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CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ
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Reunião: 0981/16
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Hora: 14h30 |
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Data: 22/8/2016 |
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DEPARTAMENTO DE TAQUIGRAFIA, REVISÃO E REDAÇÃO
NÚCLEO DE REDAÇÃO FINAL EM COMISSÕES
TEXTO COM REDAÇÃO FINAL
Versão para registro histórico
Não passível de alteraçãoCOMISSÃO
ESPECIAL - PL 4850/16 - ESTABELECE MEDIDAS CONTRA CORRUPÇÃO EVENTO:
Audiência Pública REUNIÃO Nº: 0981/16DATA: 22/08/2016LOCAL: Plenário 4
das ComissõesINÍCIO: 14h39minTÉRMINO: 17h46minPÁGINAS: 69
DEPOENTE/CONVIDADO - QUALIFICAÇÃO |
ROBERTO
ROMANO - Professor de Ética e Filosofia na Universidade Estadual de
Campinas - UNICAMP. AUGUSTO DE ARRUDA BOTELHO - Conselheiro do Instituto
de Defesa do Direito de Defesa - IDDD.
SUMÁRIO
Debate sobre o Projeto de Lei nº 4850, de 2016 - estabelece medidas contra a corrupção. Deliberação de requerimentos.
OBSERVAÇÕES
Houve intervenções inaudíveis.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Joaquim Passarinho) - Boa tarde a todos e a todas.
Declaro aberta a 8ª Reunião Extraordinária da Comissão Especial
destinada a proferir parecer ao Projeto de Lei nº 4.850, de 2016, do Sr.
Antonio Carlos Mendes Thame e outros, que estabelece medidas contra a
corrupção e demais crimes contra o patrimônio público e o combate ao
enriquecimento ilícito de agentes públicos.
Em apreciação a ata da
7ª Reunião Ordinária, realizada no último dia 16 de agosto, cujas cópias
devem ter sido distribuídas aos senhores membros.
Indago ao Plenário se há a necessidade de leitura da ata.
O SR. DEPUTADO ONYX LORENZONI - Não há necessidade de leitura, Sr. Presidente.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Joaquim Passarinho) - O Deputado Onyx Lorenzoni pede a dispensa da leitura.
Dispensada a leitura.
Indago aos senhores membros se desejam fazer alguma retificação na ata. (Pausa.)
Não havendo quem queira retificá-la, coloco-a em votação.
Os Deputados que a aprovam permaneçam como estão. (Pausa.)
Aprovada a ata.
Comunico aos Srs. Deputados o recebimento das seguintes
correspondências, cujas cópias encontram-se à disposição na Secretaria
da Comissão:
Ofícios nº 912, de 2016, e nº 93, de 2016,
respectivamente, dos Deputados Félix Mendonça Júnior e Ronaldo Fonseca,
que justificam as suas ausências na reunião do dia 15 de agosto em razão
de compromisso político-partidário.
A Ordem do Dia está dividida em duas partes: audiência pública e deliberação de requerimentos.
Esta audiência é resultado dos Requerimentos nºs 19, de 2016; 24, de
2016; e 43, de 2016, de autoria dos Deputados Rubens Bueno, Carlos Marun
e Paulo Teixeira, respectivamente.
Convido para tomar assento à
mesa os seguintes senhores expositores: o Dr. Roberto Romano, professor
de Ética e Filosofia na UNICAMP - Universidade Estadual de Campinas; e o
Dr. Augusto de Arruda Botelho, conselheiro do Instituto de Defesa do
Direito de Defesa - IDDD, que representa neste ato o Presidente Fábio
Tofic.
Estamos aguardando ainda o nosso terceiro convidado, o Dr.
José Henrique Torres, professor de Direito Penal da Pontifícia
Universidade Católica de Campinas.
Esclareço aos Srs. Parlamentares e
aos senhores expositores que a reunião está sendo transmitida ao vivo
pela Internet e gravada para posterior transcrição. Por isso,
solicitamos a todos que falem ao microfone.
Para o bom ordenamento
dos trabalhos, adotaremos alguns critérios. Os expositores terão 20
minutos, prorrogados a juízo da Comissão, não podendo ser aparteados. O
Relator disporá de 15 minutos para a sua manifestação. Os Deputados
terão a palavra conforme a lista de inscrição por 3 minutos
improrrogáveis, com preferência aos autores do requerimento.
Vamos dar início à exposição.
Concedo a palavra ao Dr. Roberto Romano para fazer a sua exposição. S.Sa. tem até 20 minutos.
O SR. ROBERTO ROMANO - Boa tarde a todos.
Agradeço o convite para me dirigir aos representantes do povo brasileiro.
Vou deixar de tocar nos itens com os quais concordo e nos que me falta
competência. Não me deterei nas penas e dosimetria propostas. Juristas
podem analisar com apuro tais elementos.
O projeto, se levado à
norma, trará benefícios à sociedade, ao Estado e à política,
escoimando-se de desvios. O texto é bem ordenado e oportuno. A
justificativa, no meu entender modesto, traz problemas que merecem
atenção.
Peço sua paciência para os pontos que enumero, pois eles brotam de um apelo à prudência.
O poder corrompe. O absoluto corrompe absolutamente.
O enunciado de Lord Acton serve hoje apenas como clichê. Se o
contextualizarmos, no entanto, sua tese ajuda a refletir sobre a
presente crise mundial de estados e nações. Em carta ao Bispo Creighton,
Acton discute a responsabilidade de quem dirige os poderes. Suas frases
sobre o mando corrosivo se complementam do seguinte modo: O poder absoluto desmoraliza.
O Bispo Creighton dizia ser preciso evitar a corrupção. É a atitude
comum em coletivos prejudicados por malfeitores públicos. Leis seriam
ideadas para prevenir costumes imorais. Eu não me preocupo, replica Acton, em evitar a corrupção, mas em saber como ela surge.
Muitos analistas se limitam à atitude de Creighton, poucos seguem o malefício até a sua fonte.
Infelizmente, noto no projeto de lei traços do Bispo Creighton e não
tanto os de Acton. E nele percebo notas que podem levar não ao reforço
da ética pública, mas à desmoralização.
A paciência que solicito
dos senhores é necessária, porque devemos passar pelas nossas origens,
quando se trata do regime democrático. A maioria dos atuais conceitos
políticos vem da Grécia clássica, e dela também nos chegam defeitos a
serem vistos com prudência.
Então, como ganho da democracia grega, nós temos a isonomia; os princípios da responsabilidade, da accountability;
os princípios do controle de um poder por outro, e isso foi proposto,
pela primeira vez, por Platão nas leis; e nós temos, então, uma série de
pontos que são extremamente importantes e que não podem ser esquecidos
na democracia contemporânea.
Mas também temos pontos negativos. O
primeiro ponto negativo é o fato de que a sociedade democrática grega
atingiu um grau de corrupção extremamente elevado. E não apenas isso:
boa parte dos que trabalhavam para o Estado, sobretudo em Atenas,
recebia recursos do Estado para exercer o seu múnus.
Por que isso é
grave? Porque, para comparecer a um julgamento - e o julgamento era
feito por centenas de juízes e cidadãos -, Sólon e depois Cleon
instituíram um pagamento por cada sessão. Cada sessão era paga.
Vejam que essa é uma situação complexa. Para receber, esses cidadãos,
que eram pequenos proprietários, iam a Atenas cumprir o seu múnus, e, lá
em Atenas, descuidavam das suas propriedades. Portanto, dependiam cada
vez mais dos aportes do Estado e se tornavam cada vez mais exigentes.
O que ocorre nesse momento? Nós temos a produção de processos, a
produção de culpados, para que esses juízes pudessem receber a sua
dracma ou o seu óbolo. Esse ponto é gravíssimo, porque nesse momento
aparece, na situação grega, a figura do sicofanta.
O sicofanta é
justamente aquele indivíduo que denuncia e que produz culpados, para ele
próprio e os juízes poderem receber dinheiro. Ora, o sicofanta - e nós
temos vários testemunhos da época - é aquele que, segundo Lísias, por
exemplo, ganha mais dinheiro com os inocentes do que com os culpados,
porque ele exerce a chantagem.
Essa é uma situação extremamente
grave de produção de culpa, de acusação falsa, tendo em vista esse tipo
de ganho por parte daqueles que vivem do Estado, que vivem da política e
aqueles que providenciam possíveis culpados.
Então vejam que, no
caso, o sicofanta era usado para combater a corrupção, mas era um
instrumento altamente corrupto e altamente perigoso.
A sociedade
grega, naquele momento, pratica a corrupção em massa. Há troca de
favores. O termo usado para essa troca de favores é doro, você dá
um favor e você recebe um favor. Tanto Platão quanto Aristófanes e
outros críticos da democracia mostram bem essa prática, esse mercadejo
dos apoios aos políticos e àqueles que vivem do Estado.
Perdoem-me,
mas eu vou entrar no âmago da questão. Dada essa experiência histórica
da Grécia, da nossa mãe-democracia, e dada a experiência de séculos de
uso de delatores, de uso de instrumentos de delação por regimes
democráticos ou por regimes autoritários, como professor de Ética,
pergunto: como é que nós podemos aceitar a proposta deste art. 38 do
projeto?
Diz o art. 38:
Art. 38. O terceiro que, não sendo
réu na ação penal correlata, espontaneamente prestar informações de
maneira eficaz ou contribuir para a obtenção de provas para a ação de
que trata esta lei, ou, ainda, colaborar para a localização dos bens,
fará jus à retribuição de até 5% do produto obtido com a liquidação
desses bens.
Parágrafo único. A retribuição de que trata este artigo será fixada na sentença.
Foi refletido, pergunto eu, na redação do artigo, o passivo moral que a prática instaura ou reitera?
A definição de Lísias, segundo a qual o sicofanta ganha mais dos
inocentes por praticar a chantagem, é algo forte. Tenho dúvidas sobre se
essa definição não se aplicaria à sociedade brasileira. Diz ele,
repito, que os inocentes chantageados dão mais lucros aos sicofantas do
que os verdadeiramente corruptos. É contra a fé pública mover
profissionais da delação paga.
O segundo ponto que preocupa no projeto é o teste de integridade, previsto no art. 48.
O Estado Democrático moderno, apesar de preso nas malhas da burocracia
com o seu segredo do cargo inexorável, busca romper com a raison d'État e
o sigilo. A transparência deve comandar os poderes e os meios
administrativos. Estados onde imperou a exceção, afastada a
transparência, mantiveram o sigilo e o ampliaram em detrimento da
liberdade cidadã.
Se o Legislativo, o Executivo, a Justiça devem
prestar contas de seus atos aos cidadãos, como instaurar um modo de
percepção da provável desonestidade de funcionários com base no segredo?
Diz o art. 50 do texto:
Art. 50. Os testes de integridade consistirão na simulação de
situações sem o conhecimento do agente público, com o objetivo de testar
sua conduta moral e predisposição para cometer ilícitos contra a
administração pública.
Poderes secretos seriam atribuídos a
corregedorias, controladorias, ouvidorias ou órgãos congêneres de
fiscalização e controle. Tais organismos devem dar ciência, de modo
sigiloso, ao Ministério Público, para que este recomende medidas
complementares.
E ainda há mais segredo:
Art. 55. A
administração pública não poderá revelar o resultado da execução dos
testes de integridade nem fazer menção aos agentes públicos testados.
O trecho respeitado o direito à intimidade surge como algo estranho no contexto.
Vou deixar com a Comissão o texto, inclusive, as notas eruditas de
Direito, de Filosofia, de História, etc. Não vou, então, me remeter a
cada citação de autoridade.
Deixando de lado a eficácia do teste,
algo muito discutido pela literatura especializada, insisto no segredo e
na sua manipulação.
Os organismos movidos para aplicar os testes
estão acima de qualquer inspeção no ato mesmo em que os efetivam? E o
que dizer do termo simulação que consta no projeto?
Um mestre político, jurídico e científico, chamado Francis Bacon, no ensaio Da Simulação e da Dissimulação, indica a essência da palavra e da coisa: A
simulação é profissão falsa e a mais culpável e a menos política,
exceto em matérias eminentes e raras. E um costume generalizado de
simulação, em seu último grau, é vício. O principal erro dos atos simulados, termina Bacon, é que eles privam a pessoa de um instrumento principal de ação: a confiança e a crença.
Uma técnica ética e moral estabelecida por Kant para testar a prática
baseada em máximas é perguntar se ela pode ser universalizada, omnia et singula. Caso contrário, ela não é moral.
Os procedimentos do teste de integridade podem ser universalizados para
toda a cidadania e para todos os que, nos poderes, exercem cargos,
como, por exemplo, na Justiça, no próprio Ministério Público? A resposta
é negativa.
Volto a Platão. Em Leis, ele instaura, pela primeira vez na história jurídica e política, a tese dos checks and balances, depois herdada por Montesquieu.
Abusos de um poder devem ser controlados pelos outros, coletivamente dispostos.
No teste de integridade, o indivíduo está solitário, sem apoio de seus
representantes, como sindicatos e associações, etc., diante de um poder
invisível que só responde a posteriori, mas que deve silenciar o nome e as condições do interrogado.
Peço que me perdoem, mas estamos no domínio do livro O Processo, escrito por um autor que denunciou o abuso do segredo. Esse autor, todos sabem, é Kafka.
Finalmente, passo à boa-fé que, diz Bacon, desaparece com práticas de simulação e dissimulação no poder e na sociedade.
Noto um ponto: os partidos políticos poderão ser punidos pelo uso de
recursos ilícitos. Existe, no entanto, quem julgue encontrar, nas suas
direções, boa-fé na admissão daquelas finanças. Cito, por exemplo,
editorial do jornal O Estado de S.Paulo: Quando Só a Boa-Fé Não Basta, de 19 de agosto de 2016.
É árduo separar o tesoureiro ou integrante de um partido e a totalidade
da agremiação. Mas seria de todo relevante, no caso, provar a
conivência de todo o partido em casos específicos. Algo similar ocorre
na coleta de provas não assistidas pela ordem legal, mas realizadas em
boa-fé pelos investigadores e/ou acusadores.
Importa refletir um pouco sobre o significado da locução boa-fé, que herdamos do latim bona fide. O exemplo que vem à lembrança é do autor da mais profunda ética ocidental: Bento de Spinoza. Em seu livro Tratado Teológico-Político,
ao elogiar Amsterdã, ele exalta o quanto a liberdade é fundamental para
a sua vida pública. Naquela urbe, diz ele que todos contratam sem dolo e
em boa-fé.
Ora, um ponto importante, quando nós temos esse contrato, são as obras que dele resultam.
Boa parte dos nossos conceitos de boa-fé vem da Grécia, com o termo pistis, e vem de Roma, com o termo é fides.
Chamo a atenção dos senhores para o seguinte ponto: é preciso notar que
o termo boa-fé não é unívoco e sem ambiguidades. Como enunciam
trabalhos jurídicos, antigos e recentes, trata-se de uma noção vaga. Tal
fato não impede que ela tenha acolhimento em vários setores do Direito.
Mas não há consenso algum sobre a exata natureza legal da boa-fé. Essa
imprecisão terminológica afeta inevitavelmente a função preenchida pela
boa-fé no Direito contemporâneo. No entanto, parece que um bom número de
sistemas considera que a boa-fé se aplica às leis que tratam das
obrigações em geral, e não apenas às leis do contrato.
No comércio e
na política, pode-se falar com maior propriedade de boa-fé, porque
existe algo que vai além dos que fazem o acordo: a mercadoria, o
dinheiro, o poder estatal que efetiva obras em proveito dos governados.
Quando o ato é unilateral e não beneficia, como no contrato, a outra
parte, de modo evidente, com dificuldade, podemos separar o conceito de
boa-fé do seu aspecto subjetivo.
A boa-fé reside no íntimo do
indivíduo que age. Ela não é algo fenomênico, para usar a linguagem
kantiana, mas apenas noumênico, se limita à consciência do agente. Para
que a consciência própria seja reconhecível no coletivo e pelo coletivo,
é preciso indicar as obras resultantes. E tais obras, na investigação
criminal, não podem negar a lei positiva. A sequência que vai dos quid facti ao quid juris
deve ser estabelecida sem quebras subjetivas. Não é preciso seguir Hans
Kelsen para notar as dificuldades de uma visão subjetiva que, ampliada,
pode se tornar equívoca e arbitrária.
Então, eu paro por aqui.
Certamente os colegas têm algo mais substancial a dizer, mas, como
professor de Ética e como professor que trata de ética e moral, eu não
posso aceitar tranquilamente essa alegação de boa-fé, em se tratando de
crimes ou de alegações e crimes coletivos.
Então, no projeto
inteiro, vejo, pelo menos, três pontos que precisariam ser refletidos
com muita prudência: primeiro, esse problema do teste de integridade;
segundo, a questão da boa-fé, que é tão importante quanto; e, terceiro,
essa questão inicial, que eu coloquei, da falta de critérios para se
encaminhar uma acusação.
Eu sei que o que estou dizendo vai irritar muita gente, mas, me parece que é bom seguir o ensino de Aristóteles: Amicus Plato, sed magis amica veritas.
Muitas vezes, nós estamos assoberbados, preocupados com a luta pela
corrupção, mas esquecemos do fator fundamental, que é a defesa. E, no
caso do teste de idoneidade, ela falha; no caso da boa-fé, ela falha; e
também no caso da acusação, não há maiores fundamentos. Sobretudo,
aquele item de dar ao delator uma parte de recursos, isso me parece uma
ressurreição do que há de pior na tradição política ocidental.
É o que tenho a dizer, por enquanto. Obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Joaquim Passarinho) - Muito obrigado, Prof. Roberto Romano.
Vamos passar a palavra agora ao Sr. Augusto de Arruda Botelho, que falará por 20 minutos.
O SR. AUGUSTO DE ARRUDA BOTELHO - Boa tarde a todas e a todos.
Inicialmente, eu gostaria de agradecer ao Sr. Presidente, ao Sr.
Relator e ao Deputado Carlos Marun o convite feito por esta Comissão e
já começo dizendo que pesquisei os outros convidados que participarão
das longas e necessárias audiências desta Comissão. Ao contrário da
maioria dos convidados, não tenho títulos de doutor, mestre, professor
ou coisa parecida. Sou, simplesmente, um advogado criminal que milita há
15 anos exclusivamente na advocacia criminal.
Então, a abordagem
que pretendo fazer hoje aqui é a da prática, do dia a dia, do Direito
Criminal e do sistema de justiça criminal.
Eu gostaria de começar
dizendo que as dez medidas contra a corrupção propostas pelo Ministério
Público já começam erradas pelo nome, porque sobre corrupção elas tratam
muito pouco.
Ao analisarmos as dez propostas de alteração
legislativa, eu consideraria que cinco delas têm ligação direta com o
crime de corrupção e as outras cinco nada mais são do que propostas de
reformulação e de alteração do Código de Processo Penal e do Código
Penal.
Essas propostas vão valer para o crime de corrupção, para o
crime de sonegação de imposto, para o furto de galinha, para o tráfico
de drogas, para absolutamente todo o crime.
Então, na verdade, não
estamos diante de uma discussão sobre medidas de combate à corrupção. O
que o Ministério Público propõe é um código de processo penal altamente
voltado ao interesse da acusação.
As reformulações em variados
artigos do Código de Processo Penal violam, de forma grave, os mais
básicos direitos de defesa. Não me refiro só aos direitos de defesa de
supostos corruptores, mas aos direitos de defesa de todos os cidadãos.
É preciso ficar bem claro. Nós estamos tratando aqui de uma reforma
ampla, radical e perigosíssima da lei, sob o manto de se estar
combatendo a corrupção.
Há propostas nesse pacote que revogam ou
modificam, Sras. e Srs. Deputados, construções que esta Casa, o Senado, a
academia e a sociedade levaram anos para construir de forma
absolutamente democrática, pensada, discutida, que, com o perdão da
palavra, podem ser revogadas em uma canetada. Ainda bem que não vai ser
em uma canetada, porque estamos aqui debatendo esse tema, o que
considero extremamente relevante.
O pretexto da proposta é o
combate a crime de corrupção. Expurgar da nossa sociedade o mal que é a
corrupção deve ser, sim, prioridade de todo e qualquer governo, mas, sob
o pretexto de se combater a corrupção, nós estamos, na verdade,
suprimindo direitos e garantias fundamentais de todos.
Estamos, em
algumas propostas, senhores, rasgando a Constituição! São direitos que, a
duras penas, depois de tantos anos, todos nós conseguimos conquistar.
Eu divido as dez medidas em três categorias. Algumas são positivas.
Faço questão de ressaltar isso. Há medidas no pacote proposto pelo
Ministério Público que são extremamente positivas, que merecem aprovação
e todo o incentivo; há medidas absolutamente históricas e
estatisticamente ineficazes; e há, pior, as medidas ilegais.
Caso
seja necessário, responderei as perguntas, mas vou procurar me
concentrar nas que considero mais graves, que eu gostaria de discutir um
pouco mais com os senhores.
A primeira delas, a proposta número três, que fala sobre o aumento de pena e a classificação de crime hediondo para corrupção.
Senhores, meu ex-chefe e mestre, Dr. Márcio Thomaz Bastos, dizia uma coisa: Eu
acho curiosa essa Lei de Crimes Hediondos porque eu não conheço crimes
adoráveis. Todos os crimes são, de certa forma, hediondos.
Em
1990, quando a Lei de Crimes Hediondos foi aprovada, num momento de
comoção, os senhores se recordam muito melhor do que eu que, a partir da
criação dessa lei, vários outros crimes - na época, o homicídio doloso
foi considerado homicídio qualificado, foi considerado um crime hediondo
- foram assim catalogados ao longo do ano, sempre em momentos de grande
repercussão, de grande comoção social. Nós temos até hoje a
falsificação de medicamentos como crime hediondo.
Então, sempre, em
algum momento de grande repercussão, a Lei de Crimes Hediondos vem e
transforma um crime considerado comum - eu não entendo o que seria um
crime comum - em um crime hediondo. Ao longo dos últimos 15 ou 20 anos,
foi assim.
O Ministério Público pretende agora, em 2016, novamente se utilizar dessa fórmula e tratar a corrupção como crime hediondo.
Qual é o problema disso, senhores? O problema é bastante simples. Isso é
absolutamente ineficaz. É nada mais do que um rótulo a um crime, com a
falsa esperança de que, transformando a corrupção em crime hediondo, o
eventual corruptor, com o Código Penal embaixo do braço, deixará de
cometer o crime de corrupção, porque agora o crime é hediondo.
As
estatísticas de todos os crimes que foram considerados, ao longo dos
últimos anos, como hediondos, no nosso sistema de legislação, mostram
que não houve redução em nenhum desses crimes. A redução foi de
absolutamente zero por cento. Isso não funciona!
É bonito? A opinião
pública gosta disso? Agora corrupção é crime hediondo, homicídio é
crime hediondo, o tráfico de drogas é crime hediondo. Isso pega bem?
Pega muito bem, mas não funciona, assim como o aumento de penas,
senhores.
O IDDD, entidade que eu até a semana passada presidi, hoje
integro o Conselho, vem, ao longo dos seus últimos 15 anos, fazendo
diversos projetos e discutindo, nesta Casa, em outras casas, na
imprensa, a desnecessidade e a ineficácia de aumento de pena para
combate de criminalidade. A história e as estatísticas demonstram que
exclusivamente aumentar a pena e, nesse caso, fazer com que o crime se
transforme em hediondo não cessa a prática desse crime. O resultado
disso vai ser próximo de zero.
Então, essa é uma medida que,
obviamente, causa um impacto midiático muito interessante. Ela está na
capa de todos os jornais, mas a eficácia, pela história e pela análise
da Lei dos Crimes Hediondos, é próxima de zero.
A segunda proposta que eu gostaria de discutir é a de nº 4, que o Ministério Público Federal tem como título o seguinte: Aumento da eficácia e da justiça dos recursos no processo penal.
Para V.Exas. perceberem como essas dez medidas contra a corrupção, na
verdade, é uma alteração de um código para processo penal acusatório,
dentro desse item 4, nós temos 11 alterações do Código de Processo
Penal! Onze alterações! Não são alterações superficiais; são
absolutamente profundas! E o Ministério Público Federal parte da
seguinte premissa - isso está no texto, não sou eu que estou dizendo -: É
comum que processos envolvendo crimes graves e complexos, praticados
por réus de colarinho branco, demorem mais de 15 anos em tribunais, após
a condenação...
Primeiro, nós temos 640 mil presos em nosso
País, e 50% deles estão presos por tráfico ou roubo. Então, nós estamos
aqui, rasgando o Código de Processo Penal, para, em tese, punir uma
minoria de uma minoria que cometeria o crime de colarinho branco.
Nós estamos ali cerceando e rasgando direitos de uma grande parcela da
população, porque há crimes graves e complexos de colarinho branco que
demoram 15 anos para serem julgados em tribunais, após a condenação. Aí
vem a parte que mais causa, no mínimo, curiosidade: ... pois as defesas - aqui culpando a Advocacia - empregam estratégias protelatórias.
Eu
acho que isso é um folclore sobre o qual nós precisamos falar
abertamente aqui, podendo causar um pouco de desconforto, mas... Nós
temos três atores no sistema de justiça criminal: o advogado, o promotor
e o juiz. O advogado cumpre prazo. O promotor cumpre prazo. Quem não
cumpre prazo? O juiz. A verdade é essa.
O Código de Processo Penal
prevê prazos extremamente exíguos para a defesa e para a acusação. O
menor prazo no Código de Processo Penal é de 24 horas; o maior é de 15
dias. Se o promotor ou o advogado perdem um prazo, acabou o recurso; eu
não tenho como entrar com esse recurso de novo. Então, nós cumprimos
prazo, assim como o Ministério Público cumpre prazo. Quem não tem prazo
para cumprir? O Judiciário! Culpa do Judiciário? Não! Culpa do
sucateamento do Judiciário.
Eu deveria ter trazido isso hoje para
mostrar aos senhores. Em outra palestra que dei em São Paulo, justamente
sobre esse tema, fiz questão de pegar dois casos de bastante
repercussão. Não são casos de colarinho branco, mas casos de bastante
repercussão no Brasil todo: um, do Pimenta Neves, do qual todos se
recordam; e outro, do Roger Abdelmassih, do qual também todos se
recordam. São sempre casos utilizados como exemplo de Justiça lenta,
Justiça atrasada, e mais, de como advogados chicaneiros entram com
recursos protelatórios para que a pessoa nunca seja condenada.
Coloquei numa linha do tempo, cronologicamente, esses dois casos, num power point,
para as pessoas olharem o que aconteceu com eles. Vai-se perceber que o
Ministério Público e as defesas apresentaram todos os recursos
cabíveis, recursos previstos em leis, recursos que têm um caráter e
requisito de admissibilidade, que muitas vezes os tribunais não
concordam, ou seja, não são recursos que basta eu apresentar, eu preciso
apresentar e dizer por que eu estou apresentando.
Então, o
Ministério Público e a defesa apresentaram todos os recursos
necessários, mas o processo demora mesmo, porque ele fica 1 ano e meio
parado no Tribunal de Justiça de São Paulo para ser distribuído; depois,
quando vai a julgamento, há um pedido de vista e ele fica mais 6 meses
aguardando.
Então, vão-se somando esses pequenos tempos, que não são
pequenos, e tem-se um processo que demora 10 anos para ser julgado.
Agora eu pergunto: A culpa é da defesa e da acusação ou a culpa é de um Judiciário, que infelizmente está sucateado?
É muito mais fácil para o Ministério Público Federal falar: Então, para tornar o processo mais rápido, vamos acabar com esses recursos da defesa.
E não é acabar com qualquer recurso! O Ministério Público Federal,
senhores, coloca proibições neste ponto 4, que, na prática, aniquilaria
um habeas corpus! Nem o regime militar fez isso!
Aqui,
embargos de declaração... De fato, há alguns pontos positivos desse
ponto 4. Por exemplo, o próprio Ministério Público fala do pedido de
vista, que tem de ter um prazo para ser cumprido. Eu concordo, óbvio que
tem de haver um prazo, mas o Ministério Público não prevê uma sanção.
Se o juiz descumpre o prazo, pede vista e fica 1 ano com o processo,
deveria haver uma sanção.
Há um ponto específico desse projeto que
fala em ser necessário apresentar as razões do recurso no Tribunal,
enfim, algumas questões bem práticas que até eu consigo concordar, mas
há outras, principalmente a questão do habeas corpus, senhores... Vai ser tão difícil impetrar um habeas corpus, se essas medidas forem aprovadas - o habeas corpus praticamente precisa parar de existir, esse recurso tão excepcional, tão importante, que é chamado de remédio heroico.
Então, é muito mais fácil, numa canetada, dizer que vamos acabar com os
recursos que a defesa dos réus processados por colarinho branco
apresenta para protelar uma condenação. Nós estamos tratando de um
microcosmo aqui e nos esquecendo de uma massa de pessoas que respondem a
processos criminais. Essas, sim, sofrerão as consequências disso,
porque os réus processados por colarinho branco continuarão tentando
recursos e contratando diversos advogados. Quem vai pagar o pato, para
usar uma expressão bem moderna, é o favelado, preso com 3 gramas de
maconha. É esse que vai sofrer.
Então, é muito mais fácil rasgar os
códigos e acabar com todos os recursos do que, de fato, fazer o que é
necessário, que é investir na Justiça. Nós só vamos ter um processo mais
rápido e um Judiciário mais rápido com investimento. Nós temos comarcas
no Estado de São Paulo, o Estado mais rico da Federação, ainda com
impressoras matriciais, com fax! Ainda bem que conseguimos que todas as
comarcas tenham computador. Ah, mas nós temos 86 juízes criminais em São Paulo, 70 desembargadores criminais!
Nós precisamos de muito mais do que isso. Temos dez Ministros no STJ,
que julgam matéria criminal, num País absolutamente litigioso como é o
Brasil. Nós precisaríamos investir pesadamente no Poder Judiciário,
porque aí, sim, nós conseguiríamos uma Justiça mais rápida e eficaz. Aí,
a sensação de impunidade, que é o que fica permeando sempre a cabeça de
todo mundo, de certa forma diminuiria. Agora, não é cerceando recursos,
não é rasgando a Constituição que vamos ter uma Justiça mais rápida e
muito menos uma Justiça mais justa.
Mais um ponto extremamente
preocupante, assim como todos dos que falei, mas este me causa arrepios:
os ajustes nas unidades penais. Eu discordo integralmente da proposta
do Ministério Público, mas especificamente a questão da prova ilícita
precisa ser rechaçada pelos senhores, porque, aí, entraríamos num
calabouço extremamente perigoso, porque nem regimes autoritários
conseguem prever a possibilidade de se condenar alguém com base numa
prova ilícita.
Senhores, eu sei que nesta Comissão, em artigos de
jornal e em entrevistas muito frequentes, os defensores dessa medida
utilizam a expressão já usada pelo Prof. Romano aqui: se a prova ilegal
foi obtida mediante boa-fé, ela pode ser utilizada. Senhores, esse termo
é de uma amplitude e de um perigo...
O que é uma prova ilícita obtida mediante boa-fé? Eu torturei sem querer. É isso? Eu
obtive a confissão dele, mas tudo bem! Eu estava bem empenhado nessa
tortura. Eu queria soltar aquela vítima do cativeiro, eu estava imbuído
de boa-fé. Olha, aquele grampo telefônico ilegal que eu fiz foi
para pegar uma coisa importantíssima. Eu pensei que fosse legal aquele
grampo, mas aí eu vi que a decisão judicial era de outra pessoa. Eu me
equivoquei. Perdão. Mas olha o que eu descobri aqui. Vamos usar essa
prova ilegal. Ou pior: nós vamos legitimar uma prática que já é absolutamente ilegítima nas nossas periferias. Eu
invadi a sua casa porque achei que você estava traficando. E aí, na
hora em que eu chutei a porta do seu barraco, sem uma ordem judicial,
eu, de fato, encontrei ali 30 gramas de cocaína. Eu tanto estava de
boa-fé que eu encontrei a droga.
Senhores, é uma coisa
extremamente subjetiva e extremamente perigosa. E volto a dizer: qual a
relação disso com corrupção? Nenhuma! Nenhuma! Se essa proposta passar,
quem vai sofrer as consequências dela não serão os corruptos, senhores,
mas os cidadãos até de bem. Infelizmente, ainda temos maus policiais,
maus promotores, maus juízes, maus advogados. Não podemos nos abraçar
numa suposta boa-fé para permitir o uso de uma prova ilícita para
condenar alguém.
E vale-se dizer: Ah, nós temos aqui a experiência americana.
Senhores, essas dez medidas contra a corrupção, que mais uma vez digo
que, de corrupção tem muito pouco, têm se baseado muito e tem trazido
muito a experiência americana, a jurisprudência americana. Esquecem-se
de dizer que o nosso sistema de justiça criminal não tem relação
nenhuma, está a léguas de distância do sistema judicial americano! E
usar os Estados Unidos como exemplo... Nós podemos usar os Estados
Unidos como exemplo para muita coisa, mas para sistema de justiça
criminal? Eles têm a maior população carcerária do mundo! Não conseguem
coibir a prática de um crime. Os índices de criminalidade só aumentam.
Vimos agora o Presidente Obama tentando uma revolução, tentando esvaziar
cadeias, porque a política criminal nos Estados Unidos vem se mostrando
completamente equivocada. E vamos trazer essa experiência para cá? Ah,
lá é possível prova ilícita. Vamos trazer prova ilícita ao Brasil
também.
Para finalizar, senhores, a Proposta nº 9 cria mais uma
modalidade de prisão preventiva para evitar dissipação do dinheiro
desviado. E diz aqui a hipótese: Permitir a identificação e a
localização ou assegurar a devolução do produto e proveito do crime ou
seu equivalente, ou para evitar que sejam utilizados para financiar a
fuga ou a defesa do investigado.
Então, está aqui: vamos prender
preventivamente para que o investigado não possa pagar ao advogado.
Então, parece que o Ministério Público está com problemas com a
advocacia.
Senhores, o artigo que dispõe sobre prisão preventiva no
nosso Código de Processo Penal é bastante taxativo nas possibilidades de
se decretar a prisão preventiva de alguém, para assegurar a lei penal,
garantia da ordem pública. Há requisitos absolutamente objetivos e
concretos de que possibilitam um decreto de prisão preventiva. Na
prática, que é o que eu conheço, juízes muitas vezes ignoram os atos
necessariamente concretos que poderiam dar ensejo a uma prisão
preventiva. E o que o Ministério Público Federal propõe aqui é a
inclusão de mais uma possibilidade de prisão preventiva, para torná-la
mais ainda uma antecipação da condenação, porque, de preventiva, não vai
ter nada.
Então, mais uma vez, muito obrigado pelo convite. Estou à disposição dos senhores para qualquer dúvida.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Joaquim Passarinho) - Muito obrigado, Sr. Augusto Botelho.
Nós queremos esclarecer, Srs. Deputados, que houve um descompasso entre
a assessoria do nosso outro convidado, José Henrique Torres, e a nossa
assessoria. Não foi solicitada a passagem a tempo. Por isso ele não pôde
estar presente por motivo de voos. Nós vamos remarcar para a próxima
semana. Então, hoje vamos ouvir apenas os dois expositores.
Encerrada a exposição, passaremos aos debates, obedecendo à ordem de
inscrição. Porém, antes, vamos conceder a palavra ao nosso Relator,
Deputado Onyx Lorenzoni, que terá até 15 minutos.
O SR. DEPUTADO ONYX LORENZONI -
Eu queria, em nome da Comissão, agradecer a presença do Prof. Roberto
Romano e também do Dr. Augusto de Arruda Botelho pelas reflexões que nos
trazem.
Esta é uma matéria de grande complexidade. Na verdade, nós
temos que compreender que há um extraordinário mérito na sua
propositura, na medida em que coloca o Congresso Nacional, apoiado por 2
milhões e meio de assinaturas, para refletir sobre este tema. Nós temos
de ter a clareza de que, após o Ministério Público propor essas dez
medidas, e é até bastante razoável que seja assim, como a expertise está diretamente vinculada ao combate à impunidade, é razoável que haja uma concentração aumentada sobre essa área.
Mas a Comissão já tem discutido isso aqui. Os palestrantes têm nos dado
a condição de refletir sobre isso, como nós estamos fazendo hoje, com
questões extremamente relevantes, tanto por parte do Prof. Romano quanto
pelo Dr. Augusto Botelho. Isso vai nos ajudar, e muito, nesse processo
de, primeiro, construirmos não apenas instrumentos de combate à
impunidade, como instrumentos de combate amplo e efetivo à corrupção,
uma grande chaga do Estado brasileiro.
E quando se tem uma
alteração na graduação de penas, é importante lembrar que houve um
cuidado, que é de crimes acima de cem salários mínimos. É importante nós
nos lembrarmos disso. Ele não é amplo, geral e irrestrito.
Segundo,
pela tradição brasileira, como os crimes de corrupção estão entre 2 a 12
anos, a tradição é a de que seja pelo menor volume de anos a
condenação. Isso tem permitido as tais transações penais, que têm dado
essa sensação de que, para o crime do colarinho branco, não há punição
adequada.
É claro que as salvaguardas constitucionais devem ser todas
preservadas. Nós não lutamos como lutamos para chegar a uma
Constituição que nos dá salvaguardas importantes para os indivíduos, num
país que sempre tratou mal o indivíduo, do ponto de vista
institucional.
O Brasil dá, na sua própria formação como nação, menos
valia em relação à figura do indivíduo. Isso foi um resgate que a
sociedade brasileira fez a partir da Constituição de 1988. Isso precisa
ser olhado com muito cuidado.
Agora, há uma determinação de todos
nós. Por isso eu reputo de excelente a reflexão, tanto do Prof. Roberto
Romano quanto do Dr. Augusto Botelho, porque esses contrapontos - e
outras pessoas virão aqui em relação à proposta do Ministério Público -
vão nos ajudar exatamente a acertarmos a graduação das coisas,
equilibrarmos as coisas.
Agora, não dá para continuar com os atuais instrumentos, achando que eles são suficientes. Não são.
Este
é um país onde se roubam 100 bilhões por ano da administração pública;
um país onde as pessoas são capazes de se organizar das mais variadas e
engenhosas formas e desviar 100 bilhões do orçamento público por ano,
partindo-se, como referência, de inúmeras entidades que tentam fazer
essa avaliação, desde a academia até entidades da organização civil - e
algumas dizem que esse número é ainda maior. É evidente que nós
precisamos olhar isso de novo.
Então, o grande mérito da proposta é o
extraordinário apoio popular que tem. E aqui eu quero fazer uma
referência à Frente Parlamentar de Combate à Corrupção, brilhantemente
presidida pelo Deputado Antônio Carlos Mendes Thame, que é, junto com
outros companheiros da Frente, subscritor dessa proposta. É evidente que
nós temos muito para discutir. Mas nós realmente temos que ter a
responsabilidade de saber que nós precisamos equipar o Brasil de
instrumentos que possam trazer a eficácia.
Eu não estou aqui defendendo nada; estou ajudando todos a refletir.
A
inclusão, por exemplo, outra questão aqui criticada, é matéria de
reflexão e não tenho convicção sobre ela. Algumas pessoas defendem a
inclusão do crime de corrupção como crime hediondo para evitar que um
corrupto ligado a um governo corrupto consiga um induto de final de ano.
Nos crimes hediondos não existe induto possível.
Aliás, nós acabamos
de ver um Governo que, durante um longuíssimo período, organizou uma
quadrilha para desviar recursos públicos. Disso, ninguém mais duvida,
nem os mais enraizados membros da grei política que levou esse grupo ao
poder. Não há dúvida sobre isso. Então, se isso foi possível, nós vimos
indutos, Prof. Romano, que acho moralmente inaceitáveis por conta do que
ocorreu.
O crime de colarinho branco não é apenas o crime de uma
pessoa. O crime de colarinho branco é o que mais mata no Brasil, porque
há ausência de estrutura prisional adequada, há ausência de forças
policiais bem treinadas e adequadamente preparadas, há omissão do Estado
brasileiro em selar as nossas fronteiras.
Como, quando o Estado
brasileiro quer, consegue fazer um evento do porte das Olimpíadas, e as
intercorrências são absolutamente não significantes? Quando todos se
unem, nós conseguimos.
Será que não seria a hora, derivada dessa grande discussão, conseguir unir o Brasil no combate à criminalidade.
Num país onde se mata como em nenhum outro lugar do mundo, até hoje,
governo algum pensou em fazer um Ministério para a segurança - e olha
que já criamos ministério para tudo!
Eu faço essa reflexão inicial,
porque este é um tema polêmico, difícil e que vai exigir de todos nós
imensa responsabilidade, pois nós temos de salvaguardar conquistas,
temos de ter noção da cidadania, temos de ter uma atenção permanente no
sentido de proteger o direito individual no Brasil, mas nós também temos
de conseguir construir alternativas.
Vou usar um exemplo. Eu também
tenho dificuldades com esse artigo que foi citado pelo Dr. Botelho,
mas, se trouxermos a metodologia que tem sido de grande valia e sucesso
tanto na América do Norte quanto na Europa do Whistleblower, do apitador
ou daquele que faz o estímulo para que as pessoas da sociedade
participem do processo de controle do seu país, de busca de
transparência e de combate à corrupção nas mais diversas sociedades,
isso terá eficácia demonstrada.
Esse é um artigo retirado de todo
um sistema. É claro que, porque ele está solteiro aqui, pode soar torto,
e as críticas são absolutamente adequadas. Agora, se nós conseguirmos
trazer para o projeto esse instrumento, será muito bom. Hoje, há vários
projetos interessantes na Câmara. Quero lembrar que um grupo de
Consultores desta Comissão, Sr. Presidente, passou 10 horas do último
sábado, aqui na Casa, trabalhando para buscar alternativas a fim de
construirmos algo equilibrado. É importante ressaltar a dedicação das
pessoas.
Antes, eu quero agradecer imensamente aos autores, o Líder
Rubens Bueno e o Deputado Carlos Marun, que permitiram a vinda do Prof.
Romano e do Dr. Augusto Arruda Botelho. Esses convidados nos farão
refletir muito sobre o tema - e nós temos que fazer isso mesmo.
Feitos esses agradecimentos e essas colocações iniciais, pergunto ao
Prof. Romano: o teste de integridade, ao qual o senhor se referiu, de
certa forma, do ponto de vista conceitual, como está escrito, traz de
volta a Santa Inquisição para o cenário do funcionalismo público
brasileiro.
A pergunta que faço vale para os dois, porque são críticos da matéria, cada um deles na sua expertise, com conhecimentos extremamente relevantes.
Nós recebemos uma sugestão de um juiz. Por exemplo, quando vamos
analisar a história da Polícia de Hong Kong, de Nova York, de Los
Angeles e de Chicago, todas essas quatro histórias passam por teste de
integridade. São polícias de culturas diferentes, não conheço no detalhe
a aplicação, mas o conceito é que, quando foi aplicada a metodologia,
obtiveram resultado.
Então, o que traz a sugestão desse juiz, que
nós recebemos aqui... Aproveito para lembrar que isso serve para as
pessoas que estão nos assistindo, porque as contribuições podem ser
enviadas ao site da Câmara dos Deputados, que nós as recebemos e processamos.
A sugestão desse juiz é no sentido de que o teste de integridade
poderia ser trazido ao Brasil desde que, primeiro, fosse fundada a
suspeita e, segundo, com autorização judicial, ou seja, a corregedoria
do órgão respectivo teria que estabelecer a fundada suspeita e depois ir
ao Judiciário buscar uma autorização para fazer uma aplicação
específica.
Então, nós retiramos a generalização e trazemos um
instrumento que, em um primeiro momento no Brasil, seria usado como
investigativo, vamos dizer assim. Teríamos de fazer algumas alterações
para talvez criminalizar o fato, se der positivo o teto. Hoje não há
previsão legal. Mas poderia ser um caminho para termos uma ferramenta
para ser aplicada em situações bem objetivas, bem pontuais, não jogando
essa desconfiança ou essa inquisição. Eu me preocupo, acho que o Dr.
Botelho vai concordar comigo, nós temos no Brasil uma tradição de abuso
de autoridade, de constrangimento, de afastamento de adversários.
Então,
nós temos uma construção do uso da autoridade muito complicada no
Brasil. Talvez essa alternativa de ser pontualmente em algo específico
venha para o Brasil como uma primeira experiência, uma ferramenta de
investigação sobre o controle do Judiciário. Eu acho que minimizamos as
questões que envolvem a perseguição política, a diferença ideológica,
essas coisas que a todos nós preocupam, com seu uso indiscriminado. A
proposta original vem passível de ser utilizada como um todo no
funcionalismo público, mas obrigatoriamente nas polícias. Já são dois
pesos e duas medidas. Eu gostaria de uma consideração, no caso do Dr.
Botelho, mais na aplicabilidade, e do Prof. Romano, na visão filosófica
ou conceitual dessa adequação, sobre como os dois enxergam essa
possibilidade.
Bem, eu já comentei a questão da corrupção, com
relação ao hediondo, qual é a função. Agora, para fugir da transação
penal e daí... Há um fato muito importante. Com referência ao ex-Senador
Luiz Estevão - eu vou usar esse exemplo conhecido de todos, eu já disse
isso aqui, até porque em dado momento involuntariamente eu assisti a um
episódio desse - havia uma certa gabolice de que nunca seria preso,
dada a condição de poder trabalhar pela prescrição daquele episódio do
TRT paulista. Ele só foi cumprir pena porque houve uma recente decisão,
bastante polêmica, do Supremo Tribunal Federal, que, por sete votos a
quatro, decidiu que, em condenação de colegiado em segunda instância, já
se começa a cumprir pena.
Então, eu vejo essa inclusão como crime
hediondo dos crimes de corrupção como uma tentativa - vamos dizer assim -
de buscar, conjugada com uma modificação do período de apenamento,
subindo dos 2 para os 4 anos, correlacionado - a pergunta é específica
para o Dr. Botelho, mas se o Prof. Romano quiser comentar também, ótimo -
casada, Dr. Botelho, com o volume de recursos desviado. Esse é um
cuidado importante. São atos de corrupção. No entanto, uma coisa é o
sujeito lá na ponta, que daqui a pouco, em qualquer circunstância, é
flagrado em algo que não é recomendável, mas que talvez possa ser
corrigido; outra coisa são os milhões e bilhões, como vimos recentemente
no País. Então, gostaria de uma análise crítica sua.
Ali há um
casamento. As coisas não estão desconectadas. Como o senhor vê esse
casamento e se as críticas continuam na mesma direção. Mais uma vez,
muito obrigado. Muito mais que loas, precisamos exatamente do que os
dois estão fazendo aqui, ajudando-nos a pensar melhor.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Joaquim Passarinho) - Muito obrigado ao nosso Relator, sempre com reflexões muito positivas, coerentes.
Queria
também ressaltar ao Deputado que nós temos um grupo de Consultores da
Casa disponível para a Comissão, sempre nos acompanhando e trabalhando
essas propostas, este debate que vem sendo feito aqui.
Vamos passar a
palavra, primeiro, aos nossos expositores, para que possam fazer seus
comentários sobre as provocações do nosso Relator.
Dr. Augusto.
O SR. DEPUTADO ONYX LORENZONI -
Prof. Romano, aquela questão que o senhor abordou sobre a boa fé também
me preocupa muito. O senhor me trouxe um texto. Acho que tenho algumas
dúvidas. Depois, eu gostaria de conversar com o senhor, fora daqui, para
poder analisar aquilo com mais critério ainda.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Joaquim Passarinho) - Prof. Augusto Botelho.
O SR. AUGUSTO DE ARRUDA BOTELHO
- Primeiro, vou falar do teste. Da forma como a proposta está redigida,
nós partimos de algumas premissas que não são permitidas pelo nosso
Direito. A primeira é a presunção de desonestidade. Partimos desse
cenário, o que, para mim, é no mínimo questionável.
Eu não entendo
também como poderia haver uma punição da mera vontade, salvo em casos
absolutamente excepcionais, e o nosso Direito Penal permite esse tipo de
composição.
Haveria no texto atualmente proposto um conflito
evidente com uma súmula do Supremo que dispõe sobre o flagrante
preparado, porque seria uma situação muito semelhante à do flagrante
preparado a realização de um teste dessa natureza. Acho extremamente
ampla e extremamente pouco controlada a proposta apresentada, mas
entendo a intenção como boa.
Portanto, essa proposta, que eu
desconheço, mas que parece que foi encaminhada pelo juiz aos senhores,
já deixa a proposta um pouco mais simpática a meus olhos, pelo menos.
Haveria um crivo do Judiciário para as situações absolutamente
específicas. Em já havendo uma fundada suspeita antes, não se pode
deixar da forma genérica como o texto atual propõe.
Com relação à
questão dos crimes hediondos, eu volto a falar da eficácia. Eu entendo
essa majoração em relação aos salários mínimos, mas vejam que coisa
curiosa: com a diferença de um salário mínimo, nós transformaríamos um
crime não hediondo em um crime hediondo. Essa flexibilidade e essa
subjetividade dentro da dosimetria da pena no Direito Penal é algo
extremamente perigoso. É algo extremamente perigoso.
A Lei dos
Crimes Hediondos já vem, na prática, demonstrando distorções muito
graves na dosimetria da pena. Há crimes extremamente graves, crimes
dolosos contra a vida, que correm o risco de serem apenados de forma
mais branda do que os crimes sem qualquer tipo de violência direta.
Concordo que o crime de corrupção é uma violência indireta, que o crime
de colarinho branco mata indiretamente. Concordo com essa análise, mas
atualmente o nosso Código Penal e nossas leis penais já trazem
distorções extremamente relevantes na dosimetria da pena. Dessa questão
de monetarizar o que é hediondo e o que não é hediondo, eu não consigo
entender a lógica. Mais uma vez, a diferença de um salário mínimo vai
fazer o crime não hediondo passar a ser hediondo? Eu não consigo
entender essa lógica.
Portanto, aliado à total ineficácia histórica e
estatística da Lei dos Crimes Hediondos, eu continuo entendendo que
essa proposta não é interessante.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Joaquim Passarinho) - Tem a palavra o Prof. Roberto Romano.
O SR. ROBERTO ROMANO
- Em primeiro lugar, eu acho que a pergunta e a provocação do Deputado
Onyx se baseiam em um processo lógico, mas eu gostaria de lembrar que,
apesar dessa proposta do juiz, nós não podemos fazer abstração do nível e
da produção ética da sociedade brasileira. A sociedade brasileira, à
semelhança do Estado, vive do favor, vive do compadrio e vive da
animosidade recíproca.
Então, por exemplo, nesse caso da
apresentação de suspeita bem fundamentada, se nós conhecemos o modo de
funcionamento das instituições que vão do Município até o poder federal,
nós sabemos que ali dentro não reside a paz perpétua, porque há
disputa, concorrência, inveja; tudo aquilo que Espinoza analisa sobre
ética está presente no cotidiano. Aí é o momento em que aparece a
indicação do possível culpado.
Nesse ponto, eu fico muito
preocupado, porque cai no ouvido - esse caso do juiz pode ajudar um
pouco - de um corregedor, cai no ouvido do próprio Ministério Público
uma acusação semicaluniosa, não precisa ser totalmente caluniosa, e aí
as consequências são terríveis.
Eu tenho muito receio disso. No
Estado brasileiro, nós passamos mais de cem anos tentando combater a
corrupção. Essa luta contra a corrupção não é de ontem. Eu só lembro que
o regime instituído em 1964 era contra os subversivos e contra os
corruptos; e os corruptos viveram muito bem, viveram tão bem que
prosperaram, inclusive. Então, eu tenho muito receio daquilo que se
incrusta dentro do Estado através do segredo. O segredo pode justificar
muita coisa, sobretudo injustiça.
Outro ponto que está no texto que
eu passei para o senhor é que, a pretexto de se combater a corrupção,
engendrou-se o jacobinismo. Isso engendrou os regimes mais horrendos da
história.
Não por acaso, eu comecei com a questão do sicofanta, do
delator. A figura do delator é extremamente complicada. Espanta-me que
num projeto em que estejam colocando em debate a questão do combate à
corrupção haja um item referente ao pagamento para um delator que não
faz parte do processo. Isso me parece profundamente antiético.
Desculpem-me, eu acho antiético e acho imoral se pagar a alguém porque
colaborou para se chegar a alguma coisa. Quantos vão aparecer? Essa
indústria vai prosperar. Eu tenho muito receio disso.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Joaquim Passarinho) - Muito obrigado, Prof. Roberto Romano.
Vamos passar agora a palavra aos Deputados, mantendo a fórmula que
temos adotado, ou seja, falarão de três em três. Três Deputados vão
falar e depois passaremos a palavra aos expositores, para que possam
responder.
Pela ordem, pediram a palavra dois autores. O primeiro
inscrito é o Deputado Marun, pelo PMDB, que vai também utilizar o tempo
de Liderança. Então, S.Exa. disporá 13 minutos.
Depois falará o Deputado Rubens Bueno, também como autor, e posteriormente o Deputado Antonio Carlos Mendes Thame.
Tem a palavra o Deputado Carlos Marun por 13 minutos.
O SR. DEPUTADO CARLOS MARUN - Saudações!
Eu vou fazer o seguinte: vou ficar meio minuto em silêncio, e V.Exa.
diz que eu tenho 12 minutos e meio. Esse número 13 não me traz boas...
Estou brincando.
Estou brincando por uma razão: ao ouvir as palavras
do Prof. Roberto Romano, eu efetivamente me senti diante de um
professor. Em alguns momentos, isso me fez recuar no tempo, ao bom tempo
em que, jovem - não que eu não seja ainda um jovem -, frequentava os
bancos escolares de uma faculdade de Direito, onde aprendi, acima de
tudo, princípios - porque leis mudam, mas princípios, não -, onde
tentava avançar os meu conhecimento na questão dos princípios, ouvindo
um professor.
O Prof. Romano é a personificação do professor: voz
serena, sabedoria evidente, jeito de professor, e eu me senti naquela
época. Eu fico feliz por isso. Fico feliz por isso.
Quero também
fazer uma saudação e dizer que o acaso fez com que tivéssemos aqui dois
exemplos: um da cátedra e outro da ação - o advogado. O advogado se
formou, já pegou a pasta, já saiu a correr, bem-sucedido, lutando no dia
a dia nas delegacias e nos tribunais, no sentido de fazer valer o
direito daqueles que muitas vezes são vítimas de denúncias caluniosas e
de abuso do poder. Então, eu me sinto completo e vejo como altamente
complexo o painel que temos aqui hoje.
Vou fazer duas considerações
preliminares. Primeiro, os membros do Conselho de Segurança Nacional
que, na madrugada de 12 para 13 de dezembro de 1968, decretaram o AI-5,
pensavam estar agindo de boa-fé, até baseados no princípio da
necessidade, boa-fé e necessidade.
Jarbas Passarinho, um homem
vocacionado para a democracia e para o Iluminismo, teve essa nódoa em
toda a sua vida. Ele viu que estava fazendo uma coisa. Ele disse: Às favas, democracia!
Quase arrancou os cabelos. Estou mentindo? Estou trazendo a história.
Agiam de boa-fé, porque ninguém pensa... Achavam que estavam fazendo o
melhor, baseados no tal princípio da necessidade, que tem feito com que
muita gente se julgue no direito de rasgar a Constituição, de
vilipendiar os princípios, para fazer prosperar teorias completamente
alienígenas e fazê-las prevalecer no Direito brasileiro.
Ontem, o
Brasil viveu um dia especial. Fomos campeões olímpicos de vôlei.
Encerramos uma Olimpíada que efetivamente nos reinclui no âmbito dos
países respeitáveis do mundo. Cheguei à noite em casa, feliz, me deitei,
botei meu pijama, e liguei a televisão - para verem como eu sou
azarado, e não termina bem o dia.
Adivinhem o que estava passando na
televisão? Um debate sobre as dez medidas do MP. E lá estavam um
representante do Ministério Público Federal, um membro do Instituto de
Defesa - nem peguei os nomes - e uma professora. Não havia Deputado,
porque só somos chamados para falar o que é gravado, para ver, depois,
se pode ir à televisão.
Eu, na questão da defesa regimental que fiz
do Eduardo Cunha, devo ter dado mais de cem entrevistas, mas nunca ao
vivo. Devem ter medo de eu dizer alguma coisa. Debate? Não participei de
nenhum. Marun, venha cá e fale; depois é editado.
Aliás, eu minto. A TV Manchete
me convidou para um debate gravado. Rede Manchete, não; agora é RedeTV!
Eu sou do tempo ainda de Adolpho Bloch. A RedeTV! me convidou para um
debate. Nós não podemos participar de debates, nós temos de ouvir
quietos.
Quero chamar a atenção dos senhores. Quem não exige
respeito para si próprio não pode exigir respeito para ninguém. Como
começa? Não anotei o nome, mas havia um membro do Ministério Público
Federal, que deveria estar representando o Ministério Público Federal,
eloquente, bem apresentado. E houve a pergunta da jornalista: Vejam bem essas dez medidas. Todo o mundo dizia que batia palmas, mas agora chegou lá e Deputado está querendo discutir.
Aí eu já fiquei parecido com um porco-espinho na cama.
Veio a resposta: Não,
é assim mesmo. Vejam bem, eles são corruptos e têm medo da Lava-Jato.
Então, eles querem mexer, querem mexer nas nossas dez medidas. Não,
a sociedade abraçou isso aí. Eles não têm que discutir, eles têm que
aprovar na íntegra, porque os que discutem são corruptos, têm medo da
Lava-Jato. Eles têm que aprovar na íntegra.
Eu, meio sonolento,
já corri para botar meu terno. Até parecia que eu tinha que vir aqui
para votar, que eu tinha que vir correndo para cá.
Nós temos que
exigir respeito nesta Comissão. O Presidente tem que exigir respeito.
V.Exa., Deputado Onyx Lorenzoni, tem que exigir respeito a esta
Comissão, senão V.Exas. não estão à altura do papel que estão
desempenhando. O Ministério Público é bem-vindo à discussão, mas tem que
cuidar, para ver quem manda para dar essas entrevistas montadas, no
sentido de só quererem desmoralizar esta Casa.
Eu não tenho nada
contra o Ministério Público. Fui Secretário por mais de 16 anos, fiz
mais de 500 licitações e nunca fui sequer acusado de nada, nem pelos
meus adversários. E os senhores sabem que eu sou um adversário veemente,
quando tenho de sê-lo. Poderia ter sido acusado, tenho adversários e
até inimigos na política. Agora, o cara está na cama, do lado da mulher,
filho dormindo no quarto do lado, e tem que ouvir uma coisa dessas? É
demais.
Temos que exigir respeito. Querem discutir? Vamos discutir.
Mas não aceitamos, e os senhores não podem aceitar a criminalização da
política. Não existe democracia sem política e sem políticos. Não
existe. Fora isso é AI-5. Quem tem saudade do AI-5 se declare; eu não
tenho. E eu odeio a ditadura, seja ela verde-oliva, seja vermelha, seja
preta, seja a cor que tiver.
Aqui não é lugar para ficar posando de
bacana e fazendo jogo para a torcida. Quem está aqui com esse espírito
não está à altura do papel histórico que a vida política do Brasil nos
reservou. Então, eu peço que nós exijamos, daquele que lá compareceu
representando o Ministério Público, uma retratação, ou então nós aqui,
por estarmos discutindo, estaremos passando o recibo da corrupção ou de
qualquer coisa semelhante.
A direção desta Comissão não pode ficar
silente. Silêncio neste momento é uma atitude de covardes. E eu sei que
nem os senhores nem nós somos covardes, até porque temos a coragem de
estar aqui.
Sigo dizendo o seguinte: aqui, mais do que medidas
anticorrupção - que devem ser feitas, há coisa boa aí -, nós estamos
discutindo o Estado Democrático de Direito neste País. Nós estamos
discutindo a própria democracia. Eu não quero que o meu filho tenha que
ver monumento de sicofanta nas ruas, porque parece que o Brasil caminha
para isso. Existem países que homenageiam o soldado desconhecido. Logo,
daqui a pouco, vão homenagear o sicofanta desconhecido. Erguerão um
monumento ao sicofanta desconhecido. É este o País que nós queremos
construir? É este o País que nós queremos construir, professor de ética?
Muita gente me pergunta: Marun, depois que o Cunha já deu o impeachment, por que você ficou? Por ética. Por que continuou defendendo?
Nunca disse que o Cunha é inocente. Não sei. Defendi-o processualmente
aqui na Casa. Por que eu não mudei de lado, se ele já tinha derrubado a
Dilma?
O barro de que eu sou feito não é o mesmo do que é feita
essa turma de vira casaca. E eu vejo isso no sorriso do meu pai, que é
um advogado que tem mais ou menos o seu estilo, pois, quando eu chego lá
e vou falar com ele, ele está firme: Filho, a gente tem que ter, acima de tudo, vergonha na cara, e mudar de lado não é coisa de homem sério..
A Pátria brasileira não pode ser uma pátria do êxito dos sicofantas;
não é isso que nós temos de construir aqui. Temos que construir uma
coisa justa, o equilíbrio entre acusação e defesa, a responsabilização
de quem acusa indevidamente, a criminalização também da sonegação. A
sociedade tem que saber que nós não estamos brincando. Vamos mudar?
Vamos mudar. Mas tem que ser uma coisa completa: Pau que dá em Chico tem que dar em Francisco..
Eu me aproximo do encerramento, perguntando ao professor e ao advogado.
Rapaz, eu, te ouvindo aqui, senti saudade de ser advogado! Deu saudade.
Os senhores falaram, comentaram sobre aquilo a que são contrários.
Agora eu volto a dizer e pediria aos senhores que solicitassem uma cópia
desse programa a que eu assisti ontem, pois chegou a hora de dizermos: Alto lá!. Senão, não haverá respeito, e sem respeito mútuo nós não vamos chegar a lugar nenhum.
Existe coisa boa nesse projeto. Vamos valorizar, regar, fazer crescer o
que efetivamente é bom, mas sem abrimos mão do direito de discutir. Se
formos a vinte gabinetes aqui da Câmara, acharemos 2 milhões de votos.
Aleatoriamente, ao sair daqui, o senhor visite vinte gabinetes: há 2
milhões de votos aqui dentro. Nós somos 500 Deputados. Certo? Então, não
nos sintamos pregados na parede por esse projeto apresentado. Vamos ter
coragem de discuti-lo.
Eu concluo perguntando: o que os senhores acham de positivo, de bom nesse projeto, para que nós possamos avançar?
O SR. PRESIDENTE (Deputado Joaquim Passarinho) - Obrigado, Deputado Carlos Marun. É um prazer ouvi-lo.
Eu gostaria de dizer que esta Comissão nunca se sentiu constrangida por
nenhum tipo de posicionamento do Ministério Público. Ao contrário, na
segunda audiência desta Comissão, vieram debater com esta Casa os
membros do Ministério Público Federal, na pessoa do Sr. Deltan
Dallagnol.
O SR. DEPUTADO CARLOS MARUN - E ele discutiu.
Deixe-me dizer isso. Esteve aqui o Dallagnol e discutiu. Agora, já que
ele aceitou discutir, ele é corrupto? Ele está com medo da Lava-Jato?
O SR. PRESIDENTE (Deputado Joaquim Passarinho) - Deixe-me concluir. V.Exa. teve 13 minutos.
O SR. DEPUTADO CARLOS MARUN - Nosso Presidente tem todo o tempo do mundo.
O SR. PRESIDENTE (Deputado
Joaquim Passarinho) - Eu só queria dizer que nós, enquanto Comissão,
não nos sentimos desrespeitados em nenhum momento, até porque as pessoas
que propuseram no Ministério Público estiveram aqui e disseram: Trouxemos os temas, e queremos que os senhores discutam.
E nem afirmaram que as soluções que apresentaram são as melhores de
todas. Apenas propuseram alguma coisa. Então, uma posição individual de
um membro do Ministério Público não pode ser a representação de todo
aquele Parquet, até porque, quando um membro desta Casa também faz uma coisa errada, isso não pode ser imputado a todos nós.
O SR. DEPUTADO CARLOS MARUN -
Não estive na reunião com o Sérgio Moro, mas estive na reunião com o
Procurador Dallagnol, que demonstrou grande conhecimento e boa vontade
em relação ao debate, já de pronto admitindo que, do jeito que estava, o
próprio teste de integridade... Então, ele aceita discutir. Agora, não
dá para vir aqui, aceitar discutir e ir à televisão... Então, temos que
ver que papel desempenhou essa promotora ontem em relação ao que nós
estamos discutindo aqui. Trago a minha revolta, mas tenho certeza de que
temos um comando nesta Comissão à altura para verificar o que aconteceu
e para que nós possamos, juntos, avançar.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Joaquim Passarinho) - Muito obrigado.
O SR. DEPUTADO ONYX LORENZONI - Presidente...
O SR. PRESIDENTE (Deputado Joaquim Passarinho) - Pois não, Deputado Onyx.
O SR. DEPUTADO ONYX LORENZONI -
Com a sua permissão, eu quero só aduzir ao seu raciocínio o seguinte:
nós vamos discutir à exaustão. Já está aprovado o comparecimento de mais
de 125 pessoas, representando todas as instituições que militam no
mundo jurídico brasileiro e fora do mundo jurídico brasileiro. São
representantes, se não me falha a memória, Alessandro, de seis ou sete
universidades, os titulares de Direito Penal, de Direito Criminal. Ou
seja, nós vamos discutir à exaustão.
Eu quero deixar isso claro para
o Plenário desta Comissão e que fique registrado nos Anais que a
primeira atitude, após nós termos sido indicados e eleitos por V.Exas., e
eu ser indicado Relator, foi estar diante do Dr. Sérgio Moro, quando
fomos a Curitiba, o que resultou na vinda dele aqui, e diante do
Ministério Público Federal. Nós dissemos - há testemunhas, inclusive
presentes nesta sala, a nossa consultoria, que estavam nos acompanhando -
o Presidente e eu, que temos consciência de que, neste momento que o
projeto foi apresentado, é da formatação e da institucionalidade do
Parlamento discutir toda e qualquer medida que aqui chegue. E, uma vez
submetida ao crivo do Parlamento... Porque quem representa a sociedade
brasileira somos nós.
Perguntaram-me numa entrevista o que eu acho e
qual é a minha opinião sobre o Governo. Eu acho que, quanto mais
distante o Governo estiver das decisões tomadas pelo Parlamento, mais
saudável será para a sociedade e para democracia brasileira.
Então,
Deputado Marun, V.Exa. tem razão do alerta que faz, mas eu quero, por
dever de justiça, e em nome do Deputado Joaquim Passarinho, dizer a
V.Exa. que nós dissemos o que V.Exa. acabou de dizer, ao vivo, dentro da
sede do Ministério Público, lá em Curitiba. Eles estão cientes de que
nós vamos debater com responsabilidade, com seriedade, e que nós vamos
debater do primeiro ao último minuto. E o resultado final vai ser o
melhor resultado para o País que todos nós amamos. Eles o amam e nós
também. Mas é nosso dever construir e votar em plenário.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Joaquim Passarinho) - Muito obrigado, Deputado Onyx.
O SR. DEPUTADO CARLOS MARUN - Peço 1 minutinho, só para encerrar esse assunto, Sr. Presidente.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Joaquim Passarinho) - Pois não. V.Exa. dispõe de 30 segundos.
O SR. DEPUTADO CARLOS MARUN -
O meu alerta também se dá no seguinte aspecto: quem fala pelo
Ministério Público, os promotores, daqui a pouco todo mundo passará a
dar entrevista. Todos sabem que a política virou a Geni, e todo mundo
gosta de bater na Geni, dá IBOPE.
Nós temos que ter cuidado com isso. Faço este alerta aos senhores.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Joaquim Passarinho) - Eu vou reescrever V.Exa. aqui.
O SR. DEPUTADO CARLOS MARUN - Não faça isso, por favor.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Joaquim Passarinho) - Sempre é bom ouvi-lo.
O SR. DEPUTADO CARLOS MARUN - As minhas perguntas já foram feitas.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Joaquim Passarinho) - Com a palavra o Deputado Rubens Bueno, que agregará o tempo de Liderança.
O SR. DEPUTADO RUBENS BUENO -
Sr. Presidente, Sr. Relator, senhores convidados, Prof. Roberto Romano,
que tive o prazer de convidá-lo para estar aqui conosco hoje não só
pela sua postura, mas também pelas suas entrevistas que sempre trazem
muita luz _- e não LOAS, como disse o nosso Relator -; e Conselheiro
Augusto de Arruda Botelho, convidado pelo Deputado Carlos Marun, eu vou
dividir aqui em dois momentos as perguntas ao Prof. Romano, porque eu
acho que, para mim, vai ser esclarecedor e, depois, quero fazer também
perguntas para o Dr. Augusto.
Saiu um artigo no jornal O Estado de S.Paulo
no ano passado - se não me engano, em janeiro - em que o senhor falava
sobre as manifestações de 2013. Coincidentemente, eu estava fora do
País, e aquelas manifestações chamaram - e muito - a atenção daqueles
que estavam no poder, sobretudo daqueles preocupados com o País, mas, no
poder, parece que não se preocuparam muito, porque a manifestação deu
no que deu, a não ser a própria reação da sociedade em manifestações
seguintes, porque o Governo fez apenas um discurso momentâneo de reforma
política e nada aconteceu.
Então, farei ao senhor duas perguntas
nessa fase, professor. A primeira: o senhor crê que esse projeto que
estamos debatendo tem o poder de realizar essas mudanças? A segunda:
quais são os pontos que o senhor considerava indispensáveis e que estão
nesse projeto para o Brasil avançar na luta contra a corrupção?
De outro lado, eu ouvi um comentário seu na GloboNews, mostrando que o País caiu sete posições no ranking
mundial no combate à corrupção - isso em janeiro deste ano, 1 ano
depois. E o senhor falava da hipercentralização de políticas públicas,
recursos, decisões, etc. O senhor mencionou ainda os Estados, aliás, os
Municípios desassistidos por falta dessa descentralização, dessa
concentração do poder, de recursos, etc. E o projeto que nós estamos
aqui discutindo evidentemente não trata disso. Mas isso é apenas para
clarear algo que eu acho que vale a pena comentar e o senhor nos
responder, com a sua capacidade reconhecida por todos nós.
O senhor
acredita que o projeto que estamos debatendo tem o condão de combater a
corrupção de forma eficaz no contexto que o senhor chamou, naquela
entrevista, de circuito perverso da corrupção? Qual é a sugestão que o
senhor pode apresentar em relação a esse circuito perverso da corrupção?
Nessa entrevista, o senhor ainda menciona que o Ministério Público se
municiou de técnicas novas de investigação e conhecimentos jurídicos
profundos. Pergunto: o senhor acredita que as medidas aqui apresentadas,
e que foram uma iniciativa do Ministério Público, são reflexos dessa
evolução?
Quarta e última pergunta: o que o senhor poderia falar a
respeito da Controladoria-Geral da União, atual Ministério da
Transparência, Fiscalização e Controle, órgão ligado ao Poder Executivo e
que atua no combate à corrupção?
Vou agora fazer as perguntas ao
Dr. Augusto Arruda Botelho, lembrando a ambos, Sr. Roberto e Dr.
Augusto, que há uma PEC que trata da impunidade dos juízes no Brasil e
que não tem efeito administrativo para aposentá-los com perda de
aposentadoria.
No Brasil, o juiz pode desonrar a Justiça, pode fazer
o que quiser, porque, ao final, ele vai ser premiado com a sua
aposentadoria e vai para casa. Eu acho que ninguém está acima da lei,
muito menos um juiz que deve não só honrar o seu cargo, mas também
defender a Justiça e fazer justiça.
Dr. Augusto de Arruda Botelho, o senhor disse à Folha de S.Paulo
que a delação, ao contrário do que certos advogados propagandeiam, não
tem sido uma opção voluntária do acusado. A caguetagem, na prática, é
uma imposição, uma coação legitimada por juízes e promotores que, antes
de oferecerem a benesse, impigem ao cidadão uma série de atrocidades.
Pergunto: acordo de colaboração premiada com réu preso é regra ou é
exceção? Segunda pergunta: como melhorar tal instituto para proteger as
garantias constitucionais do acusado?
São essas as perguntas, agradecendo a ambos a presença.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Joaquim Passarinho) - Muito obrigado, Deputado Rubens Bueno.
O terceiro orador deste bloco é o Deputado Antonio Carlos Mendes Thame,
a quem concedo a palavra para fazer suas considerações.
O SR. DEPUTADO ANTONIO CARLOS MENDES THAME -
Sr. Presidente, Sr. Relator, senhores convidados, Sras. e Srs.
Deputados, duas características são aritméticas, são inegáveis, são
irrefutáveis. A primeira é que a situação não pode continuar como está. A
segunda é que a percentagem dos crimes de colarinho branco pode ser
reduzida, mas, no volume dos recursos, é imensa, chega a quase 100
bilhões. Ora, quanto é o orçamento do Governo Federal para a saúde?
Cento e quinze bilhões.
A Fundação Getúlio Vargas fez uma pesquisa
mostrando que há um desvio por ano de 100 bilhões de reais, e a OCDE diz
que não são 100 bilhões de reais; são 200 bilhões de dólares, que dão
mais de 700 bilhões de reais, quase 1 trilhão de reais. Então, a
percentagem dos crimes de colarinho branco é muito grande, e a situação
não pode continuar como está.
As perguntas que faço ao Dr. Roberto
Romano, por quem tenho admiração já de longa data - e hoje tenho o
imenso prazer de conhecer o Dr. Augusto de Arruda Botelho -, são: quais
as alternativas para aquilo que porventura não funcione dentre as dez
medidas? O que é uma sociedade equilibrada, na opinião dos senhores, no
sentido de a acusação e a defesa estarem equilibradas? O atual momento é
de equilíbrio, com tanta gente tendo os seus crimes prescritos ou suas
penas prescritas?
Aliás, disse o Dr. Augusto que, das dez medidas,
cinco são de combate à corrupção e cinco são de alteração do Código de
Processo Penal. Quer dizer, vale para todos os crimes e não apenas para
corrupção. Ora, tinha de ser assim mesmo, porque, na realidade, eu estou
mudando a tipificação do crime de corrupção. Eu estou, ao mesmo tempo,
dificultando esses crimes, quando o advogado não conseguir dizer que o
sujeito não é criminoso: Mas a prova é ilícita, Mas há uma prescrição. Em suma, tem de haver alguma mudança.
Por último, o que são crimes hediondos? A população sabe o que são ou é
apenas um nome? Sabe que, sendo um crime hediondo, não cabe o indulto
no final do ano, como bem disse o nosso Relator?
Países que deram
certo são aqueles que eram muito corruptos e hoje estão na lista dos dez
países mais transparentes na relação anual da transparência
internacional. O que fizeram esses países? Primeiro, um investimento
maciço em conscientização popular, contando para a população o que é
crime hediondo, porque a maioria não sabe o que é crime hediondo. Por
isso há a impressão de que crime hediondo e outro crime que não é
hediondo são crimes saudáveis. Não é. Mas o crime que é hediondo, pela
nossa classificação, é aquele para o qual não cabe indulto no final do
ano, não cabe comutação da pena, não cabe regressão da pena? É isso o
que nós queremos saber.
Quais são as três medidas que esses países
fizeram que deram certo? Primeiro, investimento maciço na
conscientização popular, mostrando que a corrupção é um grande mal. E,
se somarmos a ela a sonegação, então - Nossa Senhora! -, fica um mal
dobrado, muito grande!
Segunda vertente: legislação. Na verdade, é a
lei que é cumprida ou não. Investiram em tapar os buracos legais,
aquilo que os advogados chamam de vacatio legis.
Em terceiro
lugar, fortalecimento dos órgãos de combate à corrupção. Não adianta ter
CGU, AGU, COAF, Ministério Público Federal, Tribunal de Contas, se eles
não forem fortes. Essas pessoas ganham para proteger o Erário em tempo
integral, para proteger os recursos públicos. Ora, não vamos fortalecer
essas pessoas para que eles façam bem o seu papel?
Eram essas as perguntas que eu queria submeter ao Dr. Augusto e ao Dr. Roberto Romano.
Muito obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Deputado
Joaquim Passarinho) - Obrigado, Deputado Antonio Carlos Mendes Thame.
Mesmo com problemas de saúde, é o primeiro a chegar à Casa e a estar
aqui conosco na Comissão.
O SR. DEPUTADO ANTONIO CARLOS MENDES THAME - Obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Joaquim Passarinho) - Vamos passar agora a palavra aos nossos expositores.
Concedo a palavra, inicialmente, ao Dr. Roberto Romano.
O SR. ROBERTO ROMANO
- Em primeiro lugar, agradeço as perguntas, apesar de que, claro, não
terei tempo suficiente para responder a todas, ou, pelo menos, de
maneira circunstanciada.
Deputado Carlos Marun, eu concordo com essa
caracterização do AI-5 como de pessoas de boa-fé que imaginam que vão
modificar o País, mas eu gosto de lembrar sempre a outra parte dessa
reunião famosa em que o Vice-Presidente Pedro Aleixo disse que o AI-5
era um instrumento muito pesado e que poderia causar abusos. Alguém
disse que o Presidente Costa e Silva não abusaria, e a réplica foi: E o guarda da esquina?
Quando você institui um sistema todo ele baseado na punição e
negligencia, ou pelo menos atenua, a defesa, evidentemente os abusos
aparecem de baixo para cima, não apenas de cima para baixo. É isso que
me preocupa mais.
Eu posso dizer isso com certa tranquilidade,
porque eu fui preso político e fui julgado por um tribunal militar, como
um juiz togado, e eu senti isso. Eu fui acusado de terrorismo e tudo
mais e finalmente fui absolvido, por absoluta falta de prova e
inexistência de crime, 1 ano e meio depois de cadeia e de tortura.
Então, eu tenho muito receio de sistemas punitivos que se tornam
autoritários. Essa questão me parece muito relevante, e nesta ocasião
acho que é bom pensar.
O segundo ponto é o seguinte: o que é bom no
projeto? Eu acho que esse projeto apresentado é resultado de um diálogo,
de uma tensão da opinião pública, que não está mais levando em conta e
que não está mais valorizando os sistemas habituais de representação
política. Os senhores conhecem bem as pesquisas e sabem que há uma
espécie de desconfiança da cidadania contra os meios de representação.
Isso é muito grave para quem é democrata. Então, o que eu diria que é
bom no projeto é a tentativa de responder a esse anseio. Dessa tentativa
a chegar à tese de que todos os pontos apresentados por esse projeto
devem ser assumidos há uma distância.
Eu me limitei a apresentar apenas quatro problemas éticos graves, mas outros podem aparecer, como o meu colega colocou.
Nessa medida, eu sei que esta minha crítica pode trazer muitas
reflexões contrárias a minha pessoa, mas fico tranquilo em relação ao
Ministério Público Federal e ao Ministério Público Estadual, etc.,
porque procuro defender, como alguém que estuda ética, os dois lados.
Muitas vezes eu vim em apoio público ao Ministério Público e muitas
vezes eu vim também em defesa da defesa.
Eu me lembro de que, na
época de Fernando Henrique Cardoso, quando a Polícia Federal invadiu
escritórios de advocacia em São Paulo, eu vim a público para defender a
defesa.
Eu acho que é dever do cidadão não ser Maniqueu, menos
ainda quem trabalha com ética e quem trabalha com política. O
maniqueísmo funciona no plano do sectarismo, no plano da inimizade,
etc., mas não no da política, não no da ética. Então, isso é o que eu
teria a dizer ao senhor.
Perante o Deputado Rubens Bueno, que fez
uma proposta de perguntas extremamente complexa, eu me desculpo por
talvez não poder responder a tudo. Primeiro ponto: não acredito que
esse projeto ou que nenhuma lei possa realizar essas mudanças tão
fundamentais na sociedade e no Estado brasileiro. Eu acho que essa é uma
crença muito grande. Não que eu despreze a lei; eu acho que a lei é um
instrumento importantíssimo de normatividade da vida social e da vida
política, mas essa confiança na lei, que nós estabelecemos, faz-nos
esquecer DE um ponto que é básico, a existência real na sociedade de
interesses fortes, do ponto de vista econômico, do ponto de vista social
e do ponto de vista inclusive religioso.
Então, eu gosto sempre
daquela definição do Diógenes, chamado o Cínico, de que a lei é aquela
teia de aranha que prende os insetos pequenos e é arrombada pelos
insetos grandes. Essa parece ser uma realidade que nós vivemos sempre.
Então, nós não podemos jamais deixar de considerar que esses interesses
continuarão.
Aí está um ponto que me parece grave: situar a
corrupção apenas e tão somente no plano da política, como tem sido a
tentativa, parece-me esquecer de que dentro da sociedade existem
interesses altamente corruptores e altamente irresponsáveis, do ponto de
vista do dinheiro público inclusive. Todas as investigações da
Lava-Jato não levam apenas a políticos. Então, esse é um ponto.
Quais os pontos positivos? Eu diria que o projeto inteiro é essa
tentativa, que eu acho positiva, de tentar responder à insatisfação da
população. Mas, assim como eu identifiquei alguns pontos que, no meu
entender, do ponto de vista moral e ético, são gravíssimos, eu acho que -
o Doutor apontou outros - nós temos, sim, que discutir esse projeto, e
não aceitá-lo como se fosse um decreto, porque, num Estado e numa
sociedade democrática, ninguém pode se arrogar a tutela da cidadania,
nem mesmo esta Câmara dos Deputados, nem mesmo o Poder Executivo, nem
mesmo a Justiça. Se é verdade que a soberania é de fato do povo, nós não
podemos nos considerar tutores do povo.
E há certo vício na vida
intelectual brasileira de colocar os intelectuais como aqueles que ditam
normas para a população. Eu sempre me coloquei contra isso. E aí,
Deputado Rubens, chega essa questão da hipercentralização.
A
primeira vez que o Procurador de Justiça de São Paulo me convidou para
conversar sobre um problema de ética para o Ministério Público, a minha
pergunta o surpreendeu. Por que todo Prefeito de cidade do interior odeia promotor de justiça?
Porque o Prefeito não recebe o retorno dos impostos que seguem da sua
cidade para o poder central, o que volta é uma parcela extremamente
pequena desse dinheiro. Ele tem despesas que são as mais pesadas, as
mais elevadas - esgoto, saúde, educação, etc. - e só pode ter diante de
si o pastor protestante, o padre, a dona de casa, que lhe cobram creche,
obras, esgoto, etc. Quando ele avança um pouquinho na Lei de
Responsabilidade Fiscal, o promotor o pune pesadamente.
Essa
equação não bate. Por que sai tanto recurso do Município, e os Prefeitos
estão sempre com um pires na mão, diante do Palácio do Planalto,
pedindo aumento da participação dos Municípios? Por quê?
Esse é um
problema que toca a estrutura do Estado brasileiro. Nós temos uma falsa
federalização. Nós não temos uma Federação, perdoem-me. Nós temos uma
superconcentração do poder, sobretudo no plano orçamentário, na recolha
dos impostos, sem a devida distribuição. Isso gera, sim, corrupção em
larga escala. Será que todos os Prefeitos são corruptos no sentido exato
da palavra? Esse é um ponto que precisa ser pensado.
O projeto tem o
condão de combater a corrupção? Eu acho que existem pontos nele que
podem ajudar. Eu volto à fala do Deputado Onyx Lorenzoni, que foi muito
interessante. O Estado brasileiro tem a tradição - e isso é passado para
a sociedade brasileira - de negar os direitos individuais. Eu gosto
sempre de lembrar o discurso de Getúlio Vargas, em 1º de maio de 1936,
em que dizia que os indivíduos não têm direitos; têm deveres para com a
sociedade e para com o Estado. Essa tradição não é de Getúlio, é do
Estado brasileiro.
Tanto é verdade que - e eu sempre digo para os meus alunos -, em qualquer Prefeitura, atrás do balcão, está escrito no cartaz: Insulto ao funcionário público: tantos anos de cadeia. Mas não há, ao lado, um cartaz que alerte: Desrespeito ao cidadão: tantos anos de cadeia.
Essa falta de isonomia é um pressuposto básico da não democracia. E nós
só vamos encaminhar a luta contra a corrupção na hora em que o cidadão
tiver o respeito do Estado. Eu não vejo solução mágica por meio de uma
lei. É preciso que a soberania popular defina esses padrões, a partir do
Município.
Quanto às técnicas novas, eu vejo que, entre as
atuações de alguns elementos do Ministério Público Federal no período
Fernando Henrique Cardoso e o que nós estamos vendo agora, há uma
diferença técnica muito grande. Eu acho que isso deveria ser aproveitado
para incentivar o combate à corrupção e tudo o mais, mas dentro do
diálogo, dentro do debate.
Quando a CGU - Controladoria-Geral da
União foi criada, eu achei a proposta muito interessante. Estive nesta
Casa mesma, com o Dr. Jorge Hage, conversando sobre essas questões da
CGU.
O problema da CGU, no meu entender, é que ela tinha que
investigar os Municípios com esses problemas fundamentais e não tinha
pessoal nem recursos para acompanhar todos. Ela fazia os sorteios, etc.
Se ela cresce demais, ela vira o quê? Uma KGB. Se ela fica no mesmo
tamanho, ela fica impotente, porque a quantidade...
Então, parece-me
que neste momento - aí chego ao Deputado Thame -, diante da crise
geral, a crise não é do Estado brasileiro, a crise é do Estado na sua
totalidade. Além da Ética, eu estudo a questão da razão de Estado e
tenho trabalhado bastante isso nos últimos 30 anos. E nota-se que o
Estado no mundo não consegue mais manter aqueles famosos três monopólios
enunciados por Max Weber: o monopólio da força, o monopólio da norma
jurídica e o monopólio da captação dos impostos. Não consegue!
Se
nós pegarmos a questão do narcotráfico, que é um desafio para o governo
norte-americano, para o governo francês, etc., a questão do
terrorismo... Quando se fala em monopólio da força física, há obstáculos
tremendos. Também na captação dos recursos, a lavagem de dinheiro não é
um problema brasileiro, é um problema mundial. Então essa crise do
Estado bate na nossa crise, e quando se tem crise, tem que se ter
prudência.
Esse é um ponto fundamental em termos éticos. E é
imprudente, no meu entender, tentar resolver uma questão complexa com
medidas extremamente imediatistas. É isso que me leva a questionar
alguns desses pontos do projeto e a mostrar que de fato - e no meu texto
que está com o Deputado Onyx eu insisto neste ponto - a prudência é
fundamental para o Ministério Público, para os senhores, para nós, da
sociedade. É muito fácil criar mecanismos de exceção, mecanismos
autoritários; mudar é muito difícil, é muito difícil.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Joaquim Passarinho) - Muito obrigado, Prof. Roberto.
Tem a palavra o Dr. Augusto Botelho.
O SR. AUGUSTO DE ARRUDA BOTELHO - Bom, vou tentar condensar aqui todas as respostas de forma bem didática.
Primeiro, o Deputado Marun pergunta sobre os pontos positivos desse
projeto. Eu acho que o maior ponto positivo desse projeto é promover
isto aqui, a discussão, a conscientização, é levar o problema endêmico
gravíssimo da corrupção no nosso País para ser discutido em todas as
casas, para ser discutido na sociedade, para que ela se conscientize da
corrupção, a começar daquela corrupção que acontece no dia a dia, na
ação mais comezinha, do pedir o servicinho sem nota, porque isso também
não deixa de ser uma prática delituosa comum. Então, os pontos positivos
são a conscientização da sociedade do mal que a corrupção causa e a
discussão de uma melhor proposta, de uma saída com base no Estado
Democrático de Direito para enfrentar esse problema.
Causa-me -
causou-me e continua a me causar - desconforto a forma como o Ministério
Público Federal tocou de início, e vem tocando, essa proposta das 10
Medidas contra a Corrupção. Já iniciei a minha fala dizendo que o nome,
no meu ponto de vista, era absolutamente equivocado, porque foi uma
campanha de marketing - e não há demérito nenhum nisso. De todo modo, a condução dessa campanha me causou enorme desconforto.
Vou contar aqui uma passagem pessoal: eu sou palmeirense roxo e estava
no jogo Palmeiras e Corinthians - tenho essa falha, gravíssima. Estava
na fila para entrar no estádio, o belíssimo estádio do meu time, o
Palmeiras, e havia um quiosque do Ministério Público Federal para colher
assinaturas para as 10 Medidas.
A tarde já estava caindo, vários
voluntários passavam na fila - e fila de estádio sempre é uma coisa meio
tensa, nunca se está ali a passeio. Eles gritavam assim: Quem quer acabar com a corrupção no País assine a lista!
E ia passando a fila. Obviamente a fila inteira assinava a lista.
Quando a lista chegou à minha mão, eu educadamente falei para a
voluntária, que era uma senhora: Eu discordo de alguns pontos da proposta, então eu não vou assinar. Eu quase apanhei. Primeiro começaram a me chamar de petista: Petista, saia da fila! Depois, começaram a me chamar de corintiano, aí eu disse: Não, espere um pouquinho. (Risos.)
Não estou aqui desmerecendo os mais de 2 milhões de assinaturas pelo
projeto. É óbvio que há pessoas absolutamente conscientizadas que o
leram, entenderam-no e concordam com ele, como eu concordo com alguns
pontos das propostas apresentadas pelo Ministério Público Federal. Não
há aqui qualquer crítica a quem assinou a lista ou, inclusive, a parte
das propostas, mas esse formato marqueteiro de se apresentar isso... E é
utilizado até hoje, e foi utilizado nesta Casa.
Nós temos o apoio
de mais de 2 milhões de assinaturas, portanto, não pode haver nenhuma
modificação, como se uma discussão aqui ou qualquer modificação a esse
texto fosse uma afronta aos 2 milhões de assinaturas. Não, pelo
contrário, isso é o que mostra a maturidade desta Casa, mostra a
maturidade do processo legislativo, em que é preciso, sim, uma
discussão.
Então, especificamente, o que eu acho que já poderíamos
aprovar necessariamente, sem qualquer alteração, do meu ponto de vista
pessoal, como advogado criminalista? São pontos que estão contidos,
quase todos eles, no primeiro item das 10 Medidas: prevenção à
corrupção, transparência e proteção da fonte.
Há pontos aqui, como,
por exemplo, investimento de um percentual em programas voltados a
estabelecer uma cultura de intolerância à corrupção; conscientização da
população dos danos sociais e individuais causados por ela, que são
propostas absolutamente positivas, que podem ser implementadas de
qualquer forma. Há ainda a proposta de que o Judiciário e o Ministério
Público prestem contas da duração de processos - eu acho isso
extremamente importante - e formulem propostas para evitar que processos
prescrevam e para fazê-los andar mais rápido.
Em relação ao
segundo ponto, a criminalização do enriquecimento ilícito, num primeiro
olhar, eu até achei interessante a proposta, mas, no decorrer da
leitura, vi que o texto estraga uma proposta que pode ser boa. O que diz
o Ministério Público? De qual premissa parte o Ministério Público ao
propor a criminalização do enriquecimento ilícito?
É muito difícil
comprovar a corrupção, diz o Ministério Público. Então, vamos tentar de
alguma forma punir o corrupto, não pela corrupção, já que a corrupção é
muito difícil de ser comprovada. Isso não sou eu que estou dizendo, é o
texto que diz. Então, vamos aqui instituir um crime: enriquecimento
ilícito. Mas, como também é muito difícil provar o enriquecimento
ilícito, vamos fazer o seguinte: ele tem que provar que ele não
enriqueceu ilicitamente, ou seja, vamos inverter o ônus da prova.
Então, vejam bem, é uma proposta que, em tese, até poderia ter um viés
interessante, mas que, ao longo do texto, fica ilegal por completo com a
inversão do ônus da prova e a justificativa da pessoa. Ou seja, se a
pessoa não justificar, haverá o pressuposto de que o enriquecimento foi
ilícito. Essa é uma proposta que me causa bastante espanto.
Voltando
ainda às propostas que eu considero interessantes, algumas das
propostas contidas no item 4, que pretendem aumentar a eficiência da
Justiça, são extremamente positivas. A fixação de um limite para pedido
de vista num julgamento é algo extremamente positivo. Alguns recursos,
de fato, são desnecessários e podem ser substituídos, mas não, mais uma
vez, na forma ampla e irrestrita, com o cerceamento e com a supressão de
diversos direitos e garantias fundamentais, como a proposta 4, como um
todo, pede.
O item 5 eu considero favorável. Ele traz a
possibilidade de tornar as ações de improbidade mais céleres, reduz
alguns prazos. Vê-se que há a possibilidade de se tornar um processo
mais rápido e, ainda assim, deixá-lo um processo justo e equilibrado - o
equilíbrio entre a defesa e a acusação. É possível fazer isso sem
deixar a balança absolutamente desigual.
As propostas do Ministério
Público tornam a balança completamente desigual. Nós vamos estar diante
de um Código de Processo Penal acusatório, de um modelo acusatório de se
julgar. Por isso, eu digo: As medidas têm relação com a corrupção?
Elas têm relação com a corrupção, mas a maioria delas têm relação com o
sistema de justiça criminal. São alterações do Código de Processo
Penal. Vejam, ao longo de anos, em diversas Comissões, em diversas
tentativas de reforma do Código Penal, alterações tão profundas como
essas não foram feitas.
O último ponto positivo: alguns pontos da
última medida para recuperação do lucro derivado do crime. Algumas
formas mais fáceis de recuperar esse dinheiro eu as considero
extremamente positivas, porque não só a prisão evita o crime, mas o
bolso ajuda também. Portanto, eu entendo que essas medidas, de pronto,
já são positivas.
Respondendo ao Deputado Rubens Bueno com relação à delação de réu preso, essa frase que o senhor citou, minha, publicada na Folha de S.Paulo,
foi um artigo que eu escrevi 2 anos atrás. Apanhei bastante há 2 anos
em razão desse artigo, e hoje eu estou cada vez mais convicto da minha
posição de 2 anos atrás.
Eu sou um defensor e um crítico, na
verdade, da forma equivocada como a delação premiada vem sendo usada no
nosso País. Eu entendo que o instituto da delação premiada seja algo
extremamente importante e extremamente eficaz se utilizado de forma
correta, mas aquilo que eu chamo de delação à brasileira, no meu ponto
de vista, é absolutamente ilegal.
A ilegalidade está baseada em uma
premissa que eu defendo, a premissa de que réus presos não podem
delatar, assim como empresas que tenham diretores presos não podem
firmar acordo de leniência. O primeiro pedido, a primeira necessidade, o
primeiro requisito de uma delação e de um acordo de leniência é a
voluntariedade, e réu preso, de voluntário, tem muito pouco.
Eu
continuo entendendo que há um excesso de prisões preventivas que tem o
claro intuito de forçar delações premiadas. Eu não concordo com a
estatística que o Ministério Público Federal reiteradamente apresenta de
que um número muito pequeno de réus presos fizeram delação premiada e
de que a maioria das delações premiadas firmadas, principalmente na
Operação Lava-Jato, tenham sido feitas com réus soltos.
Essa
estatística está errada, foi feita de forma absolutamente tendenciosa, e
explico o porquê, de maneira bastante rápida. Como o Ministério Público
faz a estatística? Vamos lá: fizemos cem acordos de delação premiada ao
longo da Operação Lava-Jato; 30 réus estavam presos; então, 70% das
delações são com réus soltos.
Só que o Ministério Público esquece
uma pequena conta: quantos desses réus estiveram presos e foram
colocados em liberdade? Quantos desses réus que optaram por fazer a
delação premiada tiveram sua prisão preventiva ou prisão temporária
pedidas e não decretadas? Quantos desses réus tiveram ameaças de serem
presos? Qualquer que seja a situação para mim não importa. Eu assinei a
delação premiada no dia 18. No dia 18 eu estava preso? Não, no dia 19 ou
no dia 17 eu tinha uma prisão decretada. Eu fui solto um dia antes.
O caráter de voluntariedade da delação premiada, para mim, é algo
absolutamente essencial. Portanto, eu continuo a defender a
impossibilidade de se firmar um acordo de delação em caso de réu preso.
Acho que respondi.
Como melhorar a delação? O começo seria este: não
permitir a delação de um réu preso e deixar a delação com critérios
muito mais específicos de benefícios, com critérios muito mais
específicos de condições. A principal queixa é a de que a delação só se
faz uma vez. Não existe aquele que se arrepende duas vezes. É isso.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Joaquim Passarinho) - Muito obrigado, Dr. Augusto.
Eu só vou pedir licença para votarmos os requerimentos, porque estamos
com quórum. A Ordem do Dia pode começar, e nós não mais poderemos
votaremos os requerimentos. Depois nós continuaremos com as falas dos
Deputados.
Requerimento nº 78, de 2016, do Deputado Rubens Bueno, que convida o Sr. Ruszel Lima Verde Cavalcante.
Os Srs. Deputados que o aprovam permaneçam como se encontram.
Aprovado.
Requerimento nº 79, de 2016, do Deputado Onyx Lorenzoni, que convida o
Delegado Federal da Polícia Federal Igor Romário de Paula.
Os Srs. Deputados que o aprovam permaneçam como se encontram.
Aprovado.
Requerimento nº 80, de 2016, do Deputado Antonio Carlos Mendes Thame, que convida as Sras. Ana Paula Sayão; Iza Mansur; Rosa Richter e Thais Keiko, representantes da sociedade civil.
Os Srs. Deputados que o aprovam permaneçam como se encontram.
Aprovado.
Requerimento nº 81, de 2016, do Deputado Antonio Carlos Mendes Thame, que convida o advogado Dr. Rafael Thomaz Favetti.
Os Srs. Deputados que o aprovam permaneçam como se encontram.
Aprovado.
Requerimento nº 82, de 2016, do Deputado Valdir Colatto, que convida o Sr. Vinicios Leoncio, advogado.
Os Srs. Deputados que o aprovam permaneçam como se encontram.
Aprovado.
Requerimento nº 83, de 2016, do Deputado Valdir Colatto, que convida o
Sr. Promotor de Justiça do Estado do Ceará. Dr. Igor Pereira Pinheiro.
Os Srs. Deputados que o aprovam permaneçam como se encontram.
Aprovado.
Requerimento nº 84, de 2016, do Deputado Onyx Lorenzoni, que convida o
Sr. Ives Gandra da Silva Martins, advogado, tributarista, professor e
jurista.
Os Srs. Deputados que o aprovam permaneçam como se encontram.
Aprovado.
Requerimento nº 85, de 2016, do Deputado Onyx Lorenzoni, que convida o
Presidente da Federação Nacional das Entidades dos Servidores dos
Tribunais de Contas do Brasil, Sr. Amauri Perusso.
Os Srs. Deputados que o aprovam permaneçam como se encontram.
Aprovado.
Requerimento nº 86, de 2016, do Deputado Marcelo Aro, que convida o Dr. Fábio Medina Osório, Advogado-Geral da União.
Os Srs. Deputados que o aprovam permaneçam como se encontram.
Aprovado.
Requerimento Nº 87, de 2016, do Deputado Onyx Lorenzoni, que convida o
Presidente da Federação Nacional dos Policiais Federais, Sr. Luís
Boudens.
Os Srs. Deputados que o aprovam permaneçam como se encontram.
Aprovado.
Requerimento nº 88, de 2016, do Deputado Onyx Lorenzoni, que convida o
Sr. Gianpaolo Poggio Smanio, Procurador-Geral de Justiça de São Paulo.
Os Srs. Deputados que o aprovam permaneçam como se encontram.
Aprovado.
Requerimento nº 89, de 2016, do Deputado Onyx Lorenzoni, que convida o Sr. Luiz Flávio Gomes, doutor em Direito Penal.
Os Srs. Deputados que o aprovam permaneçam como se encontram.
Aprovado.
Requerimento nº 90, de 2016, do Deputado Antonio Carlos Mendes Thame,
que convida o Sr. Marcos Paulo Ferreira, representante do movimento Mude
- Chega de Corrupção.
Os Srs. Deputados que o aprovam permaneçam como se encontram.
Aprovado.
Requerimento nº 91, de 2016, do Deputado Antonio Carlos Mendes Thame,
que convida o Sr. Antonio Rodrigo Machado, Presidente da Comissão de
Combate à Corrupção, da OAB/DF.
Os Srs. Deputados que o aprovam, permaneçam como se encontram.
Aprovado.
Esses eram os requerimentos.
Vamos agora para uma nova rodada de fala dos Srs. Deputados. Estavam
inscritos o Deputado Aluisio Mendes, que precisou sair, o Deputado Mauro
Pereira e o Deputado Carlos Sampaio.
Vou conceder a palavra ao Deputado Mauro Pereira, mas antes ao Deputado Onyx Lorenzoni.
O SR. DEPUTADO ONYX LORENZONI -
Sr. Presidente, quero só fornecer uma informação: o Deputado Marcelo
Aro apresentou a convocação do titular da AGU - Advocacia-Geral da
União; ela já estava no plano de trabalho, mas, para permitir os
questionamentos do Deputado Marcelo, nós a aceitamos. Eu só queria
informar isso ao Plenário.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Joaquim Passarinho) - Obrigado, Deputado Onyx Lorenzoni.
Concedo a palavra ao Deputado Mauro Pereira.
O SR. DEPUTADO MAURO PEREIRA -
Primeiramente, quero cumprimentar a todos. Cumprimento nosso
Presidente, Deputado Joaquim Passarinho; o Relator, Deputado Onyx
Lorenzoni; nosso Vice-Presidente, Deputado JHC, e nossos convidados, Dr.
Roberto Romano e Dr. Augusto de Arruda Botelho.
Parabenizo esta
Comissão, que está aqui reunida numa segunda-feira. Até agora todas as
reuniões foram realizadas com base no quórum, e isso é muito importante,
pois mostra o interesse desta Comissão em fazer com que as coisas
realmente aconteçam.
Eu tenho acompanhado muito atentamente todos os
convidados que vieram a esta Comissão até o momento. Todos os
depoimentos foram de extrema importância, da mesma forma que os
depoimentos de hoje também estão sendo muito importantes. Aprendemos
muito com eles.
As 10 Medidas contra a Corrupção que foram
encaminhadas a esta Casa pelo Ministério Público, com quase 3 milhões de
assinaturas, resultaram, é lógico, do que aconteceu com o nosso País.
Infelizmente, o nosso País hoje não tem dinheiro, a bem dizer, para
nada. Os Ministérios todos simplesmente só sabem dizer não, porque não
têm recursos. Ao mesmo tempo, ficou comprovado que as nossas leis são
realmente muito brandas.
Eu participei da CPI do BNDES e acompanhei muito a CPI da PETROBRAS. Nós vimos convidados que chegavam para depor na CPI com habeas corpus para
não dizer nada. E não diziam nada, e pronto. E muitos deles ainda
ficavam aqui dando risadas à mesa, pessoas que hoje estão presas. Foi
com base em tudo isso que se foi formando uma indignação, não só na
sociedade, mas aqui também, na maioria dos Deputados.
E o que nos
resta a fazer agora, na minha opinião, é pegar as experiências, por
exemplo, do Dr. Botelho, do Dr. Romano e dos profissionais do Tribunal
de Contas da União que estiveram aqui também e seguem mais ou menos a
mesma linha. Cabe a nós pegar aquilo que os doutores acham que pode ser
mudado para nos ajudar. Uma coisa é certa: esta Comissão terá que dar
uma resposta para a sociedade. Do jeito que está não pode ficar.
Todas essas entidades, todas essas companhias têm os famosos conselhos.
Por exemplo, a Presidenta Dilma era Presidente do Conselho da PETROBRAS.
Olhem, tudo o que aconteceu na PETROBRAS foi com a autorização de um
grupo de conselheiros, assim como no BNDES. Aonde se vai, existem
conselhos, e as coisas vão acontecendo. Então, tudo que foi formado até
agora, foi formado para que desse certo, e não deu certo, não deu certo.
Essa corrupção é tão desastrosa que até agora os promotores públicos,
os policiais federais e o próprio Supremo ainda não têm noção do estrago
que se fez. A Operação Lava-Jato não tem mais limites, porque, onde
quer que eles mexam, há corrupção - e é grossa.
A delação premiada
só aconteceu porque os membros ficaram presos. Se não ficassem presos,
eles não iam falar. Eles estão falando e mostrando o braço da corrupção -
não é o braço, é o polvo da corrupção. Agora o que vai acontecer? Esse
processo da Lava-Jato vem dando certo, vem mostrando que a corrupção
existe, que ela é grande, tanto que vem apontando um por um.
Nós
temos que unir as pessoas de bem, Dr. Roberto e Dr. Augusto, para nos
ajudarem a melhorar a Constituição, a fazer uma lei, não para ser contra
ela ou para piorá-la, mas para apresentar ao Plenário uma coisa boa,
através do nosso Relator Onyx Lorenzoni e da nossa Mesa.
Realmente a
situação é muito difícil, é muito complicada. Vamos ter que ser duros
com quem pensa em ser corrupto, de forma que, quando pensar nisso,
desista.
Muito obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Joaquim Passarinho) - Muito obrigado, Deputado Mauro Pereira.
Concedo a palavra ao Deputado Carlos Sampaio.
O SR. DEPUTADO CARLOS SAMPAIO - Sr. Presidente, Sr. Relator, demais colegas, ilustres palestrantes, farei apenas uma colocação rápida.
Eu gostaria de uma reflexão de ambos, se for possível, em que pese isso
não esteja no âmbito das dez medidas especificamente, mas são temas que
estão sendo discutidos nesta Comissão. Queria saber, em primeiro lugar,
a posição de cada um sobre a questão do foro privilegiado, em rápidas
palavras; e, em segundo lugar, sobre a questão da aposentadoria
compulsória.
Muito se diz que o promotor e o juiz, por serem
vitalícios, são aposentados compulsoriamente e não perdem o cargo. É uma
meia verdade. Enquanto o órgão de classe os julgou, eles de fato
continuaram com a aposentadoria compulsória, mas, sobrevindo a sentença
condenatória transitada em julgado, eles evidentemente perdem o cargo
como qualquer outro servidor. Existe uma crítica quanto a essa
aposentadoria compulsória, e eu gostaria de ouvi-los.
Por último,
apenas uma reflexão: eu sou favorável ao instituto da delação premiada,
acho até que pode ser aprimorado em muitas coisas. Gostaria de saber se
os senhores concordariam com uma reflexão no sentido de que, por via
indireta, ela possa estar incentivando a prática de grandes crimes ou a
figura do grande criminoso.
Aquele que se envolve dentro da
PETROBRAS no esquema de corrupção de milhões - e tem seus asseclas, tem
seu braço político, tem seu braço operacional - sabe muito, e a chance
de ele ir para casa é muito grande; e aquele que nada sabe, cujo roubo
foi minúsculo perto do outro, em que pese ser também roubo, está fadado à
prisão. É uma reflexão que faço, porque a estou fazendo comigo mesmo.
O senhor sabe muito? Sei. Então o seu esquema criminoso foi brutal!
Brutal. Envolveu todas as esferas? Todas as esferas. Desviaram-se
bilhões? Bilhões. Se sou advogado, eu falo: O senhor fique tranquilo, porque a chance de ir para casa é grande. Depois pego o outro cliente: E
você? Eu não sei de nada; eu realmente roubei aquele dinheiro, mas não
sei quem se envolveu; fui eu que fiz, não sei... Ah, não, você me
desculpe, mas sua chance de prisão é muito grande.
Esta reflexão cabe ou é uma reflexão desmedida da minha parte?
O SR. PRESIDENTE (Deputado Joaquim Passarinho) - Muito obrigado, Deputado Carlos Sampaio.
Concedo a palavra ao Deputado Celso Maldaner.
O SR. DEPUTADO CELSO MALDANER - Presidente Joaquim, cumprimento em seu nome todos os colegas Parlamentares, especialmente os nobres palestrantes.
Quero justificar o nosso atraso. Não pudemos pegar o conteúdo das falas dos expositores.
Sobre o foro privilegiado, gostaria de dizer que tenho também uma PEC
tramitando nesta Casa, a PEC 247, para acabar com o foro privilegiado
para todos, inclusive para o Presidente da República, para os
integrantes dos Poderes Judiciário, Legislativo e Executivo.
É
importante nós escutarmos. Não sei qual é a posição da OAB, dos
advogados, enfim, dos que trabalham nessa atividade, mas eu pergunto se a
delação premiada prejudicaria a aprovação dessas dez medidas.
Escutei o nobre palestrante Dr. Augusto de Arruda Botelho falar sobre isso.
Será que isso prejudicaria a atividade do profissional, do advogado?
Isso ia diminuir o serviço do advogado? Será que isso prejudicaria muito
a classe dos advogados? Porque a delação premiada clareia. Ninguém vai
delatar alguma coisa que não seja verdade; seria o cúmulo. Pergunto,
portanto, se isso iria prejudicar muito essa classe dos advogados.
A
minha grande preocupação, como economista, não querendo fugir do tema, é
porque o Poder Público está muito pesado, muito obeso, com excesso de
gordura. Como acabar com a corrupção sem aumentar essa obesidade? A
sociedade não aguenta mais pagar imposto, não dá nem para falar em
aumento de imposto. Não aguentamos mais. A sociedade paga muito caro, o
Governo cobra demais. Como acabar com a corrupção diminuindo,
desinchando as estruturas governamentais, tanto no Poder Legislativo
quanto no Poder Judiciário, no Ministério Público, na AGU? Nós não
aguentamos mais.
Este é o grande problema do Brasil: ter que
desinchar a máquina, ter que cortar o teto. Pelo amor de Deus, é urgente
votar e acabar com isso, porque nós, os empreendedores e os empresários
não aguentamos mais.
Em Santa Catarina, o que está acontecendo?
Ações trabalhistas. Hoje os advogados pegam ações de motoristas, de todo
mundo. Há ações de motoristas de caminhão no valor até de 1,8 milhão
reais, 1,4 milhão reais, 1,3 milhão reais.
Estamos acabando com a
economia do País. Temos que facilitar, criar mais competitividade. Hoje
os advogados pegam procuração por 2 mil reais, 3 mil reais e cobram
milhões. As pessoas assinam a procuração, e o advogado já está cobrando,
infelizmente.
Não aguentamos mais. Temos que criar um país
mais competitivo. É isso o que nós temos que defender. Preocupa-me muito
inchar mais ainda a máquina, para evitar a corrupção. Temos que
facilitar a legislação, para acabar com a corrupção, mas não inchar a
máquina.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Joaquim Passarinho) - Obrigado, Deputado Celso Maldaner.
Vamos passar a palavra agora aos nossos expositores.
Concedo a palavra ao Prof. Roberto Romano, para colocar suas posições.
O SR. ROBERTO ROMANO -
Deputado Mauro Pereira, concordo com o senhor em gênero, número e
casos. Quer dizer, temos de fato falta de recursos, que, aliás, não se
deve apenas - esse é um ponto que me parece importante - às duas últimas
Presidências da República. Esse é um problema estrutural do Estado
brasileiro. Essa falta de recursos vai aumentando justamente e na medida
em que se concentram as decisões no Poder Executivo Federal.
Os
senhores sabem melhor do que eu que 90% das políticas públicas
brasileiras passam pela égide do Poder Executivo Federal. Há uma
burocracia enorme criada para esse fim. Esse ponto tem sido pouco
considerado nas análises de corrupção no Brasil.
No programa Roda Viva,
em que me entrevistaram, tentei passar a ideia de que nós no Brasil -
em termos mundiais também, mas no Brasil sobretudo - não percebemos que a
corrupção tem dois eixos temporais. O primeiro eixo é aquilo que eu
chamo de eixo diacrônico - um escândalo vem depois de outro escândalo,
depois de outro escândalo, depois de outro escândalo. Mas esses
escândalos, vistos do ponto de vista diacrônico, causam descrença,
porque você acaba de sair de um escândalo e já há outro, mais outro,
mais outro. A população fica cansada e desanimada com os instrumentos de
representação política, mas não se leva em conta o sincrônico, que
depende da estrutura do Estado e da sociedade brasileira. No momento em
que um escândalo, que uma apropriação indébita está ocorrendo numa firma
privada ou pública, no mesmo momento outros estão ocorrendo também. A
nossa percepção é diacrônica, e a imprensa tem uma percepção diacrônica
também. Então, há uma aparente ausência de saída.
Ora, as soluções não são fáceis, mas elas precisariam ser debatidas, como, por exemplo, a federalização do Estado brasileiro.
Os senhores estão debatendo agora a questão da dívida dos Estados. A
todo o momento há a questão da guerra fiscal entre os Estados. Por quê?
Porque todos os Governadores e todas as Assembleias Legislativas dos
Estados sabem que a parte do leão é do Governo Federal, que cobra o seu
dinheiro como se fosse um butim. Eu estou falando na presença de um
Deputado do Rio Grande do Sul, que sabe perfeitamente dessa situação.
Conforme a Lei Kandir, o Governo Federal deveria pagar os Estados. Ele
não paga, e cobra - os senhores sabem disso.
Essa federalização do
Brasil é urgente, e é difícil de ser conseguida, pois é muito
complicada. Ao mesmo tempo, essa federalização poderia permitir maior
democratização das instâncias e maior responsabilidade também. Se eu
dependo, como Prefeito, de um político influente em Brasília no
Ministério tal para conseguir tal recurso, não vou ter, evidentemente,
aquele sentimento de responsabilidade com a verba que tenho na mão,
porque vou contar com a proteção daquele político importante. Isso
acontece no meu campo também, no campo da universidade.
Por que até
agora a autonomia das universidades federais não foi regulamentada?
Porque os senhores reitores acham que o melhor é ter acesso político ao
Ministério da Educação, para negociar e receber apoios. Desculpem-me,
mas não estou dizendo isso só aqui, já disse em várias entrevistas
públicas.
Com isso temos uma má gestão, que corresponde também a um
autoritarismo muito grande. É uma situação complicada. Boa parte dos
recursos do Estado do Acre são devidos à Universidade Federal do Acre,
que é onde está o maior aporte de recursos. Isso acontece no Brasil
inteiro. A responsabilidade com a administração tem que supor também
autonomia. Essa ditadura perene do Poder Executivo deveria ser
questionada.
Quando falam no Brasil de harmonia dos Poderes, a
primeira coisa de que eu discordo de muitos políticos importantes, assim
como meus colegas e jornalistas, é dessa história de que as
instituições brasileiras estão funcionando normalmente. Como pode? O
conceito de normalidade não é bem esse. Quando se sofre um empurrão de
um lado e de outro e a imposição da força de outro, como fica essa
história? Esse é um ponto que precisaria ser muito bem debatido.
Perdoem-me, mas as minhas respostas são um pouco insatisfatórias para a complexidade das perguntas.
Deputado Carlos Sampaio, eu sou contra essa história de foro
privilegiado. Em primeiro lugar, não é foro privilegiado, é a famosa
prerrogativa de foro. Eu acho que essa universalização deveria ser
questionada. Mas me parece que os chefes dos Poderes deveriam ter essa
prerrogativa, sim, senhor. É bom lembrar que a inclusão desse elemento
veio como tentativa de colocar na Constituição a defesa do exercício
público do mandato. Por quê? Porque evidentemente a sociedade civil e a
sociedade política vivem em guerra permanente. Se na cadeira da
Presidência de um dos Poderes tem uma pessoa que desagrada grupos,
setores, evidentemente aquela pessoa vai sofrer um ataque e vai ter que
responder.
Mas me parece que o grande erro foi essa
universalização. Criou-se uma casta, e não se criou prerrogativa de
foro. Por um lado, eu acho que é muito complicado, até do ponto de vista
de segurança nacional, tirar a prerrogativa de foro dos chefes dos
Poderes, mas, por outro lado, é preciso levar em conta esse problema.
Essa questão que o senhor coloca, do pequeno que não sabe e do grande
que sabe, é meio complicada, porque se entra no campo ético e no campo
do debate moral, problemas dos mais difíceis da história do pensamento
da humanidade. Como se pode aquilatar a percepção da própria culpa? Até
onde vai isso?
Há um sistema no Brasil extremamente terrível, o
senhor tem toda razão. O sujeito que mete a mão em bilhões do Erário
público fica indene, e aquela pessoa que rouba um xampu fica sem olho -
esse caso o senhor conhece -, passa 1 ano na cadeia e não tem nenhuma
justiça.
Eu acho que é complicado, sim - volto à minha cantilena de
pesquisador da ética -, mas é preciso prudência. Prudência não é
covardia, todo mundo sabe; prudência é pesar a coisa na sua própria
medida, e não numa medida exterior.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Joaquim Passarinho) - Obrigado, professor.
Concedo a palavra ao Dr. Augusto de Arruda Botelho.
O SR. AUGUSTO DE ARRUDA BOTELHO -
Deputado Carlos Sampaio, a primeira pergunta, com relação ao foro
privilegiado, é uma questão que, de forma bastante honesta, eu debato
internamente com frequência. Eu não concordo com a existência do foro
privilegiado, mas eu consigo entender quais as justificativas de sua
existência. Eu não vou conseguir ser tão taxativo e dizer se sou contra
ou a favor.
Acho que esta matéria é extremamente difícil de
discutir, porque de fato parece uma excrecência se ter prerrogativa de
foro, seja qual for o seu cargo, mas eu consigo entender também que nós
vivemos num País de dimensões continentais.
Eu fico pensando naquele
Prefeito de uma pequena cidade do interior que tem um problema grave
com o promotor dali e que tem problemas políticos de uma pequena Comarca
que podem influenciar decisões judiciais e persecuções criminais. Essa
pessoa não deveria ter prerrogativa? Não é um privilégio. Eu acho que o
termo privilegiado está errado, pois é uma prerrogativa de ser
investigado, de ser julgado por um Tribunal um pouco mais isento do que
eventualmente uma pequena Comarca, mas acho também que esse sistema
produz desequilíbrios evidentes.
Eu não tenho uma forma correta. Não
é fácil. Eu não saberia dizer, de forma transparente, se sou contra ou a
favor. Eu consigo entender, mas, ao mesmo tempo, causa-me dificuldade a
existência disso.
A segunda pergunta é sobre a delação premiada e o
eventual incentivo à prática de crimes. É curioso, porque eu sou a voz
que prega isso praticamente no deserto hoje em dia. Mais uma vez digo
que não sou um crítico do instituto da delação premiada. Eu acho que ele
é positivo, que pode ser usado positivamente em vários aspectos, mas a
forma como estamos usando a delação premiada no nosso País ultimamente
é, sim, um elemento que incentiva a prática de crime.
Digo isso como
um exemplo absolutamente público e notório de delatores que fazem
delação mais de uma vez. Eu acho que isso é um incentivo para a
sociedade pensar: Eu vim aqui, cometi um crime e, com o objeto desse
crime, faturei não sei quantos milhões, mas eu faço uma delação premiada
e cumpro uma pequena pena. Alguns anos depois, novamente eu sou
investigado e novamente eu faço uma delação premiada e devolvo mais uma
vez para... A imagem que isso passa à sociedade é uma imagem de impunidade. É justamente o contrário do que a Justiça deveria passar.
Portanto, a forma como a delação vem sendo usada pode, sim, ser um incentivo à prática de crime, infelizmente.
O Deputado Celso Maldaner me fez uma pergunta com relação ao reflexo
das dez medidas contra a corrupção para a Advocacia. Acho que vou ser
bastante polêmico aqui, mas, se essas dez medidas forem aprovadas, se
pensarmos do ponto de vista comercial, vai ser uma maravilha. Vão haver
crimes novos; ou seja, mais casos para o advogado e maiores
possibilidades de prisão. Com o réu preso, haverá menos recursos. Eu vou
ter que trabalhar menos, e isso será uma maravilha! Vou ter mais
clientes, trabalhando menos.
Então, do ponto de vista estritamente comercial, essas dez medidas para a Advocacia são boas.
Estou hoje aqui tranquilamente representando o Instituto que eu fundei -
sou o atual Conselheiro. Estamos com 370 advogados criminalistas
espalhados no Brasil inteiro. Há vários ex-Ministros da Justiça,
ex-Secretários de Segurança, ex-Deputados, todos integrantes do
Instituto e do Conselho contra uma série dessas medidas.
A postura
do Instituto de Defesa do Direito de Defesa, que é uma entidade
representativa da Advocacia Criminal no nosso País, é contrária a uma
série das dez medidas, mesmo que, numa análise exclusivamente comercial,
elas possam ser, do ponto de vista comercial, excelentes para a
Advocacia.
Acho que respondi a todos.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Joaquim Passarinho) - Obrigado, Dr. Augusto.
Concedo a palavra ao Deputado Vanderlei Macris. Depois, vou concedê-la ao Deputado Marun novamente.
O SR. DEPUTADO VANDERLEI MACRIS -
Presidente Passarinho, gostaria muito de agradecer a presença do Dr.
Augusto e do Dr. Roberto e a colaboração à nossa Comissão.
O País
vive um momento muito delicado. Temos necessidade de dar respostas a um
movimento da sociedade. Esse movimento não é só do Ministério Público
mas também da sociedade, que pretende fazer alterações nesse processo de
corrupção que vivemos no País hoje, levantado pela Lava-Jato.
Uma
das questões que me incomodam bastante é a da morosidade da Justiça.
Tenho a impressão de que, quando se demora a aplicar a lei, a impunidade
estará presente nesse processo. Essa é uma questão que já foi debatida
por vários depoentes. Uma das coisas que se falam é do excesso de
recursos que nós temos hoje no nosso sistema jurídico, capaz de levar
permanentemente à prescrição de crimes que são cometidos na sociedade.
Muitos dos crimes cometidos que vão à prescrição - tivemos alguns
depoimentos dizendo que alguns processos demoraram 10, 12, 15, 20 anos -
o foram exatamente porque o excesso de recursos está caracterizado por
uma legislação que não contempla a necessidade de uma punição mais
rápida, com a garantia, é claro, da defesa, a fim de que todo aquele que
cometeu crime seja capaz de poder sentir efetivamente o que aconteceu.
A pergunta que deixo aos dois nobres juristas é esta: quais são os
recursos que nós poderíamos prescindir para termos uma Justiça mais
rápida na punição de quem cometeu esses atos criminosos?
Outro dia aqui se falou: Agravo do agravo do agravo do agravo.
E a coisa vai, vai, vai... Discordo um pouco do Dr. Augusto, porque o
advogado precisa, sim, de todas as artimanhas que a legislação e as
brechas da Justiça nos permitem para poder fixar o cliente por mais
tempo dentro do seu escritório.
Eu sou bacharel em Direito, então
tenho liberdade para dizer isso. Trabalhei em cartório durante 10 anos,
como funcionário, e conheço muito bem essa lógica. O advogado tem, sim,
tranquilidade de, quanto mais brechas tiver a lei e quanto mais recursos
forem apresentados na legislação, ver essa possibilidade ser real.
Eu queria a opinião dos senhores sobre quais recursos nós poderíamos
prescindir para garantir o apressamento da decisão da punibilidade
daquele ato criminoso, mas que não ferissem o direito de defesa da
pessoa que está sendo defendida. Esse é um ponto.
Uma das questões
também que tenho perguntado a todos os nossos depoentes é sobre a
Instituição, no âmbito do Supremo Tribunal Federal, do Superior Tribunal
de Justiça, dos Tribunais Regionais Federais, dos Tribunais de Justiça,
de Turmas e de Câmaras especializadas e exclusivas em matéria de
probidade administrativa.
A proposta que estou fazendo ao Relator,
Deputado Onyx Lorenzoni, e à Comissão é no sentido de que possamos ter
câmaras especializadas nessa questão da corrupção.
São essas as minhas duas sugestões, sobre as quais eu gostaria de ter a opinião de ambos.
Muito obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Joaquim Passarinho) - Obrigado, Deputado Vanderlei Macris.
Com a palavra o Deputado Carlos Marun.
O SR. DEPUTADO CARLOS MARUN - Eu destaco a visão que tive dos depoimentos dos nobres juristas que enriquecem este debate.
Existe um temor. Vejam bem o momento pelo qual nós estamos passando! O
Prof. Roberto Romano em várias considerações, quando colocava objeções
ao projeto, até desaconselhando uma aprovação na íntegra do que está
proposto, dizendo eu sei que vai ter gritaria - como se o senhor estivesse com medo de ser preso de novo e de passar 1 ano e meio lá sob tortura... Eu sei que vai ter gritaria. O senhor já se colocava em posição de defesa.
O nobre advogado Augusto Botelho, também, quando corajosamente disse
que discorda da delação, que a delação tem que ser voluntária, disse: Tomei porrada e quase apanhei no jogo Palmeiras e Corinthians.
Meu Deus do céu, nós temos que tomar a decisão que os senhores tomaram,
mesmo enfrentando. O bom é jogar para a torcida. O bom é chegar lá e
dizer: Mesmo sendo palmeirense, eu sou corintiano. Oba! E há
muita gente aqui que gosta disso. Nesta Câmara está cheio de gente assim
- se o Corinthians ganhou, bota a camisa desse time nas costas e corre
para lá. Mas tem que haver gente que diga que é palmeirense, mesmo no
meio de corintiano, para que nós possamos, sim, fazer um projeto
equilibrado.
Eu gostaria de ouvir o senhor sobre os pontos que
considero positivos. Estou buscando o positivo. Não adianta virem aqui
dizer que sou contra; estou buscando o positivo.
O recurso sem efeito suspensivo contra decisão de habeas corpus,
que é pleiteada em algum momento nesse projeto pelo Ministério Público,
eu penso que é uma posição não panfletária, mas vejo aí até um
equilíbrio entre a acusação e a defesa.
Presidente, peço mais um minutinho. Eu me excedi. São três perguntas. Agora é só pergunta, não faço mais considerações.
Em relação ao teste de integridade, pergunto se o Instituto entende... Pela forma cidadã com que se portou aqui o Procurador Dallagnol,
entendendo com humildade que poderia, sim, avaliar, quase admitindo que
precisava ser aperfeiçoada essa questão da delação, estou começando a
me propor votar favoravelmente, como uma homenagem a isso, nas condições
que o senhor colocou: decisão judicial, forte suspeita. Essa está sendo
a tendência da minha posição.
Quanto ao enriquecimento ilícito, Dr.
Augusto Botelho, eu continuo quase que mandando às favas os princípios,
quase que aceitando uma inversão do ônus da prova, quando um servidor
aparece rico. Eu quase vejo o cerne maior dessa questão. O servidor
público que, em pouco tempo, como num toque de mágica, aparece rico tem
que explicar de onde veio o dinheiro.
Eu me posiciono, a princípio,
favoravelmente à criminalização do enriquecimento ilícito, à inversão do
ônus da prova nessa questão.
O SR. DEPUTADO ONYX LORENZONI - Deputado Marun, eu quero só fazer uma observação conceitual.
O SR. DEPUTADO CARLOS MARUN - Vetou o meu tempo de Líder. (Risos.)
O SR. DEPUTADO ONYX LORENZONI - V.Exa. falou em servidor público. Eu gostaria que falássemos em agente público.
O SR. DEPUTADO CARLOS MARUN - Agente público.
O SR. DEPUTADO ONYX LORENZONI - Porque engloba todo mundo.
O SR. DEPUTADO CARLOS MARUN - Sim, desculpe-me. É agente público.
O SR. DEPUTADO ONYX LORENZONI - Porque é como V.Exa. disse: o Chico e o Francisco.
O SR. DEPUTADO CARLOS MARUN - Chico, Francisco, José, Zé.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Joaquim Passarinho) - Encerre sua fala, Deputado Marun, por favor.
O SR. DEPUTADO CARLOS MARUN -
Concluindo, abordo a questão da terceira instância, do triplo grau de
jurisdição. Essa redução do triplo para o duplo grau de jurisdição, no
meu modo de ver, afronta a Constituição.
Mesmo que possamos soltar
foguetes - muitos estão dizendo que isso é positivo; agora o chefe do
Ministério Público de São Paulo, e não poderia ser diferente, diz que é
positivo -, não seria o caso de estabelecer uma condição ou como está na
Constituição, trânsito em julgado? Trânsito em julgado eu entendo que é
a partir do momento em que não existe mais recursos que possam
efetivamente coroar por êxito a defesa.
Não poderia se estabelecer
uma forma em que, com determinado prazo, passassem a sobrestar pauta do
Supremo Tribunal Federal casos de condenação pelo segundo grau para que
nós mantivéssemos o terceiro grau de jurisdição, mas sem que isso
automaticamente significasse um delongar extremo que resultasse na
impunidade?
Gostaria de ouvir a opinião dos senhores sobre essas questões.
O SR. PRESIDENTE (Deputado
Joaquim Passarinho) - Muito obrigado, Deputado Carlos Marun, que ficou
mal-acostumado com o tempo do PMDB, que sempre é muito grande. (Riso.)
Tem a palavra o Deputado Domingos Sávio.
O SR. DEPUTADO DOMINGOS SÁVIO -
Sr. Presidente Deputado Joaquim Passarinho; prezado amigo, nobre
Relator Deputado Onyx Lorenzoni; Dr. Roberto Romano, ilustre professor;
prezado Dr. Augusto Arruda; colegas Parlamentares, estive ainda agora,
numa Comissão Especial do Congresso Nacional, tratando de uma medida
provisória, passei pelo plenário. Começamos a segunda-feira com várias
atividades.
Mas não abriria mão de estar aqui - tenho procurado
estar em todas as reuniões -, para reiterar o nosso compromisso de que
nós podemos avançar na aprovação de um projeto que, de fato, dê ao País,
não apenas a sensação, mas efetivamente medidas duras de combate à
corrupção, de busca da valorização daqueles que estão na vida pública,
seja como agentes públicos eleitos, seja como servidores públicos, com o
compromisso de cumprir uma missão de vida, uma carreira digna e sóbria.
Que o povo brasileiro possa voltar a acreditar, a confiar, até
mesmo, eu diria, por que não, a valorizar tanto a figura tanto dos
servidores públicos como a de seus representantes! Isso é a essência da
democracia. Para tanto, é preciso separar o joio do trigo e acabar com a
impunidade. Eu tenho ouvido isso de todos os colegas.
Eu disse
isso aqui inúmeras vezes, Sr. Presidente, quando tentamos debater o
assunto. Foi isso que fiz aqui na última reunião, dizendo, por exemplo,
que acredito que se pode aprimorar a redação do art. 1º - logo do art.
1º - quando trata de descrever o enriquecimento ilícito. Após uma
vírgula, coloca-se que aquele patrimônio adquirido, ainda que
licitamente... Confundindo isso com enriquecimento ilícito. Cheguei a
dizer que, no mínimo, isso não é uma redação muito feliz, pois pode
levar o magistrado, a quem caberá interpretar a lei, a mais de uma
interpretação. Ora, se assim for feita a lei, ela, ao invés de servir à
justiça, pode ser um pressuposto para a injustiça. Isso é tão elementar.
Depois falei inclusive sobre essa questão do teste de integridade, que é
algo com que também precisamos ter atenção, principalmente para termos
segurança de quem haveria de aplicá-lo, já que não podemos trazer Deus
aqui na Terra todas as vezes que os homens falharem, para que Deus se
faça presente e diga que de fato este é íntegro, este não é.
Se
alguém será submetido ao teste de integridade, quem estará com a missão
de submeter este alguém ao teste precisará observar uma série de
critérios, que me pareceu que não estão muito claros.
Daí por que
eu ter dito que, se não observarmos o cuidado do direito de defesa, se
não observarmos os princípios elementares do Estado Democrático de
Direito, poderíamos, ao estar aprovando uma lei para endurecer contra a
corrupção - que eu defendo, que sinto que é voz comum, que eu diria que é
consenso -, enveredar para o risco de voltar à Idade Media, de fazer
uma caça às bruxas. Tão somente isso eu disse.
Qual a manchete,
alguns minutos depois, de um jornal que eu respeito muito - e que vou
citar, porque liguei duas vezes pedindo que procurassem reestabelecer a
verdade, e não o fizeram -, O Estadão? O jornal coloca na sua página: Deputado Domingos Sávio diz que, se aprovada a lei, será a volta à Idade Media.
Não foi isso que eu disse. Eu disse que, se aprovada na íntegra,
correríamos o risco, precisaríamos debater. Eu já recebi milhares de e-mails. Dizem: Quer dizer que você é contra? Mentira, falácia, desserviço à Nação!
Assisti a um dos canais mais assistidos do telejornalismo, e não estou
aqui a fazer propaganda, até porque seria antipropaganda, a GloboNews. Mas não culpo a GloboNews. Lá
estava uma Procuradora, parece-me que federal, em exercício no Estado
de São Paulo, pelo que creio, debatendo com o Presidente do Instituto de
Defesa do Direito de Defesa. Qual a minha surpresa quando ela afirma
categoricamente, conhecedora de tudo - Promotora, acima do bem e do mal,
fala por todos e nivela todos na sua régua: Os Deputados da Comissão
Especial que analisa o projeto de medidas contra a corrupção são contra
o aumento da pena sobre o crime de corrupção. De onde ela tirou isso?
O que o Ministério Público, ou melhor, o que alguns elementos - para
não cair no mesmo erro dela - que vão falar em nome do Ministério
Público em grandes veículos de comunicação do Brasil pretendem com esse
tipo de achincalhe ao Parlamento brasileiro? Isso é achincalhe ao
Parlamento brasileiro!
Querem de fato aprovar um projeto de lei
anticorrupção achincalhando o Parlamento? O que querem alguns desses
profissionais de imprensa, alguns, achincalhando aqueles que querem
debater o projeto? Querem de fato, então, aprovar alguma lei
anticorrupção ou fazer sensacionalismo?
É esse o tipo de
profissional que devemos defender, como defendo a livre imprensa? Não,
esse tipo de profissional que falta com a verdade não merece o nosso
respeito. Eu não disse, em momento algum aqui, que seria contra o
projeto. Pelo contrário, disse e estou insistindo: Sou profundamente a favor.
Assinei nas ruas, assinei aqui dentro da Casa, ao lado do Deputado
Onyx, citei inclusive os colegas. Creio que todos que estão nesta
Comissão, com certeza a ampla maioria, registramos aqui na Casa o desejo
de prioridade. Pedi que eu estivesse nesta Comissão para defender o
projeto, mas não para defendê-lo como alguém que não seja capaz de
debatê-lo, senão eu não mereceria estar aqui representando o povo de
Minas Gerais.
Se eu não tivesse coragem de levantar a minha voz
contra esses que se colocam como paladinos da justiça e da verdade para
aparecer nas redes sociais e para achincalhar pessoas, eu também não
mereceria estar aqui.
Alto lá, portanto, com essa campanha de querer levar a rodo e dizer: Aprove na íntegra, porque, se não for na íntegra, você também faz parte daqueles que são corruptos.
Ora, isso é um achincalhe à verdadeira democracia, isso é um despreparo
por parte daqueles que se dizem defensores da moral e da ética, é um
absoluto despreparo!
Falo isso na presença de alguém que respeito
profundamente, Prof. Roberto Romano. Não creio que queira que nós aqui
nos curvemos a um projeto que, por melhor que seja, pode e deve ser
aprimorado.
Portanto, é esta a minha posição, Sr. Presidente.
Estarei aqui para debater cada artigo, cada vírgula, para aprimorar o
projeto e principalmente para não deixar que amoleça, para que seja duro
contra a corrupção e funcione, porque, se ele for inconstitucional, de
nada valerá.
Obrigado, Sr. Presidente.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Onyx Lorenzoni) - Obrigado, Deputado Domingos Sávio.
Vou passar a palavra aos nossos dois debatedores para as suas necessárias e convenientes respostas.
(Intervenção fora do microfone. Inaudível.)
O SR. PRESIDENTE (Deputado Onyx Lorenzoni) - Sim, nós já sabemos, Deputado, e o Brasil também já descobriu pela Internet. (Riso.)
O Presidente me sinaliza que é para pedir aos nossos dois convidados
que, ao responderem, já façam suas considerações finais, em virtude do
adiantado da hora.
O SR. ROBERTO ROMANO - Bom, quanto à
questão do Deputado Vanderlei Macris, eu acho que nós temos um problema
de estrutura das nossas Cortes de Justiça. Essa história de o STF ser
tudo e não ser nada, tribunal constitucional e não sei o que mais, toda
essa pletora de missões dadas ao STF, as quais ele vai assumindo, e
muitas vezes gostosamente...
Por exemplo, é bom lembrar que a cláusula de barreira que existia etc. eles...
(Intervenção fora do microfone. Inaudível.)
O SR. ROBERTO ROMANO - É um desserviço.
Essa é uma questão que precisaria ser discutida, sobretudo, pelos
legisladores brasileiros. Quer dizer, não vejo nenhum tribunal supremo
do mundo que tenha tantas prerrogativas e tantas competências. É preciso
decidir se ele é, por exemplo, um tribunal constitucional. Sabemos que,
enquanto nós não decidirmos isso, essa história do recurso à Santíssima
Trindade vai continuar. Isso é o que eu penso.
Deputado Carlos
Marun, os pontos que o senhor coloca são positivos, sim. Agora, a minha
pergunta, muito modesta, é a seguinte. Se um cidadão comum não presta
contas de mil reais na sua Declaração do Imposto sobre a Renda, a
Receita Federal é célere em lhe aplicar multa e exigir prestação. O que
fez a Receita Federal nesses últimos anos no Brasil? Perdoe-me:
Lava-Jato, mensalão, não sei o que mais. O que foi feito por ela? Ela
colocou uma venda, como a Justiça? O que aconteceu? Os computadores que
detectam mil reais do contribuinte pobre não viram bilhões?
Essa é
uma questão que, também, nós podemos levar para o Tribunal Eleitoral. A
prestação de contas é legal, mas não era legal. Então, escute: que
fiscalização é essa que está ocorrendo? Esse é um ponto que me parece
que deve...
O SR. DEPUTADO CARLOS MARUN - Mas o senhor está se referindo a qual das minhas colocações?
O SR. ROBERTO ROMANO
- O senhor indicou pontos positivos e chegou à questão do Ministério
Público Federal e dessa impunidade, dessa coisa que não continua, quer
dizer, essa detecção dos erros. O senhor voltou à questão da instância,
inclusive.
O SR. DEPUTADO CARLOS MARUN - A da terceira instância.
O SR. ROBERTO ROMANO
- A da terceira instância. Eu não vejo assim tanto problema, se não se
enxergar a função da Receita Federal no seu sentido exato.
O SR. DEPUTADO CARLOS MARUN - Eu acho que o senhor não entendeu a minha pergunta. Eu não me referi ao (inaudível.)
O SR. ROBERTO ROMANO - Não, mas eu estou falando que, nessa linha, nós temos que levar em conta isso, sim.
Eu sou da época da ditadura, de quando foi criado o Serviço Federal de
Processamento de Dados - SERPRO. E o pessoal que era da minha linha de
esquerda dizia que era o big brother que estava chegando e tal. O big brother parece que é caolho, não é? Ele vê mil reais, mas não vê 1 bilhão. Então, alguma coisa está acontecendo.
Concordo, praticamente, in totum
com o Deputado Domingos Sávio, porque, como eu disse anteriormente, não
posso aceitar que existam tutores da cidadania. Não existem tutores da
cidadania. Os senhores são representantes do povo soberano, mas os
senhores não são tutores da cidadania, como o Ministério Público,
também, não é. Esse é um ponto que me parece importante.
O Deputado
Marun disse que eu fico um pouco intimidado com isso. Não. Eu tenho um
preceito ético que acho que é interessante. Eu sigo os cínicos. Eu acho
que os cínicos são os filósofos mais éticos da história da Filosofia.
Diógenes, o cínico, dizia o seguinte: Quando eu digo alguma coisa e a multidão aplaude, é porque alguma bobagem eu falei.
Quer dizer, quando só se recebe elogio, tem-se que dizer coisas que
suscitam o debate, suscitam críticas, etc. O nível das críticas, na
sociedade civil brasileira, desceu muito. Se o indivíduo não reza com
Francisco, é inimigo de Francisco e tem que ser caluniado, destruído,
etc. Isso é um defeito de todas as ideologias que existem no Brasil e de
todos os partidos políticos. Perdoem-me.
Então, alguém, velho como
eu, que defende a autonomia do pensamento só pode ter problema, não é?
Não é que eu tenha medo do Ministério Público, mas acho que, volto à
questão, é preciso prudência na elaboração das leis, porque leis
excelentes podem se tornar extremamente nocivas, mudando os agentes que
definem o poder. O poder é efêmero, nós sabemos disso. Há 4 meses nós
tínhamos uma Presidente, talvez não a tenhamos. Não existe partido que
possa se arrogar como dono do Estado, sempre. E, se é democrático, deve
mudar. Então, nessas leis tem que se levar em conta, sempre, os
operadores do Estado: quem está manipulando o Poder Executivo, o Poder
Legislativo e o Judiciário.
É o que eu tenho a dizer.
O SR. PRESIDENTE (Deputado
Joaquim Passarinho) - Muito obrigado, Prof. Roberto. Só discordo da
situação de velho. Mais experiente pode ser, mas velho não.
Com a palavra o Sr. Augusto Botelho.
O SR. AUGUSTO DE ARRUDA BOTELHO
- Deputado Vanderlei Macris, eu concordo integralmente com essa
conclusão de que a morosidade na Justiça causa uma sensação enorme de
impunidade. Eu acho que o processo justo é um processo rápido, se
respeitados todos os direitos e garantias fundamentais. A morosidade é o
principal fator que causa a sensação de impunidade. Eu concordo
plenamente. Eu só não concordo, como já defendi aqui, e vou reiterar,
com as causas geralmente aplicadas ao porquê dessa morosidade. Eu não
vejo, com raríssimas exceções... Um ou dois recursos realmente não
servem para nada, no Código de Processo, como carta testemunhável, que
ninguém usa. Mas, nas propostas apresentadas pelo Ministério Público, em
que eles preveem a retirada de uma série de recursos, não há um deles
que eu acho que seja desnecessário, que seja protelatório ou que tenha
que ser extirpado a fórceps do nosso Código de Processo Penal.
Eu
acho que não é a solução para a morosidade da Justiça a supressão de
recursos. Volto a dizer: a solução para uma Justiça mais rápida é
investimento na Justiça. Nós precisamos de mais juízes, mais promotores,
mais defensores públicos, mais comarcas, justiças especializadas, varas
especializadas em crimes financeiros, em crimes de corrupção, mais
ministros do STJ. Nós precisamos gastar mais com a Justiça. Essa é a
verdade.
Nós somos um país, é verdade, altamente litigioso; temos
milhões e milhões de processos, e os juízes não conseguem julgar. Volto a
dizer: se colocarmos numa linha do tempo os cinco processos criminais
mais notórios, que são sempre utilizados por todos para mostrar que a
Justiça é lenta, vamos ver que o que demora é o julgamento. Ah, mas você entrou com recurso. Bom,
entrou com recurso, porque o recurso é válido. Há um pedido válido a
ser feito, há um pedido válido, seja do Ministério Público ou não.
Há uma série de recursos que o Ministério Público também apresenta. O
próprio Ministério Público coloca aqui que é um recurso apresentado pela
defesa. Vamos pegar como exemplo o caso Pimenta Neves, que é um caso
emblemático. Uma série de recursos o MP apresentou. O MP está querendo
protelar o julgamento final? Não está. Se o MP acha que tem uma tese
favorável à acusação, ele tem que entrar com essa tese. Assim como, se a
defesa acha que tem uma tese favorável, tem que entrar com o recurso. O
problema é que ele demora para ser julgado. O problema não é o recurso
em si; é a demora no julgamento. Por isso uma das propostas do
Ministério Público, que eu acho extremamente importante, é a que
regulamenta a questão de quanto tempo um ministro, um desembargador ou
um juiz pode ficar sentado, com o perdão da palavra, em cima de um
processo, sem julgar.
Então, para dar celeridade à Justiça, há
outras formas menos gravosas. Nós não precisamos suprimir recursos, não
precisamos suprimir direitos para tornar a Justiça menos lenta. Nós
precisamos investir na Justiça. Mas concordo que essa morosidade é a
maior causa da sensação de impunidade.
Deputado Marun, eu ainda vou
tentar convencer o senhor, no caso do enriquecimento ilícito, sobre a
questão da inversão do ônus da prova. Sabe qual é o programa que eu
vejo? Eu até consigo, numa primeira leitura, ser um pouco simpático à
construção que o Ministério Público Federal fez, mas o meu problema - e
eu vou usar uma expressão bem popular - é abrir a porteira. Vamos abrir a
porteira para inverter o ônus da prova, no caso do enriquecimento
ilícito. Para o que vamos abrir a porteira depois? Essa pequena
flexibilização de direitos e garantias fundamentais que, numa primeira
análise, não são assim tão importantes - apesar de esse ser um direito
absolutamente importante, o do ônus da prova, a quem cabe provar -, essa
pequena flexibilização, que, às vezes, passa despercebida numa primeira
análise, num segundo momento onde vai ser utilizada?
Então, eu
consigo entender, mais uma vez, a construção lógica do Ministério
Público ao propor a criminalização do enriquecimento ilícito, mas ainda
vejo com preocupação a inversão do ônus da prova, porque isso pode ser
usado em outras hipóteses que não essa.
Com relação à execução
provisória da pena, e falo isso de forma bastante tranquila, triste
modificação da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, acho que essa
guinada na jurisprudência do Supremo, que, sem qualquer
constrangimento, eu posso dizer, rasgou a Constituição ao tirar o
trânsito em julgado como essencial para o cumprimento da pena, foi uma
decisão de que os próprios Ministros do Supremo hoje se arrependem. E eu
acredito que os recursos apresentados a essa decisão vão ter um
resultado favorável. O Supremo vai revisar e vai voltar a jurisprudência
anterior.
Mas ela é um reflexo de um sistema e de uma sociedade
altamente punitivista que nós estamos vivendo, e é natural que isso
aconteça. Nós olhamos todos os dias bilhões desviados, crimes
gravíssimos acontecendo, e é natural que a sociedade pense sempre na
pena mais alta, na supressão de recursos e no cumprimento de uma pena
rápida, mas escolheram a pior forma. Executar uma pena antes do trânsito
em julgado é jogar no lixo a presunção de inocência, é, sob o falso
pretexto de colocar 1, 2, 10 ou 15 na cadeia, esquecer uma vasta parte
da nossa população carcerária que tem direitos a serem defendidos, tem
recursos que ainda podem ser apresentados.
O Ministro Barroso se
utilizou de uma estatística de quantos recursos que chegavam ao Supremo
tinham a decisão revista. Falar em Justiça Criminal e falar de
estatística é uma coisa um pouco complicada. Se um inocente, uma pessoa
ficar um dia a mais preso por causa de uma decisão como essa, a decisão
está errada. A decisão tem que ser revista.
O SR. DEPUTADO ONYX LORENZONI - Eu quero aproveitar e fazer uma pergunta.
O SR. AUGUSTO DE ARRUDA BOTELHO - Claro.
O SR. DEPUTADO ONYX LORENZONI - A tese do enriquecimento ilícito criminalizado sem inversão do ônus da prova...
O SR. AUGUSTO DE ARRUDA BOTELHO - Eu parto da premissa de um crime sem inversão de nada. Mas eu acho bem melhor.
O SR. DEPUTADO ONYX LORENZONI - É que eu preciso fazer essa pergunta como Relator, para que haja representação.
O SR. AUGUSTO DE ARRUDA BOTELHO - Sem inversão do ônus da prova, ela melhora bastante.
Eu queria só finalizar, primeiro, agradecendo a oportunidade desse
debate, que foi extremamente importante. Agradeço ao Prof. Roberto e a
todos os Deputados o convite. Acho que aprendi bastante aqui hoje também
com a importância do tema. E digo, de forma bastante tranquila, que o
IDDD e a advocacia criminal como um todo estamos sofrendo bastante
ultimamente, porque confundem muitas vezes o cliente com o advogado
criminal. E costumam dizer que nós advogados criminalistas, com as
nossas teses, somos aliados da impunidade, que o que queremos é a
prescrição dos casos, é a liberdade de nossos clientes.
Na verdade,
senhores, o combate à criminalidade, seja de colarinho branco, seja a
criminalidade comum, é interesse de todos, é absolutamente essencial
para qualquer Estado Democrático de Direito. Mas esse combate ao crime,
seja de corrupção, tráfico de drogas, furto, estelionato, qualquer que
seja o crime, deve ser pautado sempre no estrito e na observância total
dos preceitos constitucionais que a duras penas nós conseguimos ver
aprovados no nosso País.
Não há crime grave o suficiente que
justifique o atropelo da lei. Não há escândalo grave o suficiente que
justifique uma modificação drástica e dramática na jurisprudência. Não
há desvio de bilhões que justifique uma série dessas medidas propostas
pelo Ministério Público Federal que rasgam os códigos, fazem alterações
gravíssimas no Código de Processo Penal e na nossa Constituição.
O
Ministro Marco Aurélio tem uma frase que eu acho muito interessante: o
respeito às leis, no combate ao crime, é um preço muito barato que se
paga por se viver num Estado Democrático de Direito. E eu gostaria que a
construção do nosso futuro, no combate ao crime, fosse sempre pautada
por isso.
Agradeço a atenção de todos. Obrigado, mais uma vez.
O SR. PRESIDENTE (Deputado
Joaquim Passarinho) - Muito obrigado, Dr. Augusto Botelho. Eu só
queria, se puder, assim como o Dr. Roberto Romano mandou por escrito,
que nos trouxesse alguma coisa por escrito. E há também a colocação do
Deputado Macris, com a qual eu concordo.
O SR. DEPUTADO VANDERLEI MACRIS - Se pudessem mandar por escrito a opinião sobre a questão das Câmaras Especializadas.
O SR. PRESIDENTE (Deputado
Joaquim Passarinho) - E também dos prazos, os recursos, possibilidade
de recursos e embargos, porque, como foi dito até por V.Exa., se se
demora tanto no Judiciário para julgar, a cada embargo, a cada coisa, é
mais um julgamento, é mais uma procrastinação.
O SR. DEPUTADO DOMINGOS SÁVIO -
Eu já verifiquei com o nobre Relator, mas só confirmando, Presidente,
que eu acho que é importante nesta fase nós, regimentalmente, usarmos as
prerrogativas de apresentar ao nobre Relator as nossas sugestões de
emendas, porque esse é o verdadeiro sentido do processo legislativo. E
espero, já na próxima reunião, trazer ao Relator algumas sugestões que
busquem, nessa linha que eu disse, o aperfeiçoamento do texto, sem
contudo diminuir o compromisso de sermos duros contra a corrupção,
obviamente sem transigir nos princípios essenciais do respeito à nossa
Constituição, do respeito ao direito de defesa, do respeito à dignidade
humana. É perfeitamente possível fazer isso, combater a corrupção,
preservando os princípios elementares da democracia. E é isso que nós
haveremos de conseguir com esse relatório.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Joaquim Passarinho) - Muito obrigado, Deputado Domingos Sávio.
E todos os Deputados e Deputadas, se quiserem apresentar as suas
propostas antecipadamente, saibam que isso ajuda o Relator, ajuda a
construir esse novo relatório com a participação de cada um.
O SR. DEPUTADO ONYX LORENZONI - Ajuda, e muito.
Eu quero fazer uma homenagem aqui ao Prof. Romano dizendo o seguinte: o
relatório que nós vamos construir será prudente, mas firme no combate à
corrupção.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Joaquim Passarinho) -
Gostaria de agradecer mais uma vez a presença dos senhores expositores, o
Dr. Augusto Botelho, o Prof. Roberto Romano, e a todos os que
acompanharam esta audiência, a todos os funcionários da Comissão, aos
nossos assessores da Consultoria Legislativa. Muito obrigado pelo
acompanhamento desta reunião.
Nada mais havendo a tratar, convoco os
senhores membros para a reunião ordinária de amanhã, às 9h30min, no
Plenário 9 deste Anexo, para mais uma rodada de audiências.
Muito obrigado.
Está encerrada a presente reunião.