Reflexões sobre o STF
(*) Roberto Romano da Silva
Correio Popular de Campinas
Retomo as análises sobre o
STF. O artigo anterior ao desastre Renan Calheiros, sobre o tribunal
supremo, recordou as teses de Francis Bacon, um dos maiores pensadores e
estadistas da modernidade. Como temos fartura de tudo, menos de
estadistas, sigo na companhia de Bacon. Para ele, os juízes devem
exercer autoridade no Estado, mas não de modo a enfraquecer o poder
público. Eles devem ser como “leões sob o trono”, nos enunciados do
ensaio “Sobre a judicatura”. Mas nem por isso deixam a essência leonina.
No tribunal, os juízes promovem a certeza na aplicação da lei, agem
como intermediários entre o poder soberano e os indivíduos privados,
esclarecem antigas leis, excercem grande poder no Estado e na sociedade.
Os juízes devem recordar que seu ofício é “jus dicere” e não “jus dare”, interpretar e não fazer a lei. Eles devem ser mais ilustrados do que inteligentes, mais respeitáveis do que plausíveis e mais desconfiados do que confidentes. O dever do juiz é suprimir a força e a fraude, pois a força é mais perniciosa se aberta e a fraude quando oculta. Os juízes devem se acautelar contra as construções sistemáticas e inferências, pois não existe tortura pior do que a das leis. No campo penal eles devem ter muito cuidado. Paciência e gravidade nas audiências são necessárias. O juiz gárrulo é címbalo desajustado. São quatro as partes do juiz nas audiências: dirigir tudo para obter provas, moderar a extensão, a repetição, a impertinência da fala. Recapitular, selecionar e citar o que foi dito. E redigir a sentença. Tudo o que estiver além disso é demasiado e procede da glória, do comichão de falar, da impaciência em ouvir, memória curta, parca atenção.
Os juízes devem recordar que seu ofício é “jus dicere” e não “jus dare”, interpretar e não fazer a lei. Eles devem ser mais ilustrados do que inteligentes, mais respeitáveis do que plausíveis e mais desconfiados do que confidentes. O dever do juiz é suprimir a força e a fraude, pois a força é mais perniciosa se aberta e a fraude quando oculta. Os juízes devem se acautelar contra as construções sistemáticas e inferências, pois não existe tortura pior do que a das leis. No campo penal eles devem ter muito cuidado. Paciência e gravidade nas audiências são necessárias. O juiz gárrulo é címbalo desajustado. São quatro as partes do juiz nas audiências: dirigir tudo para obter provas, moderar a extensão, a repetição, a impertinência da fala. Recapitular, selecionar e citar o que foi dito. E redigir a sentença. Tudo o que estiver além disso é demasiado e procede da glória, do comichão de falar, da impaciência em ouvir, memória curta, parca atenção.
Bacon afirma que os juízes
devem “recordar as Doze Tábuas Romanas, o preceito de que “Salus populi
suprema lex” e saber que leis, exceto quando voltadas para aquele fim,
são capciosas, oráculos pouco inspirados. É bom para o Estado que os
reis e estamentos consultem com freqüência os juízes. E também que os
juízes consultem com o rei e estamentos com a mesma freqüência. (…)
porque muitas vezes as coisas conduzidas a juízo ligam-se ao “meum” e
“tuum”, quando a razão e a conseqüência interessam ao Estado. (…)
Recordem os juízes que o trono de Salomão era sustentado por leões nos
dois lados. Deixemos que eles sejam leões, mas sob o trono, tendo
certeza de que nada discutam ou oponham à soberania.O juízes (…)
precisam recordar o que diz o Apóstolo de uma lei maior do que as deles :
Nos “scimus quia lex bona est”, modo quis ea utatur legitime (sabemos
que a lei é boa, desde que usada por alguém com legitimidade)”.
(Agostinho, Confissões, 12, 18, onde é citada a Primeira Epistola a
Timóteo, 1.4-9)
Os juízes garantem o direito e
a obediência às leis. Mas sua independência é limitada pelo soberano. E
o que é a lei do soberano? A resposta mais direta encontra-se em
Hobbes, secretário de Bacon e tradutor para o latim dos Ensaios
baconianos. “Lex est mandatum eius personæ (sive hominis, sive curiæ)
cuius præceptum continet obedientiae rationem” (“Lei é o mandamento
daquela pessoa, homem ou assembléia, cujos preceitos exigem a
obediência”, De cive, XIV, 1. Desnecessário dizer a importância dessa
tese hobbesiana para se pensar a difícil independência dos juízes.
Enquanto “a lei natural é imediata em nós, pois conhecemos o mandamento
divino em nossa razão, a lei civil é mediada pelo conjunto de regras com
as quais a comunidade, por escrito ou oralmente, ou qualquer outro
sinal adequado (signum idoneum) de sua vontade, comanda o uso da vontade
para distinguir o certo do errado, o contrário à regra do que não é
contrário”. (Leviatã) Só a Commonwealth pode editar leis civis. O
soberano é o único legislador, não submetido às mesmas leis civis. Essa
tese é de Bacon, cuja tese é a de que a lei depende do soberano, uma
posição contraria à de Ed. Coke, para quem a Common Law é suprema.
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