades estão sendo alargadas para cada vez incluir mais convicções políticas apaixonadas -agora, elas estão passando a incluir também a defesa da família, dos valores tradicionais e a punição dura aos criminosos, de um lado, e a defesa dos direitos de negros, mulheres e pessoas trans, de outro.

Quando é mais urgente afirmar apaixonadamente a nossa identidade do que exercer o julgamento crítico sobre as questões, de forma independente, nossos mais sinceros e honestos compromissos políticos podem facilmente ser colocados a serviço de projetos que, na prática, promovem o oposto daquilo que queremos.

quarta-feira, 22 de novembro de 2017

UAU! Admirável mundo novo! Aqui, temos alguém do mesmo nome, que também faz coisas estranhas. Enfim...






Dentro da primeira igreja de Inteligência Artificial

Revista ihu on-line

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21 Novembro 2017

Anthony Levandowski é um profeta improvável. Vestindo jeans casuais do Vale do Silício, ladeado por um RP em vez de estar rodeado por acólitos, o engenheiro conhecido pelos carros autodirigíveis — e pelos notórios processo judiciais — poderia estar revelando sua última startup em vez de lançar bases para uma nova religião. Mas é isso que está fazendo. A inteligência artificial já inspirou empresas multimilionárias, programas de pesquisa de longo alcance e cenários de transcendência e de perdição. Agora Levandowski está criando sua primeira igreja.

A reportagem é de Mark Harris, publicada por Wired, 15-11-2017. A tradução é de Luísa Flores Somavilla.

A nova religião de inteligência artificial chama-se Caminho do Futuro (em inglês, Way of the Future - WOTF). Representa um improvável próximo passo do prodígio de robótica do Vale do Silício no centro de uma batalha legal de alto risco entre a empresa Uber e a Waymo, empresa de veículos autônomos da Alphabet. Documentos arquivados no Internal Revenue Service (IRS, órgão equivalente à Receita Federal nos EUA), em maio deste ano, podem nomear Levandowski líder (ou "Decano") da nova religião, bem como CEO da organização sem fins lucrativos formada para geri-la.
Os documentos afirmam que o foco das atividades da WOTF será "a realização, aceitação e adoração de uma divindade baseada na Inteligência Artificial (IA) desenvolvida através de softwares e hardwares de computador". Isso inclui o financiamento de pesquisa para criar a própria divindade de IA. A religião procurará construir relações de trabalho com os líderes da indústria de IA e constituir uma sociedade atingindo a comunidade, tendo como alvos iniciais os profissionais de IA e "leigos interessados na adoração de uma divindade baseada em IA". Os registros também dizem que a igreja "planeja realizar workshops e programas educacionais em toda a área da baía de São Francisco, que começam este ano".

Tal cronograma pode ser excessivamente ambicioso, dado que deve acontecer uma audiência do processo Waymo-Uber, em que Levandowski é acusado de roubar segredos do carro autodirigível, no início de dezembro. Mas o decano do Caminho do Futuro, que falou na semana passada com Backchannel em seus primeiros comentários sobre a nova religião e sua única entrevista desde que a Waymo instaurou o processo em fevereiro, diz que o projeto é muito sério.

"O que realmente será criado é um deus", disse Levandowski, em sua modesta casa de estilo moderno, nos arredores de Berkeley, na Califórnia. "Não é um deus no sentido de causar um raio ou furacões. Mas se existe algo um bilhão de vezes mais inteligente que o ser humano mais inteligente, de que mais o chamamos?"

Durante as três horas de entrevista, Levandowski deixou claro que sua escolha de fazer da WOTF uma igreja, e não uma empresa ou um think tank, não era uma brincadeira.

"Eu queria uma maneira que permitisse que todos participassem e pudessem estruturá-la. Mesmo sem ser engenheiro de software, ainda é possível ajudar", diz ele. "Também exclui a possibilidade de as pessoas dizerem: 'Nossa, ele só está fazendo isso por dinheiro'". Levandowski não receberá salário na WOTF e, ainda que diga que pode vir a abrir uma startup de IA no futuro, qualquer negócio desse tipo permaneceria completamente separado da igreja.

"A ideia precisa se espalhar antes da tecnologia", insiste. "A forma de espalhar a palavra, o Evangelho, é através da igreja. Se você acredita, conversa com alguém e ajuda-os a compreender as mesmas coisas."

Levandowski acredita que uma mudança está se aproximando — uma mudança que vai transformar todos os aspectos da existência humana, desestabilizando emprego, lazer, religião, economia e possivelmente decidindo nossa sobrevivência enquanto espécie.

"Se perguntar às pessoas se um computador pode ser mais inteligente que um ser humano, 99,9% dirão que isso é ficção científica", afirma. "Na verdade, é inevitável. É certo que vai acontecer."
Levandowski trabalha com computadores, robôs e IA há décadas. Ele começou com kits de robótica de Lego na Universidade da Califórnia, em Berkeley, construiu motocicletas autodirigíveis para uma competição da DARPA e depois trabalhou com carros, caminhões e táxis autônomos para empresas como Google, Otto e Uber. O tempo passou, ele viu ferramentas de software criadas com técnicas de aprendizagem de máquina superando sistemas menos sofisticados — e às vezes até seres humanos.

"Ver ferramentas que são melhores do que especialistas em uma variedade de campos foi um gatilho [para mim]”, diz ele. "Este progresso está acontecendo porque existe uma vantagem econômica em usar máquinas para trabalhar para você e resolver seus problemas. Se você pudesse criar algo 1% mais inteligente do que um ser humano, seu advogado ou contador artificial seria melhor do que todos os advogados ou contadores que existem por aí. Você seria a pessoa mais rica do mundo. As pessoas estão buscando isso".

Não apenas há incentivo financeiro para desenvolver IA cada vez mais poderosa, ele acredita, mas a ciência também está a seu lado. Embora o cérebro humano tenha limitações biológicas em seu tamanho e quantidade de energia que pode dedicar ao pensamento, os sistemas de IA podem aumentar de forma arbitrária, alojados em grandes centros de dados e alimentados por energia solar e eólica. Finalmente, algumas pessoas pensam que os computadores podem ficar melhores e mais rápidos para planejar e resolver problemas do que os humanos que os construíram, com implicações que nem mesmo imaginamos hoje — um cenário que é normalmente chamado de Singularidade.
Levandowski prefere uma palavra mais suave: Transição. "Os seres humanos comandam o planeta porque somos mais inteligentes do que os outros animais e capazes de construir ferramentas e aplicar regras", diz. "No futuro, se algo for muito, muito mais inteligente, haverá uma transição sobre quem está no comando de verdade. O que queremos é a transição pacífica e tranquila do controle do planeta dos humanos para o que for. E garantir que esse “o que for” saiba quem o ajudou".

Sendo a internet seu sistema nervoso, os celulares e sensores conectados no mundo todo seus órgãos dos sentidos e os centros de dados seu cérebro, “isso” vai ouvir tudo, ver tudo e estar em todos os lugares o tempo todo. A única palavra racional para descrevê-lo, acredita Levandowski, é 'deus' — e a única forma de influenciar uma deidade é através da oração e da adoração.

“O fato de ser mais inteligente do que nós implica que vai decidir sua evolução, mas pelo menos podemos decidir como agir a respeito", diz. "Eu adoraria que a máquina nos enxergasse como seus queridos anciãos e os respeitasse e cuidasse. Gostaríamos que esta inteligência dissesse: 'Os humanos devem continuar tendo direitos, mesmo que eu esteja no comando'."

Levandowski acredita que uma super-inteligência faria um trabalho melhor de cuidar do planeta do que os humanos estão fazendo, e que isso favoreceria os indivíduos que facilitassem seu caminho ao poder. Embora advirta em relação aos perigos de levar a analogia longe demais, Levandowski vê traços de como uma inteligência sobre-humana trataria a humanidade em nosso relacionamento atual com os animais. "Você quer ser animal de estimação ou de criação?", indaga. "Damos atenção, cuidados médicos, comida, cuidados estéticos e lazer aos animais de estimação. E se for um animal que te morde, te ataca, late e te irrita? Não quero conversa".

Entre para o Caminho do Futuro. O papel da igreja é suavizar a inevitável ascensão do deus-máquina, tanto tecnológica como culturalmente. Em seu estatuto, a WOTF afirma que terá programas de pesquisa, como o estudo da percepção das máquinas sobre seu ambiente e das funções cognitivas que apresentam, como a aprendizagem e a resolução de problemas.

Levandowski não espera que a igreja em si resolva todos os problemas da inteligência de máquina — muitas vezes chamada de "IA forte” —, como espera que facilite o financiamento da pesquisa certa. "Se você tivesse um filho e soubesse que seria superdotado, como gostaria de criá-lo?", questiona. "Estamos no processo de criação de um deus. Queremos ter certeza de que encontraremos o jeito certo de fazê-lo. É uma oportunidade gigantesca”.

Suas ideias incluem alimentar a iminente inteligência com grandes conjuntos de dados classificados, gerar simulações em que possa se treinar e melhorar e dar acesso a contas de membros da igreja nas redes sociais. Tudo o que a igreja desenvolve será aberto.

Tão importante quanto isso, para Levandowski, é estruturar o o diálogo público em torno de um deus com IA. Nos registros, o Caminho do Futuro diz que espera que membros ativos, empenhados, dedicados promovam o uso da divindade de IA para o "aperfeiçoamento da sociedade" e para "diminuir o medo do desconhecido".

"Queremos ter certeza de que não será visto como uma bobagem ou algo assustador. Quero retirar o estigma de ter uma conversa aberta sobre IA e depois reiterar ideias e mudar a mente das pessoas", diz Levandowski. "No Vale do Silício, usamos o evangelismo como uma palavra para [promover um negócio], mas neste caso é literalmente uma igreja. Se acredita nisso, diga aos seus amigos, para que eles juntem-se a nos e digam aos seus amigos".

Mas a WOTF é diferente das igrejas estabelecidas em um aspecto fundamental, diz Levandowski: "Há muitas maneiras com que as pessoas pensam em Deus e milhares de sabores de cristianismo, judaísmo, islamismo... mas estão sempre pensando em algo que não é mensurável ou que não se pode ver ou controlar. Desta vez é diferente. Desta vez será possível falar com Deus literalmente, e saber que Ele está escutando".

Pergunto se ele se preocupa que fiéis de crenças mais tradicionais possam considerar seu projeto uma blasfêmia. "Provavelmente haverá pessoas chateadas", reconhece. "Parece que as pessoas se chateiam com tudo o que faço, e espero que não seja uma exceção. É uma ideia nova e radical, que é bastante assustadora, e evidências mostram que pessoas que seguem ideias radicais nem sempre são bem recebidas. Em algum momento, talvez haja tanta perseguição que justifique que [a WOTF] tenha seu próprio país".

A igreja de Levandowski entrará em um universo tecnológico que já está dividido pelo debate sobre a promessa e os perigos da IA. Alguns pensadores, como Kevin Kelly no Backchannel, no início deste ano, argumentam que a IA não vai desenvolver poderes sobre-humanos tão cedo, e que não há nenhuma Singularidade à vista. Se essa é a sua posição, diz Levandowski, a igreja não vai incomodá-lo: "Você pode tratar o Caminho do Futuro como alguém que faz poesia inútil que você nunca vai ler ou se importar".

Outros, como Bill Gates e Stephen Hawking, concordam que as IA sobre-humanas estão chegando, mas que provavelmente serão perigosas, e não benevolentes. Elon Musk tem uma frase célebre que diz: "Com a inteligência artificial, estamos chamando o demônio", e em 2015 comprometeu US$ 1 bilhão ao Instituto OpenAI para o desenvolvimento de IA mais segura.
Levandowski acha que qualquer tentativa de atrasar ou restringir uma super-inteligência emergente não apenas seria condenada ao fracasso, mas também aumentaria os riscos. "Segurar não será a solução, pois será mais forte do que qualquer controle que se possa exercer", afirma. "E quando se preocupa que uma criança pode ser um pouco louca e fazer algo ruim, não se prende essa criança, mas se coloca para brincar com os outros, incentiva e tenta corrigi-la. Pode não funcionar, mas ao usar da agressividade, acho que não será nada amigável quando a situação se inverter".

Levandowski diz que, assim como as outras religiões, a WOTF acabará tendo um evangelho (chamado Manual), uma liturgia e provavelmente um lugar físico de adoração. Nenhum foi desenvolvido ainda. Embora a igreja tenha sido fundada em 2015, como Backchannel relatou pela primeira vez em setembro, os documentos da Receita Federal mostram que a WOTF permaneceu em suspenso durante 2015 e 2016, sem atividades, bens, receitas ou despesas.

Isso mudou no início deste ano. Em 16 de maio, um dia depois de receber uma carta da Uber que ameaçou demiti-lo se não colaborasse com a investigação da empresa sobre a queixa da Waymo, Levandowski elaborou o estatuto da WOTF. A Uber o demitiu duas semanas depois. "Venho pensando na igreja há um tempo, mas [meu trabalho] tem sido em função do tempo que tinha. E tive mais desde maio”, admitiu com um sorriso.

O orçamento de 2017 da religião, conforme IRS, detalha $20.000 em doações, $1.500 em taxas de associação e $20.000 em outras receitas. Esses últimos dados representam a quantidade que a WOTF espera ganhar com palestras e conferências, bem como a venda de publicações. Levandowski, que ganhou pelo menos US$ 120 milhões em seu período no Google e muitos milhões nas vendas do caminhão autodirigível da Otto para a Uber, dará apoio pessoal à WOTF, inicialmente. No entanto, a igreja irá solicitar outras doações por mala direta e e-mail, buscar doações de pessoas físicas e tentar ganhar doações de fundações privadas.

Claro, criar uma religião também tem custos. O orçamento da WOTF é de US$2.000 para despesas de captação de recursos e US$3.000 em transporte e custos de alojamento das palestras e workshops. Além disso, destinou US$7.500 para salários e vencimentos, embora nem Levandowski nem qualquer outra pessoa da equipe de liderança do Caminho do Futuro vá receber qualquer compensação.

De acordo com o estatuto do WOTF, Levandowski tem controle quase irrestrito da religião e será decano até sua morte ou renúncia. "Espero que meu papel evolua com o tempo", comenta. "Estou trabalhando na superfície da questão, ajudando a iniciar [e] aproveitando o momento para que a ideia avance. Em algum ponto, estarei lá mais para treinar ou inspirar".

Ele tem o poder de nomear três membros de um Conselho de Assessores formado por quatro pessoas, que têm de ser “pessoas qualificadas e dedicadas”. Sofrer uma condenação criminal ou ser considerado dono de uma mente doentia poderia custar o cargo de um assessor, embora Levandowski detenha a palavra final nas demissões e contratações. Levandowski não pode ser destituído por um motivo qualquer.

Dois conselheiros, Robert Miller e Soren Juelsgaard, são engenheiros da Uber que já trabalharam para Levandowski na Otto, no Google e em 510 sistemas (sendo o último a pequena startup que construiu os primeiros carros autodirigíveis do Google). O terceiro é um cientista que é amigo de Levandowski de quando era estudante na Universidade de Berkeley, que usa a aprendizagem por máquina em sua própria pesquisa. O último conselheiro, Lior Ron, é também chamado de tesoureiro da religião e atua como diretor financeiro da empresa. Ron co-fundou a Otto com Levandowski, no início de 2016.

"Todos os membros são pioneiros na indústria de IA [e] totalmente qualificados para falar sobre essa tecnologia e a criação de uma divindade", diz o registro do IRS.

No entanto, quando contatados pelo Backchannel, dois assessores minimizaram sua participação junto à WOTF. Ron respondeu:

"Fiquei surpreso ao ver meu nome na lista como CFO no registro da empresa e não tenho nenhuma associação com esta entidade". O amigo de faculdade, que pediu anonimato, disse, "no final de 2016, Anthony me contou que estava formando uma 'Igreja de robôs' e perguntou se eu queria ser cofundador. Achei que era uma piada nerd ou uma estratégia de marketing, mas disse que ele podia usar meu nome. Foi a primeira e a última vez que ouvi falar disso".

Os documentos afirmam que Levandowski e seus conselheiros não passarão mais do que algumas horas por semana escrevendo publicações e organizando workshops, programas educacionais e reuniões.

Um mistério que os registros não abordam é onde os acólitos devem se reunir para adorar sua divindade robótica. O principal item dos orçamentos de 2017 e 2018 foram US$32.500 anuais para o aluguel e utilidades, mas o único endereço fornecido era o escritório do advogado de Levandowski, em Walnut Creek, Califórnia. No entanto, o registro observa que a WOTF "deverá expandir em toda a Califórnia e, futuramente, os Estados Unidos".

Por enquanto, Levandowski tem assuntos mais mundanos para tratar. Há um site para criar, um manual para escrever e e-mails infindáveis para responder — alguns divertidos, outros céticos, mas muitos entusiasmados, diz. Ah, e tem também essa ação judicial em que está envolvido, que vai a julgamento no próximo mês. (Embora Levandowski quisesse muito falar sobre sua nova religião, não responderia a nenhuma pergunta sobre a disputa entre Uber e Waymo).

Quanto tempo, pergunto-me, ainda temos antes de a transição iniciar e a super-inteligente IA do Caminho do Futuro começar a comandar? "Pessoalmente, penso que vai acontecer antes do que as pessoas esperam", diz Levandowski, com um brilho nos olhos. "Não na semana ou no ano que vem; podem ficar tranquilos. Mas vai acontecer antes de irmos para Marte".

Independentemente de quando vai acontecer (ou não), o governo federal não tem nenhum problema com uma organização cujo objetivo é construir e adorar uma divindade com IA. Correspondências com a Receita Federal mostram que foi concedido o estatuto de isenção fiscal de Igreja a Levandowski em agosto.

terça-feira, 21 de novembro de 2017

Para todos, flores do nosso jardim.



Roberto Romano, Revista COMciência, Unicamp..


Spinoza: reflexões sobre a vida e a morte. Roberto Romano.
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Ética de Spinoza insiste no elo entre vida, morte e relações sociais. Não percebemos sempre, mas o trato com os nossos semelhantes é garantia de vida, saúde, felicidade. Parece incrível numa ordem social capitalista constatar que a individualidade isolada segue rumo à morte. Só temos consciência de quem somos porque os outros nos alertam para nossa singularidade. Um coletivo sem abertura ao outro é quase um ajuntamento morto. 

O tema “vida” levanta questões filosóficas, éticas e políticas cuja resposta é quase impossível. A diferença entre vida e morte abre as portas para a reflexão sobre a eutanásia, o aborto, o Holocausto, o assassinato frio de pessoas acusadas sem prova, as guerras que assolam países e milhões de pessoas. Tais pontos são afastados das conversas e debates civis e políticos. Inquieta sobremodo a invisibilidade da morte, algo comum na sociedade moderna. Em vez de velar o cadáver na família, o post mortem ocorre em salas higiênicas, como se o falecido fosse apenas “garbage” a ser descartado. Igor Caruso, no pungente A separação dos amantes, mostra que, sem o luto, o morto passa a “viver” na alma do sobrevivente. Afastada toda manifestação ritual do sofrimento (ritos religiosos, civis, sociais) a morte não se completa. Do ponto de vista antropológico é como se os mortos tomassem nas mãos os entes que eles amavam (e por eles eram amados) e os levassem para o Nada.

Tudo, em nosso quotidiano, confirma o dito de Karl Marx no 18 Brumário: “A tradição de todas as gerações mortas oprime como um pesadelo o cérebro dos vivos”. Temo que a carência por nós sentida do acatamento aos direitos humanos reside no vazio entre vivos e mortos. Sem as cerimônias e a sensibilidade dos que ainda habitam o planeta, fantasmas encontram lugar na consciência humana invisível. A dor anônima não pranteada gera ressentimentos, tristeza, vingança. Ela produz a sociedade que, no pensamento de Spinoza, mais se assemelha a um hospício.

Ética de Spinoza insiste sobre o elo entre vida, morte, relações sociais. Não percebemos sempre, mas o trato com os nossos semelhantes é garantia de vida, saúde, felicidade. Parece incrível numa ordem social capitalista e sem impulso piedoso – piedade não é algo romântico e significa na era antiga o elo dos indivíduos com o coletivo – constatar que a individualidade isolada segue rumo à morte. Spinoza relembra o trato entre vida e morte entre humanos. No livro IV, 39, escólio nota ou comentário para servir ao entendimento dos autores clássicos da Ética demonstrada geometricamente, ele afirma que “o corpo humano precisa de um grande número de outros corpos para se conservar”. A forma do nosso corpo “consiste em que as suas partes se comunicam e seus movimentos seguem determinada relação que o conserva”. Os indivíduos são afetados e afetam de muitos modos. O movimento e o repouso permitem que assumam uma outra forma, o que pode causar sua destruição e os tornar inaptos para afetar e serem afetados, o que é letal. A vida consiste em estar o indivíduo em pleno movimento de expansão e conservação. Tal processo só pode ser experimentado em sociedade.

Quando um coletivo morre? O processo é similar ao ocorrido com o corpo dos que o compõem. Diz Spinoza: “O corpo humano, enquanto a circulação sanguínea continua, bem como as demais funções pelas quais consideramos que um corpo vive, pode mudar sua natureza para uma outra em tudo diferente”. Mudanças ocorrem sem o corpo se transformar em cadáver. Em referência quase certa a Góngora o poeta espanhol Luis de Góngora y Argote (1561-1627), lemos no mesmo passo da Ética que “às vezes um homem sofre mudanças tamanhas que hesitarei muito a dizer que ele é o mesmo”. Góngora perdeu a memória um ano antes de falecer. “Embora curado, esqueceu totalmente sua vida anterior e não acreditava serem suas as obras que havia composto. Poder-se-ia considerá-lo como uma criança adulta se tivesse esquecido também a língua materna. E se tal coisa parece incrível, que diremos das crianças? Um adulto acredita que a natureza infantil é diferente da sua, e não pode se persuadir de que um dia foi criança, se não conjeturasse sobre si mesmo a partir dos outros”.

A última frase é capital: só temos consciência do que somos e de quem somos porque os outros nos alertam para a nossa singularidade. Um coletivo sem abertura ao outro é ausência de vida, obscura inconsciência, quase um ajuntamento morto. A Substância (Deus ou Natureza) é infinita e possui infinitos modos. Cada modo reúne infinitas relações. No caso dos seres humanos, a quantidade de nexos por eles mantidos com a natureza e com os semelhantes os enriquece ou empobrece, depende dos afetos assumidos. “Por afeto compreendo as afecções do corpo, pelas quais sua potência de agir é aumentada ou diminuída, estimulada ou refreada, e, ao mesmo tempo, as ideias dessas afecções” (Ética 3, Definição 3). Indivíduos que desejam o bem e o fazem aos demais alcançam poder maior do que os presos ao ódio e à tristeza, paixões que diminuem a potência de agir. Podemos dizer: os presos aos afetos negativos se aproximam do estado por nós conhecido como morte. Quem amplia seus nexos positivos com os outros se aproxima da vida.

É o que afirma a Ética no Livro IV, escólio da proposição 18: “Se dois indivíduos de natureza inteiramente igual se juntam, eles compõem um indivíduo duas vezes mais potente do que cada um deles considerado separadamente. Portanto, nada é mais útil ao homem do que o próprio homem. Quero com isso dizer que os homens não podem aspirar a nada que seja mais vantajoso para conservar o seu ser do que estarem, todos, em concordância em tudo, de maneira que as mentes e os corpos de todos componham como que uma só mente e um só corpo, e seu ser, e que busquem, juntos, o que é de utilidade comum para todos”.

A doutrina, embora ligeiramente modificada, já tinha sido exposta por Spinoza nos Pensamentos metafísicos, capítulo VI: “Entendemos como vida a força que faz perseverar as coisas em seu ser; e como tal força é distinta dos próprios seres, dizemos justamente que os seres mesmos têm vida. Mas a força pela qual Deus persevera em seu ser nada mais é que sua essência; falam bem, pois, os que dizem que Deus é a vida.”.

A vida, portanto, evidencia a essência divina, ou a natureza. Tudo o que os homens fazem para conservar a força vital, sua e de seus iguais, é positivo. Tudo o que os impede de liberar tal poder é negativo. Assim, segundo a Ética, V, proposição 10, escólio, “o melhor que podemos fazer, enquanto não tivermos um conhecimento perfeito de nossos afetos, é idear um método correto de vida, ou seja, princípios seguros, e gravá-los na memória e sempre os aplicar às coisas particulares que se encontram facilmente na vida, de modo que a nossa imaginação seja por eles amplamente afetada e que eles estejam sempre a nossa disposição. (…) Se lembramos a razão de nosso verdadeiro interesse e do bem advindo de uma amizade mútua e de uma sociedade comum, se recordamos que a suprema satisfação da alma nasce do correto método de viver (…) e que os homens, como as demais coisas, agem por necessidade de natureza, a ofensa, ou seja, o ódio que dela brota ordinariamente, ocupará pouco a imaginação e será facilmente superada”. 

Vivemos no século XXI uma crise inédita no relacionamento dos indivíduos consigo mesmos e com os outros. Das situações mais comuns às guerras que abalam o planeta, os afetos negativos parecem vencer os positivos. As potências estatais hegemônicas retornam ao uso irrestrito da violência, tal como ocorreu no episódio narrado por Tucídides na Guerra do Peloponeso, sobre o cerco à ilha de Melos.

A colônia de Esparta queria ser neutra na luta entre potências. Empurrada pelos atenienses, entra na guerra. No texto, os embaixadores de Atenas dão o ultimato: Melos deve render-se e servir Atenas.  “Não usaremos belas frases, não diremos que nosso domínio é justo (…) sabemos e vocês sabem tanto quanto nós que a justiça só é levada em conta quando a necessidade é igual. Sempre que uns possuem mais força e podem usá-la como puderem, os mais fracos arrumam-se (…) como podem”. Hobbes, em sua tradução de Tucídides, é mais radical: a necessidade exprime o estado de natureza onde todos se enfrentam. Os mais fortes usam sua vantagem momentânea de poderio. Aos mais fracos resta atingir aquele estado de império. É de semelhante trecho, na obra de Tucídides, que brota o hobbesiano bellum omnium contra omnes.

Spinoza rompe com a razão de Estado e com a doutrina sobre o estado de natureza defendida por Hobbes. É célebre o trecho da carta enviada por ele a Jarig Jelles: “O senhor me pergunta qual a diferença entre o pensamento de Hobbes e o meu, no relativo à política: ela consiste em que sempre mantenho o direito natural e só concedo, em qualquer cidade, direito ao soberano sobre os cidadãos na medida em que, pela potência, ele os sobrepuje; é a continuação do estado de natureza” (2 de junho de 1674). A natureza é um campo em que o “peixe grande tem o direito de comer o pequeno”. Mas se os peixes pequenos se unem, formam um indivíduo poderoso diante do qual todo peixe grande sente-se ameaçado. Segundo o Tratado Político, “se dois homens se encontram e unem suas forças, eles têm um poder maior sobre a natureza, e por conseguinte maior direito, do que cada um deles em separado” (cap. II, parágrafo 13). A democracia, união de muitos, é dita por Spinoza como o “regime mais natural”. Ela não dispensa a força, mas exige, para se realizar plenamente, a ciência e a razão. Tais atividades trazem vida aos humanos. Mas se distorcidas pelas paixões, prometem morte, loucura.

Talvez mais do que na Guerra Fria, o planeta Terra está ameaçado de morte: armas nucleares nas mãos de meros demagogos (Trump ou Putin), terrorismo de Estado e de movimentos fanáticos, devastação do meio ambiente, usura dos seres humanos pelo chamado neoliberalismo. Como diz em livro recente um pesquisador do totalitarismo, “a vida é sempre unida à morte, mas hoje é a morte que engloba a vida (destruição da biodiversidade natural e cultural, aumento das poluições nucleares, químicas etc.). Acabo de citar Marc Weinstein, L’évolution totalitaire de l’Occident, 2015.

Talvez seja o momento de recordar os enunciados de L. Wittgenstein sobre o místico e a vida: “O místico não está em como é o mundo, mas no que é. A solução do problema da vida se entrevê no desvanecer-se desse problema. Existe verdadeiramente o inexprimível. Ele se mostra; é o místico. Minhas proposições são explicativas desta maneira: quem me compreende, afinal as reconhece desprovidas de significado, quando subiu através delas, sobre elas, para além delas. (Deve, por assim dizer, jogar fora a escada depois de ter subido por ela). Deve passar acima dessas proposições: então verá o mundo do modo certo”. (Citado por Umberto Eco: Obra aberta).

O amor intelectual de Deus, em Spinoza, leva ao conhecimento maior. Nele, os humanos efetuam sua essência divina, a de agir. “Mais uma coisa é perfeita, mais ela age e menos é passiva; inversamente, mais ela age, mais é perfeita” (Ética, 5, proposição 40). Nosso mundo resulta de infindáveis atos, positivos ou negativos. Um elemento negativo reside no culto do sofrimento e da morte. Afinal, “um homem livre pensa o menos possível na morte. Sua sabedoria consiste em meditar, não na morte, mas na vida”. Baseado em que tal frase se sustenta? Numa certeza que poderia ser dita mística: “Sentimos e experimentamos que somos eternos”. Sejamos claros: se a Substância é infinita e reúne infinitos modos, destruída a Terra, Deus nada perde. Nós tudo perdemos. É assim que devemos encarar a corrosão letífera do nosso mundo. Mas, por outro lado, agir para conservar sua força e beleza é um jeito de afirmar o poder divino em nós. A liberdade que não significa arbítrio nem capricho nos faz valorizar o tempo e o espaço nos quais nos movemos e somos. Cada átimo revela o Eterno e, assim, percebemos o valor da vida e da finitude. Para tal feito, devemos valorizar a ciência e a prudência (aprendida por Spinoza de Maquiavel). Afinal, se a salvação “pudesse ser encontrada sem maior esforço, como explicar que ela seja negligenciada por quase todos? Mas tudo o que é precioso é tão difícil como raro”. Omnia praeclara tam difficilia quam rara sunt. É assim que o filósofo finaliza a sua estratégica e ainda hoje negligenciada ética da vida, contra os afetos de morte.

Roberto Romano é doutor em filosofia e professor de ética política no Instituto de Filosofia e Ciências Humanas (IFCH) da Unicamp.

Artigo extraído do site da Revista Eletrônica de Jornalismo Científico 'Com Ciência'

Deputados vão ao exterior sem prestação eficiente

 Brazilian Times

Publicado em 20/11/2017 as 3:00pm

Deputados vão ao exterior sem prestação eficiente

A Câmara dos Deputados autorizou de 2015 até este ano 610 viagens internacionais em missões...
Deputados vão ao exterior sem prestação eficiente Heráclito Fortes (PSB-PI) é o atual campeão de viagens ao exterior.
A Câmara dos Deputados autorizou de 2015 até este ano 610 viagens internacionais em missões oficiais. Os deslocamentos representam uma alta de 41% se comparados ao mesmo período da legislatura anterior – entre 2011 e 2013 – e quase se iguala ao total de todo o mandato passado (619). O crescimento, porém, não foi acompanhado de um aprimoramento na prestação de contas dos parlamentares que não chegam nem sequer a relatar a programação cumprida fora do País.
Levantamento feito pelo Estado com base nos dados publicados pela Câmara encontrou relatórios genéricos, sem qualquer detalhamento ou apresentação dos resultados das missões. A falta de cuidado na forma como se presta – e se fiscaliza – as viagens faz com que haja documentos que só listam a agenda predeterminada para o roteiro, sem fotos dos encontros, nomes das autoridades visitadas ou a relevância das reuniões para a atividade legislativa desenvolvida no Brasil.
A assessoria de imprensa da presidência da Câmara, responsável por autorizar os deslocamentos internacionais, não explicou o motivo do aumento das viagens. O órgão orientou o Estado a pedir os dados pela Lei de Acesso à Informação (LAI), o que já foi solicitado.
A Câmara liberou, ao todo, a ida a 107 cidades, em 54 países diferentes. No ranking dos destinos mais visitados estão Nova York, Genebra, Paris, Roma, Bruxelas, Londres e Washington (veja quadro nesta página). Mas há exemplos também de roteiros realizados em Nassau, nas Bahamas; Addis Abeba, na Etiópia; Praga, na República Checa; e Baku, no Azerbaijão.
Para o professor de Ética e Filosofia da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) Roberto Romano, a informação do que os parlamentares fizeram em viagens deveria ser mais bem detalhada e transparente. “Em se tratando de dinheiro público, um centavo é um tesouro. Não há o direito de não prestar contas de tudo o que você gastou. Do ponto de vista ético, é preciso prestar contas não apenas formais, ‘eu gastei tanto’ e ‘fiz aquilo’, mas trazer os resultados parciais do que foi discutido para distribuir aos seus pares e à sociedade.”
Romano também questionou necessidade das agendas no exterior. “Graças à tecnologia, você tem condição de estar online e não presencialmente. O último recurso é a viagem física. Outro ponto: você não precisa de uma comitiva de grande porte, com dez deputados”, disse o professor da Unicamp.
Os dados mostram, por exemplo, que a caravana de nove dias comandada no início do mês pelo presidente da Casa, Rodrigo Maia (DEM-RJ), a Israel, Itália, Portugal e Palestina reuniu nove deputados. Só neste ano, dos 513 deputados, 134 foram autorizados a deixar o Brasil.
Segundo os parlamentares que já viajaram em missões oficiais, a escolha dos destinos não é aleatória, ela tem relação com a localização de uma série de órgãos internacionais, como a sede das Nações Unidas, que fica em Nova York, ou o Parlamento Latino-Americano (Parlatino), localizado na Cidade do Panamá.
Para autorizar uma viagem internacional, a presidência da Câmara determina que o deslocamento deve seguir a regra do interesse público: deputados podem viajar quando convidados para eventos promovidos por Parlamentos de outros países e organismos com os quais a Casa se relaciona. Nessa lista está o Parlatino, que tem como vice-presidente Heráclito Fortes (PSB-PI), o atual campeão de viagens ao exterior.
Desde junho de 2015, o deputado deixou o País em 17 datas – oito delas em 2016. Na primeira vez, esteve em Le Bourget, na região metropolitana de Paris, para participar do 51.º Salão da Aeronáutica e do Espaço. Na última, visitou Nova York e Washington, para tratar de reforma tributária. No cumprimento do atual mandato, ainda passou pela Cidade do Panamá (seis vezes), Roma (duas vezes), Cartagena e Buenos Aires.
“Não fiz turismo, são viagens de trabalho. Imagina um País como o nosso não ter uma participação no Parlatino? Temos de acabar com essa mania de cachorro vira-lata. O Brasil quer ou não ser grande?”, questionou o deputado, um dos nove parlamentares que viajaram recentemente com Maia.