CADA VEZ MAIS COMPLICADO NA LAVA JATO, ELE DISPARA NA INTENÇÃO DE VOTO

Política

Às vésperas de ficar frente à frente com o juiz Sérgio Moro, acusações contra o ex-presidente se avolumam e ele é denunciado até por ex-amigos. Apesar disso, lidera com folga as enquetes para 2018. Mas, afinal, quem não abre mão de votar nele?
(Roberto Parizotti/CUT)
De São Paulo e Rio -- Réu em cinco processos e com o agravamento dos testemunhos contra ele por parte de diretores das construtoras Odebrecht e OAS, o ex-presidente Lula chega às vésperas de seu depoimento frente à frente ao juiz Sérgio Moro embalado por uma surpreendente liderança nas pesquisas eleitorais para 2018 e com números em alta.
Na pesquisa de potencial de voto feita pelo Ibope na primeira quinzena de abril, ele obteve 30% da preferência dos eleitores. Além disso, seu índice de rejeição caiu para 51%, 14 pontos inferior ao registrado em abril do ano passado, antes do impeachment de Dilma Rousseff.
A pesquisa do Ibope foi feita antes de Lula aparecer na lista de políticos envolvidos em atos de corrupção delatados por executivos da Odebrecht e do depoimento de velhos amigos, como Léo Pinheiro, ex-presidente da Construtora OAS, que afirmou que Lula mandou que ele apagasse provas de caixa 2 do PT.
No entanto, mesmo depois disso, o petista confirmou a liderança na pesquisa de intenção de votos do instituto Datafolha, divulgada no dia 30 de abril, com 31%  no primeiro turno, na disputa hipotética com o senador Aécio Neves (PSDB), o deputado federal Jair Bolsonaro (PSC), os ex-ministros Marina Silva (Rede) e Ciro Gomes (PDT) e o presidente Michel Temer (PMDB). No cenário em que o candidato tucano é o prefeito de São Paulo, João Doria, Lula lidera com a mesma porcentagem.
Mais recentemente, o ex-diretor da Petrobras, Renato Duque, também surpreendeu em depoimento a Sérgio Moro, ao afirmar que Lula comandava o esquema de propinas na estatal e que determinou que todas as provas sobre contas no exterior fossem apagadas.
Léo Pinheiro, ex-presidente da OAS e amigo de Lula: depoimento compromete ex-presidente nos casos do tríplex do Guarujá e sítio em Atibaia (Foto: reprodução TV)
 Fator militância
Apesar desse resultado parecer contraditório, especialistas ouvidos pela GME não se surpreendem.O cientista político e professor da PUC Rio, Ricardo Ismael, observa que o resultado das pesquisas eleitorais reflete um desapontamento geral com os políticos tradicionais, que afeta o desempenho de alguns dos principais adversários de Lula. “Ciro Gomes e os nomes do PSDB e PMDB parecem não encantar o eleitorado”, diz. “Ao mesmo tempo, Lula é um nome conhecido e tem um eleitorado cativo, o que faz com que lidere dentro do patamar histórico mínimo do PT na maioria das eleições”.
Para o sociólogo e cientista político Paulo Baía, “Lula reaglutinou seu grupo básico de ação, fortaleceu sua base de ação organizada nos movimentos sociais vinculados ao PT. Esses resultados refletem a força da militância e, ao mesmo tempo, imagem que o ex-presidente tem como líder”.
Lula seria favorecido ainda nas pesquisas ao ser associado por parte das camadas mais pobres ao ciclo de inclusão social e crescimento econômica durante parte de seus oito anos de mandato.
“Apesar de o círculo virtuoso da economia brasileira ter começado a partir do Plano Real, Lula foi o que mais se beneficiou dele”, observa Roberto Romano, professor da Universidade de Campinas (Unicamp). “A lembrança dele à frente do país resistiu aos erros cometidos por sua sucessora e resiste à Lava Jato”.
 Faltam oponentes
A posição do ex-presidente à frente das pesquisas também se explica e tende a se consolidar – caso tenha condições de se candidatar – porque não há ainda outra liderança política tão representativa para os brasileiros, tanto no PT quanto em outros partidos.
“O PT não tem hoje um político que possa substituir Lula. O PSDB tem a mesma situação difícil. Não tem candidatos possível. Acho que a eleição do ano que vem vai ser entre o discurso do novo e do igual ao que já foi feito”, diz Maria Teresa Kerbauy, professora do Departamento de Ciência Política da Unesp (Universidade Estadual Paulista).
O cenário, no entanto, é propício para o surgimento de uma nova liderança, distante da imagem do político tradicional, com força suficiente para se opor a Lula. “Na pesquisa do Datafolha, foi incluída a possibilidade de candidatura do Sérgio Moro e ele bateu Lula em uma simulação de segundo turno (42% a 40%, dentro da margem de erro)”, aponta Márcia Cavallari, CEO do Ibope Inteligência. Vale destacar que, assim como Moro, Marina Silva, da Rede, também bateria Lula no segundo turno, dentro da margem de erro.
Márcia também aponta a consolidação do perfil eleitoral do pré-candidato petista nas últimas pesquisas. “Em nossa última pesquisa de potencial de voto, Lula cresceu nas regiões, faixas de renda e de escolaridade em que já era mais forte”, diz. No Nordeste, o potencial de voto do ex-presidente subiu de 52% para 70% em um ano.
Movimentos recentes, como a greve geral de 28 de abril e os protestos contra as reformas Trabalhista e da Previdência, no entanto, ainda não se refletem na popularidade de Lula. “As pesquisas mais recentes são anteriores a isso”, aponta Márcia.
Ricardo Ismael é mais cauteloso. “Uma coisa é a desconfiança da população quanto as reformas, outra é transformar isso em voto para a esquerda ou para o PT”, diz.
 Carência de lideranças
Romano acredita que com o fim da geração de políticos como Ulisses Guimarães, Mário Covas, Franco Montoro e Brizola, o Brasil ficou carente de lideranças nacionais. “As novas não aparecem por causa da estrutura e da política interna dos partidos. No caso do PT, Lula sempre foi a preferência como escolha de candidato porque ele sabe captar a simpatia das massas. Com isso o partido perdeu a capacidade de propor novas lideranças nacionais. No caso dos tucanos, as lideranças nunca se projetaram em termos hegemônicos porque é um partido dividido. Serra era quem tinha maior projeção nacional por seu mandato como ministro da saúde, mas foi minada pelo Aécio”, comenta.
Baía, por sua vez, chama a atenção para a quantidade de votos nulos e indecisos. “Vivemos um momento de crise política sem precedentes. As pessoas não se sentem representadas por quem está no Congresso. Nós vamos ter mudanças de cenário com muita frequência em função desse desencanto da população, que tem a consciência política de que é o principal problema do Brasil é a corrupção e descredencia quem está no poder”.
Nada disso, no entanto, significa necessariamente favoritismo para o petista em 2018. “O crescimento de Bolsonaro e o bom desempenho de João Dória no potencial de voto mostram que há espaço para um rosto novo”, avalia Márcia. Um salvador da pátria? “Acho que o eleitor está confuso, quer alguém que resolva a crise e que olhe por ele”. E isso inclui bem mais do que simplesmente fazer a economia funcionar. “Haverá também um ingrediente moral muito forte na eleição de 2018, em função dos escândalos de corrupção”, prevê Márcia.
 Cenário judicial
Enquanto isso, Lula aguarda o duelo no tribunal contra o juiz Moro. Uma condenação em primeira instância não seria suficiente para torná-lo inelegível pela Lei da Ficha Limpa, que exige que o candidato tenha sido condenado por órgão colegiado. “É difícil que isso aconteça antes do registro da candidatura, embora o TRF da 4ª Região (responsável pelo Sul do país) seja mais ágil que o da 3ª Região (Sudeste)”, avalia Alberto Rollo, vice-presidente da Comissão de Direito Eleitoral e membro da Comissão da Reforma Política na OAB-SP.
Há quem defenda, porém, que a candidatura de Lula poderia ter o registro impugnado pelo fato de o petista ter se tornado réu. Isso aconteceria em função da decisão do STF de considerar que um réu não pode estar na linha sucessória da Presidência da República, conforme alegado pela Rede, de Marina Silva, para pedir o afastamento de Eduardo Cunha da presidência da Câmara dos Deputados.
“A tese faz algum sentido. A ideia é que se um réu não pode estar na linha sucessória, não pode estar na Presidência”, avalia Rollo. Por outro lado, também há fortes argumentos do lado contrário. “Certamente vão dizer, com certa razão, que uma decisão desse teor iria ferir o princípio de presunção da inocência”.
 A lei é para todos
Rollo faz questão de ressaltar que a lei vale para todos os potenciais candidatos. “Os mesmos princípios se aplicariam não apenas a Lula, mas a Serra, Alckmin e a qualquer outro que venha a ser investigado e se torne réu”, explica. Na hipótese de uma vitória de Lula – ou de outro réu – o que aconteceria com os processos contra o futuro presidente?
“A lei diz que um presidente não pode ser investigado por fatos prévios a seu mandato, por isso os processos ficariam suspensos, até que o réu terminasse o mandato”, diz. Nesse caso, o tempo para a prescrição dos crimes dos quais o réu-presidente é acusado também ficaria congelado. Por enquanto, a única coisa certa no cenário eleitoral de 2018 é a mais absoluta incerteza. “Essa eleição vai ser a maior caixa preta da história”, conclui Márcia Cavallari, do Ibope.