Flores

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sexta-feira, 22 de setembro de 2017

Golpes à vista! Roberto Romano, Jornal da Unicamp. 22/setembro/ 2017

Foto: Antoninho PerriRoberto Romano da Silva é professor titular aposentado do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas (IFCH) da Unicamp. Autor de vários livros, entre eles “Brasil, Igreja contra Estado” (Editora Kayrós, 1979), “Conservadorismo romântico” (Editora da Unesp), “Silêncio e Ruído, a sátira e Denis Diderot” (Editora da Unicamp), “Razão de Estado e outros estados da razão” (Editora Perspectiva). 

Golpes à vista!


Foto: Reprodução Após o regime imposto em 1964, poucos acadêmicos e políticos acreditavam que no futuro próximo haveria ameaça de outro golpe civil militar. A confiança era tamanha que alguns pontos estratégicos passaram sem grandes traumas na Carta de 1988. Uma batalha ganha pelos defensores do status quo autoritário foi definida no Artigo 142: as Forças Armadas “destinam-se à defesa da Pátria, à garantia dos poderes constitucionais e, por iniciativa de qualquer destes, da lei e da ordem”. Anódina na aparência, tal fórmula permite ao poder público exigir dos quartéis intervenções no campo civil, para manter a norma e impedir sublevações. Nada, em tal item, traz novidades para quem estuda a história dos Estados antigos, modernos e contemporâneos. De modo diverso ao previsto no Artigo 48 da Constituição de Weimar, a convocação do braço castrense não é agora atribuída apenas ao Presidente da República, mas aos três poderes. Leia-se o texto de Ruth Zimmerling, Alemanha: parlamentarismo e o fantasma de Weimar (Scielo). Trata-se de uma diferença considerável, sobretudo se levarmos em conta a hegemonia mantida pelo Executivo federal brasileiro.
Foto: Reprodução
Acima, Costa e Silva assina o AI-5, em dezembro de 1968; abaixo, Castelo Branco (à dir.), 1º presidente da ditadura militar
Deixemos de lado a capacidade de operacionalizar o uso da força pelos três poderes. O fato é que a Carta garante a legalidade da intervenção militar. Durante o tempo em que o texto magno foi elaborado, os responsáveis por aquela parte se dividiram. Os mais arredios à democracia direta e à soberania popular apoiaram a redação final, mas queriam maior rigor no texto. Os democratas desejavam atenuá-lo ao máximo. E perderam. 

Sigo adiante na lógica subjacente à fórmula acolhida e promulgada. A menção explícita à lei e à ordem retoma uma história milenar, vivida desde a república romana. Refiro-me à ditadura. Consultemos os pensadores das Luzes que recolhem os elementos históricos, imanentes ao problema. Diz a Enciclopédia coordenada por Denis Diderot: “como os romanos expulsaram seus reis, viram-se na obrigação de criar um ditador nos perigos extremos da república, como por exemplo quando ela era agitada por sedições perigosas, ou atacada por inimigos temíveis”. Suspensas as demais autoridades, o ditador tinha poder de vida e morte na cidade e no exército. “Mas como ele podia abusar de tão vasto poder, muito suspeito aos republicanos, sempre se tomou a precaução de limitar seu mando em seis meses”. Com Sila, a ditadura praticou crimes terríveis. Para autorizar tais vilanias ele se declarou ditador perpétuo, usurpando a força ditatorial. E comenta o enciclopedista: “soberano absoluto, ele mudou a seu talante a forma do governo, aboliu antigas leis e proclamou novas, se tornou senhor do tesouro público e dispôs despoticamente dos bens de seus cidadãos”. Cesar, vitorioso à custa de muita corrupção, inclusive financeira, retoma a ditadura perpétua e governa como senhor do mundo e da república. Termina da forma conhecida. 

Para explicar os fatos da ditadura romana, particularmente as de Sila e Cesar, existem imensas bibliotecas, da Idade Média aos nossos dias. Limito-me a um comentário significativo da biografia publicada por Luciano Canfora. Ao indicar o banditismo assumido por Clódio, um tonton macoute da época, diz o historiador: “Com sua presença agressiva (de Clódio) na cena política da capital chega-se ao ponto extremo e se concretiza aquela degeneração parasitária do proletariado urbano de Roma, premissa não secundária da decisão de Cesar de desvincular-se da política tradicional popularis e de sua dinâmica. Quando as classes se decompõem na incapacidade não só de assumir uma função diretiva como também de adaptar-se à hegemonia de outros grupos, afloram fenômenos de parasitismo cego e de liderança de ação violenta que desqualificam, frequentemente por um tempo às vezes longo demais, a tradição democrática”. (Júlio César, o ditador democrático). 

Para vencer sedições e “ameaças à ordem”, os ditadores Sila e Cesar, mas também outros aparentemente mais controlados até os nossos tempos, “colocam fim a uma época de anarquia mas igualmente ao ‘antigo regime’ que sua propaganda desacredita por todos os meios. (...) O ditador possui e impõe um programa geralmente bem marcado do ponto de vista político e social, o que traz uma ruptura violenta com o regime precedente. (...) Seu   principal meio de ação é a violência que se acompanha de um terror mais ou menos intenso. Os instrumentos de tal violência podem ser o exército, ou as milícias privadas” (Paul Petit, “Dictatures et légitimité dans “Empire Romain”, in Dictatures et Légitimités, org. por M. Duverger).

Os estudiosos do regime ditatorial, desde a era antiga, indicam um ponto importante, mas pouco percebido pelos que defendem aquele “remédio” para os males do Estado, a começar com a corrupção econômica e política. O regime ditatorial não é um meio para instaurar novas estruturas estatais e de sociedade. Ele é primordialmente conservador, quando não reacionário. Sua missão se define como negativa e tem como tarefa afastar o coletivo da possível destruição, daí a sua excepcionalidade e o caráter salvacionista de seu titular, individual ou de grupo. Tal aspecto é sublinhado por Spinoza, o autor ético da modernidade política e democrática: “Nos momentos de aflição, quando todos são tomados de terror pânico (...) os rostos se voltam para o homem cujas vitórias o colocam em plena luz”. (Tratado Político, capítulo 8) Os apavorados livram o ditador do respeito à lei. Na tarefa de manter um status quo, o possuidor temporário do mando absoluto destrói aquilo mesmo que ele supostamente deveria garantir. Um comentário excelente encontra-se no livro de Marie-Laurie Basilien-Gainche: État de droit et états d’exception

A ditadura de 1964 tinha como emblema lutar contra a corrupção e a subversão. No caso da segunda, os governantes impostos travaram cruentas batalhas, com muitos atentados às liberdades democráticas e aos direitos civis. No caso da primeira, o Congresso e a política não deixaram de abrigar, durante toda a ditadura, notórios corruptos ou facilitadores da corrupção. A lista é longa, e pode começar com Paulo Salim Maluf, terminando em Edison Lobão e outros apelativos sonoros.  Basta olhar tais nomes que operavam a ordem política nacional, e ainda hoje acionam os mecanismos do Estado, para nos darmos conta da derrota programada, ocorrida no regime autoritário, na suposta ou real luta contra a corrupção. Buscar uma ditadura para destruir formas corruptas é tarefa duplamente perigosa e inútil. Primeiro, se o regime foi idealizado para manter a lei e a ordem vigentes, nos casos brasileiros do século XX a lei e ordem foram mantidas, com todas as suas iniquidades, irmãs gêmeas da corrupção. E o regime de força, dada sua própria natureza negativa, não tinha legitimidade nem condições objetivas para edificar novas formas de Estado e sociedade.  Décadas de regime autoritário não produziram formas melhores de governo, de controle político, de justiça e cidadania. Quando acabou o Estado ditatorial, pelo menos temporariamente, o país estava na mesma, ou pior, do que antes de sua instauração. 

Ditadura e golpe de Estado formam um todo coerente. No século XX ocorrem inúmeros golpes de Estado, produzidos por motivos ideológicos, religiosos, políticos. Na madrugada, tanques de guerra tomam as ruas. Estações de rádio e televisão transmitem informes do governo ameaçado. O legalismo silencia e surgem proclamações dos que desejam o poder. Música patriótica compõe o apelo emocional ao povo. Caídos os dirigentes antigos, os novos interrompem os direitos públicos para limpar a pátria de toda corrupção, vencer os inimigos. “Se eles fossem vitoriosos, fariam mais ou pior do que efetivamos”, a frase modula o discurso dos novos palacianos.  Poucos países saíram de semelhante dança macabra aptos para a democracia e puderam confiar em técnicas políticas ou jurídicas aptas a produzir um Estado onde exista o convívio entre diferentes opiniões.

O modelo acima deixa na sombra que o golpe de Estado é mais sutil do que a intervenção das casernas. Um golpe pode ser incruento e não suspender todos os direitos. Caso se efetivem mudanças micrológicas na ordem legal e de governo, com pequeno acréscimo ou subtração nas leis, o seu efeito é tão desastroso para a democracia quanto um “pronunciamento” armado. Somadas, as micro-intervenções criam rupturas no direito público e privado, o que gera medo e desconfiança geral frente às instituições.

Em Gabriel Naudé encontra-se o esboço dos golpes modernos. As Considerações Políticas sobre os Golpes de Estado (1639) ordenam um modelo a ser observado e temido pelos democratas. Segundo Naudé, “o bem e a utilidade pública vêm antes da utilidade particular”. Os golpes definem “atos extraordinários que os príncipes são constrangidos a executar contra o direito comum, quando os negócios se tornam difíceis ou desesperados, sem observar nenhuma ordem ou forma de justiça”. No golpe “a tempestade cai antes dos trovões, a execução precede a sentença, (...) um indivíduo recebe o golpe que imaginava dar, outro morre quando se imaginava seguro, u m terceiro recebe o golpe que não esperava”. O governante que perdeu é punido e depois sentenciado pelos vencedores. 

Foi o que ocorreu com o Ato Institucional n.º 1 (AI-1). Aposentadas as noções de legitimidade e de soberania vigentes, o texto proclama: "A revolução vitoriosa se investe no exercício do Poder Constituinte. Este se manifesta pela eleição popular ou pela revolução. Esta é a forma mais expressiva e mais radical do Poder Constituinte. Assim, a revolução vitoriosa, como Poder Constituinte, se legitima por si mesma. (...) Ela edita normas jurídicas sem que nisto esteja limitada pela normatividade anterior à sua vitória”.

No Ato institucional de número 1, fala-se da onipotência trazida pelo poder constituinte. É impossível compreender aquele texto, que instaurou a ditadura de 1964, sem ler os trabalhos de Carl Schmitt, teórico frequentado por Francisco Campos, o pai da Polaca e dos Atos institucionais, do primeiro ao quinto. “A ditadura soberana é a comissão da ação incondicionada de um poder constituinte”, adianta Carl Schmitt no seu tremendo A Ditadura, no capítulo intitulado “O conceito de ditadura soberana”.  Diante de notícias como a defesa do golpe por um general da ativa, algo que necessariamente exigirá um regime de força, é aconselhável ler com cautela e atenção redobrada o citado livro-chave de Schmitt. Tal exame vale bem mais do que a frequência às redes sociais. Em Schmitt, temos a trilha de nosso destino, tal como se definiu no século XX e como poderá ser retomado no século XXI. Finalizo: não raro, a ameaça de um golpe dos quartéis serve para ocultar os golpes de Estado mais letíferos. Hoje, no Brasil, os golpes se condensam nas mudanças das leis, como a da previdência, trabalhista, direitos ecológicos e humanos. Além, claro, dos golpes definidos pela “reforma política”.  Com medo ou por amor aos tanques, muitos aceitarão os golpes preparados sine ira et studio pelos corrompidos palacianos. O resto é silêncio. 
 

quinta-feira, 21 de setembro de 2017

ihu unisinos.

Ataques a religiões de matriz africana fazem parte da nova dinâmica do tráfico no rio


21 Setembro 2017
“Todo o mal tem que ser desfeito, em nome de Jesus”, diz um traficante, ordenando que uma yalorixá destrua as imagens do seu terreiro em Nova Iguaçu, na Baixada Fluminense, divulgado na quarta-feira (13). Em outro vídeo que circula nas redes sociais, um homem “lembra” a um pai de santo que o chefe não quer macumba no local: “É só um diálogo [segurando um taco de baseball escrito diálogo] que eu tô tendo com vocês. Da próxima vez eu mato”, diz. As cenas absurdas são uma amostra de uma onda de ataques a terreiros de umbanda e candomblé comandados por traficantes que seguem acontecendo no Rio de Janeiro.
Até o momento, só em setembro, foram oito casos registrados apenas em Nova Iguaçu. O Disque 100, serviço de denúncias de violações de direitos humanos do Governo Federal, recebeu, entre 2011 e 2016, 175 denúncias de intolerância religiosa no estado – 10% do total no país. Há relatos de ataques e perseguições em toda a Região Metropolitana. No Rio, traficantes proíbem a prática das religiões e o uso de roupas brancas, levando filhos de santos a deixarem as favelas. Na Cidade Alta, após a troca de comando no morro em novembro do ano passado, imagens de santos foram retiradas de comércios locais.
Os casos mencionados aconteceram em lugares dominados pela mesma facção criminosa, o Terceiro Comando Puro. As investigações correm em sigilo e parte dos envolvidos já foi identificada. Como resposta ao crescente número de casos de intolerância, a Polícia Civil e a Secretaria de Segurança Pública acenam com a criação de uma delegacia especializada até o fim do ano.
A conversão religiosa dos “homens do tráfico” não é um fenômeno novo, e esse tipo de perseguição acontece há mais de 10 anos nas favelas cariocas. Para ajudar a entender essa dinâmica em que traficantes que se denominam evangélicos tentam combater outras religiões nos territórios que dominam, conversamos com a professora de sociologia da UFF e autora do livro Oração de traficante: uma etnografia Christina Vital da Cunha, que pesquisa o tema há 23 anos.
A entrevista é de Juliana Gonçalves, publicada por The Intercept Brasil, 20-09-2017.

Eis a entrevista.

Por que é comum que traficantes busquem ajuda religiosa?
Tanto policiais quanto traficantes, sempre estão no limite. Então, buscam proteção na religião. O salmo 91 é usado por policiais e traficantes, por exemplo. Assim como São Jorge foi e ainda é. O que acontece com essa proximidade mais recente dos traficantes com esse universo evangélico é que a igreja se apresenta como uma rede que os auxilia em diferentes questões da vida, como a preparar a saída do tráfico. O que os pastores chamam de libertação de traficantes.
Como aconteceu essa aproximação com os evangélicos?
A primeira coisa que a gente tem que pensar quando vai se analisar essa situação é que os traficantes são formados em um caldo cultural que é comum hoje às pessoas de favelas e periferias. Eles sempre são produto de um meio. A gente vem observando com o passar das décadas, sobretudo dos anos 1990, um crescimento muito expressivo no número de templos religiosos evangélicos. Muitos deles são de famílias evangélicas, então já foram educados com referencial religioso. Somado a isso, os pentecostais têm por característica a realização de missões com grupos marginalizados, entre eles os traficantes, oferecendo rede de proteção espiritual, psicológica e também material. Isso tem efetividade nessas localidades, assim como no sistema prisional.
O pastor Marcos Pereira teve grande influência sobre a conversão de vários chefes do tráfico, a partir da ação dele nos presídios. Mas não só ele, traficantes convertidos, a Universal do Reino de Deus e a Assembleia de Deus também participam dessas ações em favelas e periferias.
Como os líderes religiosos enxergam esses traficantes que se denominam evangélicos?
Há muitos nessa comunidade moral que é a comunidade religiosa, que negam o pertencimento do traficante, pois ele não pode dizer que é evangélico porque ele não tem uma conduta correta. Dizem que eles estão em um processo. Tem muita gente séria que leva a palavra de Deus a essas pessoas, pois acreditam que elas podem e devem se libertar. Mas também tem os que usam o dinheiro do tráfico. A coisa é complexa e tem de tudo.
A figura de traficantes evangélicos é exclusiva do Terceiro Comando Puro - TCP?
Nos anos 2000, houve a conversão de um dos chefes do Terceiro Comando. Essa conversão atualiza comportamentos no crime. Havia uma orientação que levava a menos confrontos, menos mortes e também se referia às sucessões na hierarquia do tráfico baseada em uma visão que uma pessoa teve na igreja. A partir daí, traficantes de lugares diferentes da hierarquia do crime passam a se vincular ao universo religioso e ter o comportamento orientado por esse conjunto de valores evangélicos.
Agora, não podemos afirmar que todo traficante evangélico pertence a uma única facção. É verdade que os casos midiatizados nos últimos dias são em localidades da mesma facção. Mas, por exemplo, no Complexo da Maré [no Rio], na parte do território do Comando Vermelho é comum as pichações com salmos e orações nas paredes. É algo que faz parte da cultura da periferia.
Em que momento as religiões de matriz africana passam a ser perseguidas?
Existem líderes religiosos que incentivam a partir dos seus discursos nas igrejas atos de combate a inimigos espirituais e terrenos. Isso é uma prática que não acontecem só em igrejas de denominação única [independentes] em favelas e periferias. Isso acontece também com lideranças que estão aparecendo na mídia, e a gente vai encontrar isso em diferentes denominações e camadas sociais.
A partir da valorização de uma teologia do domínio, insuflam o combate ao inimigo, o combate das forças do bem contra o mal. E o mal está localizado em determinados símbolos, signos, grupos, religiões e comportamentos que devem ser combatidos com ações enérgicas em perspectivas violentas.
A gente vai acompanhando os efeitos negativos na sociedade em geral, como a menina Kaylane, que levou uma pedrada em 2015. Agora a gente vê com mais frequência essa ação dos traficantes, mas já tem pelo menos dez anos de perseguição e constrangimento em relação a religiões afrobrasileiras nas favelas.
Por que agora os ataques se tornaram constantes e são divulgados pelos próprios traficantes?
Isso começa a sair do controle dos líderes religiosos e passa a ser como um código entre os traficantes. Um modo de comportamento que é divulgado como um modo de demonstrar força e domínio. E acaba viralizando na facção, em parte tem a ver com o estímulo de liderança religiosa, mas, também, tem relação com a própria dinâmica do tráfico. É uma demonstração de poder que se expressa no combate a esses religiosos que representam o mal dentro da favela. Trata-se de mais uma modalidade de violência.
O que pode ser feito contra essa perseguição?
É muito importante que esses casos sejam midiatizados. A pessoas precisam procurar meios de falar sobre isso. Campanhas que criem estigmas em relação aos intolerantes e ações do estado em diferentes frentes são necessárias para que esse ataques parem.

terça-feira, 19 de setembro de 2017

Roberto Romano, Ética e Ministério Publico. Scielo

http://books.scielo.org/id/ff2x7/pdf/livianu-9788579820137-19.pdf

Persquisa CNT, última

Notícias

19/09/2017
Resultados da 134ª Pesquisa CNT/MDA

Levantamento mostra avaliações sobre o presidente Michel Temer, expectativas da população e cenários para a eleição presidencial 2018, entre outros temas
Foto: Fotos: Gueldon Britto

A 134ª Pesquisa CNT/MDA, realizada de 13 a 16 de setembro de 2017 e divulgada pela CNT (Confederação Nacional do Transporte), mostra a avaliação dos índices de popularidade do governo e pessoal do presidente Michel Temer. Mede ainda a expectativa da população em relação ao emprego, à renda, à saúde, à educação e à segurança pública.

Esta edição aborda também alguns cenários para a eleição presidencial de 2018 e traz a opinião dos entrevistados sobre questões relativas à reforma política, Operação Lava Jato, hábitos de consumo de notícias no país. Foram ouvidas 2.002 pessoas, em 137 municípios de 25 Unidades Federativas, das cinco regiões. A margem de erro é de 2,2 pontos percentuais com 95% de nível de confiança.


Avaliação do governo 

Desempenho pessoal do presidente


Federal: A avaliação do governo do presidente Michel Temer é positiva para 3,4% dos entrevistados, contra 75,6% de avaliação negativa. Para 18,0%, a avaliação é regular e 3,0% não souberam opinar. A aprovação do desempenho pessoal do presidente atinge 10,1% contra 84,5% de desaprovação, além de 5,4% que não souberam opinar.

Estadual: 3,0% avaliam o governador de seu Estado como ótimo. 16,4% como bom, 36,8% como regular, 15,6% como ruim e 22,0% como péssimo.

Municipal: 6,6% avaliam o prefeito de sua cidade como ótimo. 27,8% como bom, 33,8% como regular, 10,4% como ruim e 15,9% como péssimo.
 

Expectativa (para os próximos 6 meses)


Emprego: vai melhorar: 25,7%, vai piorar: 35,4%, vai ficar igual: 36,0%
Renda mensal: vai aumentar: 22,1%, vai diminuir: 20,6%, vai ficar igual: 53,2%
Saúde: vai melhorar: 21,1%, vai piorar: 36,5%, vai ficar igual: 40,3%
Educação: vai melhorar: 25,0%, vai piorar: 29,4%, vai ficar igual: 43,6%
Segurança pública: vai melhorar: 16,6%, vai piorar: 45,7%, vai ficar igual:  36,2%

Eleição presidencial 2018 


1º turno: Intenção de voto espontânea

Lula: 20,2% 
Jair Bolsonaro: 10,9% 
João Doria: 2,4%
Marina Silva: 1,5%
Geraldo Alckmin: 1,2%
Ciro Gomes: 1,2%
Álvaro Dias: 1,0%
Dilma Rousseff: 0,7%
Michel Temer: 0,4%
Aécio Neves: 0,3%
Outros: 2,0%
Branco/Nulo: 21,2%
Indecisos: 37,0%


1º turno: Intenção de voto estimulada

CENÁRIO 1: Lula 32,4%, Jair Bolsonaro 19,8%, Marina Silva 12,1%, Ciro Gomes 5,3%, Aécio Neves 3,2%, Branco/Nulo 21,9%, Indecisos 5,3%.

CENÁRIO 2: Lula 32,0%, Jair Bolsonaro 19,4%, Marina Silva 11,4%, Geraldo Alckmin 8,7%, Ciro Gomes 4,6%, Branco/Nulo 19,0%, Indecisos 4,9%.

CENÁRIO 3: Lula 32,7%, Jair Bolsonaro 18,4%, Marina Silva 12,0%, João Doria 9,4%, Ciro Gomes 5,2%, Branco/Nulo 17,6%, Indecisos 4,7%.

2º turno: Intenção de voto estimulada 

CENÁRIO 1: Lula 41,8%, Aécio Neves 14,8%, Branco/Nulo: 39,6%, 
Indecisos: 3,8%.
CENÁRIO 2: Lula 40,6%, Geraldo Alckmin 23,2%, Branco/Nulo: 31,9%, Indecisos: 4,3%.

CENÁRIO 3: Lula 41,6%, João Doria 25,2%, Branco/Nulo: 28,8%, 
Indecisos: 4,4%.

CENÁRIO 4: Lula 40,5%, Jair Bolsonaro 28,5%, Branco/Nulo: 27,0%,
Indecisos: 4,0%.

CENÁRIO 5: Lula 39,8%, Marina Silva 25,8%, Branco/Nulo: 31,3%, 
Indecisos: 3,1%.

CENÁRIO 6: Jair Bolsonaro 28,0%, Geraldo Alckmin 23,8%, Branco/Nulo: 40,6%, Indecisos: 7,6%.

CENÁRIO 7: Marina Silva 28,4%, Geraldo Alckmin 23,6%, Branco/Nulo: 41,5%, Indecisos: 6,5%.

CENÁRIO 8: Jair Bolsonaro 32,0%, Aécio Neves 13,9%, Branco/Nulo: 46,4%, Indecisos: 7,7%.

CENÁRIO 9: Marina Silva 33,6%, Aécio Neves 13,0%, Branco/Nulo: 47,3%, Indecisos: 6,1%.

CENÁRIO 10: Jair Bolsonaro 28,5%, João Doria 23,9%, Branco/Nulo: 39,2%, Indecisos: 8,4%.

CENÁRIO 11: Marina Silva 30,5%, João Doria 22,7%, Branco/Nulo: 39,9%, Indecisos: 6,9%.

CENÁRIO 12: Marina Silva 29,2%, Jair Bolsonaro 27,9%, Branco/Nulo: 36,7%, Indecisos: 6,2%.


Limite de voto – Presidência da República

AÉCIO NEVES: é o único em que votaria (1,1%); é um candidato em que poderia votar (23,5%); não votaria nele de jeito nenhum (69,5%); não conhece/não sabe quem é/ nunca ouviu falar (4,1%).

CIRO GOMES: é o único em que votaria (2,4%); é um candidato em que poderia votar (25,6%); não votaria nele de jeito nenhum (54,8%); não conhece/não sabe quem é/ nunca ouviu falar (14,6%).

GERALDO ALCKMIN: é o único em que votaria (2,8%); é um candidato em que poderia votar (35,9%); não votaria nele de jeito nenhum (52,3%); não conhece/não sabe quem é/ nunca ouviu falar (6,5%).

JAIR BOLSONARO: é o único em que votaria (13,4%); é um candidato em que poderia votar (26,3%); não votaria nele de jeito nenhum (45,4%); não conhece/não sabe quem é/ nunca ouviu falar (13,0%).

JOÃO DORIA: é o único em que votaria (4,1%); é um candidato em que poderia votar (31,2%); não votaria nele de jeito nenhum (42,9%); não conhece/não sabe quem é/ nunca ouviu falar (19,9%).

LULA: é o único em que votaria (23,4%); é um candidato em que poderia votar (24,3%); não votaria nele de jeito nenhum (50,5%); não conhece/não sabe quem é/ nunca ouviu falar (0,6%).

MARINA SILVA: é a única em que votaria (6,7%); é uma candidata em que poderia votar (38,1%); não votaria nela de jeito nenhum (51,5%); não conhece/não sabe quem é/ nunca ouviu falar (1,4%).


Posicionamento político


Protestos
Entre os entrevistados, 91,0% dizem não ter participado de protesto ou ato político no país desde 2013; 9,0% declaram ter participado. Desses, 45,3% se manifestaram pela saída da ex-presidente Dilma Rousseff do cargo; 28,2% pela permanência de Dilma Rousseff; 23,8% declaram não ter se manifestado em relação ao impeachment.
Perguntados se têm intenção de participar de alguma manifestação pela saída do presidente Michel Temer da Presidência da República, 67,7% responderam não e 30,8% responderam sim.
Interrogados sobre os motivos dos panelaços e das manifestações contra a corrupção terem diminuído no governo Michel Temer, 50,3% dizem ter perdido a esperança com os atuais políticos; 25,4% alegam falta de perspectivas de mudanças no curto prazo. Para 16,3%, o motivo foi a saída do PT da Presidência da República; 3,9% dizem que hoje há menos motivos para protestar.

Crise política
Para 94,3% dos entrevistados, o país está em crise política. Desses, 49,9% acreditam que a troca do presidente da República não resolveria a situação, enquanto 41,2% acreditam que a mudança do presidente da República resolveria a crise.
Em relação à situação política no Brasil, 36,1% consideram que ela está completamente fora de rumo; 59,5% avaliam que está fora do rumo, mas ainda há esperança; e 2,3% acreditam que a política está no caminho certo.

Michel Temer
A maior parte (46,7%) dos participantes da pesquisa avalia que o presidente Michel Temer não é respeitado; 35,6% consideram que Temer é pouco respeitado. Para 11,4%, ele é moderadamente respeitado e 2,4% dizem que Michel Temer é muito respeitado.
5,8% acreditam que Michel Temer está enfrentando os principais problemas do país. 30,3% acham que ele está enfrentando alguns problemas enquanto 59,0% dos entrevistados acreditam que Temer não os está enfrentando.
80,0% acreditam que Michel Temer não está fazendo as reformas necessárias ao país. Para 13,7% as reformas necessárias estão sendo feitas. 6,3% não souberam opinar.
A maioria (58,6%) dos entrevistados declara não ter nenhuma confiança no presidente Michel Temer. O grau de confiança no presidente é baixo para 26,9%; médio para 12,8%; e alto para 0,7%.
Comparando Dilma Rousseff e Michel Temer, 55,4% dos entrevistados declaram não confiar em nenhum dos dois; 30,1% dizem que confiam mais em Dilma e 11,6% confiam mais em Temer.


Reforma Política 


54,0% dos entrevistados dizem não saber que há uma reforma política tramitando no Congresso Nacional. Com relação ao modelo eleitoral, 74,0% afirmam preferir que os candidatos sejam eleitos pelos votos obtidos diretamente; 3,7% acham que os candidatos devem ser eleitos pela soma dos votos do partido e 15,4% por uma combinação das duas formas.

Lava Jato e corrupção


Sobre a operação Lava Jato, 79,9% dizem que estão acompanhando, enquanto 20,1% não estão acompanhando.
78,5% afirmam que aprovam a Lava Jato na investigação de casos de corrupção envolvendo políticos e empresários. 9,3% a desaprovam e 7,7% não a aprovam e nem a desaprovam.
Para 54,0%, a Operação Lava Jato está beneficiando o Brasil. 24,0% avaliam que ela não está beneficiando nem prejudicando; e 15,9% acham que ela está prejudicando o país.

Desemprego


Sobre a oferta de empregos, 37,2% acreditam que está melhorando (0,1% em ritmo acelerado, 6,0% em ritmo moderado; e 31,1% em ritmo lento); 32,7% acham que está piorando e 29,0% não percebem mudanças.
37,5% dos entrevistados dizem conhecer alguém que conseguiu emprego nos últimos seis meses, contra 62,5% que não conhecem.

Hábitos de consumo de notícias


A televisão ainda é o principal meio de informação dos brasileiros (51,8%), seguida pela internet (39,4%) e pelo jornal impresso (3,4%).
A maior parte (40,6%) dos entrevistados afirma que não compartilha notícias na internet. Entre os que compartilham, 33,1% dizem evitar a divulgação de notícias que não são verdadeiras e 16,8% dizem que nem sempre se preocupam com a veracidade da informação compartilhada; 5,9% afirmam que, se for do seu interesse, compartilham a informação sem checar.

CONCLUSÃO


Os resultados da 134ª Pesquisa CNT/MDA mostram aumento da percepção negativa sobre o governo Michel Temer, alcançando os índices mais baixos no histórico das pesquisas realizadas pela CNT (Confederação Nacional do Transporte). 

A intenção de voto para a eleição presidencial em 2018 indica manutenção da liderança do ex-presidente Lula em todos os cenários de primeiro e segundo turnos. Jair Bolsonaro se consolida na segunda posição. Nota-se, também, elevado percentual de rejeição individual para todos os pré-candidatos avaliados, inclusive para João Doria, que passa a ser percebido como um político comum. O potencial de rejeição de todos os pré-candidatos ultrapassa 50%. 

Há percepção de que o país se encontra em crise e fora de rumo do ponto de vista político. Em relação ao emprego, as melhoras na economia são percebidas de forma tímida pela população. Os brasileiros continuam acompanhando as ações da operação Lava Jato, aprovando suas ações e acreditando, em sua maioria, que ela está beneficiando o Brasil.

O meio de comunicação mais utilizado para se obter informações continua sendo a televisão, seguida pela internet.

Na avaliação da CNT, a pesquisa demonstra que a eleição está aberta para um nome de alta respeitabilidade não ligado ao meio político, podendo ser da área judiciária, médica ou empresarial.

Clique aqui para acessar os resultados completos.

Fala de Raquel Dodge reforça ideia do MP como tutor do cidadão

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ANÁLISE: Fala de Raquel Dodge reforça ideia do MP como tutor do cidadão

COMISSÃO ESPECIAL - PL 4850/16 - ESTABELECE MEDIDAS CONTRA CORRUPÇÃO EVENTO: Audiência Pública REUNIÃO Nº: 0981/16DATA: 22/08/2016LOCAL: Plenário 4 das ComissõesINÍCIO: 14h39minTÉRMINO: 17h46minPÁGINAS: 69 DEPOENTE/CONVIDADO - QUALIFICAÇÃO ROBERTO ROMANO - Professor de Ética e Filosofia na Universidade Estadual de Campinas - UNICAMP. AUGUSTO DE ARRUDA BOTELHO - Conselheiro do Instituto de Defesa do Direito de Defesa - IDDD. SUMÁRIO Debate sobre o Projeto de Lei nº 4850, de 2016 - estabelece medidas contra a corrupção. Deliberação de requerimentos.

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CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ


Reunião: 0981/16 Hora: 14h30
  Data: 22/8/2016

DEPARTAMENTO DE TAQUIGRAFIA, REVISÃO E REDAÇÃO

NÚCLEO DE REDAÇÃO FINAL EM COMISSÕES

TEXTO COM REDAÇÃO FINAL

Versão para registro histórico

Não passível de alteração


COMISSÃO ESPECIAL - PL 4850/16 - ESTABELECE MEDIDAS CONTRA CORRUPÇÃO EVENTO: Audiência Pública REUNIÃO Nº: 0981/16DATA: 22/08/2016LOCAL: Plenário 4 das ComissõesINÍCIO: 14h39minTÉRMINO: 17h46minPÁGINAS: 69
DEPOENTE/CONVIDADO - QUALIFICAÇÃO

ROBERTO ROMANO - Professor de Ética e Filosofia na Universidade Estadual de Campinas - UNICAMP. AUGUSTO DE ARRUDA BOTELHO - Conselheiro do Instituto de Defesa do Direito de Defesa - IDDD.
SUMÁRIO
Debate sobre o Projeto de Lei nº 4850, de 2016 - estabelece medidas contra a corrupção. Deliberação de requerimentos.
OBSERVAÇÕES
Houve intervenções inaudíveis.
 
O SR. PRESIDENTE (Deputado Joaquim Passarinho) - Boa tarde a todos e a todas.
Declaro aberta a 8ª Reunião Extraordinária da Comissão Especial destinada a proferir parecer ao Projeto de Lei nº 4.850, de 2016, do Sr. Antonio Carlos Mendes Thame e outros, que estabelece medidas contra a corrupção e demais crimes contra o patrimônio público e o combate ao enriquecimento ilícito de agentes públicos.
Em apreciação a ata da 7ª Reunião Ordinária, realizada no último dia 16 de agosto, cujas cópias devem ter sido distribuídas aos senhores membros.
Indago ao Plenário se há a necessidade de leitura da ata.
O SR. DEPUTADO ONYX LORENZONI - Não há necessidade de leitura, Sr. Presidente.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Joaquim Passarinho) - O Deputado Onyx Lorenzoni pede a dispensa da leitura.
Dispensada a leitura.
Indago aos senhores membros se desejam fazer alguma retificação na ata. (Pausa.)
Não havendo quem queira retificá-la, coloco-a em votação.
Os Deputados que a aprovam permaneçam como estão. (Pausa.)
Aprovada a ata.
Comunico aos Srs. Deputados o recebimento das seguintes correspondências, cujas cópias encontram-se à disposição na Secretaria da Comissão:
Ofícios nº 912, de 2016, e nº 93, de 2016, respectivamente, dos Deputados Félix Mendonça Júnior e Ronaldo Fonseca, que justificam as suas ausências na reunião do dia 15 de agosto em razão de compromisso político-partidário.
A Ordem do Dia está dividida em duas partes: audiência pública e deliberação de requerimentos.
Esta audiência é resultado dos Requerimentos nºs 19, de 2016; 24, de 2016; e 43, de 2016, de autoria dos Deputados Rubens Bueno, Carlos Marun e Paulo Teixeira, respectivamente.
Convido para tomar assento à mesa os seguintes senhores expositores: o Dr. Roberto Romano, professor de Ética e Filosofia na UNICAMP - Universidade Estadual de Campinas; e o Dr. Augusto de Arruda Botelho, conselheiro do Instituto de Defesa do Direito de Defesa - IDDD, que representa neste ato o Presidente Fábio Tofic.
Estamos aguardando ainda o nosso terceiro convidado, o Dr. José Henrique Torres, professor de Direito Penal da Pontifícia Universidade Católica de Campinas.
Esclareço aos Srs. Parlamentares e aos senhores expositores que a reunião está sendo transmitida ao vivo pela Internet e gravada para posterior transcrição. Por isso, solicitamos a todos que falem ao microfone.

Para o bom ordenamento dos trabalhos, adotaremos alguns critérios. Os expositores terão 20 minutos, prorrogados a juízo da Comissão, não podendo ser aparteados. O Relator disporá de 15 minutos para a sua manifestação. Os Deputados terão a palavra conforme a lista de inscrição por 3 minutos improrrogáveis, com preferência aos autores do requerimento.
Vamos dar início à exposição.
Concedo a palavra ao Dr. Roberto Romano para fazer a sua exposição. S.Sa. tem até 20 minutos.
O SR. ROBERTO ROMANO - Boa tarde a todos.
Agradeço o convite para me dirigir aos representantes do povo brasileiro.
Vou deixar de tocar nos itens com os quais concordo e nos que me falta competência. Não me deterei nas penas e dosimetria propostas. Juristas podem analisar com apuro tais elementos.
O projeto, se levado à norma, trará benefícios à sociedade, ao Estado e à política, escoimando-se de desvios. O texto é bem ordenado e oportuno. A justificativa, no meu entender modesto, traz problemas que merecem atenção.
Peço sua paciência para os pontos que enumero, pois eles brotam de um apelo à prudência.
O poder corrompe. O absoluto corrompe absolutamente. O enunciado de Lord Acton serve hoje apenas como clichê. Se o contextualizarmos, no entanto, sua tese ajuda a refletir sobre a presente crise mundial de estados e nações. Em carta ao Bispo Creighton, Acton discute a responsabilidade de quem dirige os poderes. Suas frases sobre o mando corrosivo se complementam do seguinte modo: O poder absoluto desmoraliza. O Bispo Creighton dizia ser preciso evitar a corrupção. É a atitude comum em coletivos prejudicados por malfeitores públicos. Leis seriam ideadas para prevenir costumes imorais. Eu não me preocupo, replica Acton, em evitar a corrupção, mas em saber como ela surge.
Muitos analistas se limitam à atitude de Creighton, poucos seguem o malefício até a sua fonte.
Infelizmente, noto no projeto de lei traços do Bispo Creighton e não tanto os de Acton. E nele percebo notas que podem levar não ao reforço da ética pública, mas à desmoralização.
A paciência que solicito dos senhores é necessária, porque devemos passar pelas nossas origens, quando se trata do regime democrático. A maioria dos atuais conceitos políticos vem da Grécia clássica, e dela também nos chegam defeitos a serem vistos com prudência.
Então, como ganho da democracia grega, nós temos a isonomia; os princípios da responsabilidade, da accountability; os princípios do controle de um poder por outro, e isso foi proposto, pela primeira vez, por Platão nas leis; e nós temos, então, uma série de pontos que são extremamente importantes e que não podem ser esquecidos na democracia contemporânea.
Mas também temos pontos negativos. O primeiro ponto negativo é o fato de que a sociedade democrática grega atingiu um grau de corrupção extremamente elevado. E não apenas isso: boa parte dos que trabalhavam para o Estado, sobretudo em Atenas, recebia recursos do Estado para exercer o seu múnus.
Por que isso é grave? Porque, para comparecer a um julgamento - e o julgamento era feito por centenas de juízes e cidadãos -, Sólon e depois Cleon instituíram um pagamento por cada sessão. Cada sessão era paga.
Vejam que essa é uma situação complexa. Para receber, esses cidadãos, que eram pequenos proprietários, iam a Atenas cumprir o seu múnus, e, lá em Atenas, descuidavam das suas propriedades. Portanto, dependiam cada vez mais dos aportes do Estado e se tornavam cada vez mais exigentes.
O que ocorre nesse momento? Nós temos a produção de processos, a produção de culpados, para que esses juízes pudessem receber a sua dracma ou o seu óbolo. Esse ponto é gravíssimo, porque nesse momento aparece, na situação grega, a figura do sicofanta.
O sicofanta é justamente aquele indivíduo que denuncia e que produz culpados, para ele próprio e os juízes poderem receber dinheiro. Ora, o sicofanta - e nós temos vários testemunhos da época - é aquele que, segundo Lísias, por exemplo, ganha mais dinheiro com os inocentes do que com os culpados, porque ele exerce a chantagem.
Essa é uma situação extremamente grave de produção de culpa, de acusação falsa, tendo em vista esse tipo de ganho por parte daqueles que vivem do Estado, que vivem da política e aqueles que providenciam possíveis culpados.
Então vejam que, no caso, o sicofanta era usado para combater a corrupção, mas era um instrumento altamente corrupto e altamente perigoso.
A sociedade grega, naquele momento, pratica a corrupção em massa. Há troca de favores. O termo usado para essa troca de favores é doro, você dá um favor e você recebe um favor. Tanto Platão quanto Aristófanes e outros críticos da democracia mostram bem essa prática, esse mercadejo dos apoios aos políticos e àqueles que vivem do Estado.
Perdoem-me, mas eu vou entrar no âmago da questão. Dada essa experiência histórica da Grécia, da nossa mãe-democracia, e dada a experiência de séculos de uso de delatores, de uso de instrumentos de delação por regimes democráticos ou por regimes autoritários, como professor de Ética, pergunto: como é que nós podemos aceitar a proposta deste art. 38 do projeto?
Diz o art. 38:
Art. 38. O terceiro que, não sendo réu na ação penal correlata, espontaneamente prestar informações de maneira eficaz ou contribuir para a obtenção de provas para a ação de que trata esta lei, ou, ainda, colaborar para a localização dos bens, fará jus à retribuição de até 5% do produto obtido com a liquidação desses bens.
Parágrafo único. A retribuição de que trata este artigo será fixada na sentença.

Foi refletido, pergunto eu, na redação do artigo, o passivo moral que a prática instaura ou reitera?
A definição de Lísias, segundo a qual o sicofanta ganha mais dos inocentes por praticar a chantagem, é algo forte. Tenho dúvidas sobre se essa definição não se aplicaria à sociedade brasileira. Diz ele, repito, que os inocentes chantageados dão mais lucros aos sicofantas do que os verdadeiramente corruptos. É contra a fé pública mover profissionais da delação paga.
O segundo ponto que preocupa no projeto é o teste de integridade, previsto no art. 48.
O Estado Democrático moderno, apesar de preso nas malhas da burocracia com o seu segredo do cargo inexorável, busca romper com a raison d'État e o sigilo. A transparência deve comandar os poderes e os meios administrativos. Estados onde imperou a exceção, afastada a transparência, mantiveram o sigilo e o ampliaram em detrimento da liberdade cidadã.
Se o Legislativo, o Executivo, a Justiça devem prestar contas de seus atos aos cidadãos, como instaurar um modo de percepção da provável desonestidade de funcionários com base no segredo?
Diz o art. 50 do texto:
Art. 50. Os testes de integridade consistirão na simulação de situações sem o conhecimento do agente público, com o objetivo de testar sua conduta moral e predisposição para cometer ilícitos contra a administração pública.
Poderes secretos seriam atribuídos a corregedorias, controladorias, ouvidorias ou órgãos congêneres de fiscalização e controle. Tais organismos devem dar ciência, de modo sigiloso, ao Ministério Público, para que este recomende medidas complementares.
E ainda há mais segredo:
Art. 55. A administração pública não poderá revelar o resultado da execução dos testes de integridade nem fazer menção aos agentes públicos testados.
O trecho respeitado o direito à intimidade surge como algo estranho no contexto.
Vou deixar com a Comissão o texto, inclusive, as notas eruditas de Direito, de Filosofia, de História, etc. Não vou, então, me remeter a cada citação de autoridade.
Deixando de lado a eficácia do teste, algo muito discutido pela literatura especializada, insisto no segredo e na sua manipulação.
Os organismos movidos para aplicar os testes estão acima de qualquer inspeção no ato mesmo em que os efetivam? E o que dizer do termo simulação que consta no projeto?
Um mestre político, jurídico e científico, chamado Francis Bacon, no ensaio Da Simulação e da Dissimulação, indica a essência da palavra e da coisa: A simulação é profissão falsa e a mais culpável e a menos política, exceto em matérias eminentes e raras. E um costume generalizado de simulação, em seu último grau, é vício. O principal erro dos atos simulados, termina Bacon, é que eles privam a pessoa de um instrumento principal de ação: a confiança e a crença.
Uma técnica ética e moral estabelecida por Kant para testar a prática baseada em máximas é perguntar se ela pode ser universalizada, omnia et singula. Caso contrário, ela não é moral.
Os procedimentos do teste de integridade podem ser universalizados para toda a cidadania e para todos os que, nos poderes, exercem cargos, como, por exemplo, na Justiça, no próprio Ministério Público? A resposta é negativa.
Volto a Platão. Em Leis, ele instaura, pela primeira vez na história jurídica e política, a tese dos checks and balances, depois herdada por Montesquieu.
Abusos de um poder devem ser controlados pelos outros, coletivamente dispostos.
No teste de integridade, o indivíduo está solitário, sem apoio de seus representantes, como sindicatos e associações, etc., diante de um poder invisível que só responde a posteriori, mas que deve silenciar o nome e as condições do interrogado.
Peço que me perdoem, mas estamos no domínio do livro O Processo, escrito por um autor que denunciou o abuso do segredo. Esse autor, todos sabem, é Kafka.
Finalmente, passo à boa-fé que, diz Bacon, desaparece com práticas de simulação e dissimulação no poder e na sociedade.
Noto um ponto: os partidos políticos poderão ser punidos pelo uso de recursos ilícitos. Existe, no entanto, quem julgue encontrar, nas suas direções, boa-fé na admissão daquelas finanças. Cito, por exemplo, editorial do jornal O Estado de S.Paulo: Quando Só a Boa-Fé Não Basta, de 19 de agosto de 2016.
É árduo separar o tesoureiro ou integrante de um partido e a totalidade da agremiação. Mas seria de todo relevante, no caso, provar a conivência de todo o partido em casos específicos. Algo similar ocorre na coleta de provas não assistidas pela ordem legal, mas realizadas em boa-fé pelos investigadores e/ou acusadores.
Importa refletir um pouco sobre o significado da locução boa-fé, que herdamos do latim bona fide. O exemplo que vem à lembrança é do autor da mais profunda ética ocidental: Bento de Spinoza. Em seu livro Tratado Teológico-Político, ao elogiar Amsterdã, ele exalta o quanto a liberdade é fundamental para a sua vida pública. Naquela urbe, diz ele que todos contratam sem dolo e em boa-fé.
Ora, um ponto importante, quando nós temos esse contrato, são as obras que dele resultam.
Boa parte dos nossos conceitos de boa-fé vem da Grécia, com o termo pistis, e vem de Roma, com o termo é fides. Chamo a atenção dos senhores para o seguinte ponto: é preciso notar que o termo boa-fé não é unívoco e sem ambiguidades. Como enunciam trabalhos jurídicos, antigos e recentes, trata-se de uma noção vaga. Tal fato não impede que ela tenha acolhimento em vários setores do Direito. Mas não há consenso algum sobre a exata natureza legal da boa-fé. Essa imprecisão terminológica afeta inevitavelmente a função preenchida pela boa-fé no Direito contemporâneo. No entanto, parece que um bom número de sistemas considera que a boa-fé se aplica às leis que tratam das obrigações em geral, e não apenas às leis do contrato.
No comércio e na política, pode-se falar com maior propriedade de boa-fé, porque existe algo que vai além dos que fazem o acordo: a mercadoria, o dinheiro, o poder estatal que efetiva obras em proveito dos governados. Quando o ato é unilateral e não beneficia, como no contrato, a outra parte, de modo evidente, com dificuldade, podemos separar o conceito de boa-fé do seu aspecto subjetivo.
A boa-fé reside no íntimo do indivíduo que age. Ela não é algo fenomênico, para usar a linguagem kantiana, mas apenas noumênico, se limita à consciência do agente. Para que a consciência própria seja reconhecível no coletivo e pelo coletivo, é preciso indicar as obras resultantes. E tais obras, na investigação criminal, não podem negar a lei positiva. A sequência que vai dos quid facti ao quid juris deve ser estabelecida sem quebras subjetivas. Não é preciso seguir Hans Kelsen para notar as dificuldades de uma visão subjetiva que, ampliada, pode se tornar equívoca e arbitrária.
Então, eu paro por aqui. Certamente os colegas têm algo mais substancial a dizer, mas, como professor de Ética e como professor que trata de ética e moral, eu não posso aceitar tranquilamente essa alegação de boa-fé, em se tratando de crimes ou de alegações e crimes coletivos.
Então, no projeto inteiro, vejo, pelo menos, três pontos que precisariam ser refletidos com muita prudência: primeiro, esse problema do teste de integridade; segundo, a questão da boa-fé, que é tão importante quanto; e, terceiro, essa questão inicial, que eu coloquei, da falta de critérios para se encaminhar uma acusação.
Eu sei que o que estou dizendo vai irritar muita gente, mas, me parece que é bom seguir o ensino de Aristóteles: Amicus Plato, sed magis amica veritas.
Muitas vezes, nós estamos assoberbados, preocupados com a luta pela corrupção, mas esquecemos do fator fundamental, que é a defesa. E, no caso do teste de idoneidade, ela falha; no caso da boa-fé, ela falha; e também no caso da acusação, não há maiores fundamentos. Sobretudo, aquele item de dar ao delator uma parte de recursos, isso me parece uma ressurreição do que há de pior na tradição política ocidental.
É o que tenho a dizer, por enquanto. Obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Joaquim Passarinho) - Muito obrigado, Prof. Roberto Romano.
Vamos passar a palavra agora ao Sr. Augusto de Arruda Botelho, que falará por 20 minutos.
O SR. AUGUSTO DE ARRUDA BOTELHO - Boa tarde a todas e a todos.
Inicialmente, eu gostaria de agradecer ao Sr. Presidente, ao Sr. Relator e ao Deputado Carlos Marun o convite feito por esta Comissão e já começo dizendo que pesquisei os outros convidados que participarão das longas e necessárias audiências desta Comissão. Ao contrário da maioria dos convidados, não tenho títulos de doutor, mestre, professor ou coisa parecida. Sou, simplesmente, um advogado criminal que milita há 15 anos exclusivamente na advocacia criminal.
Então, a abordagem que pretendo fazer hoje aqui é a da prática, do dia a dia, do Direito Criminal e do sistema de justiça criminal.
Eu gostaria de começar dizendo que as dez medidas contra a corrupção propostas pelo Ministério Público já começam erradas pelo nome, porque sobre corrupção elas tratam muito pouco.
Ao analisarmos as dez propostas de alteração legislativa, eu consideraria que cinco delas têm ligação direta com o crime de corrupção e as outras cinco nada mais são do que propostas de reformulação e de alteração do Código de Processo Penal e do Código Penal.
Essas propostas vão valer para o crime de corrupção, para o crime de sonegação de imposto, para o furto de galinha, para o tráfico de drogas, para absolutamente todo o crime.
Então, na verdade, não estamos diante de uma discussão sobre medidas de combate à corrupção. O que o Ministério Público propõe é um código de processo penal altamente voltado ao interesse da acusação.
As reformulações em variados artigos do Código de Processo Penal violam, de forma grave, os mais básicos direitos de defesa. Não me refiro só aos direitos de defesa de supostos corruptores, mas aos direitos de defesa de todos os cidadãos.
É preciso ficar bem claro. Nós estamos tratando aqui de uma reforma ampla, radical e perigosíssima da lei, sob o manto de se estar combatendo a corrupção.
Há propostas nesse pacote que revogam ou modificam, Sras. e Srs. Deputados, construções que esta Casa, o Senado, a academia e a sociedade levaram anos para construir de forma absolutamente democrática, pensada, discutida, que, com o perdão da palavra, podem ser revogadas em uma canetada. Ainda bem que não vai ser em uma canetada, porque estamos aqui debatendo esse tema, o que considero extremamente relevante.
O pretexto da proposta é o combate a crime de corrupção. Expurgar da nossa sociedade o mal que é a corrupção deve ser, sim, prioridade de todo e qualquer governo, mas, sob o pretexto de se combater a corrupção, nós estamos, na verdade, suprimindo direitos e garantias fundamentais de todos.
Estamos, em algumas propostas, senhores, rasgando a Constituição! São direitos que, a duras penas, depois de tantos anos, todos nós conseguimos conquistar.
Eu divido as dez medidas em três categorias. Algumas são positivas. Faço questão de ressaltar isso. Há medidas no pacote proposto pelo Ministério Público que são extremamente positivas, que merecem aprovação e todo o incentivo; há medidas absolutamente históricas e estatisticamente ineficazes; e há, pior, as medidas ilegais.
Caso seja necessário, responderei as perguntas, mas vou procurar me concentrar nas que considero mais graves, que eu gostaria de discutir um pouco mais com os senhores.
A primeira delas, a proposta número três, que fala sobre o aumento de pena e a classificação de crime hediondo para corrupção.
Senhores, meu ex-chefe e mestre, Dr. Márcio Thomaz Bastos, dizia uma coisa: Eu acho curiosa essa Lei de Crimes Hediondos porque eu não conheço crimes adoráveis. Todos os crimes são, de certa forma, hediondos.
Em 1990, quando a Lei de Crimes Hediondos foi aprovada, num momento de comoção, os senhores se recordam muito melhor do que eu que, a partir da criação dessa lei, vários outros crimes - na época, o homicídio doloso foi considerado homicídio qualificado, foi considerado um crime hediondo - foram assim catalogados ao longo do ano, sempre em momentos de grande repercussão, de grande comoção social. Nós temos até hoje a falsificação de medicamentos como crime hediondo.
Então, sempre, em algum momento de grande repercussão, a Lei de Crimes Hediondos vem e transforma um crime considerado comum - eu não entendo o que seria um crime comum - em um crime hediondo. Ao longo dos últimos 15 ou 20 anos, foi assim.
O Ministério Público pretende agora, em 2016, novamente se utilizar dessa fórmula e tratar a corrupção como crime hediondo.
Qual é o problema disso, senhores? O problema é bastante simples. Isso é absolutamente ineficaz. É nada mais do que um rótulo a um crime, com a falsa esperança de que, transformando a corrupção em crime hediondo, o eventual corruptor, com o Código Penal embaixo do braço, deixará de cometer o crime de corrupção, porque agora o crime é hediondo.
As estatísticas de todos os crimes que foram considerados, ao longo dos últimos anos, como hediondos, no nosso sistema de legislação, mostram que não houve redução em nenhum desses crimes. A redução foi de absolutamente zero por cento. Isso não funciona!
É bonito? A opinião pública gosta disso? Agora corrupção é crime hediondo, homicídio é crime hediondo, o tráfico de drogas é crime hediondo. Isso pega bem? Pega muito bem, mas não funciona, assim como o aumento de penas, senhores.
O IDDD, entidade que eu até a semana passada presidi, hoje integro o Conselho, vem, ao longo dos seus últimos 15 anos, fazendo diversos projetos e discutindo, nesta Casa, em outras casas, na imprensa, a desnecessidade e a ineficácia de aumento de pena para combate de criminalidade. A história e as estatísticas demonstram que exclusivamente aumentar a pena e, nesse caso, fazer com que o crime se transforme em hediondo não cessa a prática desse crime. O resultado disso vai ser próximo de zero.
Então, essa é uma medida que, obviamente, causa um impacto midiático muito interessante. Ela está na capa de todos os jornais, mas a eficácia, pela história e pela análise da Lei dos Crimes Hediondos, é próxima de zero.
A segunda proposta que eu gostaria de discutir é a de nº 4, que o Ministério Público Federal tem como título o seguinte: Aumento da eficácia e da justiça dos recursos no processo penal.
Para V.Exas. perceberem como essas dez medidas contra a corrupção, na verdade, é uma alteração de um código para processo penal acusatório, dentro desse item 4, nós temos 11 alterações do Código de Processo Penal! Onze alterações! Não são alterações superficiais; são absolutamente profundas! E o Ministério Público Federal parte da seguinte premissa - isso está no texto, não sou eu que estou dizendo -: É comum que processos envolvendo crimes graves e complexos, praticados por réus de colarinho branco, demorem mais de 15 anos em tribunais, após a condenação...
Primeiro, nós temos 640 mil presos em nosso País, e 50% deles estão presos por tráfico ou roubo. Então, nós estamos aqui, rasgando o Código de Processo Penal, para, em tese, punir uma minoria de uma minoria que cometeria o crime de colarinho branco.
Nós estamos ali cerceando e rasgando direitos de uma grande parcela da população, porque há crimes graves e complexos de colarinho branco que demoram 15 anos para serem julgados em tribunais, após a condenação. Aí vem a parte que mais causa, no mínimo, curiosidade: ... pois as defesas - aqui culpando a Advocacia - empregam estratégias protelatórias.
Eu acho que isso é um folclore sobre o qual nós precisamos falar abertamente aqui, podendo causar um pouco de desconforto, mas... Nós temos três atores no sistema de justiça criminal: o advogado, o promotor e o juiz. O advogado cumpre prazo. O promotor cumpre prazo. Quem não cumpre prazo? O juiz. A verdade é essa.
O Código de Processo Penal prevê prazos extremamente exíguos para a defesa e para a acusação. O menor prazo no Código de Processo Penal é de 24 horas; o maior é de 15 dias. Se o promotor ou o advogado perdem um prazo, acabou o recurso; eu não tenho como entrar com esse recurso de novo. Então, nós cumprimos prazo, assim como o Ministério Público cumpre prazo. Quem não tem prazo para cumprir? O Judiciário! Culpa do Judiciário? Não! Culpa do sucateamento do Judiciário.
Eu deveria ter trazido isso hoje para mostrar aos senhores. Em outra palestra que dei em São Paulo, justamente sobre esse tema, fiz questão de pegar dois casos de bastante repercussão. Não são casos de colarinho branco, mas casos de bastante repercussão no Brasil todo: um, do Pimenta Neves, do qual todos se recordam; e outro, do Roger Abdelmassih, do qual também todos se recordam. São sempre casos utilizados como exemplo de Justiça lenta, Justiça atrasada, e mais, de como advogados chicaneiros entram com recursos protelatórios para que a pessoa nunca seja condenada.
Coloquei numa linha do tempo, cronologicamente, esses dois casos, num power point, para as pessoas olharem o que aconteceu com eles. Vai-se perceber que o Ministério Público e as defesas apresentaram todos os recursos cabíveis, recursos previstos em leis, recursos que têm um caráter e requisito de admissibilidade, que muitas vezes os tribunais não concordam, ou seja, não são recursos que basta eu apresentar, eu preciso apresentar e dizer por que eu estou apresentando.
Então, o Ministério Público e a defesa apresentaram todos os recursos necessários, mas o processo demora mesmo, porque ele fica 1 ano e meio parado no Tribunal de Justiça de São Paulo para ser distribuído; depois, quando vai a julgamento, há um pedido de vista e ele fica mais 6 meses aguardando.
Então, vão-se somando esses pequenos tempos, que não são pequenos, e tem-se um processo que demora 10 anos para ser julgado. Agora eu pergunto: A culpa é da defesa e da acusação ou a culpa é de um Judiciário, que infelizmente está sucateado?
É muito mais fácil para o Ministério Público Federal falar: Então, para tornar o processo mais rápido, vamos acabar com esses recursos da defesa. E não é acabar com qualquer recurso! O Ministério Público Federal, senhores, coloca proibições neste ponto 4, que, na prática, aniquilaria um habeas corpus! Nem o regime militar fez isso!
Aqui, embargos de declaração... De fato, há alguns pontos positivos desse ponto 4. Por exemplo, o próprio Ministério Público fala do pedido de vista, que tem de ter um prazo para ser cumprido. Eu concordo, óbvio que tem de haver um prazo, mas o Ministério Público não prevê uma sanção. Se o juiz descumpre o prazo, pede vista e fica 1 ano com o processo, deveria haver uma sanção.
Há um ponto específico desse projeto que fala em ser necessário apresentar as razões do recurso no Tribunal, enfim, algumas questões bem práticas que até eu consigo concordar, mas há outras, principalmente a questão do habeas corpus, senhores... Vai ser tão difícil impetrar um habeas corpus, se essas medidas forem aprovadas - o habeas corpus praticamente precisa parar de existir, esse recurso tão excepcional, tão importante, que é chamado de remédio heroico.
Então, é muito mais fácil, numa canetada, dizer que vamos acabar com os recursos que a defesa dos réus processados por colarinho branco apresenta para protelar uma condenação. Nós estamos tratando de um microcosmo aqui e nos esquecendo de uma massa de pessoas que respondem a processos criminais. Essas, sim, sofrerão as consequências disso, porque os réus processados por colarinho branco continuarão tentando recursos e contratando diversos advogados. Quem vai pagar o pato, para usar uma expressão bem moderna, é o favelado, preso com 3 gramas de maconha. É esse que vai sofrer.
Então, é muito mais fácil rasgar os códigos e acabar com todos os recursos do que, de fato, fazer o que é necessário, que é investir na Justiça. Nós só vamos ter um processo mais rápido e um Judiciário mais rápido com investimento. Nós temos comarcas no Estado de São Paulo, o Estado mais rico da Federação, ainda com impressoras matriciais, com fax! Ainda bem que conseguimos que todas as comarcas tenham computador. Ah, mas nós temos 86 juízes criminais em São Paulo, 70 desembargadores criminais! Nós precisamos de muito mais do que isso. Temos dez Ministros no STJ, que julgam matéria criminal, num País absolutamente litigioso como é o Brasil. Nós precisaríamos investir pesadamente no Poder Judiciário, porque aí, sim, nós conseguiríamos uma Justiça mais rápida e eficaz. Aí, a sensação de impunidade, que é o que fica permeando sempre a cabeça de todo mundo, de certa forma diminuiria. Agora, não é cerceando recursos, não é rasgando a Constituição que vamos ter uma Justiça mais rápida e muito menos uma Justiça mais justa.
Mais um ponto extremamente preocupante, assim como todos dos que falei, mas este me causa arrepios: os ajustes nas unidades penais. Eu discordo integralmente da proposta do Ministério Público, mas especificamente a questão da prova ilícita precisa ser rechaçada pelos senhores, porque, aí, entraríamos num calabouço extremamente perigoso, porque nem regimes autoritários conseguem prever a possibilidade de se condenar alguém com base numa prova ilícita.
Senhores, eu sei que nesta Comissão, em artigos de jornal e em entrevistas muito frequentes, os defensores dessa medida utilizam a expressão já usada pelo Prof. Romano aqui: se a prova ilegal foi obtida mediante boa-fé, ela pode ser utilizada. Senhores, esse termo é de uma amplitude e de um perigo...
O que é uma prova ilícita obtida mediante boa-fé? Eu torturei sem querer. É isso? Eu obtive a confissão dele, mas tudo bem! Eu estava bem empenhado nessa tortura. Eu queria soltar aquela vítima do cativeiro, eu estava imbuído de boa-fé. Olha, aquele grampo telefônico ilegal que eu fiz foi para pegar uma coisa importantíssima. Eu pensei que fosse legal aquele grampo, mas aí eu vi que a decisão judicial era de outra pessoa. Eu me equivoquei. Perdão. Mas olha o que eu descobri aqui. Vamos usar essa prova ilegal. Ou pior: nós vamos legitimar uma prática que já é absolutamente ilegítima nas nossas periferias. Eu invadi a sua casa porque achei que você estava traficando. E aí, na hora em que eu chutei a porta do seu barraco, sem uma ordem judicial, eu, de fato, encontrei ali 30 gramas de cocaína. Eu tanto estava de boa-fé que eu encontrei a droga.
Senhores, é uma coisa extremamente subjetiva e extremamente perigosa. E volto a dizer: qual a relação disso com corrupção? Nenhuma! Nenhuma! Se essa proposta passar, quem vai sofrer as consequências dela não serão os corruptos, senhores, mas os cidadãos até de bem. Infelizmente, ainda temos maus policiais, maus promotores, maus juízes, maus advogados. Não podemos nos abraçar numa suposta boa-fé para permitir o uso de uma prova ilícita para condenar alguém.
E vale-se dizer: Ah, nós temos aqui a experiência americana. Senhores, essas dez medidas contra a corrupção, que mais uma vez digo que, de corrupção tem muito pouco, têm se baseado muito e tem trazido muito a experiência americana, a jurisprudência americana. Esquecem-se de dizer que o nosso sistema de justiça criminal não tem relação nenhuma, está a léguas de distância do sistema judicial americano! E usar os Estados Unidos como exemplo... Nós podemos usar os Estados Unidos como exemplo para muita coisa, mas para sistema de justiça criminal? Eles têm a maior população carcerária do mundo! Não conseguem coibir a prática de um crime. Os índices de criminalidade só aumentam. Vimos agora o Presidente Obama tentando uma revolução, tentando esvaziar cadeias, porque a política criminal nos Estados Unidos vem se mostrando completamente equivocada. E vamos trazer essa experiência para cá? Ah, lá é possível prova ilícita. Vamos trazer prova ilícita ao Brasil também.
Para finalizar, senhores, a Proposta nº 9 cria mais uma modalidade de prisão preventiva para evitar dissipação do dinheiro desviado. E diz aqui a hipótese: Permitir a identificação e a localização ou assegurar a devolução do produto e proveito do crime ou seu equivalente, ou para evitar que sejam utilizados para financiar a fuga ou a defesa do investigado.
Então, está aqui: vamos prender preventivamente para que o investigado não possa pagar ao advogado. Então, parece que o Ministério Público está com problemas com a advocacia.
Senhores, o artigo que dispõe sobre prisão preventiva no nosso Código de Processo Penal é bastante taxativo nas possibilidades de se decretar a prisão preventiva de alguém, para assegurar a lei penal, garantia da ordem pública. Há requisitos absolutamente objetivos e concretos de que possibilitam um decreto de prisão preventiva. Na prática, que é o que eu conheço, juízes muitas vezes ignoram os atos necessariamente concretos que poderiam dar ensejo a uma prisão preventiva. E o que o Ministério Público Federal propõe aqui é a inclusão de mais uma possibilidade de prisão preventiva, para torná-la mais ainda uma antecipação da condenação, porque, de preventiva, não vai ter nada.
Então, mais uma vez, muito obrigado pelo convite. Estou à disposição dos senhores para qualquer dúvida.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Joaquim Passarinho) - Muito obrigado, Sr. Augusto Botelho.
Nós queremos esclarecer, Srs. Deputados, que houve um descompasso entre a assessoria do nosso outro convidado, José Henrique Torres, e a nossa assessoria. Não foi solicitada a passagem a tempo. Por isso ele não pôde estar presente por motivo de voos. Nós vamos remarcar para a próxima semana. Então, hoje vamos ouvir apenas os dois expositores.
Encerrada a exposição, passaremos aos debates, obedecendo à ordem de inscrição. Porém, antes, vamos conceder a palavra ao nosso Relator, Deputado Onyx Lorenzoni, que terá até 15 minutos.
O SR. DEPUTADO ONYX LORENZONI - Eu queria, em nome da Comissão, agradecer a presença do Prof. Roberto Romano e também do Dr. Augusto de Arruda Botelho pelas reflexões que nos trazem.
Esta é uma matéria de grande complexidade. Na verdade, nós temos que compreender que há um extraordinário mérito na sua propositura, na medida em que coloca o Congresso Nacional, apoiado por 2 milhões e meio de assinaturas, para refletir sobre este tema. Nós temos de ter a clareza de que, após o Ministério Público propor essas dez medidas, e é até bastante razoável que seja assim, como a expertise está diretamente vinculada ao combate à impunidade, é razoável que haja uma concentração aumentada sobre essa área.
Mas a Comissão já tem discutido isso aqui. Os palestrantes têm nos dado a condição de refletir sobre isso, como nós estamos fazendo hoje, com questões extremamente relevantes, tanto por parte do Prof. Romano quanto pelo Dr. Augusto Botelho. Isso vai nos ajudar, e muito, nesse processo de, primeiro, construirmos não apenas instrumentos de combate à impunidade, como instrumentos de combate amplo e efetivo à corrupção, uma grande chaga do Estado brasileiro.
E quando se tem uma alteração na graduação de penas, é importante lembrar que houve um cuidado, que é de crimes acima de cem salários mínimos. É importante nós nos lembrarmos disso. Ele não é amplo, geral e irrestrito.
Segundo, pela tradição brasileira, como os crimes de corrupção estão entre 2 a 12 anos, a tradição é a de que seja pelo menor volume de anos a condenação. Isso tem permitido as tais transações penais, que têm dado essa sensação de que, para o crime do colarinho branco, não há punição adequada.
É claro que as salvaguardas constitucionais devem ser todas preservadas. Nós não lutamos como lutamos para chegar a uma Constituição que nos dá salvaguardas importantes para os indivíduos, num país que sempre tratou mal o indivíduo, do ponto de vista institucional.
O Brasil dá, na sua própria formação como nação, menos valia em relação à figura do indivíduo. Isso foi um resgate que a sociedade brasileira fez a partir da Constituição de 1988. Isso precisa ser olhado com muito cuidado.
Agora, há uma determinação de todos nós. Por isso eu reputo de excelente a reflexão, tanto do Prof. Roberto Romano quanto do Dr. Augusto Botelho, porque esses contrapontos - e outras pessoas virão aqui em relação à proposta do Ministério Público - vão nos ajudar exatamente a acertarmos a graduação das coisas, equilibrarmos as coisas.
Agora, não dá para continuar com os atuais instrumentos, achando que eles são suficientes. Não são.
Este é um país onde se roubam 100 bilhões por ano da administração pública; um país onde as pessoas são capazes de se organizar das mais variadas e engenhosas formas e desviar 100 bilhões do orçamento público por ano, partindo-se, como referência, de inúmeras entidades que tentam fazer essa avaliação, desde a academia até entidades da organização civil - e algumas dizem que esse número é ainda maior. É evidente que nós precisamos olhar isso de novo.
Então, o grande mérito da proposta é o extraordinário apoio popular que tem. E aqui eu quero fazer uma referência à Frente Parlamentar de Combate à Corrupção, brilhantemente presidida pelo Deputado Antônio Carlos Mendes Thame, que é, junto com outros companheiros da Frente, subscritor dessa proposta. É evidente que nós temos muito para discutir. Mas nós realmente temos que ter a responsabilidade de saber que nós precisamos equipar o Brasil de instrumentos que possam trazer a eficácia.
Eu não estou aqui defendendo nada; estou ajudando todos a refletir.
A inclusão, por exemplo, outra questão aqui criticada, é matéria de reflexão e não tenho convicção sobre ela. Algumas pessoas defendem a inclusão do crime de corrupção como crime hediondo para evitar que um corrupto ligado a um governo corrupto consiga um induto de final de ano. Nos crimes hediondos não existe induto possível.
Aliás, nós acabamos de ver um Governo que, durante um longuíssimo período, organizou uma quadrilha para desviar recursos públicos. Disso, ninguém mais duvida, nem os mais enraizados membros da grei política que levou esse grupo ao poder. Não há dúvida sobre isso. Então, se isso foi possível, nós vimos indutos, Prof. Romano, que acho moralmente inaceitáveis por conta do que ocorreu.
O crime de colarinho branco não é apenas o crime de uma pessoa. O crime de colarinho branco é o que mais mata no Brasil, porque há ausência de estrutura prisional adequada, há ausência de forças policiais bem treinadas e adequadamente preparadas, há omissão do Estado brasileiro em selar as nossas fronteiras.
Como, quando o Estado brasileiro quer, consegue fazer um evento do porte das Olimpíadas, e as intercorrências são absolutamente não significantes? Quando todos se unem, nós conseguimos.
Será que não seria a hora, derivada dessa grande discussão, conseguir unir o Brasil no combate à criminalidade.
Num país onde se mata como em nenhum outro lugar do mundo, até hoje, governo algum pensou em fazer um Ministério para a segurança - e olha que já criamos ministério para tudo!
Eu faço essa reflexão inicial, porque este é um tema polêmico, difícil e que vai exigir de todos nós imensa responsabilidade, pois nós temos de salvaguardar conquistas, temos de ter noção da cidadania, temos de ter uma atenção permanente no sentido de proteger o direito individual no Brasil, mas nós também temos de conseguir construir alternativas.
Vou usar um exemplo. Eu também tenho dificuldades com esse artigo que foi citado pelo Dr. Botelho, mas, se trouxermos a metodologia que tem sido de grande valia e sucesso tanto na América do Norte quanto na Europa do Whistleblower, do apitador ou daquele que faz o estímulo para que as pessoas da sociedade participem do processo de controle do seu país, de busca de transparência e de combate à corrupção nas mais diversas sociedades, isso terá eficácia demonstrada.
Esse é um artigo retirado de todo um sistema. É claro que, porque ele está solteiro aqui, pode soar torto, e as críticas são absolutamente adequadas. Agora, se nós conseguirmos trazer para o projeto esse instrumento, será muito bom. Hoje, há vários projetos interessantes na Câmara. Quero lembrar que um grupo de Consultores desta Comissão, Sr. Presidente, passou 10 horas do último sábado, aqui na Casa, trabalhando para buscar alternativas a fim de construirmos algo equilibrado. É importante ressaltar a dedicação das pessoas.
Antes, eu quero agradecer imensamente aos autores, o Líder Rubens Bueno e o Deputado Carlos Marun, que permitiram a vinda do Prof. Romano e do Dr. Augusto Arruda Botelho. Esses convidados nos farão refletir muito sobre o tema - e nós temos que fazer isso mesmo.
Feitos esses agradecimentos e essas colocações iniciais, pergunto ao Prof. Romano: o teste de integridade, ao qual o senhor se referiu, de certa forma, do ponto de vista conceitual, como está escrito, traz de volta a Santa Inquisição para o cenário do funcionalismo público brasileiro.
A pergunta que faço vale para os dois, porque são críticos da matéria, cada um deles na sua expertise, com conhecimentos extremamente relevantes.
Nós recebemos uma sugestão de um juiz. Por exemplo, quando vamos analisar a história da Polícia de Hong Kong, de Nova York, de Los Angeles e de Chicago, todas essas quatro histórias passam por teste de integridade. São polícias de culturas diferentes, não conheço no detalhe a aplicação, mas o conceito é que, quando foi aplicada a metodologia, obtiveram resultado.
Então, o que traz a sugestão desse juiz, que nós recebemos aqui... Aproveito para lembrar que isso serve para as pessoas que estão nos assistindo, porque as contribuições podem ser enviadas ao site da Câmara dos Deputados, que nós as recebemos e processamos.
A sugestão desse juiz é no sentido de que o teste de integridade poderia ser trazido ao Brasil desde que, primeiro, fosse fundada a suspeita e, segundo, com autorização judicial, ou seja, a corregedoria do órgão respectivo teria que estabelecer a fundada suspeita e depois ir ao Judiciário buscar uma autorização para fazer uma aplicação específica.
Então, nós retiramos a generalização e trazemos um instrumento que, em um primeiro momento no Brasil, seria usado como investigativo, vamos dizer assim. Teríamos de fazer algumas alterações para talvez criminalizar o fato, se der positivo o teto. Hoje não há previsão legal. Mas poderia ser um caminho para termos uma ferramenta para ser aplicada em situações bem objetivas, bem pontuais, não jogando essa desconfiança ou essa inquisição. Eu me preocupo, acho que o Dr. Botelho vai concordar comigo, nós temos no Brasil uma tradição de abuso de autoridade, de constrangimento, de afastamento de adversários.
Então, nós temos uma construção do uso da autoridade muito complicada no Brasil. Talvez essa alternativa de ser pontualmente em algo específico venha para o Brasil como uma primeira experiência, uma ferramenta de investigação sobre o controle do Judiciário. Eu acho que minimizamos as questões que envolvem a perseguição política, a diferença ideológica, essas coisas que a todos nós preocupam, com seu uso indiscriminado. A proposta original vem passível de ser utilizada como um todo no funcionalismo público, mas obrigatoriamente nas polícias. Já são dois pesos e duas medidas. Eu gostaria de uma consideração, no caso do Dr. Botelho, mais na aplicabilidade, e do Prof. Romano, na visão filosófica ou conceitual dessa adequação, sobre como os dois enxergam essa possibilidade.
Bem, eu já comentei a questão da corrupção, com relação ao hediondo, qual é a função. Agora, para fugir da transação penal e daí... Há um fato muito importante. Com referência ao ex-Senador Luiz Estevão - eu vou usar esse exemplo conhecido de todos, eu já disse isso aqui, até porque em dado momento involuntariamente eu assisti a um episódio desse - havia uma certa gabolice de que nunca seria preso, dada a condição de poder trabalhar pela prescrição daquele episódio do TRT paulista. Ele só foi cumprir pena porque houve uma recente decisão, bastante polêmica, do Supremo Tribunal Federal, que, por sete votos a quatro, decidiu que, em condenação de colegiado em segunda instância, já se começa a cumprir pena.
Então, eu vejo essa inclusão como crime hediondo dos crimes de corrupção como uma tentativa - vamos dizer assim - de buscar, conjugada com uma modificação do período de apenamento, subindo dos 2 para os 4 anos, correlacionado - a pergunta é específica para o Dr. Botelho, mas se o Prof. Romano quiser comentar também, ótimo - casada, Dr. Botelho, com o volume de recursos desviado. Esse é um cuidado importante. São atos de corrupção. No entanto, uma coisa é o sujeito lá na ponta, que daqui a pouco, em qualquer circunstância, é flagrado em algo que não é recomendável, mas que talvez possa ser corrigido; outra coisa são os milhões e bilhões, como vimos recentemente no País. Então, gostaria de uma análise crítica sua.
Ali há um casamento. As coisas não estão desconectadas. Como o senhor vê esse casamento e se as críticas continuam na mesma direção. Mais uma vez, muito obrigado. Muito mais que loas, precisamos exatamente do que os dois estão fazendo aqui, ajudando-nos a pensar melhor.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Joaquim Passarinho) - Muito obrigado ao nosso Relator, sempre com reflexões muito positivas, coerentes.
Queria também ressaltar ao Deputado que nós temos um grupo de Consultores da Casa disponível para a Comissão, sempre nos acompanhando e trabalhando essas propostas, este debate que vem sendo feito aqui.
Vamos passar a palavra, primeiro, aos nossos expositores, para que possam fazer seus comentários sobre as provocações do nosso Relator.
Dr. Augusto.
O SR. DEPUTADO ONYX LORENZONI - Prof. Romano, aquela questão que o senhor abordou sobre a boa fé também me preocupa muito. O senhor me trouxe um texto. Acho que tenho algumas dúvidas. Depois, eu gostaria de conversar com o senhor, fora daqui, para poder analisar aquilo com mais critério ainda.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Joaquim Passarinho) - Prof. Augusto Botelho.
O SR. AUGUSTO DE ARRUDA BOTELHO - Primeiro, vou falar do teste. Da forma como a proposta está redigida, nós partimos de algumas premissas que não são permitidas pelo nosso Direito. A primeira é a presunção de desonestidade. Partimos desse cenário, o que, para mim, é no mínimo questionável.
Eu não entendo também como poderia haver uma punição da mera vontade, salvo em casos absolutamente excepcionais, e o nosso Direito Penal permite esse tipo de composição.
Haveria no texto atualmente proposto um conflito evidente com uma súmula do Supremo que dispõe sobre o flagrante preparado, porque seria uma situação muito semelhante à do flagrante preparado a realização de um teste dessa natureza. Acho extremamente ampla e extremamente pouco controlada a proposta apresentada, mas entendo a intenção como boa.
Portanto, essa proposta, que eu desconheço, mas que parece que foi encaminhada pelo juiz aos senhores, já deixa a proposta um pouco mais simpática a meus olhos, pelo menos. Haveria um crivo do Judiciário para as situações absolutamente específicas. Em já havendo uma fundada suspeita antes, não se pode deixar da forma genérica como o texto atual propõe.
Com relação à questão dos crimes hediondos, eu volto a falar da eficácia. Eu entendo essa majoração em relação aos salários mínimos, mas vejam que coisa curiosa: com a diferença de um salário mínimo, nós transformaríamos um crime não hediondo em um crime hediondo. Essa flexibilidade e essa subjetividade dentro da dosimetria da pena no Direito Penal é algo extremamente perigoso. É algo extremamente perigoso.
A Lei dos Crimes Hediondos já vem, na prática, demonstrando distorções muito graves na dosimetria da pena. Há crimes extremamente graves, crimes dolosos contra a vida, que correm o risco de serem apenados de forma mais branda do que os crimes sem qualquer tipo de violência direta.
Concordo que o crime de corrupção é uma violência indireta, que o crime de colarinho branco mata indiretamente. Concordo com essa análise, mas atualmente o nosso Código Penal e nossas leis penais já trazem distorções extremamente relevantes na dosimetria da pena. Dessa questão de monetarizar o que é hediondo e o que não é hediondo, eu não consigo entender a lógica. Mais uma vez, a diferença de um salário mínimo vai fazer o crime não hediondo passar a ser hediondo? Eu não consigo entender essa lógica.
Portanto, aliado à total ineficácia histórica e estatística da Lei dos Crimes Hediondos, eu continuo entendendo que essa proposta não é interessante.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Joaquim Passarinho) - Tem a palavra o Prof. Roberto Romano.
O SR. ROBERTO ROMANO - Em primeiro lugar, eu acho que a pergunta e a provocação do Deputado Onyx se baseiam em um processo lógico, mas eu gostaria de lembrar que, apesar dessa proposta do juiz, nós não podemos fazer abstração do nível e da produção ética da sociedade brasileira. A sociedade brasileira, à semelhança do Estado, vive do favor, vive do compadrio e vive da animosidade recíproca.
Então, por exemplo, nesse caso da apresentação de suspeita bem fundamentada, se nós conhecemos o modo de funcionamento das instituições que vão do Município até o poder federal, nós sabemos que ali dentro não reside a paz perpétua, porque há disputa, concorrência, inveja; tudo aquilo que Espinoza analisa sobre ética está presente no cotidiano. Aí é o momento em que aparece a indicação do possível culpado.
Nesse ponto, eu fico muito preocupado, porque cai no ouvido - esse caso do juiz pode ajudar um pouco - de um corregedor, cai no ouvido do próprio Ministério Público uma acusação semicaluniosa, não precisa ser totalmente caluniosa, e aí as consequências são terríveis.
Eu tenho muito receio disso. No Estado brasileiro, nós passamos mais de cem anos tentando combater a corrupção. Essa luta contra a corrupção não é de ontem. Eu só lembro que o regime instituído em 1964 era contra os subversivos e contra os corruptos; e os corruptos viveram muito bem, viveram tão bem que prosperaram, inclusive. Então, eu tenho muito receio daquilo que se incrusta dentro do Estado através do segredo. O segredo pode justificar muita coisa, sobretudo injustiça.
Outro ponto que está no texto que eu passei para o senhor é que, a pretexto de se combater a corrupção, engendrou-se o jacobinismo. Isso engendrou os regimes mais horrendos da história.
Não por acaso, eu comecei com a questão do sicofanta, do delator. A figura do delator é extremamente complicada. Espanta-me que num projeto em que estejam colocando em debate a questão do combate à corrupção haja um item referente ao pagamento para um delator que não faz parte do processo. Isso me parece profundamente antiético. Desculpem-me, eu acho antiético e acho imoral se pagar a alguém porque colaborou para se chegar a alguma coisa. Quantos vão aparecer? Essa indústria vai prosperar. Eu tenho muito receio disso.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Joaquim Passarinho) - Muito obrigado, Prof. Roberto Romano.
Vamos passar agora a palavra aos Deputados, mantendo a fórmula que temos adotado, ou seja, falarão de três em três. Três Deputados vão falar e depois passaremos a palavra aos expositores, para que possam responder.
Pela ordem, pediram a palavra dois autores. O primeiro inscrito é o Deputado Marun, pelo PMDB, que vai também utilizar o tempo de Liderança. Então, S.Exa. disporá 13 minutos.
Depois falará o Deputado Rubens Bueno, também como autor, e posteriormente o Deputado Antonio Carlos Mendes Thame.
Tem a palavra o Deputado Carlos Marun por 13 minutos.
O SR. DEPUTADO CARLOS MARUN - Saudações!
Eu vou fazer o seguinte: vou ficar meio minuto em silêncio, e V.Exa. diz que eu tenho 12 minutos e meio. Esse número 13 não me traz boas... Estou brincando.
Estou brincando por uma razão: ao ouvir as palavras do Prof. Roberto Romano, eu efetivamente me senti diante de um professor. Em alguns momentos, isso me fez recuar no tempo, ao bom tempo em que, jovem - não que eu não seja ainda um jovem -, frequentava os bancos escolares de uma faculdade de Direito, onde aprendi, acima de tudo, princípios - porque leis mudam, mas princípios, não -, onde tentava avançar os meu conhecimento na questão dos princípios, ouvindo um professor.
O Prof. Romano é a personificação do professor: voz serena, sabedoria evidente, jeito de professor, e eu me senti naquela época. Eu fico feliz por isso. Fico feliz por isso.
Quero também fazer uma saudação e dizer que o acaso fez com que tivéssemos aqui dois exemplos: um da cátedra e outro da ação - o advogado. O advogado se formou, já pegou a pasta, já saiu a correr, bem-sucedido, lutando no dia a dia nas delegacias e nos tribunais, no sentido de fazer valer o direito daqueles que muitas vezes são vítimas de denúncias caluniosas e de abuso do poder. Então, eu me sinto completo e vejo como altamente complexo o painel que temos aqui hoje.
Vou fazer duas considerações preliminares. Primeiro, os membros do Conselho de Segurança Nacional que, na madrugada de 12 para 13 de dezembro de 1968, decretaram o AI-5, pensavam estar agindo de boa-fé, até baseados no princípio da necessidade, boa-fé e necessidade.
Jarbas Passarinho, um homem vocacionado para a democracia e para o Iluminismo, teve essa nódoa em toda a sua vida. Ele viu que estava fazendo uma coisa. Ele disse: Às favas, democracia! Quase arrancou os cabelos. Estou mentindo? Estou trazendo a história. Agiam de boa-fé, porque ninguém pensa... Achavam que estavam fazendo o melhor, baseados no tal princípio da necessidade, que tem feito com que muita gente se julgue no direito de rasgar a Constituição, de vilipendiar os princípios, para fazer prosperar teorias completamente alienígenas e fazê-las prevalecer no Direito brasileiro.
Ontem, o Brasil viveu um dia especial. Fomos campeões olímpicos de vôlei. Encerramos uma Olimpíada que efetivamente nos reinclui no âmbito dos países respeitáveis do mundo. Cheguei à noite em casa, feliz, me deitei, botei meu pijama, e liguei a televisão - para verem como eu sou azarado, e não termina bem o dia.
Adivinhem o que estava passando na televisão? Um debate sobre as dez medidas do MP. E lá estavam um representante do Ministério Público Federal, um membro do Instituto de Defesa - nem peguei os nomes - e uma professora. Não havia Deputado, porque só somos chamados para falar o que é gravado, para ver, depois, se pode ir à televisão.
Eu, na questão da defesa regimental que fiz do Eduardo Cunha, devo ter dado mais de cem entrevistas, mas nunca ao vivo. Devem ter medo de eu dizer alguma coisa. Debate? Não participei de nenhum. Marun, venha cá e fale; depois é editado.
Aliás, eu minto. A TV Manchete me convidou para um debate gravado. Rede Manchete, não; agora é RedeTV! Eu sou do tempo ainda de Adolpho Bloch. A RedeTV! me convidou para um debate. Nós não podemos participar de debates, nós temos de ouvir quietos.
Quero chamar a atenção dos senhores. Quem não exige respeito para si próprio não pode exigir respeito para ninguém. Como começa? Não anotei o nome, mas havia um membro do Ministério Público Federal, que deveria estar representando o Ministério Público Federal, eloquente, bem apresentado. E houve a pergunta da jornalista: Vejam bem essas dez medidas. Todo o mundo dizia que batia palmas, mas agora chegou lá e Deputado está querendo discutir.
Aí eu já fiquei parecido com um porco-espinho na cama.
Veio a resposta: Não, é assim mesmo. Vejam bem, eles são corruptos e têm medo da Lava-Jato. Então, eles querem mexer, querem mexer nas nossas dez medidas. Não, a sociedade abraçou isso aí. Eles não têm que discutir, eles têm que aprovar na íntegra, porque os que discutem são corruptos, têm medo da Lava-Jato. Eles têm que aprovar na íntegra.
Eu, meio sonolento, já corri para botar meu terno. Até parecia que eu tinha que vir aqui para votar, que eu tinha que vir correndo para cá.
Nós temos que exigir respeito nesta Comissão. O Presidente tem que exigir respeito. V.Exa., Deputado Onyx Lorenzoni, tem que exigir respeito a esta Comissão, senão V.Exas. não estão à altura do papel que estão desempenhando. O Ministério Público é bem-vindo à discussão, mas tem que cuidar, para ver quem manda para dar essas entrevistas montadas, no sentido de só quererem desmoralizar esta Casa.
Eu não tenho nada contra o Ministério Público. Fui Secretário por mais de 16 anos, fiz mais de 500 licitações e nunca fui sequer acusado de nada, nem pelos meus adversários. E os senhores sabem que eu sou um adversário veemente, quando tenho de sê-lo. Poderia ter sido acusado, tenho adversários e até inimigos na política. Agora, o cara está na cama, do lado da mulher, filho dormindo no quarto do lado, e tem que ouvir uma coisa dessas? É demais.
Temos que exigir respeito. Querem discutir? Vamos discutir. Mas não aceitamos, e os senhores não podem aceitar a criminalização da política. Não existe democracia sem política e sem políticos. Não existe. Fora isso é AI-5. Quem tem saudade do AI-5 se declare; eu não tenho. E eu odeio a ditadura, seja ela verde-oliva, seja vermelha, seja preta, seja a cor que tiver.
Aqui não é lugar para ficar posando de bacana e fazendo jogo para a torcida. Quem está aqui com esse espírito não está à altura do papel histórico que a vida política do Brasil nos reservou. Então, eu peço que nós exijamos, daquele que lá compareceu representando o Ministério Público, uma retratação, ou então nós aqui, por estarmos discutindo, estaremos passando o recibo da corrupção ou de qualquer coisa semelhante.
A direção desta Comissão não pode ficar silente. Silêncio neste momento é uma atitude de covardes. E eu sei que nem os senhores nem nós somos covardes, até porque temos a coragem de estar aqui.
Sigo dizendo o seguinte: aqui, mais do que medidas anticorrupção - que devem ser feitas, há coisa boa aí -, nós estamos discutindo o Estado Democrático de Direito neste País. Nós estamos discutindo a própria democracia. Eu não quero que o meu filho tenha que ver monumento de sicofanta nas ruas, porque parece que o Brasil caminha para isso. Existem países que homenageiam o soldado desconhecido. Logo, daqui a pouco, vão homenagear o sicofanta desconhecido. Erguerão um monumento ao sicofanta desconhecido. É este o País que nós queremos construir? É este o País que nós queremos construir, professor de ética?
Muita gente me pergunta: Marun, depois que o Cunha já deu o impeachment, por que você ficou? Por ética. Por que continuou defendendo? Nunca disse que o Cunha é inocente. Não sei. Defendi-o processualmente aqui na Casa. Por que eu não mudei de lado, se ele já tinha derrubado a Dilma?
O barro de que eu sou feito não é o mesmo do que é feita essa turma de vira casaca. E eu vejo isso no sorriso do meu pai, que é um advogado que tem mais ou menos o seu estilo, pois, quando eu chego lá e vou falar com ele, ele está firme: Filho, a gente tem que ter, acima de tudo, vergonha na cara, e mudar de lado não é coisa de homem sério..
A Pátria brasileira não pode ser uma pátria do êxito dos sicofantas; não é isso que nós temos de construir aqui. Temos que construir uma coisa justa, o equilíbrio entre acusação e defesa, a responsabilização de quem acusa indevidamente, a criminalização também da sonegação. A sociedade tem que saber que nós não estamos brincando. Vamos mudar? Vamos mudar. Mas tem que ser uma coisa completa: Pau que dá em Chico tem que dar em Francisco..
Eu me aproximo do encerramento, perguntando ao professor e ao advogado. Rapaz, eu, te ouvindo aqui, senti saudade de ser advogado! Deu saudade. Os senhores falaram, comentaram sobre aquilo a que são contrários. Agora eu volto a dizer e pediria aos senhores que solicitassem uma cópia desse programa a que eu assisti ontem, pois chegou a hora de dizermos: Alto lá!. Senão, não haverá respeito, e sem respeito mútuo nós não vamos chegar a lugar nenhum.
Existe coisa boa nesse projeto. Vamos valorizar, regar, fazer crescer o que efetivamente é bom, mas sem abrimos mão do direito de discutir. Se formos a vinte gabinetes aqui da Câmara, acharemos 2 milhões de votos. Aleatoriamente, ao sair daqui, o senhor visite vinte gabinetes: há 2 milhões de votos aqui dentro. Nós somos 500 Deputados. Certo? Então, não nos sintamos pregados na parede por esse projeto apresentado. Vamos ter coragem de discuti-lo.
Eu concluo perguntando: o que os senhores acham de positivo, de bom nesse projeto, para que nós possamos avançar?
O SR. PRESIDENTE (Deputado Joaquim Passarinho) - Obrigado, Deputado Carlos Marun. É um prazer ouvi-lo.
Eu gostaria de dizer que esta Comissão nunca se sentiu constrangida por nenhum tipo de posicionamento do Ministério Público. Ao contrário, na segunda audiência desta Comissão, vieram debater com esta Casa os membros do Ministério Público Federal, na pessoa do Sr. Deltan Dallagnol.
O SR. DEPUTADO CARLOS MARUN - E ele discutiu. Deixe-me dizer isso. Esteve aqui o Dallagnol e discutiu. Agora, já que ele aceitou discutir, ele é corrupto? Ele está com medo da Lava-Jato?
O SR. PRESIDENTE (Deputado Joaquim Passarinho) - Deixe-me concluir. V.Exa. teve 13 minutos.
O SR. DEPUTADO CARLOS MARUN - Nosso Presidente tem todo o tempo do mundo.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Joaquim Passarinho) - Eu só queria dizer que nós, enquanto Comissão, não nos sentimos desrespeitados em nenhum momento, até porque as pessoas que propuseram no Ministério Público estiveram aqui e disseram: Trouxemos os temas, e queremos que os senhores discutam. E nem afirmaram que as soluções que apresentaram são as melhores de todas. Apenas propuseram alguma coisa. Então, uma posição individual de um membro do Ministério Público não pode ser a representação de todo aquele Parquet, até porque, quando um membro desta Casa também faz uma coisa errada, isso não pode ser imputado a todos nós.
O SR. DEPUTADO CARLOS MARUN - Não estive na reunião com o Sérgio Moro, mas estive na reunião com o Procurador Dallagnol, que demonstrou grande conhecimento e boa vontade em relação ao debate, já de pronto admitindo que, do jeito que estava, o próprio teste de integridade... Então, ele aceita discutir. Agora, não dá para vir aqui, aceitar discutir e ir à televisão... Então, temos que ver que papel desempenhou essa promotora ontem em relação ao que nós estamos discutindo aqui. Trago a minha revolta, mas tenho certeza de que temos um comando nesta Comissão à altura para verificar o que aconteceu e para que nós possamos, juntos, avançar.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Joaquim Passarinho) - Muito obrigado.
O SR. DEPUTADO ONYX LORENZONI - Presidente...
O SR. PRESIDENTE (Deputado Joaquim Passarinho) - Pois não, Deputado Onyx.
O SR. DEPUTADO ONYX LORENZONI - Com a sua permissão, eu quero só aduzir ao seu raciocínio o seguinte: nós vamos discutir à exaustão. Já está aprovado o comparecimento de mais de 125 pessoas, representando todas as instituições que militam no mundo jurídico brasileiro e fora do mundo jurídico brasileiro. São representantes, se não me falha a memória, Alessandro, de seis ou sete universidades, os titulares de Direito Penal, de Direito Criminal. Ou seja, nós vamos discutir à exaustão.
Eu quero deixar isso claro para o Plenário desta Comissão e que fique registrado nos Anais que a primeira atitude, após nós termos sido indicados e eleitos por V.Exas., e eu ser indicado Relator, foi estar diante do Dr. Sérgio Moro, quando fomos a Curitiba, o que resultou na vinda dele aqui, e diante do Ministério Público Federal. Nós dissemos - há testemunhas, inclusive presentes nesta sala, a nossa consultoria, que estavam nos acompanhando - o Presidente e eu, que temos consciência de que, neste momento que o projeto foi apresentado, é da formatação e da institucionalidade do Parlamento discutir toda e qualquer medida que aqui chegue. E, uma vez submetida ao crivo do Parlamento... Porque quem representa a sociedade brasileira somos nós.
Perguntaram-me numa entrevista o que eu acho e qual é a minha opinião sobre o Governo. Eu acho que, quanto mais distante o Governo estiver das decisões tomadas pelo Parlamento, mais saudável será para a sociedade e para democracia brasileira.
Então, Deputado Marun, V.Exa. tem razão do alerta que faz, mas eu quero, por dever de justiça, e em nome do Deputado Joaquim Passarinho, dizer a V.Exa. que nós dissemos o que V.Exa. acabou de dizer, ao vivo, dentro da sede do Ministério Público, lá em Curitiba. Eles estão cientes de que nós vamos debater com responsabilidade, com seriedade, e que nós vamos debater do primeiro ao último minuto. E o resultado final vai ser o melhor resultado para o País que todos nós amamos. Eles o amam e nós também. Mas é nosso dever construir e votar em plenário.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Joaquim Passarinho) - Muito obrigado, Deputado Onyx.
O SR. DEPUTADO CARLOS MARUN - Peço 1 minutinho, só para encerrar esse assunto, Sr. Presidente.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Joaquim Passarinho) - Pois não. V.Exa. dispõe de 30 segundos.
O SR. DEPUTADO CARLOS MARUN - O meu alerta também se dá no seguinte aspecto: quem fala pelo Ministério Público, os promotores, daqui a pouco todo mundo passará a dar entrevista. Todos sabem que a política virou a Geni, e todo mundo gosta de bater na Geni, dá IBOPE.
Nós temos que ter cuidado com isso. Faço este alerta aos senhores.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Joaquim Passarinho) - Eu vou reescrever V.Exa. aqui.
O SR. DEPUTADO CARLOS MARUN - Não faça isso, por favor.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Joaquim Passarinho) - Sempre é bom ouvi-lo.
O SR. DEPUTADO CARLOS MARUN - As minhas perguntas já foram feitas.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Joaquim Passarinho) - Com a palavra o Deputado Rubens Bueno, que agregará o tempo de Liderança.
O SR. DEPUTADO RUBENS BUENO - Sr. Presidente, Sr. Relator, senhores convidados, Prof. Roberto Romano, que tive o prazer de convidá-lo para estar aqui conosco hoje não só pela sua postura, mas também pelas suas entrevistas que sempre trazem muita luz _- e não LOAS, como disse o nosso Relator -; e Conselheiro Augusto de Arruda Botelho, convidado pelo Deputado Carlos Marun, eu vou dividir aqui em dois momentos as perguntas ao Prof. Romano, porque eu acho que, para mim, vai ser esclarecedor e, depois, quero fazer também perguntas para o Dr. Augusto.
Saiu um artigo no jornal O Estado de S.Paulo no ano passado - se não me engano, em janeiro - em que o senhor falava sobre as manifestações de 2013. Coincidentemente, eu estava fora do País, e aquelas manifestações chamaram - e muito - a atenção daqueles que estavam no poder, sobretudo daqueles preocupados com o País, mas, no poder, parece que não se preocuparam muito, porque a manifestação deu no que deu, a não ser a própria reação da sociedade em manifestações seguintes, porque o Governo fez apenas um discurso momentâneo de reforma política e nada aconteceu.
Então, farei ao senhor duas perguntas nessa fase, professor. A primeira: o senhor crê que esse projeto que estamos debatendo tem o poder de realizar essas mudanças? A segunda: quais são os pontos que o senhor considerava indispensáveis e que estão nesse projeto para o Brasil avançar na luta contra a corrupção?
De outro lado, eu ouvi um comentário seu na GloboNews, mostrando que o País caiu sete posições no ranking mundial no combate à corrupção - isso em janeiro deste ano, 1 ano depois. E o senhor falava da hipercentralização de políticas públicas, recursos, decisões, etc. O senhor mencionou ainda os Estados, aliás, os Municípios desassistidos por falta dessa descentralização, dessa concentração do poder, de recursos, etc. E o projeto que nós estamos aqui discutindo evidentemente não trata disso. Mas isso é apenas para clarear algo que eu acho que vale a pena comentar e o senhor nos responder, com a sua capacidade reconhecida por todos nós.
O senhor acredita que o projeto que estamos debatendo tem o condão de combater a corrupção de forma eficaz no contexto que o senhor chamou, naquela entrevista, de circuito perverso da corrupção? Qual é a sugestão que o senhor pode apresentar em relação a esse circuito perverso da corrupção?
Nessa entrevista, o senhor ainda menciona que o Ministério Público se municiou de técnicas novas de investigação e conhecimentos jurídicos profundos. Pergunto: o senhor acredita que as medidas aqui apresentadas, e que foram uma iniciativa do Ministério Público, são reflexos dessa evolução?
Quarta e última pergunta: o que o senhor poderia falar a respeito da Controladoria-Geral da União, atual Ministério da Transparência, Fiscalização e Controle, órgão ligado ao Poder Executivo e que atua no combate à corrupção?
Vou agora fazer as perguntas ao Dr. Augusto Arruda Botelho, lembrando a ambos, Sr. Roberto e Dr. Augusto, que há uma PEC que trata da impunidade dos juízes no Brasil e que não tem efeito administrativo para aposentá-los com perda de aposentadoria.
No Brasil, o juiz pode desonrar a Justiça, pode fazer o que quiser, porque, ao final, ele vai ser premiado com a sua aposentadoria e vai para casa. Eu acho que ninguém está acima da lei, muito menos um juiz que deve não só honrar o seu cargo, mas também defender a Justiça e fazer justiça.
Dr. Augusto de Arruda Botelho, o senhor disse à Folha de S.Paulo que a delação, ao contrário do que certos advogados propagandeiam, não tem sido uma opção voluntária do acusado. A caguetagem, na prática, é uma imposição, uma coação legitimada por juízes e promotores que, antes de oferecerem a benesse, impigem ao cidadão uma série de atrocidades.
Pergunto: acordo de colaboração premiada com réu preso é regra ou é exceção? Segunda pergunta: como melhorar tal instituto para proteger as garantias constitucionais do acusado?
São essas as perguntas, agradecendo a ambos a presença.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Joaquim Passarinho) - Muito obrigado, Deputado Rubens Bueno.
O terceiro orador deste bloco é o Deputado Antonio Carlos Mendes Thame, a quem concedo a palavra para fazer suas considerações.
O SR. DEPUTADO ANTONIO CARLOS MENDES THAME - Sr. Presidente, Sr. Relator, senhores convidados, Sras. e Srs. Deputados, duas características são aritméticas, são inegáveis, são irrefutáveis. A primeira é que a situação não pode continuar como está. A segunda é que a percentagem dos crimes de colarinho branco pode ser reduzida, mas, no volume dos recursos, é imensa, chega a quase 100 bilhões. Ora, quanto é o orçamento do Governo Federal para a saúde? Cento e quinze bilhões.
A Fundação Getúlio Vargas fez uma pesquisa mostrando que há um desvio por ano de 100 bilhões de reais, e a OCDE diz que não são 100 bilhões de reais; são 200 bilhões de dólares, que dão mais de 700 bilhões de reais, quase 1 trilhão de reais. Então, a percentagem dos crimes de colarinho branco é muito grande, e a situação não pode continuar como está.
As perguntas que faço ao Dr. Roberto Romano, por quem tenho admiração já de longa data - e hoje tenho o imenso prazer de conhecer o Dr. Augusto de Arruda Botelho -, são: quais as alternativas para aquilo que porventura não funcione dentre as dez medidas? O que é uma sociedade equilibrada, na opinião dos senhores, no sentido de a acusação e a defesa estarem equilibradas? O atual momento é de equilíbrio, com tanta gente tendo os seus crimes prescritos ou suas penas prescritas?
Aliás, disse o Dr. Augusto que, das dez medidas, cinco são de combate à corrupção e cinco são de alteração do Código de Processo Penal. Quer dizer, vale para todos os crimes e não apenas para corrupção. Ora, tinha de ser assim mesmo, porque, na realidade, eu estou mudando a tipificação do crime de corrupção. Eu estou, ao mesmo tempo, dificultando esses crimes, quando o advogado não conseguir dizer que o sujeito não é criminoso: Mas a prova é ilícita, Mas há uma prescrição. Em suma, tem de haver alguma mudança.
Por último, o que são crimes hediondos? A população sabe o que são ou é apenas um nome? Sabe que, sendo um crime hediondo, não cabe o indulto no final do ano, como bem disse o nosso Relator?
Países que deram certo são aqueles que eram muito corruptos e hoje estão na lista dos dez países mais transparentes na relação anual da transparência internacional. O que fizeram esses países? Primeiro, um investimento maciço em conscientização popular, contando para a população o que é crime hediondo, porque a maioria não sabe o que é crime hediondo. Por isso há a impressão de que crime hediondo e outro crime que não é hediondo são crimes saudáveis. Não é. Mas o crime que é hediondo, pela nossa classificação, é aquele para o qual não cabe indulto no final do ano, não cabe comutação da pena, não cabe regressão da pena? É isso o que nós queremos saber.
Quais são as três medidas que esses países fizeram que deram certo? Primeiro, investimento maciço na conscientização popular, mostrando que a corrupção é um grande mal. E, se somarmos a ela a sonegação, então - Nossa Senhora! -, fica um mal dobrado, muito grande!
Segunda vertente: legislação. Na verdade, é a lei que é cumprida ou não. Investiram em tapar os buracos legais, aquilo que os advogados chamam de vacatio legis.
Em terceiro lugar, fortalecimento dos órgãos de combate à corrupção. Não adianta ter CGU, AGU, COAF, Ministério Público Federal, Tribunal de Contas, se eles não forem fortes. Essas pessoas ganham para proteger o Erário em tempo integral, para proteger os recursos públicos. Ora, não vamos fortalecer essas pessoas para que eles façam bem o seu papel?
Eram essas as perguntas que eu queria submeter ao Dr. Augusto e ao Dr. Roberto Romano.
Muito obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Joaquim Passarinho) - Obrigado, Deputado Antonio Carlos Mendes Thame. Mesmo com problemas de saúde, é o primeiro a chegar à Casa e a estar aqui conosco na Comissão.
O SR. DEPUTADO ANTONIO CARLOS MENDES THAME - Obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Joaquim Passarinho) - Vamos passar agora a palavra aos nossos expositores.
Concedo a palavra, inicialmente, ao Dr. Roberto Romano.
O SR. ROBERTO ROMANO - Em primeiro lugar, agradeço as perguntas, apesar de que, claro, não terei tempo suficiente para responder a todas, ou, pelo menos, de maneira circunstanciada.
Deputado Carlos Marun, eu concordo com essa caracterização do AI-5 como de pessoas de boa-fé que imaginam que vão modificar o País, mas eu gosto de lembrar sempre a outra parte dessa reunião famosa em que o Vice-Presidente Pedro Aleixo disse que o AI-5 era um instrumento muito pesado e que poderia causar abusos. Alguém disse que o Presidente Costa e Silva não abusaria, e a réplica foi: E o guarda da esquina? Quando você institui um sistema todo ele baseado na punição e negligencia, ou pelo menos atenua, a defesa, evidentemente os abusos aparecem de baixo para cima, não apenas de cima para baixo. É isso que me preocupa mais.
Eu posso dizer isso com certa tranquilidade, porque eu fui preso político e fui julgado por um tribunal militar, como um juiz togado, e eu senti isso. Eu fui acusado de terrorismo e tudo mais e finalmente fui absolvido, por absoluta falta de prova e inexistência de crime, 1 ano e meio depois de cadeia e de tortura. Então, eu tenho muito receio de sistemas punitivos que se tornam autoritários. Essa questão me parece muito relevante, e nesta ocasião acho que é bom pensar.
O segundo ponto é o seguinte: o que é bom no projeto? Eu acho que esse projeto apresentado é resultado de um diálogo, de uma tensão da opinião pública, que não está mais levando em conta e que não está mais valorizando os sistemas habituais de representação política. Os senhores conhecem bem as pesquisas e sabem que há uma espécie de desconfiança da cidadania contra os meios de representação. Isso é muito grave para quem é democrata. Então, o que eu diria que é bom no projeto é a tentativa de responder a esse anseio. Dessa tentativa a chegar à tese de que todos os pontos apresentados por esse projeto devem ser assumidos há uma distância.
Eu me limitei a apresentar apenas quatro problemas éticos graves, mas outros podem aparecer, como o meu colega colocou.
Nessa medida, eu sei que esta minha crítica pode trazer muitas reflexões contrárias a minha pessoa, mas fico tranquilo em relação ao Ministério Público Federal e ao Ministério Público Estadual, etc., porque procuro defender, como alguém que estuda ética, os dois lados. Muitas vezes eu vim em apoio público ao Ministério Público e muitas vezes eu vim também em defesa da defesa.
Eu me lembro de que, na época de Fernando Henrique Cardoso, quando a Polícia Federal invadiu escritórios de advocacia em São Paulo, eu vim a público para defender a defesa.
Eu acho que é dever do cidadão não ser Maniqueu, menos ainda quem trabalha com ética e quem trabalha com política. O maniqueísmo funciona no plano do sectarismo, no plano da inimizade, etc., mas não no da política, não no da ética. Então, isso é o que eu teria a dizer ao senhor.
Perante o Deputado Rubens Bueno, que fez uma proposta de perguntas extremamente complexa, eu me desculpo por talvez não poder responder a tudo. Primeiro ponto: não acredito que esse projeto ou que nenhuma lei possa realizar essas mudanças tão fundamentais na sociedade e no Estado brasileiro. Eu acho que essa é uma crença muito grande. Não que eu despreze a lei; eu acho que a lei é um instrumento importantíssimo de normatividade da vida social e da vida política, mas essa confiança na lei, que nós estabelecemos, faz-nos esquecer DE um ponto que é básico, a existência real na sociedade de interesses fortes, do ponto de vista econômico, do ponto de vista social e do ponto de vista inclusive religioso.
Então, eu gosto sempre daquela definição do Diógenes, chamado o Cínico, de que a lei é aquela teia de aranha que prende os insetos pequenos e é arrombada pelos insetos grandes. Essa parece ser uma realidade que nós vivemos sempre. Então, nós não podemos jamais deixar de considerar que esses interesses continuarão.
Aí está um ponto que me parece grave: situar a corrupção apenas e tão somente no plano da política, como tem sido a tentativa, parece-me esquecer de que dentro da sociedade existem interesses altamente corruptores e altamente irresponsáveis, do ponto de vista do dinheiro público inclusive. Todas as investigações da Lava-Jato não levam apenas a políticos. Então, esse é um ponto.
Quais os pontos positivos? Eu diria que o projeto inteiro é essa tentativa, que eu acho positiva, de tentar responder à insatisfação da população. Mas, assim como eu identifiquei alguns pontos que, no meu entender, do ponto de vista moral e ético, são gravíssimos, eu acho que - o Doutor apontou outros - nós temos, sim, que discutir esse projeto, e não aceitá-lo como se fosse um decreto, porque, num Estado e numa sociedade democrática, ninguém pode se arrogar a tutela da cidadania, nem mesmo esta Câmara dos Deputados, nem mesmo o Poder Executivo, nem mesmo a Justiça. Se é verdade que a soberania é de fato do povo, nós não podemos nos considerar tutores do povo.
E há certo vício na vida intelectual brasileira de colocar os intelectuais como aqueles que ditam normas para a população. Eu sempre me coloquei contra isso. E aí, Deputado Rubens, chega essa questão da hipercentralização.
A primeira vez que o Procurador de Justiça de São Paulo me convidou para conversar sobre um problema de ética para o Ministério Público, a minha pergunta o surpreendeu. Por que todo Prefeito de cidade do interior odeia promotor de justiça? Porque o Prefeito não recebe o retorno dos impostos que seguem da sua cidade para o poder central, o que volta é uma parcela extremamente pequena desse dinheiro. Ele tem despesas que são as mais pesadas, as mais elevadas - esgoto, saúde, educação, etc. - e só pode ter diante de si o pastor protestante, o padre, a dona de casa, que lhe cobram creche, obras, esgoto, etc. Quando ele avança um pouquinho na Lei de Responsabilidade Fiscal, o promotor o pune pesadamente.
Essa equação não bate. Por que sai tanto recurso do Município, e os Prefeitos estão sempre com um pires na mão, diante do Palácio do Planalto, pedindo aumento da participação dos Municípios? Por quê?
Esse é um problema que toca a estrutura do Estado brasileiro. Nós temos uma falsa federalização. Nós não temos uma Federação, perdoem-me. Nós temos uma superconcentração do poder, sobretudo no plano orçamentário, na recolha dos impostos, sem a devida distribuição. Isso gera, sim, corrupção em larga escala. Será que todos os Prefeitos são corruptos no sentido exato da palavra? Esse é um ponto que precisa ser pensado.
O projeto tem o condão de combater a corrupção? Eu acho que existem pontos nele que podem ajudar. Eu volto à fala do Deputado Onyx Lorenzoni, que foi muito interessante. O Estado brasileiro tem a tradição - e isso é passado para a sociedade brasileira - de negar os direitos individuais. Eu gosto sempre de lembrar o discurso de Getúlio Vargas, em 1º de maio de 1936, em que dizia que os indivíduos não têm direitos; têm deveres para com a sociedade e para com o Estado. Essa tradição não é de Getúlio, é do Estado brasileiro.
Tanto é verdade que - e eu sempre digo para os meus alunos -, em qualquer Prefeitura, atrás do balcão, está escrito no cartaz: Insulto ao funcionário público: tantos anos de cadeia. Mas não há, ao lado, um cartaz que alerte: Desrespeito ao cidadão: tantos anos de cadeia. Essa falta de isonomia é um pressuposto básico da não democracia. E nós só vamos encaminhar a luta contra a corrupção na hora em que o cidadão tiver o respeito do Estado. Eu não vejo solução mágica por meio de uma lei. É preciso que a soberania popular defina esses padrões, a partir do Município.
Quanto às técnicas novas, eu vejo que, entre as atuações de alguns elementos do Ministério Público Federal no período Fernando Henrique Cardoso e o que nós estamos vendo agora, há uma diferença técnica muito grande. Eu acho que isso deveria ser aproveitado para incentivar o combate à corrupção e tudo o mais, mas dentro do diálogo, dentro do debate.
Quando a CGU - Controladoria-Geral da União foi criada, eu achei a proposta muito interessante. Estive nesta Casa mesma, com o Dr. Jorge Hage, conversando sobre essas questões da CGU.
O problema da CGU, no meu entender, é que ela tinha que investigar os Municípios com esses problemas fundamentais e não tinha pessoal nem recursos para acompanhar todos. Ela fazia os sorteios, etc. Se ela cresce demais, ela vira o quê? Uma KGB. Se ela fica no mesmo tamanho, ela fica impotente, porque a quantidade...
Então, parece-me que neste momento - aí chego ao Deputado Thame -, diante da crise geral, a crise não é do Estado brasileiro, a crise é do Estado na sua totalidade. Além da Ética, eu estudo a questão da razão de Estado e tenho trabalhado bastante isso nos últimos 30 anos. E nota-se que o Estado no mundo não consegue mais manter aqueles famosos três monopólios enunciados por Max Weber: o monopólio da força, o monopólio da norma jurídica e o monopólio da captação dos impostos. Não consegue!
Se nós pegarmos a questão do narcotráfico, que é um desafio para o governo norte-americano, para o governo francês, etc., a questão do terrorismo... Quando se fala em monopólio da força física, há obstáculos tremendos. Também na captação dos recursos, a lavagem de dinheiro não é um problema brasileiro, é um problema mundial. Então essa crise do Estado bate na nossa crise, e quando se tem crise, tem que se ter prudência.
Esse é um ponto fundamental em termos éticos. E é imprudente, no meu entender, tentar resolver uma questão complexa com medidas extremamente imediatistas. É isso que me leva a questionar alguns desses pontos do projeto e a mostrar que de fato - e no meu texto que está com o Deputado Onyx eu insisto neste ponto - a prudência é fundamental para o Ministério Público, para os senhores, para nós, da sociedade. É muito fácil criar mecanismos de exceção, mecanismos autoritários; mudar é muito difícil, é muito difícil.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Joaquim Passarinho) - Muito obrigado, Prof. Roberto.
Tem a palavra o Dr. Augusto Botelho.
O SR. AUGUSTO DE ARRUDA BOTELHO - Bom, vou tentar condensar aqui todas as respostas de forma bem didática.
Primeiro, o Deputado Marun pergunta sobre os pontos positivos desse projeto. Eu acho que o maior ponto positivo desse projeto é promover isto aqui, a discussão, a conscientização, é levar o problema endêmico gravíssimo da corrupção no nosso País para ser discutido em todas as casas, para ser discutido na sociedade, para que ela se conscientize da corrupção, a começar daquela corrupção que acontece no dia a dia, na ação mais comezinha, do pedir o servicinho sem nota, porque isso também não deixa de ser uma prática delituosa comum. Então, os pontos positivos são a conscientização da sociedade do mal que a corrupção causa e a discussão de uma melhor proposta, de uma saída com base no Estado Democrático de Direito para enfrentar esse problema.
Causa-me - causou-me e continua a me causar - desconforto a forma como o Ministério Público Federal tocou de início, e vem tocando, essa proposta das 10 Medidas contra a Corrupção. Já iniciei a minha fala dizendo que o nome, no meu ponto de vista, era absolutamente equivocado, porque foi uma campanha de marketing - e não há demérito nenhum nisso. De todo modo, a condução dessa campanha me causou enorme desconforto.
Vou contar aqui uma passagem pessoal: eu sou palmeirense roxo e estava no jogo Palmeiras e Corinthians - tenho essa falha, gravíssima. Estava na fila para entrar no estádio, o belíssimo estádio do meu time, o Palmeiras, e havia um quiosque do Ministério Público Federal para colher assinaturas para as 10 Medidas.
A tarde já estava caindo, vários voluntários passavam na fila - e fila de estádio sempre é uma coisa meio tensa, nunca se está ali a passeio. Eles gritavam assim: Quem quer acabar com a corrupção no País assine a lista! E ia passando a fila. Obviamente a fila inteira assinava a lista. Quando a lista chegou à minha mão, eu educadamente falei para a voluntária, que era uma senhora: Eu discordo de alguns pontos da proposta, então eu não vou assinar. Eu quase apanhei. Primeiro começaram a me chamar de petista: Petista, saia da fila! Depois, começaram a me chamar de corintiano, aí eu disse: Não, espere um pouquinho. (Risos.)
Não estou aqui desmerecendo os mais de 2 milhões de assinaturas pelo projeto. É óbvio que há pessoas absolutamente conscientizadas que o leram, entenderam-no e concordam com ele, como eu concordo com alguns pontos das propostas apresentadas pelo Ministério Público Federal. Não há aqui qualquer crítica a quem assinou a lista ou, inclusive, a parte das propostas, mas esse formato marqueteiro de se apresentar isso... E é utilizado até hoje, e foi utilizado nesta Casa.
Nós temos o apoio de mais de 2 milhões de assinaturas, portanto, não pode haver nenhuma modificação, como se uma discussão aqui ou qualquer modificação a esse texto fosse uma afronta aos 2 milhões de assinaturas. Não, pelo contrário, isso é o que mostra a maturidade desta Casa, mostra a maturidade do processo legislativo, em que é preciso, sim, uma discussão.
Então, especificamente, o que eu acho que já poderíamos aprovar necessariamente, sem qualquer alteração, do meu ponto de vista pessoal, como advogado criminalista? São pontos que estão contidos, quase todos eles, no primeiro item das 10 Medidas: prevenção à corrupção, transparência e proteção da fonte.
Há pontos aqui, como, por exemplo, investimento de um percentual em programas voltados a estabelecer uma cultura de intolerância à corrupção; conscientização da população dos danos sociais e individuais causados por ela, que são propostas absolutamente positivas, que podem ser implementadas de qualquer forma. Há ainda a proposta de que o Judiciário e o Ministério Público prestem contas da duração de processos - eu acho isso extremamente importante - e formulem propostas para evitar que processos prescrevam e para fazê-los andar mais rápido.
Em relação ao segundo ponto, a criminalização do enriquecimento ilícito, num primeiro olhar, eu até achei interessante a proposta, mas, no decorrer da leitura, vi que o texto estraga uma proposta que pode ser boa. O que diz o Ministério Público? De qual premissa parte o Ministério Público ao propor a criminalização do enriquecimento ilícito?
É muito difícil comprovar a corrupção, diz o Ministério Público. Então, vamos tentar de alguma forma punir o corrupto, não pela corrupção, já que a corrupção é muito difícil de ser comprovada. Isso não sou eu que estou dizendo, é o texto que diz. Então, vamos aqui instituir um crime: enriquecimento ilícito. Mas, como também é muito difícil provar o enriquecimento ilícito, vamos fazer o seguinte: ele tem que provar que ele não enriqueceu ilicitamente, ou seja, vamos inverter o ônus da prova.
Então, vejam bem, é uma proposta que, em tese, até poderia ter um viés interessante, mas que, ao longo do texto, fica ilegal por completo com a inversão do ônus da prova e a justificativa da pessoa. Ou seja, se a pessoa não justificar, haverá o pressuposto de que o enriquecimento foi ilícito. Essa é uma proposta que me causa bastante espanto.
Voltando ainda às propostas que eu considero interessantes, algumas das propostas contidas no item 4, que pretendem aumentar a eficiência da Justiça, são extremamente positivas. A fixação de um limite para pedido de vista num julgamento é algo extremamente positivo. Alguns recursos, de fato, são desnecessários e podem ser substituídos, mas não, mais uma vez, na forma ampla e irrestrita, com o cerceamento e com a supressão de diversos direitos e garantias fundamentais, como a proposta 4, como um todo, pede.
O item 5 eu considero favorável. Ele traz a possibilidade de tornar as ações de improbidade mais céleres, reduz alguns prazos. Vê-se que há a possibilidade de se tornar um processo mais rápido e, ainda assim, deixá-lo um processo justo e equilibrado - o equilíbrio entre a defesa e a acusação. É possível fazer isso sem deixar a balança absolutamente desigual.
As propostas do Ministério Público tornam a balança completamente desigual. Nós vamos estar diante de um Código de Processo Penal acusatório, de um modelo acusatório de se julgar. Por isso, eu digo: As medidas têm relação com a corrupção? Elas têm relação com a corrupção, mas a maioria delas têm relação com o sistema de justiça criminal. São alterações do Código de Processo Penal. Vejam, ao longo de anos, em diversas Comissões, em diversas tentativas de reforma do Código Penal, alterações tão profundas como essas não foram feitas.
O último ponto positivo: alguns pontos da última medida para recuperação do lucro derivado do crime. Algumas formas mais fáceis de recuperar esse dinheiro eu as considero extremamente positivas, porque não só a prisão evita o crime, mas o bolso ajuda também. Portanto, eu entendo que essas medidas, de pronto, já são positivas.
Respondendo ao Deputado Rubens Bueno com relação à delação de réu preso, essa frase que o senhor citou, minha, publicada na Folha de S.Paulo, foi um artigo que eu escrevi 2 anos atrás. Apanhei bastante há 2 anos em razão desse artigo, e hoje eu estou cada vez mais convicto da minha posição de 2 anos atrás.
Eu sou um defensor e um crítico, na verdade, da forma equivocada como a delação premiada vem sendo usada no nosso País. Eu entendo que o instituto da delação premiada seja algo extremamente importante e extremamente eficaz se utilizado de forma correta, mas aquilo que eu chamo de delação à brasileira, no meu ponto de vista, é absolutamente ilegal.
A ilegalidade está baseada em uma premissa que eu defendo, a premissa de que réus presos não podem delatar, assim como empresas que tenham diretores presos não podem firmar acordo de leniência. O primeiro pedido, a primeira necessidade, o primeiro requisito de uma delação e de um acordo de leniência é a voluntariedade, e réu preso, de voluntário, tem muito pouco.
Eu continuo entendendo que há um excesso de prisões preventivas que tem o claro intuito de forçar delações premiadas. Eu não concordo com a estatística que o Ministério Público Federal reiteradamente apresenta de que um número muito pequeno de réus presos fizeram delação premiada e de que a maioria das delações premiadas firmadas, principalmente na Operação Lava-Jato, tenham sido feitas com réus soltos.
Essa estatística está errada, foi feita de forma absolutamente tendenciosa, e explico o porquê, de maneira bastante rápida. Como o Ministério Público faz a estatística? Vamos lá: fizemos cem acordos de delação premiada ao longo da Operação Lava-Jato; 30 réus estavam presos; então, 70% das delações são com réus soltos.
Só que o Ministério Público esquece uma pequena conta: quantos desses réus estiveram presos e foram colocados em liberdade? Quantos desses réus que optaram por fazer a delação premiada tiveram sua prisão preventiva ou prisão temporária pedidas e não decretadas? Quantos desses réus tiveram ameaças de serem presos? Qualquer que seja a situação para mim não importa. Eu assinei a delação premiada no dia 18. No dia 18 eu estava preso? Não, no dia 19 ou no dia 17 eu tinha uma prisão decretada. Eu fui solto um dia antes.
O caráter de voluntariedade da delação premiada, para mim, é algo absolutamente essencial. Portanto, eu continuo a defender a impossibilidade de se firmar um acordo de delação em caso de réu preso. Acho que respondi.
Como melhorar a delação? O começo seria este: não permitir a delação de um réu preso e deixar a delação com critérios muito mais específicos de benefícios, com critérios muito mais específicos de condições. A principal queixa é a de que a delação só se faz uma vez. Não existe aquele que se arrepende duas vezes. É isso.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Joaquim Passarinho) - Muito obrigado, Dr. Augusto.
Eu só vou pedir licença para votarmos os requerimentos, porque estamos com quórum. A Ordem do Dia pode começar, e nós não mais poderemos votaremos os requerimentos. Depois nós continuaremos com as falas dos Deputados.
Requerimento nº 78, de 2016, do Deputado Rubens Bueno, que convida o Sr.
Ruszel Lima Verde Cavalcante.
Os Srs. Deputados que o aprovam permaneçam como se encontram.
Aprovado.

Requerimento nº 79, de 2016, do Deputado Onyx Lorenzoni, que convida o Delegado Federal da Polícia Federal Igor Romário de Paula.
Os Srs. Deputados que o aprovam permaneçam como se encontram.
Aprovado.

Requerimento nº 80, de 2016, do Deputado Antonio Carlos Mendes Thame, que convida as Sras. Ana Paula Sayão; Iza Mansur; Rosa Richter e Thais Keiko, representantes da sociedade civil.
Os Srs. Deputados que o aprovam permaneçam como se encontram.
Aprovado.

Requerimento nº 81, de 2016, do Deputado Antonio Carlos Mendes Thame, que convida o advogado Dr. Rafael Thomaz Favetti.
Os Srs. Deputados que o aprovam permaneçam como se encontram.
Aprovado.

Requerimento nº 82, de 2016, do Deputado Valdir Colatto, que convida o Sr. Vinicios Leoncio, advogado.
Os Srs. Deputados que o aprovam permaneçam como se encontram.
Aprovado.

Requerimento nº 83, de 2016, do Deputado Valdir Colatto, que convida o Sr. Promotor de Justiça do Estado do Ceará. Dr. Igor Pereira Pinheiro.
Os Srs. Deputados que o aprovam permaneçam como se encontram.
Aprovado.

Requerimento nº 84, de 2016, do Deputado Onyx Lorenzoni, que convida o Sr. Ives Gandra da Silva Martins, advogado, tributarista, professor e jurista.
Os Srs. Deputados que o aprovam permaneçam como se encontram.
Aprovado.

Requerimento nº 85, de 2016, do Deputado Onyx Lorenzoni, que convida o Presidente da Federação Nacional das Entidades dos Servidores dos Tribunais de Contas do Brasil, Sr. Amauri Perusso.
Os Srs. Deputados que o aprovam permaneçam como se encontram.
Aprovado.
Requerimento nº 86, de 2016, do Deputado
Marcelo Aro, que convida o Dr. Fábio Medina Osório, Advogado-Geral da União.
Os Srs. Deputados que o aprovam permaneçam como se encontram.
Aprovado.

Requerimento Nº 87, de 2016, do Deputado Onyx Lorenzoni, que convida o Presidente da Federação Nacional dos Policiais Federais, Sr. Luís Boudens.
Os Srs. Deputados que o aprovam permaneçam como se encontram.
Aprovado.

Requerimento nº 88, de 2016, do Deputado Onyx Lorenzoni, que convida o Sr. Gianpaolo Poggio Smanio, Procurador-Geral de Justiça de São Paulo.
Os Srs. Deputados que o aprovam permaneçam como se encontram.
Aprovado.

Requerimento nº 89, de 2016, do Deputado Onyx Lorenzoni, que convida o Sr. Luiz Flávio Gomes, doutor em Direito Penal.
Os Srs. Deputados que o aprovam permaneçam como se encontram.
Aprovado.

Requerimento nº 90, de 2016, do Deputado Antonio Carlos Mendes Thame, que convida o Sr. Marcos Paulo Ferreira, representante do movimento Mude - Chega de Corrupção.
Os Srs. Deputados que o aprovam permaneçam como se encontram.
Aprovado.

Requerimento nº 91, de 2016, do Deputado Antonio Carlos Mendes Thame, que convida o Sr. Antonio Rodrigo Machado, Presidente da Comissão de Combate à Corrupção, da OAB/DF.
Os Srs. Deputados que o aprovam, permaneçam como se encontram.
Aprovado.

Esses eram os requerimentos.
Vamos agora para uma nova rodada de fala dos Srs. Deputados. Estavam inscritos o Deputado Aluisio Mendes, que precisou sair, o Deputado Mauro Pereira e o Deputado Carlos Sampaio.
Vou conceder a palavra ao Deputado Mauro Pereira, mas antes ao Deputado Onyx Lorenzoni.
O SR. DEPUTADO ONYX LORENZONI - Sr. Presidente, quero só fornecer uma informação: o Deputado Marcelo Aro apresentou a convocação do titular da AGU - Advocacia-Geral da União; ela já estava no plano de trabalho, mas, para permitir os questionamentos do Deputado Marcelo, nós a aceitamos. Eu só queria informar isso ao Plenário.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Joaquim Passarinho) - Obrigado, Deputado Onyx Lorenzoni.
Concedo a palavra ao Deputado Mauro Pereira.
O SR. DEPUTADO MAURO PEREIRA - Primeiramente, quero cumprimentar a todos. Cumprimento nosso Presidente, Deputado Joaquim Passarinho; o Relator, Deputado Onyx Lorenzoni; nosso Vice-Presidente, Deputado JHC, e nossos convidados, Dr. Roberto Romano e Dr. Augusto de Arruda Botelho.
Parabenizo esta Comissão, que está aqui reunida numa segunda-feira. Até agora todas as reuniões foram realizadas com base no quórum, e isso é muito importante, pois mostra o interesse desta Comissão em fazer com que as coisas realmente aconteçam.
Eu tenho acompanhado muito atentamente todos os convidados que vieram a esta Comissão até o momento. Todos os depoimentos foram de extrema importância, da mesma forma que os depoimentos de hoje também estão sendo muito importantes. Aprendemos muito com eles.
As 10 Medidas contra a Corrupção que foram encaminhadas a esta Casa pelo Ministério Público, com quase 3 milhões de assinaturas, resultaram, é lógico, do que aconteceu com o nosso País.
Infelizmente, o nosso País hoje não tem dinheiro, a bem dizer, para nada. Os Ministérios todos simplesmente só sabem dizer não, porque não têm recursos. Ao mesmo tempo, ficou comprovado que as nossas leis são realmente muito brandas.
Eu participei da CPI do BNDES e acompanhei muito a CPI da PETROBRAS. Nós vimos convidados que chegavam para depor na CPI com habeas corpus para não dizer nada. E não diziam nada, e pronto. E muitos deles ainda ficavam aqui dando risadas à mesa, pessoas que hoje estão presas. Foi com base em tudo isso que se foi formando uma indignação, não só na sociedade, mas aqui também, na maioria dos Deputados.
E o que nos resta a fazer agora, na minha opinião, é pegar as experiências, por exemplo, do Dr. Botelho, do Dr. Romano e dos profissionais do Tribunal de Contas da União que estiveram aqui também e seguem mais ou menos a mesma linha. Cabe a nós pegar aquilo que os doutores acham que pode ser mudado para nos ajudar. Uma coisa é certa: esta Comissão terá que dar uma resposta para a sociedade. Do jeito que está não pode ficar.
Todas essas entidades, todas essas companhias têm os famosos conselhos. Por exemplo, a Presidenta Dilma era Presidente do Conselho da PETROBRAS. Olhem, tudo o que aconteceu na PETROBRAS foi com a autorização de um grupo de conselheiros, assim como no BNDES. Aonde se vai, existem conselhos, e as coisas vão acontecendo. Então, tudo que foi formado até agora, foi formado para que desse certo, e não deu certo, não deu certo.
Essa corrupção é tão desastrosa que até agora os promotores públicos, os policiais federais e o próprio Supremo ainda não têm noção do estrago que se fez. A Operação Lava-Jato não tem mais limites, porque, onde quer que eles mexam, há corrupção - e é grossa.
A delação premiada só aconteceu porque os membros ficaram presos. Se não ficassem presos, eles não iam falar. Eles estão falando e mostrando o braço da corrupção - não é o braço, é o polvo da corrupção. Agora o que vai acontecer? Esse processo da Lava-Jato vem dando certo, vem mostrando que a corrupção existe, que ela é grande, tanto que vem apontando um por um.
Nós temos que unir as pessoas de bem, Dr. Roberto e Dr. Augusto, para nos ajudarem a melhorar a Constituição, a fazer uma lei, não para ser contra ela ou para piorá-la, mas para apresentar ao Plenário uma coisa boa, através do nosso Relator Onyx Lorenzoni e da nossa Mesa.
Realmente a situação é muito difícil, é muito complicada. Vamos ter que ser duros com quem pensa em ser corrupto, de forma que, quando pensar nisso, desista.
Muito obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Joaquim Passarinho) - Muito obrigado, Deputado Mauro Pereira.
Concedo a palavra ao Deputado Carlos Sampaio.
O SR. DEPUTADO CARLOS SAMPAIO - Sr. Presidente, Sr. Relator, demais colegas, ilustres palestrantes, farei apenas uma colocação rápida.
Eu gostaria de uma reflexão de ambos, se for possível, em que pese isso não esteja no âmbito das dez medidas especificamente, mas são temas que estão sendo discutidos nesta Comissão. Queria saber, em primeiro lugar, a posição de cada um sobre a questão do foro privilegiado, em rápidas palavras; e, em segundo lugar, sobre a questão da aposentadoria compulsória.
Muito se diz que o promotor e o juiz, por serem vitalícios, são aposentados compulsoriamente e não perdem o cargo. É uma meia verdade. Enquanto o órgão de classe os julgou, eles de fato continuaram com a aposentadoria compulsória, mas, sobrevindo a sentença condenatória transitada em julgado, eles evidentemente perdem o cargo como qualquer outro servidor. Existe uma crítica quanto a essa aposentadoria compulsória, e eu gostaria de ouvi-los.
Por último, apenas uma reflexão: eu sou favorável ao instituto da delação premiada, acho até que pode ser aprimorado em muitas coisas. Gostaria de saber se os senhores concordariam com uma reflexão no sentido de que, por via indireta, ela possa estar incentivando a prática de grandes crimes ou a figura do grande criminoso.
Aquele que se envolve dentro da PETROBRAS no esquema de corrupção de milhões - e tem seus asseclas, tem seu braço político, tem seu braço operacional - sabe muito, e a chance de ele ir para casa é muito grande; e aquele que nada sabe, cujo roubo foi minúsculo perto do outro, em que pese ser também roubo, está fadado à prisão. É uma reflexão que faço, porque a estou fazendo comigo mesmo.
O senhor sabe muito? Sei. Então o seu esquema criminoso foi brutal! Brutal. Envolveu todas as esferas? Todas as esferas. Desviaram-se bilhões? Bilhões. Se sou advogado, eu falo: O senhor fique tranquilo, porque a chance de ir para casa é grande. Depois pego o outro cliente: E você? Eu não sei de nada; eu realmente roubei aquele dinheiro, mas não sei quem se envolveu; fui eu que fiz, não sei... Ah, não, você me desculpe, mas sua chance de prisão é muito grande.
Esta reflexão cabe ou é uma reflexão desmedida da minha parte?
O SR. PRESIDENTE (Deputado Joaquim Passarinho) - Muito obrigado, Deputado Carlos Sampaio.
Concedo a palavra ao Deputado Celso Maldaner.
O SR. DEPUTADO CELSO MALDANER - Presidente Joaquim, cumprimento em seu nome todos os colegas Parlamentares, especialmente os nobres palestrantes.
Quero justificar o nosso atraso. Não pudemos pegar o conteúdo das falas dos expositores.
Sobre o foro privilegiado, gostaria de dizer que tenho também uma PEC tramitando nesta Casa, a PEC 247, para acabar com o foro privilegiado para todos, inclusive para o Presidente da República, para os integrantes dos Poderes Judiciário, Legislativo e Executivo.
É importante nós escutarmos. Não sei qual é a posição da OAB, dos advogados, enfim, dos que trabalham nessa atividade, mas eu pergunto se a delação premiada prejudicaria a aprovação dessas dez medidas.
Escutei o nobre palestrante Dr.
Augusto de Arruda Botelho falar sobre isso. Será que isso prejudicaria a atividade do profissional, do advogado? Isso ia diminuir o serviço do advogado? Será que isso prejudicaria muito a classe dos advogados? Porque a delação premiada clareia. Ninguém vai delatar alguma coisa que não seja verdade; seria o cúmulo. Pergunto, portanto, se isso iria prejudicar muito essa classe dos advogados.
A minha grande preocupação, como economista, não querendo fugir do tema, é porque o Poder Público está muito pesado, muito obeso, com excesso de gordura. Como acabar com a corrupção sem aumentar essa obesidade? A sociedade não aguenta mais pagar imposto, não dá nem para falar em aumento de imposto. Não aguentamos mais. A sociedade paga muito caro, o Governo cobra demais. Como acabar com a corrupção diminuindo, desinchando as estruturas governamentais, tanto no Poder Legislativo quanto no Poder Judiciário, no Ministério Público, na AGU? Nós não aguentamos mais.
Este é o grande problema do Brasil: ter que desinchar a máquina, ter que cortar o teto. Pelo amor de Deus, é urgente votar e acabar com isso, porque nós, os empreendedores e os empresários não aguentamos mais.
Em Santa Catarina, o que está acontecendo? Ações trabalhistas. Hoje os advogados pegam ações de motoristas, de todo mundo. Há ações de motoristas de caminhão no valor até de 1,8 milhão reais, 1,4 milhão reais, 1,3 milhão reais.
Estamos acabando com a economia do País. Temos que facilitar, criar mais competitividade. Hoje os advogados pegam procuração por 2 mil reais, 3 mil reais e cobram milhões. As pessoas assinam a procuração, e o advogado já está cobrando, infelizmente.
Não aguentamos mais. Temos que criar um país mais competitivo. É isso o que nós temos que defender. Preocupa-me muito inchar mais ainda a máquina, para evitar a corrupção. Temos que facilitar a legislação, para acabar com a corrupção, mas não inchar a máquina.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Joaquim Passarinho) - Obrigado, Deputado Celso Maldaner.
Vamos passar a palavra agora aos nossos expositores.
Concedo a palavra ao Prof. Roberto Romano, para colocar suas posições.
O SR. ROBERTO ROMANO - Deputado Mauro Pereira, concordo com o senhor em gênero, número e casos. Quer dizer, temos de fato falta de recursos, que, aliás, não se deve apenas - esse é um ponto que me parece importante - às duas últimas Presidências da República. Esse é um problema estrutural do Estado brasileiro. Essa falta de recursos vai aumentando justamente e na medida em que se concentram as decisões no Poder Executivo Federal.
Os senhores sabem melhor do que eu que 90% das políticas públicas brasileiras passam pela égide do Poder Executivo Federal. Há uma burocracia enorme criada para esse fim. Esse ponto tem sido pouco considerado nas análises de corrupção no Brasil.
No programa Roda Viva, em que me entrevistaram, tentei passar a ideia de que nós no Brasil - em termos mundiais também, mas no Brasil sobretudo - não percebemos que a corrupção tem dois eixos temporais. O primeiro eixo é aquilo que eu chamo de eixo diacrônico - um escândalo vem depois de outro escândalo, depois de outro escândalo, depois de outro escândalo. Mas esses escândalos, vistos do ponto de vista diacrônico, causam descrença, porque você acaba de sair de um escândalo e já há outro, mais outro, mais outro. A população fica cansada e desanimada com os instrumentos de representação política, mas não se leva em conta o sincrônico, que depende da estrutura do Estado e da sociedade brasileira. No momento em que um escândalo, que uma apropriação indébita está ocorrendo numa firma privada ou pública, no mesmo momento outros estão ocorrendo também. A nossa percepção é diacrônica, e a imprensa tem uma percepção diacrônica também. Então, há uma aparente ausência de saída.
Ora, as soluções não são fáceis, mas elas precisariam ser debatidas, como, por exemplo, a federalização do Estado brasileiro.
Os senhores estão debatendo agora a questão da dívida dos Estados. A todo o momento há a questão da guerra fiscal entre os Estados. Por quê? Porque todos os Governadores e todas as Assembleias Legislativas dos Estados sabem que a parte do leão é do Governo Federal, que cobra o seu dinheiro como se fosse um butim. Eu estou falando na presença de um Deputado do Rio Grande do Sul, que sabe perfeitamente dessa situação. Conforme a Lei Kandir, o Governo Federal deveria pagar os Estados. Ele não paga, e cobra - os senhores sabem disso.
Essa federalização do Brasil é urgente, e é difícil de ser conseguida, pois é muito complicada. Ao mesmo tempo, essa federalização poderia permitir maior democratização das instâncias e maior responsabilidade também. Se eu dependo, como Prefeito, de um político influente em Brasília no Ministério tal para conseguir tal recurso, não vou ter, evidentemente, aquele sentimento de responsabilidade com a verba que tenho na mão, porque vou contar com a proteção daquele político importante. Isso acontece no meu campo também, no campo da universidade.
Por que até agora a autonomia das universidades federais não foi regulamentada? Porque os senhores reitores acham que o melhor é ter acesso político ao Ministério da Educação, para negociar e receber apoios. Desculpem-me, mas não estou dizendo isso só aqui, já disse em várias entrevistas públicas.
Com isso temos uma má gestão, que corresponde também a um autoritarismo muito grande. É uma situação complicada. Boa parte dos recursos do Estado do Acre são devidos à Universidade Federal do Acre, que é onde está o maior aporte de recursos. Isso acontece no Brasil inteiro. A responsabilidade com a administração tem que supor também autonomia. Essa ditadura perene do Poder Executivo deveria ser questionada.
Quando falam no Brasil de harmonia dos Poderes, a primeira coisa de que eu discordo de muitos políticos importantes, assim como meus colegas e jornalistas, é dessa história de que as instituições brasileiras estão funcionando normalmente. Como pode? O conceito de normalidade não é bem esse. Quando se sofre um empurrão de um lado e de outro e a imposição da força de outro, como fica essa história? Esse é um ponto que precisaria ser muito bem debatido.
Perdoem-me, mas as minhas respostas são um pouco insatisfatórias para a complexidade das perguntas.
Deputado Carlos Sampaio, eu sou contra essa história de foro privilegiado. Em primeiro lugar, não é foro privilegiado, é a famosa prerrogativa de foro. Eu acho que essa universalização deveria ser questionada. Mas me parece que os chefes dos Poderes deveriam ter essa prerrogativa, sim, senhor. É bom lembrar que a inclusão desse elemento veio como tentativa de colocar na Constituição a defesa do exercício público do mandato. Por quê? Porque evidentemente a sociedade civil e a sociedade política vivem em guerra permanente. Se na cadeira da Presidência de um dos Poderes tem uma pessoa que desagrada grupos, setores, evidentemente aquela pessoa vai sofrer um ataque e vai ter que responder.
Mas me parece que o grande erro foi essa universalização. Criou-se uma casta, e não se criou prerrogativa de foro. Por um lado, eu acho que é muito complicado, até do ponto de vista de segurança nacional, tirar a prerrogativa de foro dos chefes dos Poderes, mas, por outro lado, é preciso levar em conta esse problema.
Essa questão que o senhor coloca, do pequeno que não sabe e do grande que sabe, é meio complicada, porque se entra no campo ético e no campo do debate moral, problemas dos mais difíceis da história do pensamento da humanidade. Como se pode aquilatar a percepção da própria culpa? Até onde vai isso?
Há um sistema no Brasil extremamente terrível, o senhor tem toda razão. O sujeito que mete a mão em bilhões do Erário público fica indene, e aquela pessoa que rouba um xampu fica sem olho - esse caso o senhor conhece -, passa 1 ano na cadeia e não tem nenhuma justiça.
Eu acho que é complicado, sim - volto à minha cantilena de pesquisador da ética -, mas é preciso prudência. Prudência não é covardia, todo mundo sabe; prudência é pesar a coisa na sua própria medida, e não numa medida exterior.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Joaquim Passarinho) - Obrigado, professor.
Concedo a palavra ao Dr. Augusto de Arruda Botelho.
O SR. AUGUSTO DE ARRUDA BOTELHO - Deputado Carlos Sampaio, a primeira pergunta, com relação ao foro privilegiado, é uma questão que, de forma bastante honesta, eu debato internamente com frequência. Eu não concordo com a existência do foro privilegiado, mas eu consigo entender quais as justificativas de sua existência. Eu não vou conseguir ser tão taxativo e dizer se sou contra ou a favor.
Acho que esta matéria é extremamente difícil de discutir, porque de fato parece uma excrecência se ter prerrogativa de foro, seja qual for o seu cargo, mas eu consigo entender também que nós vivemos num País de dimensões continentais.
Eu fico pensando naquele Prefeito de uma pequena cidade do interior que tem um problema grave com o promotor dali e que tem problemas políticos de uma pequena Comarca que podem influenciar decisões judiciais e persecuções criminais. Essa pessoa não deveria ter prerrogativa? Não é um privilégio. Eu acho que o termo privilegiado está errado, pois é uma prerrogativa de ser investigado, de ser julgado por um Tribunal um pouco mais isento do que eventualmente uma pequena Comarca, mas acho também que esse sistema produz desequilíbrios evidentes.
Eu não tenho uma forma correta. Não é fácil. Eu não saberia dizer, de forma transparente, se sou contra ou a favor. Eu consigo entender, mas, ao mesmo tempo, causa-me dificuldade a existência disso.
A segunda pergunta é sobre a delação premiada e o eventual incentivo à prática de crimes. É curioso, porque eu sou a voz que prega isso praticamente no deserto hoje em dia. Mais uma vez digo que não sou um crítico do instituto da delação premiada. Eu acho que ele é positivo, que pode ser usado positivamente em vários aspectos, mas a forma como estamos usando a delação premiada no nosso País ultimamente é, sim, um elemento que incentiva a prática de crime.
Digo isso como um exemplo absolutamente público e notório de delatores que fazem delação mais de uma vez. Eu acho que isso é um incentivo para a sociedade pensar: Eu vim aqui, cometi um crime e, com o objeto desse crime, faturei não sei quantos milhões, mas eu faço uma delação premiada e cumpro uma pequena pena. Alguns anos depois, novamente eu sou investigado e novamente eu faço uma delação premiada e devolvo mais uma vez para... A imagem que isso passa à sociedade é uma imagem de impunidade. É justamente o contrário do que a Justiça deveria passar.
Portanto, a forma como a delação vem sendo usada pode, sim, ser um incentivo à prática de crime, infelizmente.
O Deputado Celso Maldaner me fez uma pergunta com relação ao reflexo das dez medidas contra a corrupção para a Advocacia. Acho que vou ser bastante polêmico aqui, mas, se essas dez medidas forem aprovadas, se pensarmos do ponto de vista comercial, vai ser uma maravilha. Vão haver crimes novos; ou seja, mais casos para o advogado e maiores possibilidades de prisão. Com o réu preso, haverá menos recursos. Eu vou ter que trabalhar menos, e isso será uma maravilha! Vou ter mais clientes, trabalhando menos.
Então, do ponto de vista estritamente comercial, essas dez medidas para a Advocacia são boas.
Estou hoje aqui tranquilamente representando o Instituto que eu fundei - sou o atual Conselheiro. Estamos com 370 advogados criminalistas espalhados no Brasil inteiro. Há vários ex-Ministros da Justiça, ex-Secretários de Segurança, ex-Deputados, todos integrantes do Instituto e do Conselho contra uma série dessas medidas.
A postura do Instituto de Defesa do Direito de Defesa, que é uma entidade representativa da Advocacia Criminal no nosso País, é contrária a uma série das dez medidas, mesmo que, numa análise exclusivamente comercial, elas possam ser, do ponto de vista comercial, excelentes para a Advocacia.
Acho que respondi a todos.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Joaquim Passarinho) - Obrigado, Dr. Augusto.
Concedo a palavra ao Deputado Vanderlei Macris. Depois, vou concedê-la ao Deputado Marun novamente.
O SR. DEPUTADO VANDERLEI MACRIS - Presidente Passarinho, gostaria muito de agradecer a presença do Dr. Augusto e do Dr. Roberto e a colaboração à nossa Comissão.
O País vive um momento muito delicado. Temos necessidade de dar respostas a um movimento da sociedade. Esse movimento não é só do Ministério Público mas também da sociedade, que pretende fazer alterações nesse processo de corrupção que vivemos no País hoje, levantado pela Lava-Jato.
Uma das questões que me incomodam bastante é a da morosidade da Justiça. Tenho a impressão de que, quando se demora a aplicar a lei, a impunidade estará presente nesse processo. Essa é uma questão que já foi debatida por vários depoentes. Uma das coisas que se falam é do excesso de recursos que nós temos hoje no nosso sistema jurídico, capaz de levar permanentemente à prescrição de crimes que são cometidos na sociedade.
Muitos dos crimes cometidos que vão à prescrição - tivemos alguns depoimentos dizendo que alguns processos demoraram 10, 12, 15, 20 anos - o foram exatamente porque o excesso de recursos está caracterizado por uma legislação que não contempla a necessidade de uma punição mais rápida, com a garantia, é claro, da defesa, a fim de que todo aquele que cometeu crime seja capaz de poder sentir efetivamente o que aconteceu.
A pergunta que deixo aos dois nobres juristas é esta: quais são os recursos que nós poderíamos prescindir para termos uma Justiça mais rápida na punição de quem cometeu esses atos criminosos?
Outro dia aqui se falou: Agravo do agravo do agravo do agravo. E a coisa vai, vai, vai... Discordo um pouco do Dr. Augusto, porque o advogado precisa, sim, de todas as artimanhas que a legislação e as brechas da Justiça nos permitem para poder fixar o cliente por mais tempo dentro do seu escritório.
Eu sou bacharel em Direito, então tenho liberdade para dizer isso. Trabalhei em cartório durante 10 anos, como funcionário, e conheço muito bem essa lógica. O advogado tem, sim, tranquilidade de, quanto mais brechas tiver a lei e quanto mais recursos forem apresentados na legislação, ver essa possibilidade ser real.
Eu queria a opinião dos senhores sobre quais recursos nós poderíamos prescindir para garantir o apressamento da decisão da punibilidade daquele ato criminoso, mas que não ferissem o direito de defesa da pessoa que está sendo defendida. Esse é um ponto.
Uma das questões também que tenho perguntado a todos os nossos depoentes é sobre a Instituição, no âmbito do Supremo Tribunal Federal, do Superior Tribunal de Justiça, dos Tribunais Regionais Federais, dos Tribunais de Justiça, de Turmas e de Câmaras especializadas e exclusivas em matéria de probidade administrativa.
A proposta que estou fazendo ao Relator, Deputado Onyx Lorenzoni, e à Comissão é no sentido de que possamos ter câmaras especializadas nessa questão da corrupção.
São essas as minhas duas sugestões, sobre as quais eu gostaria de ter a opinião de ambos.
Muito obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Joaquim Passarinho) - Obrigado, Deputado Vanderlei Macris.
Com a palavra o Deputado Carlos Marun.
O SR. DEPUTADO CARLOS MARUN - Eu destaco a visão que tive dos depoimentos dos nobres juristas que enriquecem este debate.
Existe um temor. Vejam bem o momento pelo qual nós estamos passando! O Prof. Roberto Romano em várias considerações, quando colocava objeções ao projeto, até desaconselhando uma aprovação na íntegra do que está proposto, dizendo eu sei que vai ter gritaria - como se o senhor estivesse com medo de ser preso de novo e de passar 1 ano e meio lá sob tortura... Eu sei que vai ter gritaria. O senhor já se colocava em posição de defesa.
O nobre advogado Augusto Botelho, também, quando corajosamente disse que discorda da delação, que a delação tem que ser voluntária, disse: Tomei porrada e quase apanhei no jogo Palmeiras e Corinthians. Meu Deus do céu, nós temos que tomar a decisão que os senhores tomaram, mesmo enfrentando. O bom é jogar para a torcida. O bom é chegar lá e dizer: Mesmo sendo palmeirense, eu sou corintiano. Oba! E há muita gente aqui que gosta disso. Nesta Câmara está cheio de gente assim - se o Corinthians ganhou, bota a camisa desse time nas costas e corre para lá. Mas tem que haver gente que diga que é palmeirense, mesmo no meio de corintiano, para que nós possamos, sim, fazer um projeto equilibrado.
Eu gostaria de ouvir o senhor sobre os pontos que considero positivos. Estou buscando o positivo. Não adianta virem aqui dizer que sou contra; estou buscando o positivo.
O recurso sem efeito suspensivo contra decisão de habeas corpus, que é pleiteada em algum momento nesse projeto pelo Ministério Público, eu penso que é uma posição não panfletária, mas vejo aí até um equilíbrio entre a acusação e a defesa.
Presidente, peço mais um minutinho. Eu me excedi. São três perguntas. Agora é só pergunta, não faço mais considerações.
Em relação ao teste de integridade, pergunto se o Instituto entende... Pela forma cidadã com que se portou aqui o Procurador
Dallagnol, entendendo com humildade que poderia, sim, avaliar, quase admitindo que precisava ser aperfeiçoada essa questão da delação, estou começando a me propor votar favoravelmente, como uma homenagem a isso, nas condições que o senhor colocou: decisão judicial, forte suspeita. Essa está sendo a tendência da minha posição.
Quanto ao enriquecimento ilícito, Dr. Augusto Botelho, eu continuo quase que mandando às favas os princípios, quase que aceitando uma inversão do ônus da prova, quando um servidor aparece rico. Eu quase vejo o cerne maior dessa questão. O servidor público que, em pouco tempo, como num toque de mágica, aparece rico tem que explicar de onde veio o dinheiro.
Eu me posiciono, a princípio, favoravelmente à criminalização do enriquecimento ilícito, à inversão do ônus da prova nessa questão.
O SR. DEPUTADO ONYX LORENZONI - Deputado Marun, eu quero só fazer uma observação conceitual.
O SR. DEPUTADO CARLOS MARUN - Vetou o meu tempo de Líder. (Risos.)
O SR. DEPUTADO ONYX LORENZONI - V.Exa. falou em servidor público. Eu gostaria que falássemos em agente público.
O SR. DEPUTADO CARLOS MARUN - Agente público.
O SR. DEPUTADO ONYX LORENZONI - Porque engloba todo mundo.
O SR. DEPUTADO CARLOS MARUN - Sim, desculpe-me. É agente público.
O SR. DEPUTADO ONYX LORENZONI - Porque é como V.Exa. disse: o Chico e o Francisco.
O SR. DEPUTADO CARLOS MARUN - Chico, Francisco, José, Zé.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Joaquim Passarinho) - Encerre sua fala, Deputado Marun, por favor.
O SR. DEPUTADO CARLOS MARUN - Concluindo, abordo a questão da terceira instância, do triplo grau de jurisdição. Essa redução do triplo para o duplo grau de jurisdição, no meu modo de ver, afronta a Constituição.
Mesmo que possamos soltar foguetes - muitos estão dizendo que isso é positivo; agora o chefe do Ministério Público de São Paulo, e não poderia ser diferente, diz que é positivo -, não seria o caso de estabelecer uma condição ou como está na Constituição, trânsito em julgado? Trânsito em julgado eu entendo que é a partir do momento em que não existe mais recursos que possam efetivamente coroar por êxito a defesa.
Não poderia se estabelecer uma forma em que, com determinado prazo, passassem a sobrestar pauta do Supremo Tribunal Federal casos de condenação pelo segundo grau para que nós mantivéssemos o terceiro grau de jurisdição, mas sem que isso automaticamente significasse um delongar extremo que resultasse na impunidade?
Gostaria de ouvir a opinião dos senhores sobre essas questões.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Joaquim Passarinho) - Muito obrigado, Deputado Carlos Marun, que ficou mal-acostumado com o tempo do PMDB, que sempre é muito grande. (Riso.)
Tem a palavra o Deputado Domingos Sávio.
O SR. DEPUTADO DOMINGOS SÁVIO - Sr. Presidente Deputado Joaquim Passarinho; prezado amigo, nobre Relator Deputado Onyx Lorenzoni; Dr. Roberto Romano, ilustre professor; prezado Dr. Augusto Arruda; colegas Parlamentares, estive ainda agora, numa Comissão Especial do Congresso Nacional, tratando de uma medida provisória, passei pelo plenário. Começamos a segunda-feira com várias atividades.
Mas não abriria mão de estar aqui - tenho procurado estar em todas as reuniões -, para reiterar o nosso compromisso de que nós podemos avançar na aprovação de um projeto que, de fato, dê ao País, não apenas a sensação, mas efetivamente medidas duras de combate à corrupção, de busca da valorização daqueles que estão na vida pública, seja como agentes públicos eleitos, seja como servidores públicos, com o compromisso de cumprir uma missão de vida, uma carreira digna e sóbria.
Que o povo brasileiro possa voltar a acreditar, a confiar, até mesmo, eu diria, por que não, a valorizar tanto a figura tanto dos servidores públicos como a de seus representantes! Isso é a essência da democracia. Para tanto, é preciso separar o joio do trigo e acabar com a impunidade. Eu tenho ouvido isso de todos os colegas.
Eu disse isso aqui inúmeras vezes, Sr. Presidente, quando tentamos debater o assunto. Foi isso que fiz aqui na última reunião, dizendo, por exemplo, que acredito que se pode aprimorar a redação do art. 1º - logo do art. 1º - quando trata de descrever o enriquecimento ilícito. Após uma vírgula, coloca-se que aquele patrimônio adquirido, ainda que licitamente... Confundindo isso com enriquecimento ilícito. Cheguei a dizer que, no mínimo, isso não é uma redação muito feliz, pois pode levar o magistrado, a quem caberá interpretar a lei, a mais de uma interpretação. Ora, se assim for feita a lei, ela, ao invés de servir à justiça, pode ser um pressuposto para a injustiça. Isso é tão elementar.
Depois falei inclusive sobre essa questão do teste de integridade, que é algo com que também precisamos ter atenção, principalmente para termos segurança de quem haveria de aplicá-lo, já que não podemos trazer Deus aqui na Terra todas as vezes que os homens falharem, para que Deus se faça presente e diga que de fato este é íntegro, este não é.
Se alguém será submetido ao teste de integridade, quem estará com a missão de submeter este alguém ao teste precisará observar uma série de critérios, que me pareceu que não estão muito claros.
Daí por que eu ter dito que, se não observarmos o cuidado do direito de defesa, se não observarmos os princípios elementares do Estado Democrático de Direito, poderíamos, ao estar aprovando uma lei para endurecer contra a corrupção - que eu defendo, que sinto que é voz comum, que eu diria que é consenso -, enveredar para o risco de voltar à Idade Media, de fazer uma caça às bruxas. Tão somente isso eu disse.
Qual a manchete, alguns minutos depois, de um jornal que eu respeito muito - e que vou citar, porque liguei duas vezes pedindo que procurassem reestabelecer a verdade, e não o fizeram -, O Estadão? O jornal coloca na sua página: Deputado Domingos Sávio diz que, se aprovada a lei, será a volta à Idade Media. Não foi isso que eu disse. Eu disse que, se aprovada na íntegra, correríamos o risco, precisaríamos debater. Eu já recebi milhares de e-mails. Dizem: Quer dizer que você é contra? Mentira, falácia, desserviço à Nação!
Assisti a um dos canais mais assistidos do telejornalismo, e não estou aqui a fazer propaganda, até porque seria antipropaganda, a GloboNews. Mas não culpo a GloboNews. Lá estava uma Procuradora, parece-me que federal, em exercício no Estado de São Paulo, pelo que creio, debatendo com o Presidente do Instituto de Defesa do Direito de Defesa. Qual a minha surpresa quando ela afirma categoricamente, conhecedora de tudo - Promotora, acima do bem e do mal, fala por todos e nivela todos na sua régua: Os Deputados da Comissão Especial que analisa o projeto de medidas contra a corrupção são contra o aumento da pena sobre o crime de corrupção. De onde ela tirou isso?
O que o Ministério Público, ou melhor, o que alguns elementos - para não cair no mesmo erro dela - que vão falar em nome do Ministério Público em grandes veículos de comunicação do Brasil pretendem com esse tipo de achincalhe ao Parlamento brasileiro? Isso é achincalhe ao Parlamento brasileiro!
Querem de fato aprovar um projeto de lei anticorrupção achincalhando o Parlamento? O que querem alguns desses profissionais de imprensa, alguns, achincalhando aqueles que querem debater o projeto? Querem de fato, então, aprovar alguma lei anticorrupção ou fazer sensacionalismo?
É esse o tipo de profissional que devemos defender, como defendo a livre imprensa? Não, esse tipo de profissional que falta com a verdade não merece o nosso respeito. Eu não disse, em momento algum aqui, que seria contra o projeto. Pelo contrário, disse e estou insistindo: Sou profundamente a favor.
Assinei nas ruas, assinei aqui dentro da Casa, ao lado do Deputado Onyx, citei inclusive os colegas. Creio que todos que estão nesta Comissão, com certeza a ampla maioria, registramos aqui na Casa o desejo de prioridade. Pedi que eu estivesse nesta Comissão para defender o projeto, mas não para defendê-lo como alguém que não seja capaz de debatê-lo, senão eu não mereceria estar aqui representando o povo de Minas Gerais.
Se eu não tivesse coragem de levantar a minha voz contra esses que se colocam como paladinos da justiça e da verdade para aparecer nas redes sociais e para achincalhar pessoas, eu também não mereceria estar aqui.
Alto lá, portanto, com essa campanha de querer levar a rodo e dizer: Aprove na íntegra, porque, se não for na íntegra, você também faz parte daqueles que são corruptos. Ora, isso é um achincalhe à verdadeira democracia, isso é um despreparo por parte daqueles que se dizem defensores da moral e da ética, é um absoluto despreparo!
Falo isso na presença de alguém que respeito profundamente, Prof. Roberto Romano. Não creio que queira que nós aqui nos curvemos a um projeto que, por melhor que seja, pode e deve ser aprimorado.
Portanto, é esta a minha posição, Sr. Presidente. Estarei aqui para debater cada artigo, cada vírgula, para aprimorar o projeto e principalmente para não deixar que amoleça, para que seja duro contra a corrupção e funcione, porque, se ele for inconstitucional, de nada valerá.
Obrigado, Sr. Presidente.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Onyx Lorenzoni) - Obrigado, Deputado Domingos Sávio.
Vou passar a palavra aos nossos dois debatedores para as suas necessárias e convenientes respostas.
(Intervenção fora do microfone. Inaudível.)
O SR. PRESIDENTE (Deputado Onyx Lorenzoni) - Sim, nós já sabemos, Deputado, e o Brasil também já descobriu pela Internet. (Riso.)
O Presidente me sinaliza que é para pedir aos nossos dois convidados que, ao responderem, já façam suas considerações finais, em virtude do adiantado da hora.
O SR. ROBERTO ROMANO - Bom, quanto à questão do Deputado Vanderlei Macris, eu acho que nós temos um problema de estrutura das nossas Cortes de Justiça. Essa história de o STF ser tudo e não ser nada, tribunal constitucional e não sei o que mais, toda essa pletora de missões dadas ao STF, as quais ele vai assumindo, e muitas vezes gostosamente...
Por exemplo, é bom lembrar que a cláusula de barreira que existia etc. eles...
(Intervenção fora do microfone. Inaudível.)
O SR. ROBERTO ROMANO - É um desserviço.
Essa é uma questão que precisaria ser discutida, sobretudo, pelos legisladores brasileiros. Quer dizer, não vejo nenhum tribunal supremo do mundo que tenha tantas prerrogativas e tantas competências. É preciso decidir se ele é, por exemplo, um tribunal constitucional. Sabemos que, enquanto nós não decidirmos isso, essa história do recurso à Santíssima Trindade vai continuar. Isso é o que eu penso.
Deputado Carlos Marun, os pontos que o senhor coloca são positivos, sim. Agora, a minha pergunta, muito modesta, é a seguinte. Se um cidadão comum não presta contas de mil reais na sua Declaração do Imposto sobre a Renda, a Receita Federal é célere em lhe aplicar multa e exigir prestação. O que fez a Receita Federal nesses últimos anos no Brasil? Perdoe-me: Lava-Jato, mensalão, não sei o que mais. O que foi feito por ela? Ela colocou uma venda, como a Justiça? O que aconteceu? Os computadores que detectam mil reais do contribuinte pobre não viram bilhões?
Essa é uma questão que, também, nós podemos levar para o Tribunal Eleitoral. A prestação de contas é legal, mas não era legal. Então, escute: que fiscalização é essa que está ocorrendo? Esse é um ponto que me parece que deve...
O SR. DEPUTADO CARLOS MARUN - Mas o senhor está se referindo a qual das minhas colocações?
O SR. ROBERTO ROMANO - O senhor indicou pontos positivos e chegou à questão do Ministério Público Federal e dessa impunidade, dessa coisa que não continua, quer dizer, essa detecção dos erros. O senhor voltou à questão da instância, inclusive.
O SR. DEPUTADO CARLOS MARUN - A da terceira instância.
O SR. ROBERTO ROMANO - A da terceira instância. Eu não vejo assim tanto problema, se não se enxergar a função da Receita Federal no seu sentido exato.
O SR. DEPUTADO CARLOS MARUN - Eu acho que o senhor não entendeu a minha pergunta. Eu não me referi ao (inaudível.)
O SR. ROBERTO ROMANO - Não, mas eu estou falando que, nessa linha, nós temos que levar em conta isso, sim.
Eu sou da época da ditadura, de quando foi criado o Serviço Federal de Processamento de Dados - SERPRO. E o pessoal que era da minha linha de esquerda dizia que era o big brother que estava chegando e tal. O big brother parece que é caolho, não é? Ele vê mil reais, mas não vê 1 bilhão. Então, alguma coisa está acontecendo.
Concordo, praticamente, in totum com o Deputado Domingos Sávio, porque, como eu disse anteriormente, não posso aceitar que existam tutores da cidadania. Não existem tutores da cidadania. Os senhores são representantes do povo soberano, mas os senhores não são tutores da cidadania, como o Ministério Público, também, não é. Esse é um ponto que me parece importante.
O Deputado Marun disse que eu fico um pouco intimidado com isso. Não. Eu tenho um preceito ético que acho que é interessante. Eu sigo os cínicos. Eu acho que os cínicos são os filósofos mais éticos da história da Filosofia.
Diógenes, o cínico, dizia o seguinte: Quando eu digo alguma coisa e a multidão aplaude, é porque alguma bobagem eu falei. Quer dizer, quando só se recebe elogio, tem-se que dizer coisas que suscitam o debate, suscitam críticas, etc. O nível das críticas, na sociedade civil brasileira, desceu muito. Se o indivíduo não reza com Francisco, é inimigo de Francisco e tem que ser caluniado, destruído, etc. Isso é um defeito de todas as ideologias que existem no Brasil e de todos os partidos políticos. Perdoem-me.
Então, alguém, velho como eu, que defende a autonomia do pensamento só pode ter problema, não é? Não é que eu tenha medo do Ministério Público, mas acho que, volto à questão, é preciso prudência na elaboração das leis, porque leis excelentes podem se tornar extremamente nocivas, mudando os agentes que definem o poder. O poder é efêmero, nós sabemos disso. Há 4 meses nós tínhamos uma Presidente, talvez não a tenhamos. Não existe partido que possa se arrogar como dono do Estado, sempre. E, se é democrático, deve mudar. Então, nessas leis tem que se levar em conta, sempre, os operadores do Estado: quem está manipulando o Poder Executivo, o Poder Legislativo e o Judiciário.
É o que eu tenho a dizer.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Joaquim Passarinho) - Muito obrigado, Prof. Roberto. Só discordo da situação de velho. Mais experiente pode ser, mas velho não.
Com a palavra o Sr. Augusto Botelho.
O SR. AUGUSTO DE ARRUDA BOTELHO - Deputado Vanderlei Macris, eu concordo integralmente com essa conclusão de que a morosidade na Justiça causa uma sensação enorme de impunidade. Eu acho que o processo justo é um processo rápido, se respeitados todos os direitos e garantias fundamentais. A morosidade é o principal fator que causa a sensação de impunidade. Eu concordo plenamente. Eu só não concordo, como já defendi aqui, e vou reiterar, com as causas geralmente aplicadas ao porquê dessa morosidade. Eu não vejo, com raríssimas exceções... Um ou dois recursos realmente não servem para nada, no Código de Processo, como carta testemunhável, que ninguém usa. Mas, nas propostas apresentadas pelo Ministério Público, em que eles preveem a retirada de uma série de recursos, não há um deles que eu acho que seja desnecessário, que seja protelatório ou que tenha que ser extirpado a fórceps do nosso Código de Processo Penal.
Eu acho que não é a solução para a morosidade da Justiça a supressão de recursos. Volto a dizer: a solução para uma Justiça mais rápida é investimento na Justiça. Nós precisamos de mais juízes, mais promotores, mais defensores públicos, mais comarcas, justiças especializadas, varas especializadas em crimes financeiros, em crimes de corrupção, mais ministros do STJ. Nós precisamos gastar mais com a Justiça. Essa é a verdade.
Nós somos um país, é verdade, altamente litigioso; temos milhões e milhões de processos, e os juízes não conseguem julgar. Volto a dizer: se colocarmos numa linha do tempo os cinco processos criminais mais notórios, que são sempre utilizados por todos para mostrar que a Justiça é lenta, vamos ver que o que demora é o julgamento. Ah, mas você entrou com recurso. Bom, entrou com recurso, porque o recurso é válido. Há um pedido válido a ser feito, há um pedido válido, seja do Ministério Público ou não.
Há uma série de recursos que o Ministério Público também apresenta. O próprio Ministério Público coloca aqui que é um recurso apresentado pela defesa. Vamos pegar como exemplo o caso Pimenta Neves, que é um caso emblemático. Uma série de recursos o MP apresentou. O MP está querendo protelar o julgamento final? Não está. Se o MP acha que tem uma tese favorável à acusação, ele tem que entrar com essa tese. Assim como, se a defesa acha que tem uma tese favorável, tem que entrar com o recurso. O problema é que ele demora para ser julgado. O problema não é o recurso em si; é a demora no julgamento. Por isso uma das propostas do Ministério Público, que eu acho extremamente importante, é a que regulamenta a questão de quanto tempo um ministro, um desembargador ou um juiz pode ficar sentado, com o perdão da palavra, em cima de um processo, sem julgar.
Então, para dar celeridade à Justiça, há outras formas menos gravosas. Nós não precisamos suprimir recursos, não precisamos suprimir direitos para tornar a Justiça menos lenta. Nós precisamos investir na Justiça. Mas concordo que essa morosidade é a maior causa da sensação de impunidade.
Deputado Marun, eu ainda vou tentar convencer o senhor, no caso do enriquecimento ilícito, sobre a questão da inversão do ônus da prova. Sabe qual é o programa que eu vejo? Eu até consigo, numa primeira leitura, ser um pouco simpático à construção que o Ministério Público Federal fez, mas o meu problema - e eu vou usar uma expressão bem popular - é abrir a porteira. Vamos abrir a porteira para inverter o ônus da prova, no caso do enriquecimento ilícito. Para o que vamos abrir a porteira depois? Essa pequena flexibilização de direitos e garantias fundamentais que, numa primeira análise, não são assim tão importantes - apesar de esse ser um direito absolutamente importante, o do ônus da prova, a quem cabe provar -, essa pequena flexibilização, que, às vezes, passa despercebida numa primeira análise, num segundo momento onde vai ser utilizada?
Então, eu consigo entender, mais uma vez, a construção lógica do Ministério Público ao propor a criminalização do enriquecimento ilícito, mas ainda vejo com preocupação a inversão do ônus da prova, porque isso pode ser usado em outras hipóteses que não essa.
Com relação à execução provisória da pena, e falo isso de forma bastante tranquila, triste modificação da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, acho que essa guinada na jurisprudência do Supremo, que, sem qualquer constrangimento, eu posso dizer, rasgou a Constituição ao tirar o trânsito em julgado como essencial para o cumprimento da pena, foi uma decisão de que os próprios Ministros do Supremo hoje se arrependem. E eu acredito que os recursos apresentados a essa decisão vão ter um resultado favorável. O Supremo vai revisar e vai voltar a jurisprudência anterior.
Mas ela é um reflexo de um sistema e de uma sociedade altamente punitivista que nós estamos vivendo, e é natural que isso aconteça. Nós olhamos todos os dias bilhões desviados, crimes gravíssimos acontecendo, e é natural que a sociedade pense sempre na pena mais alta, na supressão de recursos e no cumprimento de uma pena rápida, mas escolheram a pior forma. Executar uma pena antes do trânsito em julgado é jogar no lixo a presunção de inocência, é, sob o falso pretexto de colocar 1, 2, 10 ou 15 na cadeia, esquecer uma vasta parte da nossa população carcerária que tem direitos a serem defendidos, tem recursos que ainda podem ser apresentados.
O Ministro Barroso se utilizou de uma estatística de quantos recursos que chegavam ao Supremo tinham a decisão revista. Falar em Justiça Criminal e falar de estatística é uma coisa um pouco complicada. Se um inocente, uma pessoa ficar um dia a mais preso por causa de uma decisão como essa, a decisão está errada. A decisão tem que ser revista.
O SR. DEPUTADO ONYX LORENZONI - Eu quero aproveitar e fazer uma pergunta.
O SR. AUGUSTO DE ARRUDA BOTELHO - Claro.
O SR. DEPUTADO ONYX LORENZONI - A tese do enriquecimento ilícito criminalizado sem inversão do ônus da prova...
O SR. AUGUSTO DE ARRUDA BOTELHO - Eu parto da premissa de um crime sem inversão de nada. Mas eu acho bem melhor.
O SR. DEPUTADO ONYX LORENZONI - É que eu preciso fazer essa pergunta como Relator, para que haja representação.
O SR. AUGUSTO DE ARRUDA BOTELHO - Sem inversão do ônus da prova, ela melhora bastante.
Eu queria só finalizar, primeiro, agradecendo a oportunidade desse debate, que foi extremamente importante. Agradeço ao Prof. Roberto e a todos os Deputados o convite. Acho que aprendi bastante aqui hoje também com a importância do tema. E digo, de forma bastante tranquila, que o IDDD e a advocacia criminal como um todo estamos sofrendo bastante ultimamente, porque confundem muitas vezes o cliente com o advogado criminal. E costumam dizer que nós advogados criminalistas, com as nossas teses, somos aliados da impunidade, que o que queremos é a prescrição dos casos, é a liberdade de nossos clientes.
Na verdade, senhores, o combate à criminalidade, seja de colarinho branco, seja a criminalidade comum, é interesse de todos, é absolutamente essencial para qualquer Estado Democrático de Direito. Mas esse combate ao crime, seja de corrupção, tráfico de drogas, furto, estelionato, qualquer que seja o crime, deve ser pautado sempre no estrito e na observância total dos preceitos constitucionais que a duras penas nós conseguimos ver aprovados no nosso País.
Não há crime grave o suficiente que justifique o atropelo da lei. Não há escândalo grave o suficiente que justifique uma modificação drástica e dramática na jurisprudência. Não há desvio de bilhões que justifique uma série dessas medidas propostas pelo Ministério Público Federal que rasgam os códigos, fazem alterações gravíssimas no Código de Processo Penal e na nossa Constituição.
O Ministro Marco Aurélio tem uma frase que eu acho muito interessante: o respeito às leis, no combate ao crime, é um preço muito barato que se paga por se viver num Estado Democrático de Direito. E eu gostaria que a construção do nosso futuro, no combate ao crime, fosse sempre pautada por isso.
Agradeço a atenção de todos. Obrigado, mais uma vez.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Joaquim Passarinho) - Muito obrigado, Dr. Augusto Botelho. Eu só queria, se puder, assim como o Dr. Roberto Romano mandou por escrito, que nos trouxesse alguma coisa por escrito. E há também a colocação do Deputado Macris, com a qual eu concordo.
O SR. DEPUTADO VANDERLEI MACRIS - Se pudessem mandar por escrito a opinião sobre a questão das Câmaras Especializadas.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Joaquim Passarinho) - E também dos prazos, os recursos, possibilidade de recursos e embargos, porque, como foi dito até por V.Exa., se se demora tanto no Judiciário para julgar, a cada embargo, a cada coisa, é mais um julgamento, é mais uma procrastinação.
O SR. DEPUTADO DOMINGOS SÁVIO - Eu já verifiquei com o nobre Relator, mas só confirmando, Presidente, que eu acho que é importante nesta fase nós, regimentalmente, usarmos as prerrogativas de apresentar ao nobre Relator as nossas sugestões de emendas, porque esse é o verdadeiro sentido do processo legislativo. E espero, já na próxima reunião, trazer ao Relator algumas sugestões que busquem, nessa linha que eu disse, o aperfeiçoamento do texto, sem contudo diminuir o compromisso de sermos duros contra a corrupção, obviamente sem transigir nos princípios essenciais do respeito à nossa Constituição, do respeito ao direito de defesa, do respeito à dignidade humana. É perfeitamente possível fazer isso, combater a corrupção, preservando os princípios elementares da democracia. E é isso que nós haveremos de conseguir com esse relatório.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Joaquim Passarinho) - Muito obrigado, Deputado Domingos Sávio.
E todos os Deputados e Deputadas, se quiserem apresentar as suas propostas antecipadamente, saibam que isso ajuda o Relator, ajuda a construir esse novo relatório com a participação de cada um.
O SR. DEPUTADO ONYX LORENZONI - Ajuda, e muito.
Eu quero fazer uma homenagem aqui ao Prof. Romano dizendo o seguinte: o relatório que nós vamos construir será prudente, mas firme no combate à corrupção.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Joaquim Passarinho) - Gostaria de agradecer mais uma vez a presença dos senhores expositores, o Dr. Augusto Botelho, o Prof. Roberto Romano, e a todos os que acompanharam esta audiência, a todos os funcionários da Comissão, aos nossos assessores da Consultoria Legislativa. Muito obrigado pelo acompanhamento desta reunião.
Nada mais havendo a tratar, convoco os senhores membros para a reunião ordinária de amanhã, às 9h30min, no Plenário 9 deste Anexo, para mais uma rodada de audiências.
Muito obrigado.
Está encerrada a presente reunião.