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quarta-feira, 3 de outubro de 2018

Uma reflexão sobre a censura e o mando teológico-político. Roberto Romano


Uma reflexão sobre a censura e o mando teológico-político.
Roberto Romano


Nos escritos que dedicou à teologia política Carl Schmitt resume a passagem do religioso ao civil no campo da soberania. Os enunciados mais férteis da moderna doutrina do Estado “são conceitos teológicos secularizados”. O autor expõe, para quem não os percebe, os elos entre o mando transcendente e o movido na finitude. Não apenas no desenvolvimento histórico existe continuidade entre planos teológicos e políticos. É verdade, muitos se habituaram à imagem do ser divino onipotente e ao também onipotente legislador. Para além dos símiles haveria segundo Schmitt, nas duas formas de pensar e agir, algo do sistema que as reúne. E tal estrutura é necessária para entender a base sociológica de ambas. Schmitt adianta outro paradoxo que assusta quem se acostumou em demasia ao campo laico do direito estatal, sem perceber os nexos que o prendem ao religioso. “O estado de exceção tem para a jurisprudência um significado análogo ao milagre para a teologia”. (Der Ausnahmezustand hat für die Jurisprudenz eine analoge Bedeutung wie das Wunder für die Theologie). ([1])


A filosofia do Estado moderno, coetânea do deísmo (o famoso deus relojoeiro exaltado por Voltaire e outros integrantes da Luzes (o divino relojoeiro em Voltaire e seus próximos) ([2]) no qual o milagre está excluído, bem como a violação das leis naturais. O estado de exceção corresponde ao ato direto do soberano, também excluído no Estado de direito. Os pensadores da Contra revolução (De Maistre, De Bonald, Donoso Cortés sobretudo), tentaram mudar a lógica do mecanismo institucional cujo horizonte era o deísmo. Schmitt recorda que desde seus primeiros textos como jurista,  examina as analogias entre direito e teologia. ([3]) Para buscar um pensamento que desse aval à recusa do direito e imagens mecânicas, Schmitt recorda Leibniz, na Nova Methodus. Naquele escrito o filósofo afasta a jurisprudência da medicina e matemática, sublinha sua proximidade com a teologia. Esta última tem com a jurisprudência a qualidade da ratio e da Escritura, livro com revelações e leis positivas. Em resumo, diz Schmitt, “a ´onipotência´ do legislador moderno, sobre a qual lemos em todos os manuais de direito estatal, não deriva apenas da teologia nos termos técnicos. De fato, mesmo nas particularidades singulares da argumentação jurídica afloram reminiscências teológicas”. ([4])

Me permito transcrever um trecho de trabalho anterior sobre o jurista, porque ele poupa novas incursões no seu pensamento. “A escrita de Schmitt busca compreender a política, tanto em sua natureza quando na sua significação. É o que ele indica como "o político". Após grande número de textos, porque ler hoje em dia O Catolicismo Romano e Forma Política, um ensaio de 1923? Desde logo, precisamos nos referir ao livro fundamental de Schmitt sobre as duas pontas ideológicas, o liberalismo e o socialismo, pois elas tecem a estrutura de A Ditadura em 1921. Ali, diante do remédio amargo contra o poder ordinário do Estado moderno, a ditadura, ele estuda as mais variadas formas daquela função, da Idade Média a Maquiavel, deste aos jacobinos e ao pensamento de Lenine sobre a ditadura do proletariado. Na estrutura argumentativa de A Ditadura está uma análise arguta do poder pontifício que instaura a moderna Igreja, na qual os poderes mais baixos perderam a propriedade dos meios de salvação e governo no organismo religioso. Schmitt aproveita a explicação de Max Weber sobre o nascimento e reforço do poder central, na Igreja, em privilégio da Santa Sé e do Papa e em detrimento dos bispos, abades, nobreza dona de igrejas e conventos. Trata-se da famosa noção de Trennung entre o indivíduo que exerce um cargo e os próprios meios daquele cargo. Como sabemos, Weber retira a noção de Marx, onde o operário e os meios de trabalho são separados no capitalismo nascente. Assim como o operário é despossuído dos meios de trabalho (da terra aos utensílios, máquinas), também, pensa Weber, o funcionário do Estado é despossuído da posse dos meios de administração (e na Igreja, administração e salvação). Ao analisar a pessoa do legado papal, Schmitt mostra o que, para ele, significa representação. O legado representa o Sumo Pontífice, como se fosse realmente uma sua encarnação. Numa visita do legado às dioceses, não importa se ele é um simples padre e o visitado é cardeal ou arcebispo. Ele representa o poder do Papa, sem contestação. Pequena lembrança que recorda o peso de A Ditadura no escrito intitulado Catolicismo Romano e Forma Política, e vice-versa”.

Para alguns comentadores a pressuposição de Schmitt, no Catolicismo Romano, é que os Estados soberanos, “cuja origem residiria nos séculos 16 e 17, e nos quais temos as bases do ius publicum Europaeum, com uma lei internacional europocêntrica, começam a declinar no fim do século 19.

Tal forma de Estado seria um dos principais agentes da secularização e do racionalismo. Aqui, podemos resumir uma longa e tortuosa história, que joga suas raízes nas emboscadas de Felipe o Belo contra o Papa, sendo seguido por outros monarcas como Henrique I, da Inglaterra. A luta anterior pela soberania legítima, no fim da Idade Média, teve como emblema os dois sinais do poder. Tanto o rei quanto o papa disputaram as almas e os corpos, exigiram a espada para a sua soberania que, por sua vez, recebeu o nome jurídico de plenitudo potestatis, superlativa auctoritas, plenaria potestas, summa potestas, etc. Com a premissa de que a sociedade seria inteiramente cristã — a Respublica christiana — o coletivo resumia-se à comunhão religiosa, em especial nos cargos dirigentes. Como os reis cristãos tinham dignidade eclesiástica, sobretudo após instaurada a sagração dos reis franceses em 751 por Pepino o Breve — cerimônia que se espalhou pela Europa — eles deveriam seguir as ordens do papa. A sagração deixava bem clara esta dependência do rei ao pontífice nas próprias roupas que ele envergava cerimonialmente: a túnica do subdiácono, a dalmática do diácono e a casula do presbítero. O rei estava na Igreja, mas não era superior ao Corpus mysticum. Ele recebia um anel semelhante ao episcopal, mas isto não significava que seu elo com a Ecclesia era semelhante ao do bispo e do papa. Estes últimos, na ordenação, tornavam-se esposos da comunidade, o que explica a fórmula segundo a qual ´o bispo está na Igreja e a Igreja está no bispo´”.([5])


De modo consequente, Schmitt indica a passagem da ordem religiosa para a laica mostrando, na última, fundamentos não raro confessados do velho paradigma católico. ([6]) Não pretendo aqui examinar os pontos heurísticos expostos pelo jurista. Mas sublinho o fato, no meu entender difícil de negar, da continuidade entre práticas da Ecclesia semper reformanda e do Estado moderno, sobretudo num ponto essencial para a cultura e a democracia. estou me referindo à questão da censura, tal como ela passa do complexio oppositorum romano ao mundo do poder civil. A censura é um modo peculiar, usado pela Igreja e pelo Estado, de assumir uma decisão capital: afastar dos governados certos assuntos graves para a conservação do poder e impedir que os cidadãos enunciem fatos e doutrinas com a mesma força de periculosidade para a dominação política. Em tal sentido, a censura entra diretamente no plano dos arcana imperii, essenciais na razão de Estado.
Não erra quem aponta a Igreja Católica como raiz da sociedade brasileira. Muitos bens dela herdamos, males sem conta lhe devemos. Herança negativa é nossa tíbia acomodação à censura que incide sobre a ordem ética, política, científica. O Estado absolutista português teve o privilégio de interferir na política religiosa com o Padroado. Mas não seguiu em plenitude –salvo no governo Pombal– a via do poder laico, cujo esteio está nas ciências, artes e técnicas. ([7]) O contrário ocorre em outros países. Na França, a Bibliothèque Mazarine se organiza sob Gabriel Naudé,  autor das Considerações Políticas sobre o Golpe de Estado. ([8]) Ele ajudou os cardeais que definiram o sistema estatal, imitado em países europeus. Richelieu usa o saber erudito exposto por Naudé e segue em grandes linhas a tese de Bacon : “knowledge and power meet in one”. A ciência é base da moderna soberania, ao contrário das tradições, formas religiosas, etc. Também na Inglaterra: mesmo o que hoje se conhece como puritanismo entra no movimento da Renascença nutrida por Maquiavel, numa atitude messiânica que aposta nas tecnologias. O mote para tal modo de pensar e agir pode ser resumido na profecia de Daniel : “Muitos correram daqui para alí e o conhecimento foi aumentado”. ([9]) A busca dos novos saberes na reforma baconiana do ensino foi recusada por Cambridge e Oxford. Mas ela moldou controle político na Inglaterra e colônias norte-americanas. ([10]) No século 17 francês, seguindo a lição maquiavélica e baconiana, Gabriel Naudé amplia bibliotecas e arquivos,  pesquisa matemática, estatística, mecânica, optica e outros ramos da investigação, pontos sempre em debate público e acadêmico, essenciais numa cultura de pesquisa científica, artística, política. ([11])
No Brasil, desde 1500,  os requisitos para as técnicas são proibidos, livros, laboratórios, fábricas, negados pelas autoridades civis e religiosas. Após  quase dois séculos de suposta independência, ainda  não temos o conhecimento que faria nosso país obter relevância mundial. ([12]) Em décadas do século 20 a industrialização foi dinamizada pelo trabalho científico, o qual engendrou uma extensa rede de instituições que trazem saberes inovadores, pesquisas relevantes. Mas, assim como todo o sistema econômico e produtivo brasileiro, a ciência está ameaçada pela falta de uma política mais ampla, algo piorado nos cortes de recursos. A soberania nacional é vendida para  “investidores” que adquirem bens valiosos a preço insignificante.

Agora, em nosso território, o governo corta verbas da ciência aos bilhões. Nos EUA, apesar da crise que atinge aquela federação, os investimentos estatais em ciência e tecnologia estão garantidos para a guerra e setores da ordem política. ([13]) Boa parte dos investimentos têm fonte governamental, mas secreta. Se pensarmos que a censura é apenas um outro lado do segredo, podemos dizer que boa parte do saber nos EUA está sob censura, ou seja, não é partilhada pela sociedade como um todo. ([14]) Os governos franceses do século 17, ao edificar o Estado, eram ameaçados e aos mesmo tempo censuravam calvinistas, livres pensadores, católicos insatisfeitos. Apesar de tudo, estabeleceram saberes estratégicos à soberania. As ciências dos arquivos, da estatítica, recenseamentos econômicos e financeiros, ajudaram a construir a máquina estatal. ([15]) Eles usaram  a contra propaganda e literatos para garantir o rei. Aos manifestos dos insatisfeitos respondem jornais e panfletos redigidos por acadêmicos pagos pelo governo. ([16])

 Naudé vai contra os libelos (antecessores das “ redes sociais” onde calúnias circulam à vontade). O melhor para deter os panfletários, arrazoa, não é vetar, mas permitir. A tolerância afirma a soberania política. Ela indica a força e a serenidade do poder. Mando intolerante exibe fragilidade. O debate indica que o administrador está seguro. Assim, a máquina política garante o controle territorial, econômico, religioso, bélico. O ponto a ser expulso dos libelos é o anonimato que ignora a responsabilidade pública. ([17]) Quem, mais tarde, defende as liberdades na Europa e no mundo, parte do seguinte pressuposto: o mando censor confessa sua carência de legitimidade junto ao cidadão.([18])

Um controle enfraquecido surge na Igreja e pouca valia mostram os seus índices de livros proibídos. O Index Librorum  Prohibitorum seguiu toda a modernidade política, pois foi do século XVI (quando o Brasil foi “ descoberto”) até 1948. As massas da Europa católica e principamente as das colonias ibéricas sofreram o guante da censura, algo  interiorizado profundamente, gerando uma ética da repulsa à leitura e à livre pesquisa. Povos sob tal vigilância não foram além de tímidos ensaios de liberalismo, espalhado pelas Luzes mas reprimido pela força militar e policial ao longo dos séculos.

A investida censória moderna ocorre devido à falência da Inquisição. Para remédiar tal fracasso a Sé romana apela aos bispos. Cartas naquele sentido foram distribuídas às dioceses. A resposta no início foi pessimista, pois os editores e distribuidores de livros “perigosos” criaram táticas para fugir da censura. ([19]) Os bispos lamentam a voga avassaladora dos “livros perniciosos, pestilentos”. Os papas, por sua vez, redigem Encíclicas contra “livros impios e libertinos”. Uma delas tinha o nome de Quantopere Dominus Iesus. Como  ensaio para saber a reação do público,  Clemente 13 mandou imprimir apenas oito exemplares. O texto recebeu oposição de inquisidores e do cardeal Passionei , correspondente de Voltare e Montesquieu. No documento o pontífice dizia que o desejo de verdades é próprio do homem. Semelhante cupidez do verdadeiro, no entanto, o Espírito Santo manda refrear e a prova pode ser encontrada no Eclesiastes. Assim, o texto ordena que as pesquisas, no campo católico, não sejam aprofundadas. Com a crítica de Passionei, foi impresso apenas um Breve (3-11-1759) em termos brandos. ([20])

As idas e vindas da censura tiveram resultados diferentes em cada país e colônias. No Brasil elas formaram uma alma avessa ao pensamento crítico, acossada pela polícia e pela força física. Aqui, “A posse dos livros simbolizava um índice de ameaça e subversão aos olhos da Igreja. O acesso às bibliotecas, restrito aos letrados no Brasil colonial, era sujeito, desse modo, a ações inquisitórias. Sendo a representação dos livros aproximada ao diabo, enquanto metáfora dos ares libertários aspirados pela colônia, como um monstro, pela sua capacidade de deturpação. Embora o século 18 seja marcado pela inclinação à observação empírica do mundo e pela busca pelo conhecimento, qualquer ideia ou mesmo hábito tido por diferente ou perturbador pelos colonizadores eram alvo de demonização, censura e perseguição. Qualquer livro francês, por exemplo, era proibido na colônia por poder propagar o espírito revolucionário da Europa vigente na época”. ([21])


Já no século 17 um português e judeu, Bento de Spinoza analisou com rigor inaudito para seu tempo o conúbio entre trono e altar para, no Tratado Teológico-Politico, defender a liberdade de pensamento e de expressão, núcleo da existência democrática. Vale a pena recordar as teses do Capítulo XX do Tratado. Jamais ocorre, adianta o filósofo, que a alma de uma pessoa pertença inteiramente à uma outra. “Ninguém pode transferir a um outro, nem ser constrangido a abandonar seu direito natural ou a faculdade de fazer livre uso da sua própria razão”. Como pensamento e extensão expressam a única Substância divina, os humanos –constituídos pela extensão e pensamento– não podem limitar a própria fonte de sua existência, eles não podem deter o movimento dos corpos e das mentes por muito tempo, pois neles opera a potência divina. O governo violento pretende, em vão portanto, dominar por muito tempo os ânimos.  O soberano age injustamente e de modo inútil se usurpa os direitos dos cidadãos e quer prescrever o que se deve admitir como verdadeiro ou recusar como falso. E também, acrescenta Spinoza, é irrealista o poder político que busca definir  os pensamentos dos governado, “quais opiniões devem mover seu ânimo na devoção divina, pois aquelas coisas são do direito próprio de cada um, direito do qual ninguém, mesmo querendo, pode se despossuir”. Mas ocorre a servidão do indivíduo que, por ignorância, embora não tenha perdido a  força de livre pensar se põe sob o comando de um outro, “preso à sua palavra até o ponto em que podemos dizer, justamente, que ele pertence ao outro enquanto ser pensante”. Se o poder soberano se arroga o controle das mentes, segue para a própria ruína. O campo intelectual, embora conectado à extensão (que produz os corpos) é dela independente. O constrangimento físico não é bem sucedido se o governo tenta impor aos dirigidos opiniões sobre o certo e o errado, o justo e o injusto, o belo e feio. O poder que age com violência sobre corpos  “põe em perigo todo o Estado”.

É verdade, os indivíduos devem ter limites na expressão dos pensamentos, pois eles podem lesar a majestade soberana. Esta, no entanto, tem como limite a natureza de sua  potência: é absoluta, mas deve ser preservada e preservar os seus integrantes. O Estado não tem como alvo a dominação, ou manter os dirigidos pelo medo como se eles fossem propriedades de um outro. A instituição política protege os indivíduos do medo para que vivam em segurança, sem prejuízos alheios. “Não, repito, o fim do Estado não é fazer com que os homens passem da condição de seres racionais, ou deles fazer autômatos ou bestas feras. Pelo contrário, ele é instituído para que suas mentes e corpos cumpram todas as suas funções, para que eles usem uma razão livre, para que não lutem pelo ódio, colera ou astúcia, para que eles se suportem sem maltratar uns aos outros. O fim do Estado é pois, realmente, a liberdade (Finis ergo Reipublicae revera libertas est)”. ([22]) Finalmente  temos a recusa da censura tal como exercida no seu tempo: “ Querer tudo regulamentar por leis significa irritar os vícios em vez de os corrigir. O que não se pode proibir, é preciso necessariamente permitir, apesar dos prejuízos que pode resultar de tal permissão. (Quae prohiberi nequeunt, necessario concedenda sunt, tamersi inde saepe damnum sequatur)”. 

E chegamos ao núcleo das nossas considerações. A livre expressão serve para manter a paz social e no Estado, pois ela tem fundamento na própria natureza dos homens. Pensamento e extensão são modos divinos e os entes humanos não podem limitar a sua efetividade. Pode-se impedir um corpo de ir para cá e para lá temporariamente, mas ele está sempre em movimento porque seu impulso vem da Natureza. Pode-se tentar impor pensamentos, mas a sua fonte é infinita e o individuo pensante romperá as barreiras a ele impostas. Muitos parecem abdicar e fugir, nas decisões alheias, da digna operação do pensamento. Mas ele podem encontrar em si mesmos uma fonte que jorra ininterruptamente, a do livre intelecto.

Tentativas de censura, além de prejudicarem a paz social impedem por certo tempo a ciência e as artes. “Pois as ciências só podem ser cultivadas com feliz sucesso por aqueles cujo juizo é livre e totalmente liberto e minimamente preocupado (quod haec libertas apprime necessaria est ad scientias & artes promovendum; nam hae ab iis tantum felici cum sucessu coluntur, qui judicium liberum, & minime praeoccupatum habent). ([23]) o exercício da razão e da liberdade não é ato de um ente solitário, mas coletivo. Ninguém faz ciência, técnica, artes isoladamente. “Se olhamos atentamente a nossa alma, vemos que nosso intelecto seria menos perfeito caso fosse isolado e nada compreendesse, além de si mesmo. Existem, pois, fora de nós, muitas coisas que nos são úteis e desejáveis. Entre elas, nada pode ser concebido como melhor do que as que convêm à nossa natureza. Pois se dois indivíduos com a mesma natureza se unem, compõem por sua união um indivíduo duas vezes mais potente do que um em particular: eis porque nada é mais útil ao homem do que o próprio homem. Os homens nada podem desejar de melhor, para a conservação de seu ser, do que este amor de todos em todas as coisas, o qual faz de todas as mentes e corpos, por assim dizer, uma só mente e corpo. [Omnium mentes et corpora unam quasi mentem unumque corpus componant]. De tal modo que todos se esforcem, tanto quanto podem, para conservar o seu próprio ser e, ao mesmo tempo, buscar o útil para todos. Segue-se que os homens governados pela razão, os que procuram o útil segundo os conselhos da razão, nada desejam para si mesmos
que não desejem para os outros todos. Eles são justos, probos, honestos”. [justos, fidos atque honestos]. (Ética, IV, 18-escólio1). ([24])

O Estado permite controlar o mundo exterior e seguir para a cooperação entre indivíduos. “A sociedade fundada nas leis e no poder que ela tem de se conservar é o Estado. E os que ela protege com o seu direito são cidadãos. No estado de natureza, vemos claramente, nada é bom ou mau por consentimento universal, pois cada um cuida da sua própria utilidade, e segundo a sua constituição e a sua ideia do interesse particular, decide o bom e o mau, não sendo obrigado a obedecer a ninguém mais do que a si mesmo. No estado de natureza é impossível conceber pecado (peccatum).”([25])

Não foram os Estados e menos ainda os defensores da ordem democrática como Spinoza, os primeiros a inventar a censura intolerante.([26]) Eles previram  os prejuízos para a pesquisa e o ensino das ciências e das técnicas trazidos pelo poder censor. No caso da Igreja, para manter a “soberania espiritual”, ainda presente nos acordos de Latrão com Mussolini, ela reinventa meios de censura, anátema, controle policial. A razão de Estado nasce da Sancta Mater. O primeiro autor a usar o conceito foi G. Botero, próximo de Carlos Borromeu, inventor do Liber status animarum. Tal questionário é aplicado nas paróquias e dioceses, que o devolvem preenchido à Sé romana. Nas fichas, dados sobre as posses dos crentes, seus amigos e leituras.([27]) Logo vem a ragion di Stato, mas não para fortalecer o governo laico. ([28]) Roberto Bellarmino defende a soberania indireta do Pontífice, proposta recusada em larga escala, a começar por Hobbes. Este último, no Leviatã, desenvolve toda uma hermenêutica do poder a partir do livro de , onde o monstro marinho expressa a onipotência divina, marca da soberania plena. Non est potestas Super Terram quae Comparetur ei. E, certamente, na visão hobbesiana, nenhum “poder” eclesiástico, direto ou indireto, supera tal força. Leitor e tradutor de A Guerra do Peloponeso, Hobbes recorda o episódio de Melos. Os habitantes da ilha sitiada pelos atenienses apelam aos deuses ou, o que é similar, ao socorro da aliada Esparta para fugir do cerco. Dizem os atenienses, em frases de aço que até hoje definem o poder efetivo e não sonhado : “Quanto ao favor divino, nós o esperamos como vocês; porque não fazemos ou pedimos nada contrário ao que decretou a humanidade (…) os deuses seguem a opinião comum e os homens pensam que alguns, por necessidade de natureza, reinam em toda parte, segundo a força que tiverem. Não fizemos tal lei e nem somos os primeiros a usá-la; mas a encontramos e a deixaremos para a posteridade, para sempre. Assim a usamos, sabendo que vocês também a usariam, e outros que tivessem o mesmo poder que possuímos.” ([29])  Os deuses não entram em conta, pois eles mesmos decidem as suas lutas pelo critério do mais poderoso. Quanto aos espartanos, ao sangue, à honra, os de Melos são abençoados pelos atenienses pelas suas “mentes ingênuas”, mas loucas. Sem o interesse próprio e a força, nada é feito por um povo em favor de outro. ([30]) Valores são vazios sem poder. Melos não se rende, os atenienses atacam, Esparta não ajuda os sitiados. Após a invasão, os guerreiros de Melos foram mortos, crianças e mulheres escravizadas. A terra foi distribuída a colonos submissos. O perigo da vitória ateniense reside na sua ambição imperial que ultrapassou limites físicos, econômicos, políticos, bélicos. Hobbes é atento ao calcanhar de Aquiles das grandes potências. Por tal motivo, se preocupa com a concorrência religiosa que sempre brota das fraquezas do mando civil. Leitor de Eurípides, ele sabe o perigo que se apresenta nos sacerdotes, de Kalchas aos papas.

 No outro lado do poder, a Igreja busca soberania, mesmo que seja indireta como propõe Bellarmino. ([31]) Botero acha a fórmula para atingir o alvo do seu colega jesuíta e cardeal: a Igreja como instrumentum regni, com partilha do controle sobre corpos e mentes, numa verdadeira razão de Estado. ([32]) Próximo aos círculos de Carlos Borromeu e Bellarmino, Botero idealiza a racionalidade para o mando.  Mas a norma destinada ao plano laico, no seu entender, deriva do religioso. Sua busca, como a dos teóricos na Contra reforma, era deter “ a lenta e contínua erosão das normas da repraesentatio eclesiástica da comunidade civil”.([33])  O alvo era claro: “ofertar uma alternativa válida de projeto contra o fracasso da política eclesiástica e do jusnaturalismo cristão”. O plano de Botero, bem como de todos os seus pares, era impedir Maquiavel e os “ que pretendiam executar as técnicas do governo político de modo autônomo diante da profissão religiosa”. Pressuposto do realismo católico: omnis homo mendax, todos são mentirosos. Logo, só a força e a censura garantem o poder político. O mote censório reside nas frases estratégicas : “Recordem que há um tempo no qual não convem nada dizer e outro no qual é permitido dizer algo; mas não existe tempo para tudo dizer” (Botero).  É tal ponto que permite ao autor pregar, para governabilidade religiosa e laica, a instauração do segredo, algo que integra o núcleo de todas as exposições teóricas e práticas da razão de Estado.

Segundo Michel Senellart([34]) Botero busca reunir duas coisas contraditórias. A primeira é política, o Estado, se deseja existir, deve avançar para o máximo de potência. A segunda é eclesiástica: a potência do Estado não dever ser de tal modo que não se possa conceber uma autoridade superior, a da Igreja. A força pura é despótica, a lei tende a conceder autoridade absoluta ao príncipe laico. Como conciliar a potência estatal e a religiosa? A indústria, responde Botero. “Nada tem mais importância para aumentar um Estado e para o fazer muito povoado e rico como os bens da indústria dos homens e a multidão de artes e ofícios (...) A força da indústria é tamanha que nenhuma mineração de ouro e prata na Nova Espanha ou Peru lhe pode ser comparada”. ([35]) Para atingir a governabilidade só com a lei, ou a força física, seria preciso um poder absoluto. Mas com a indústria basta um dominio firme, porque com a fabricação de bens os governados encontram seus interesses atendidos. ([36]) Temos aí as bases de uma razão de Estado que prosperou na modernidade e vigora até hoje: a produção econômica é mais eficaz para todo governo do que a política. A receita foi praticada pelos fisiocratas e agora pelos supostos neo liberais. O que não significa, naturalmente, ser o Estado algo dispensável. Ele deve manter a obediência pela força, lei ou censura, formas de impor os arcana imperii de modo eficaz.

 A intolerância teológico-política age na vida estatal usando a censura, com suporte nas práticas da Realpolitik católica. Na França os protestantes não têm direitos públicos desde a revogação do edito de Nantes por Luis XIV. O absolutismo exige a unificação do governo e dos governados em todos os setores, da administração à política e crença religiosa.  Com o Edito de Fontainebleau, em 1685, o rei revoga o de Nantes, promulgado por Henrique IV (1598), que permitia a liberdade de culto aos protestantes. A repressão ordena demolir templos, exilar os refratários, extrair propriedades e títulos.
A França perdeu empresários, trabalhadores e funcionários em proveito da Inglaterra, da Prússia e de outros países. ([37])  Foi abolida a frágil liberdade de expressão, fruto da Renascença.

No século 18 um pai huguenote é acusado de matar o filho, porque o último parecia se converter ao catolicismo. Surgem boatos, as fake news da época, a policia faz um inquérito tortuoso, os promotores acusam com base em suas convicções pessoais, os juízes condenam   Calas ao suplício. Voltaire assume a causa, devolve a honra ao condenado, mas é tarde para guardar a sua vida. ([38]) Mais sorte tem Zola com Dreyfus.([39]) Mas agora o credo protestante é substituído, como bode expiatório, pela religião judaica. O antissemitismo se fortalece na querela e tem  frutos com Pétain sob as botas nazistas. Nos lugares onde o tacão de Hitler impera é aplicada a ordem de 27-09-1940, somando-se as regras que vigoram na Alemanha sobre o recenseamento de judeus. O roubo de bens judaicos se aplica com voracidade, sem que francêses se levantem. Pierre Laval, líder do governo colaboracionista, edita leis e decretos contra judeus com mais de 200 textos legislativos sobre a “questão judaica”. Ainda em 1940 a administração fantoche arranca a nacionalidade francêsa de 15 mil pessoas, dentre elas 8 mil judeus. É abolido o decreto que proibia e punia o antesemitismo. Em 1941 o governo Darlan cria o Comissariado Geral das Questões Judaicas (CGQJ), para produzir leis contra judeus. São previstos campos de internamento, sobretudo sob o governo Daladier, desde 1939. ([40])

Como enuncia Henri Michel, “nada obrigava Vichy a aplicar, na Zona Sul, as medidas alemãs; as autoridades de ocupação não lhe pediram tal coisa. É portanto por sua iniciativa própria que, em 3 de outubro, Vichy edita um estatuto dos judeus para a Zona Sul (...) em três pontos a legislação de Vichy foi mais dura. De uma parte, a definição de judeu fundada na raça, mais ampla que a da Zona Norte, fundada sobre a religião; de outro lado, os judeus estrangeiros foram presos me campos especiais – 40 mil alí estavam no fim de 1940. Finalmente (...) Vichy arrancou a nacionalidade francesa dos judeus argelinos. (...) na zona ocupada pelos italianos, as autoridades inimigas se opuseram à aplicação das leis francesas; a Itália fascista era menos antissemita que a França de Vichy (...) o ocupante, ao entrar na Zona Sul, só precisou recolher os judeus, em dezenas de milhares, já presos nos campos de internação, ghetos provisórios”. ([41]) Tal violência era apenas o prefácio para os roubos e o sadismo cometidos contra judeus, na bem católica França colaboracionista.

O confisco dos bens judaicos é feito em conúbio de Vichy com os nazistas: quadros, livros, apartamentos vazios porque seus donos foram deportados. O caráter de banditismo estatal atinge ápices infames. ([42]) E tudo com a colaboração de cristãos piedosos, calculistas e covardes diante do inimigo aparentemente mais forte. Sartre, apesar de todas as dúvidas sobre suas atitudes durante a ocupação, incluindo sua possível docilidade à censura de Vichy, tem palavras exatas e impiedosas sobre a covardia calculista da França comandada por Pétain diante do nazismo. ([43]) Franceses aos milhões apoiam o regime e obedecem a ordem ritual: oremus et pro perfidis Judaeis no final das caridosas missas sob olor de incenso.  

Até o Vaticano 2 a Igreja fomenta a intolerância, abençoa todo poder que sirva para salvar a “soberania espiritual”. Ela assina a Concordata de Império com Hitler e desarma os  católicos que imaginam resistir à tirania.([44] ) De igual feitio o trato com Mussolini. ([45]) No Brasil, temos o elo amigável entre Hierarquia e poder varguista. ([46])Chegamos às  relações da CNBB com o regime de 1964.  Os bispos abençoam o novo governo (27-29-05-1964). A sua maioria agradece aos militares por salvar o país do comunismo e “faz ressalvas e o voto de que a reconstrução do País siga a Doutrina Social da Igreja” ([47]) Atitude idêntica ocorre no AI- 5(Comissão Central da CNBB, 18-02-1969). No intervaldo das ditaduras temos a LEC (Liga Eleitoral Católica) com listas dos renegados que jamais deveriam obter votos católicos. No fim do regime ditatorial imposto em 1964, oportunistas ou desavisados apontam a Igreja como a grande aliada na luta pelos direitos humanos, contra a censura e métodos torcionários. Cometeram o erro conhecido como pars pro toto. E pior: sob o guante de João Paulo II, a Santa Madre define um Termidor pastoral e político. O pontífice, na luta contra o mundo moderno e o comunismo, alia-se a Ronald Reagan, tem papel importante no escândalo Irã Contras, abraça Pinochet, dando as costas à uma chilena torturada pelo fogo.([48]) No governo da Igreja, ele persegue eclesiásticos corajosos como Evaristo Arns (esquarteja a diocese de São Paulo), determina intervenções em seminários para conter setores eclesiásticos democráticos. O delírio de forças à esquerda, com pleno wishful thinking, chega a enxergar na Igreja sob comando do pontífice inimigo do liberalismo, do socialismo e da modernidade,  certa tendência “inevitável” rumo ao socialismo. ([49]) Outros, de pior lavra, imaginavam tarefa tranquila penetrar nas fileiras católicas e fingir crença, apesar de serem ateus. Depois de conquistadas as massas, sonhavam,  dariam adeus aos padres. Tais posturas partem da premissa fundamental: militar é impor a censura a si mesmo, depois aos outros. Quem assim aceita a censura, não pode reclamar do veto alheio.

Em resumo : na gênese das práticas intolerantes e censórias encontra-se uma instituição, suposta defensora dos direitos em tempos tirânicos. Nela, alguns bispos, padres e fiéis resistem às ditaduras. ([50]) .  Os demais, se não aderem ao nazi fascismo, aqui ao integralismo, ([51]) seguem  a doutrina oficial da Igreja, proponente principal das censuras praticada pelo poder de Estado ([52]) Quanto mais rígida a hierarquia, em qualquer coletivo humano, mais os que se encontram no topo da pirâmide deixam de lado a responsabilidade para com o todo. O princípio monárquico –acarinhado por J. De Maistre ([53]) e outros copiadores da Contra Revolução em revistas católicas brasileiras como A Ordem ([54])– requer semelhante modelo vertical. Ele se faz pela cooptação dos níveis intermediários, cujos alvos são respondidos pelos planos e interesses dos superiores. Embora recusada pelos poderes laicos, a teoria de Bellarmino continuou a informar a mente dos hierarcas da Igreja Católica. De modo exemplar, temos a definção de Pio XI, quando se tratou do Tratado de Latrão: “...na Concordata estão um diante do outro, senão dois Estados, certissimamente duas soberanias plenas, isto é, perfeitas, cada uma em sua ordem, ordem necessariamente determinada pelos respectivos fins onde quase não é preciso dizer que a dignidade objetiva dos fins, determina não menos objetivamente e necessariamente a absoluta superioridade da Igreja”.([55])

 Voltemos à Europa. No que se refere à Alemanha, M. Stolleis ([56]) narra os impulsos científicos e técnicos, as intervenções do Estado na ordem social e vice-versa. Eles criam “a sociedade industrial onde ocorre uma proliferação de normas, antes da Primeira Grande Guerra”. Crescimento material e duplicação demográfica (em 1910 a Alemanha reúne 65 milhões habitantes) suscitam debates sobre a natureza da economia e do poderio militar-industrial, os valores da ciência e da religião, desta à política e as artes. Com o darwinismo social, brotam as variantes racistas “biológicas” do antissemitismo, as quais adquirem respeitabilidade acadêmica e política ([57]). Surge o panfleto de Chamberlain, lido com entusiasmo pelo Kaiser. ([58]) Chamberlain admirava muito Richard Wagner. ([59]) Quem conhece as diatribes wagnerianas contra os judeus, reforçadas com sua leitura de Ludwig Feuerbach([60]) aquilata as bases do ataque perpetrado por Chamberlain. O comunitarismo antiliberal implica no elo “da velha oposição romântica às Luzes e à revolução com a melancolia na civilização e profundas reservas diante da ordem democrática com o liberalismo e o individualismo que deveriam ser vencidos em nome da ‘comunidade’ (Gemeinschaft), em nome do Reich e da germanidade que transcendem o Estado” (Stolleis). No mesmo terreno ressurgem as invectivas e a censura contra o “materialismo” e o mundo sem encanto. Ciência e técnica teriam gerado a sociedade mecânica, o grande desvio na vida orgânica dos povos. ([61]) Contra “as idéias de 1789” denunciadas doutrinas ordenadas em nomes de “monismo, teosofia, antroposofia, psicologia profunda” (Stolleis). O imaginário Völkisch volta-se contra os padrões democráticos e liberais e prega um anti capitalismo regressivo e também procura nas “raízes da alma popular” os antídotos contra o veneno do progresso material, visto como produto da era burguesa, desprovida de transcendência, presa à finitude política, científica, mercadológica.

Na França de Vichy a censura atingiu um clímax, verdadeira revanche contra as Luzes do século 18 e o liberalismo do século 19. Durante toda a ocupação alemã, a censura se espraiou por todos os domínios da vida coletiva. Aliás, com o pretexto da guerra, desde 1939 existia no país o controle preventivo das publicações. Após o armistício de 1940 os alemães instalam a censura mais severa. Fiel ao travestimento da língua, o regime de colaboração proíbe a frase   “governo de Vichy” e só aprova  “governo francês”. Com a falta de papel, a imprensa escrita fica ainda mais frágil e depende do governo para subsistir na faina de bajular os mandantes da hora.

Na zona ocupada, quem desejasse fundar um jornal deveria provar não ser judeu. No setor livreiro, editoras são fechadas (Denoel, Sorlot) por suas atitudes contrárias ao nazismo. É criado o Gruppe Schrifttum para a censura das edições. O grupo elaborou uma lista de 143 textos proibidos, 20 mil livros são confiscados. Logo depois, 70 editores são visitados e têm 713 382 mil livros confiscados, dez editoras são fechadas. O Sindicato dos Editores assina um termo de colaboração, prometendo fazer auto censura nas publicações. As edições Gallimard são perseguidas por terem “juificado” a edição francêsa. Calman Levy é rebatizado e recebe outro nome. Restam poucos resistentes, como as Éditions du Minuit. Em 1944 surge uma Comissão de Depuração, integrada por Jean-Paul Sartre, ([62]) Pierre Seghers e Vercors. Quando a história é vista com lupa, surgem as anamorfoses dos grandes mitos, à esquerda ou direita. É o caso de Sartre.

Vichy sintetiza o movimento católico reacionário contra as Luzes, acrescido do antissemitismo virulento. A propaganda racista traz a denúncia “das idéias de 1789” que teriam enfraquecido o povo europeu contra seus inimigos. Boa parte do alento romântico é nutrido pela Igreja, com a dupla condenação do capitalismo e do liberalismo. A hierarquia não aceita a ordem capitalista, da concepção do tempo às formas políticas. ([63]) Tal fato leva à concordância tática entre católicos e socialistas, pois ambos recusam as bases da economia de mercado e o liberalismo. A diferença entre socialistas religiosos e ateus implica a atuação da Igreja na ordem pública, nos fundamentos da propriedade (esta última, para os católicos, teria a família como base), na ordenação do justo salário, etc. O bispo Ketteler ordena o “socialismo católico” e aconselha, como Bismarck (e apesar do Kulturkampf...), a intervenção do Estado nas leis trabalhistas, nos salários, na segurança social (Daseinsvorsorge). As teses “socialistas” católicas são acolhidas na Rerum Novarum (1891) e na Graves de Communi (1901). A doutrina da Igreja recusa, ao mesmo tempo, o capitalismo e o socialismo, laicos ou ateus. Para ela, as duas vertentes retiram o alento espiritual da humanidade, por causa do materialismo que renega o Eterno e os valores religiosos. Voltemos ao útero que gerou as ideias contra revolucionárias do século 19, e às suas consequências na ordem estatal.

O historiador Joel Cornette tem excelentes análises sobre o absolutismo, campo de onde De Maistre retirou suas teses virulentas contra a democracia, sobretudo a parlamentar.  No Antigo Regime é patente a compra dos intermediários pelo ápice do poder real. A venalidade dos cargos, a isenção de impostos, os postos honoríficos,  tudo se reúne na simples compra dos apoios. A Igreja foi a mais bem sustentada estrutura daquele modelo. Os reacionários imaginam a Ecclesia como síntese feliz da monarquia, aristocracia,   democracia. Mas sua espinha dorsal foi ideada no tempos  modernos com o controle absoluto dos intermediários pelo poder central e superior. No Vaticano 2 ocorreu um tímido ensaio rumo à colegialidade. Desaparecido Paulo VI (anunciado hoje como santo), houve uma forte ação centralizadora sob João Paulo II. A sua disciplina férrea moldou um clero obediente, atento à raison de l ´Église. Se a tendência ao sigilo e à censura já existia antes daquele pontífice, tudo piorou com ele. É um clero disciplinado, obediente, mas sem o costume das críticas e debates que se tornou hegemônico agora. Antes do Termidor comandado pelo papa polonês, o clero lia e dscutia assuntos graves de ética, dogma, etc. Tais discussões desapareceram da luz diurna. Hoje, no Brasil e na América do Sul, temos raros Romeros, Casaldaligas, Arns, Câmaras. Há uma presença forte de bispos e cardeais realistas, ou seja, que apoiam o governo da hora, qualquer um que não atrapalhe os planos da Unam Sanctam. Quando ocorreu o massacre do Pinheirinho, o cardeal de São Paulo ficou rouco de tanto silenciar. O prefeito de São Paulo inventou um alimento fake para os pobres, mas tal comida teve as bençãos cardinalícias. No caso da pedofilia, não é possível desligar os eventos do Chile, dos EUA, da Irlanda, da Alemanha, da França, da rígida ordem interna que venceu com o pontificado de João Paulo II. O chamado silêncio do Vaticano diante do escândalo em escala mundial é apenas e tão somente uma das metamorfoses perversas da censura, do segredo, impostos à Igreja moderna e acolhidos pela razão de Estado. A Igreja moderna, burocratizada e centralizada como poder absoluto e absolutista, deu as bases para aquela via, abertas por Botero e Bellarmino. As esperanças nas débeis promessas do Vaticano 2 renascem com o Papa Francisco. Mas notemos que ele só consegue combater desvios com o uso de sua autoridade institucional, máxima e superior. Se fracassar, será conhecido como o responsável pelo desastre. O modelo colegiado, proposto por Nicolau de Cusa e outros, está longe de ser possível agora.([64]) Por enquanto, para analisar a instituição religiosa o relevo maior é dado à pessoa do pontífice e de seus adversários ou apoiadores. Ou seja, apesar dos modelos e pensamento diferentes, temos a ênfase posta no indivíduo situado no ápice da pirâmide. Visto de tal prisma, ainda não superamos a era de Pio X, XI, XII. É complexo em demasia, mas sempre é bom retomar a reflexão em vez das condenações sem aprofundar condicionantes.

Com a  intolerância, fruto do não saber trazido pela censura instalada na alma brasileira, indiquemos os atores eficazes e longevos. “Nossa era é propriamente o tempo da crítica, à qual tudo tem de submeter-se. A religião, por sua santidade, e a legislação, por sua majestade, querem esquivar-se dela. Mas assim suscitam justa suspeita contra si e não podem ter pretensões ao respeito sem disfarce que a razão só outorga ao capaz de sustentar seu exame livre e público”. (Kant).  Eis o antídoto para o ódio : saber, tolerância, debate publicável sem covardes anonimatos e sem vetos oficiais, mesmo os que alegam, para censurar escritos, as mentiras espalhadas pela midia e na internet, as famigeradas fake news.   Após o veneno fanático, sempre chega a hora das Luzes democráticas.








[1] Arthur F. Utz, Villars-sur-Gläne/Fribourg “Die politische Theologie von Carl Schmitt” Archiv für Rechts- und Sozialphilosophie / Archives for Philosophy of Law and Social Philosophy  Vol. 85, No. 3 (1999), pp. 398-415, também encontrável no seguinte endereço eletrônico:

[2] “Não existe (...)  para falar com exatidão, nenhuma moralidade nas ações humanas; não cabe a Deus a punição, nem a recompensa, mas apenas às leis civis: pois o que diríamos de um soberano que se arrogaria o direito de torturar em seus domínios os infratores das leis dos Estados vizinhos ? Aliás, por que Deus puniria os indivíduos maldosos ? E porque os odiaria ? O que é o maldoso, senão certa máquina organizada que age pelo esforço irresistível de certas molas, as quais a movem em tal ou qual direção, &  a determinam necessariamente ao mal ? Mas se um relógio é desregulado, o relojoeiro que o fez tem direito de se queirxar da irregularidade de seus movimentos ? E não haveria injustiça ou melhor, loucura se lhe exigissemos mais perfeição no efeito do que  havia na causa. O relojoeiro é Deus, aqui, ou  a natureza dos quais todos os homens, bons ou ruins, são a obra”. Encyclopédie (A Lausanne et a Berne, Chez les Sociétés typographiques, M.DCC. LXXXI, verbete Unitaires. T. XXXVI, p. 107 e ss.
[3] Sobretudo em O valor do Estado e a significação do indivíduo. Uso a tradução francesa de Sandrine Baume: La valeur de l´État et la signification de l ´individu (Genève, Droz, 2003). O livro é da mais alta relevância para o estudo sobre o mundo político atual.
[4] Schmitt, Carl: “ Teologia Política, quatro capítulos sobre a doutrina da soberania’ in Le categorie del ´Politico´ (Bologna, Il Mulino,1972). pp. 62 e ss. Schmitt cita a edição frankfurtiana de 1667. Uso o mesma edição (Frankfurt, Johannis Davidis Zunneri, 1767 (Parte II, parágrafos 4 e 5, p. 36 e ss. 

[5] Roberto Romano :    Sobre Carl Schmitt e Hegel, o conceito de decisão em Hegel”, in Contra a razão de Estado (blog) : http://silncioerudoasatiraemdenisdiderot.blogspot.com/2014/07/o-conceito-de-decisao-em-hegel-e-carl.html  Um texto relevante para a compreensão dos tratos entre Igreja e Estado moderno encontra-se no livro juvenil de Carl Schmitt, A visibilidade da Igreja. (tradução francesa : La visibilité de l ´Église. Catholicisme  romain et forme politique. Donoso Cortes. Paris, Cerf, 20120.  Alí, diz o jurista, pode-se resumir em duas proposições tudo o que pode ser dito sobre a visibilidade da Igreja : “ o homem não está só no mundo, o mundo é bom e o ruim nele vem do pecado humano. as duas proposições encontram significado religioso do dogma de que Deus se tornou homem’. A questão da Igreja visível ou invisível atinge o mais fundo do pensamento filosófico e político germânico, marcado pela Reforma luterana e sua concepção do elo imediato entre a consciência do fiel e o divino, sem mediações excessivas da hierarquia eclesiástica, a parte visível da instituição religiosa. No livro estratégico que publicou sobre a Revolução Francesa, Fichte dedica todo um capítulo sobre o assunto, ao analisar a estranheza absoluta entre a prática eclesial alemã e a postulada por Lutero. No mesmo ímpeto, tenta mostrar a secularização do direito, sobretudo o de propriedade, face ao transcendente. O segundo não tem nenhuma vigência no plano existencial, visível,   pois habita apenas a mente de quem nele acredita. Cf. Johann Gottlieb Fichte: Beitrag zur Berichtigung der Urtheile des Publicums über die französische Revolution, o capítulo 8 : Von der Kirche, in Beziehung auf das Recht einer Staatsveränderung” Projeto Gutenberg, ed. eletrônica : http://gutenberg.spiegel.de/buch/beitrag-zur-berichtigung-der-urtheile-des-publicums-uber-die-franzosische-revolution-412/8

[6] Um  comentário conciso do caminho entre religião e política, no pensamento de Schmitt, encontra-se nas seguintes frases : “In seiner Begriffssoziologie rekonstruierte Schmitt den historischen Prozeß der Bedeutungsübertragung zwischen Grundbegriffen beider Disziplinen, wodurch sich etwa der »allmächtige Gott« zum »omnipotenten Gesetzgeber« verweltlichte, und in eins damit analysierte er deren systematische Struktur, um charakteristische Bedeutungsanalogien, wie die zwischen dem »Ausnahmezustand« der Staatsrechtslehre und dem »Wunder « der Theologie, sichtbar zu machen. Die säkulare Fortgeltung theologischer Kategorien beschränkte sich indessen nicht auf juristische und politische Begriffe, sondern erstreckte sich auf den neuzeitlichen Säkularisierungsprozeß im ganzen. Dieser vollzog sich nicht einfach als »Entgöttlichung und Entchristlichung der Welt«, sondern immer auch als »Selbstermächtigung des Menschen« zu innerweltlichem Heilsstreben. Humanistisch wurde ein evolutionärer oder auch revolutionärer Fortschrittsglaube gestiftet, der doch »nur säkularisiertes Judentum und Christentum war und seine ›Eschata‹ von dort bezog.« Wenn das ökonomische »Zeitalter der Sekurität« zunächst von einer »dumpfen Religion der Technizität« geprägt war, welcher das »Paradies einer technisierten Erde und einer durchorganisierten Menschheit« vor Augen stand, so sollte nach den Erschütterungen des Ersten Weltkrieges eine politische Mobilisierung religiöser Endzeitvorstellungen zunehmend an die Stelle ihrer ökonomischen Neutralisierung treten”. Siegfried Gerlich: “ Zur Politischen Theologie Carl Schmitts, Sezesson, 42, juni 2011. https://sezession.de/28257/zur-politischen-theologie-carl-schmitts





[7] Mesmo sendo admirador das Luzes e do pensamento científico, Pombal não foi menos adepto da censura, só que sua política em relação ao Brasil não mudou substancialmente a prática de aqui proibir indústrias e debates perigosos ao governo. “A história da censura em Portugal remete ao século XVI, quando era exercido por três instituições, o Conselho Geral do Santo Ofício, criado em 1536 e responsável pela censura papal, o Ordinário da Diocese, ao qual cabia a censura episcopal, e, a partir de 1576, o Desembargo do Paço, responsável pela censura régia. A atividade era feita de forma preventiva, seguindo as determinações do Index, a lista de publicações proibidas elaborada pela Igreja, e incluía a circulação de livros, o que resultou no controle de entrada e saída nas alfândegas. Associada até então à Reforma Católica, a prática da censura portuguesa foi modificada em 5 de abril de 1768, quando foi instituída, por Sebastião José de Carvalho e Melo, o futuro marquês de Pombal, a Real Mesa Censória. Composta por clérigos e leigos, a Real Mesa Censória representou uma tendência à secularização da censura, expressando os interesses específicos do reformismo ilustrado português, que conciliava a valorização da razão com a manutenção do absolutismo monárquico, da religião católica e do Império colonial”. cf. Cf. Angélica Ricci Camargo, “Censores Régios,” Arquivo Nacional, acessado em 21 de junho de 2018, http://mapa.an.gov.br/index.php/dicionario-periodo-colonial/152-censores-regios
[8] Considérations politiques sur les coups d'État suivi de Naudæana Précédé de Gabriel Naudé par Sainte-Beuve. Lionel Leforestier, Maxime Leroy et Frédérique Marin (eds.). (Paris, Gallimard,2004).

[9] Daniel, 12, 4 : plurimi pertransibunt, et multiplex erit scientia. Atraente a tradução do padre Vieira (História do Futuro) : “ Plurimi pertransibunt, et multiplex erit scientia. Onde se deve advertir e notar, que muitos homens, ainda que sejam de grandes letras, cuidam que passam os livros, e passam por eles: Plurimi pertransibunt. Por quantos lugares passaram os Origenes, os Clementes, os Tertulianos, que depois entenderam os Agostinhos (...) E por quantos passaram também estes, que depois entenderam melhor os que lhe foram sucedendo, não porque os ultimos sejam mais doutos, ou de mais aguda vista, mas porque lêm e estudam á luz da candeia, ajudados e ensinados do tempo, que é o mais certo interprete das profecias....” Obras Politicas e varias, T. II,  (Lisboa, J.M.C. Seabra & T. Q. Antunes, 1855), p. 106. Entre o segredo divino e o saber humano há um abismo intransponível. Interessante que o saber protestante do século XVII tenha assumido a tarefa de aumentar a ciência, mesmo com o veto da Providência. Ou que tenha entendido a profecia de Daniel de modo oposto ao da Igreja católica, que manteve o sigilo eterno sobre as coisas transcendentes e, não raro, naturais.

[10] Cf. P. Miller, The New England Mind,1939 ; Christopher Hill:  Intellectual Origins of the English Revolution (Clarendon, 1997);Webster, Charles: The Great Instauration. Science, Medicine and Reform, 1626-1660. London, Duckworth, 1975. A Professora Maria Sylvia Carvalho Franco desenvolve os aspectos mais amplos do nexo entre saberes e poder na época. cf. Prismas do Ceticismo no Renascimento, tese para concurso de professor titular, IFCH-Unicamp.

[11] Para uma exposição ainda hoje útil, cf. Hoefer, Ferdinand: Histoire de la Physique et de la Chimie depuis les temps les plus reculés jusqu´a nos jours (Paris, Hachette et Cie, 1872). Gallica (Bibliothèque Nationale de France) https://gallica.bnf.fr/ark:/12148/bpt6k293878/f3.image  Também : Dannemann, F. e Wolf, A. : A history of science, technology, and philosophy in the 16th & 17centuries (George & Unwin, 1935). Hutton, S. : British Philosophy in the seventeenth century (Oxford University Press, 2015). Parkinson, G.H. : The renaissance and seventeenth century rationalism (London, Routledge, 1993).  Greyerz, K. von : Religion and culture n Early Modern Europe, 1500-1800 (Oxford, University Press, 2008).

[12]  “Desde os primórdios da Colonização do Brasil à República, muitos foram os desafios que os governos que se sucediam tiveram de enfrentar, pois desde a extração do ouro à metalurgia, da tecelagem do algodão aos primeiros estaleiros, as tentativas de industrialização do Brasil Colônia representaram iniciativas isoladas. A exceção foi a industrialização do açúcar que fez do país o maior produtor mundial ainda no sé culo 17. Durante o período de Brasil Colônia, compreendido entre 1530 a 1822, a industrialização não fora prioridade. Pelo contrário, os políticos de Lisboa viam o outro lado do Atlântico como uma enorme fazenda, um fornecedor de produtos que não podiam ser encontrados na Europa. As possibilidades de lucro dos portugueses, até meados do século 18, baseavam-se no comércio de especiarias com a Ásia e a economia brasileira, por sua vez, era secundária O Brasil era somente utilizado como “fazenda” para atividade de extrativismo, como do pau-brasil, do açúcar e da mineração de ouro e diamante.” Chiochetta, João C. e outros “Evolução histórica da indústria brasileira: desafios, oportunidades e formas de gestão”, Congresso Brasileiro de Ensino de Engenharia, 14-17 de setembro de 2004. http://pg.utfpr.edu.br/dirppg/ppgep/ebook/2004/17.pdf


[13]Advocates of strong and sustained Defense S&T funding assert that Defense S&T funding plays important and unique roles in the DOD innovation system, supporting medium-term, evolutionary technologies and incremental innovation that help improve existing products and systems,as well as longer-term, revolutionary technologies providingU.S. technological dominance,deterring conflict,and, when necessary, defeating adversaries. Both evolutionary and revolutionarytechnologies are viewedby most warfighters and policymakers as central to U.S. national security as well as to the lives of those serving in uniform.In FY2017, Defense S&T was $13.4billion, nearly six times the FY1978level of $2.3billion. Most growth occurred from FY1978 to FY2006, at a compound annual growth rate (CAGR) of 6.4%. From FY2006 to FY2017, growth was slower (0.1% CAGR). Most of the growth and volatility wasin advanced technology development.In FY2017 constant dollars, Defense S&T funding peaked at $16.2 billion in FY2005 and declined by $2.8 billion through FY2017”. John F. Sargent Jr specialist in Science and Technology Policy, February 21, 2018 in Congressional Research Service, informing the legislative debate since 1914, https://fas.org/sgp/crs/natsec/R45110.pdf  Para uma apologia guerreira dos investimentos em C-T, ver o texto publicado pelo Departamento de Defesa norte-americano : “ U. S. Faces Global Science, Technology Competition, Official Says” https://www.defense.gov/News/Article/Article/1467815/us-faces-global-science-technology-competition-official-says/

[14] Moreno, Jonathan : Mind Wars: Brain Science and the Military in the 21st Century (NY, Bellevue Literary Press, 2012). Do mesmo autor, The Body Politic, the battle over science in America (NY, Bellevue Literary Press, 2011).

[15] Cf o interessante texto de Dominique Reynié : “Le regard souverain, statistique sociale et raison d´État du XVIe au XVIIe siècle” in Lazzeri, Chistian e D. Reynié : La Raison d´État, politique et rationalité (Paris, PUF, 1992), pp. 43 e ss.
[16] E. Thuau, Raison d´État et pensée politique à l´époque de Richelieu.(Paris, Albin Michel, 20000.
[17]  Damien, R: Bibliothèque et État, naissance d´une raison politique dans la France du xviie siècle. (Paris, PUF, 1995).
[18] A Primeira Emenda da Constituição, nos EUA, tem origem nas Luzes republicanas e liberais e no movimento político que afasta os traços teológico-políticos da ordem pública. CF. Richard C. Cortner : The Kingfish and the Constitution: Huey Long, the First Amendment, and the Emergence of Modern Press Freedom in America (Greenwood Press, 1996).
[19] Darton, Robert : The Business of Enlightenment. A publishing history of the Encyclopédie, 1775-1800 , (Cambridge, Harvard Universityy Press, 1979).  
[20] Cf. Shackleton , R: The Encyclopédie and the clerks (Oxford, Clarendon Press, 1970); Romano, Roberto : Silêncio e ruído, a sátira e Denis Diderot (Unicamp Editora, 1999) e Delpiano, P. : Church and Censorship in Eighteen Century Italy, governing reading in the Age of Enlightenment (Routledge Research in Early Modern History).
[21]  Késia Rodrigues de Oliveira, “Um monstro nas Minas ilustradas: o diabo na livraria do cônego” in   Arquivo Maaravi: Revista Digital de Estudos Judaicos da UFMG. Belo Horizonte, v. 5, n. 8, mar. 2011. http://www.periodicos.letras.ufmg.br/index.php/maaravi/article/viewFile/1790/1866 O artigo é uma análise muito ilustrativa dos problemas nacionais, do saber ausente e censura dos pensadores que resistiram na colônia.


[22] A temática e o fantasma do poder que transforma os dirigidos em autômatos é conhecida no século XVII, sobretudo na França, terra de Rene Descartes, cujas elaborações mecânicas são familiares a Spinoza. “ É propriamente tal fantasma, composto de todos os admiradores dos ricos e grandes, que concebemos ao redor de seu trono, com sentimentos de medo, respeito e baixeza, que é o ídolo dos ambiciosos, pelo qual eles trabalham toda sua vida e se expõem a tantos perigos. e para mostrar o que eles buscam e adoram, basta considerar que se apenas um homem pensante existisse  no mundo, e todo o resto dos que tivessem figura humana fossem apenas estátuas ou autômatos; e ademais aquele único homem racional, sabendo bem que todas aquelas estátuas parecidas com ele externamente seriam inteiramente privadas de razão e pensamento, soubesse contudo o segredo para as mover por algumas cordas, e delas tirar todos os serviços que tiramos dos homens, podemos bem acreditar que ele se divertiria às vezes com o movimentos diversos que ele imprimiria às estátuas; mas com certeza ele jamais colocaria seu prazer e glória nos respeitos externos que os faria efetuar; jamais ficaria lisonjeado com suas reverências e se cansaria logo, como nos cansamos das marionetes; assim ele se contentaria com a obtenção de serviços necessários, sem se preocupar de reunir um número maior do que teria necessidade para seu uso”. Arnauld e Nicole : Logique de Port- Royal,(Paris, J. Hachette et Cie, 1834 prte 1, c. X),  p. 65.  cf. Marin,Louis: “Sur une société de machines dans la Logique de Port-Royal www.louismarin.fr/ressources_lm/pdfs/Rev.Sc.Hum82.pdf

[23]  Tractatus theologico-Politicus, XX, Hamburgui, Henricum Kunrath (Edição eletrônica da Gallica, BNF), p. 226 e seguintes. Traité Theologico-politique, XX, trad. Ch. Appun (Paris, Flammarion), pp. 327 e ss. Comparemos tal atitude, sincronizada à defesa da ordem democrática, à de Tomas Hobbes, nada simpático ao regime almejado pela democracia: “The sciences are small power, because not eminent and therefore not acknowledged in any man; nor are at all, but in a few, and in them but of a few things. For science is of that nature as none can understand it to be such as in a good measure have attained it. Arts of public use, as fortification, making of engines, and other instruments of war, because they confer to defence and victory, are power; and though the true mother of them e science, namely the mathematics, yet, because they are brought into the light by the hand of the artificer, they are esteemed, the midwife passing with the vulgar for the mother, as his issue” Leviatã, Cap. X.

[24] Ética, ed. bilingue, trad. Tomaz Tadeu, (BH, Autêntica Ed. 2007). p. 287-2890. Formulação similar no Tratado político, agora diretamente no plano do governo: é preciso que todos os integrantes da vida pública formem como um só corpo. “Como a soberania pertence à Assembléia dos patrícios tomada no seu todo, mas não cada um de seus membros (caso oposto seria massa desorganizada), é preciso que todos os patrícios sejam constrangidos por lei a formar um corpo único dirigido por um pensamento comum. Mas as leis por elas mesmas não têm a força exigida e são facilmente violadas quando seus defensores são os mesmos que podem as desobedecer e não há para refrear seu apetite nada mais que o exemplo do suplício aplicado por eles mesmos aos seus pares, o que é absurdo;  há pois lugar para que se busque um meio próprio que assegure a manutenção do corpo dos patrícios com a ordem e as leis do Estado, conservando, sempre que possível, a igualdade de todos os patrícios” (TP, 8, 19). “Attamen, quia summa hujus imperii potestas penes universum hoc Concilium, non autem penes unumquodque ejusdem membrum est (nam alias coetus esset inordinatae multitudinis), necesse ergo est, ut Patricii omnes Legibus ita astringantur, ut unum veluti corpus, quod una regitur mente, componant. At leges per se solae invalidae sunt, et facile franguntur, ubi earum vindices iiipsi sunt, qui peccare possunt, quique soli exemplum ex suppliciocapere debent, et collegas ea de causa punire, ut suum appetitumejusdem supplicii metu frenent, quod magnum est absurdum; atqueadeo medium quaerendum est, quo supremi hujus Concilii ordo,et imperii jura inviolata serventur, ita tamen, ut inter Patriciosaequalitas, quanta dari potest, sit”. Tractatus Politicus. Spinoza, Baruch - 1677  in Opera, im Auftrag der Heidelberger Akademie der Wissenschaften, hrsg. von Carl Gebhardt, Heidelberg, Carl Winters Universitaetsbuchhandlung, 1972, vol. III, pp. 269-360. Tal visão leva aos pouco afeitos ao pensamento político, em especial o de Maquiavel e Spinoza, a falar de um suposto ‘totalitarismo’ na Ética e nos tratados spinozanos. Anacrônica, tal leitura sequer nota que o trato entre o indivíduo e o todo, naquele filósofo, é algo matizado e complexo. Como não tenho espaço neste artigo para discutir o tema, remeto para o livro de Sophie Laveran, Le Concours des parties, critique de l ´atomisme et redéfinition du singulier chez Spinoza (Paris, Les Classiques Garnier, 2014). Úteis, sobretudo as páginas 314 e ss.


[25] Ética, ed. cit. proposição 37, escólio 2, pp. 310-311.  “Haec autem societas legibus et potestate sese conservandi firmata civitas apellatur, et qui ipsius iure defenduntur cives”. Notemos que Spinoza aplica ao todo reunido no Estado (Civitas) o que enunciou para todo ser, em escala cósmica. Aqui fica patente que a Ética, longe de ser um texto  “metafísico” e contemplativo teóricamente, aplica de modo rigososo a percepção do universo (Substância, Deus ou Natureza) aos planos mais imediatos da existência no tempo e no espaço. O sentido lógico da frase citada acima, sobre o Estado, é elucidado de maneira mais complexa na enunciação do esforço que todo ente realiza para continuar existindo. Podemos dizer que aí temos uma chave, com muita probabilidade de origem maquiavélica, sobre a conservação dos Estados e sua ruína. Não permanece no tempo e no espaço o todo humano, Civitas, que perde a força interna de se manter, em proveito de outros. Trata-se de um eco distante mas  rastreável de Maquiavel, bem entendido por Fichte: no plano internacional diminuem seu poder os que deixam outros aumentarem o seu. Segundo Fichte, existem duas regras da defesa nacional, ambas em termos éticos e políticos, mas definidas pela prudência máxima: 1) O vizinho, a menos que ele seja constrangido a nos considerar como seu aliado natural contra uma outra potência temível para nós dois, está prestes continuamente, na primeira ocasião, desde que ele possa fazê-lo com segurança, a crescer às nossas custas. É preciso que ele faça assim, se ele for prudente, e não pode negligenciar isso, mesmo que fosse nosso irmão. 2) Não basta defender o nosso território mas é preciso conservar imperturbavelmente os olhos abertos sobre tudo o que pode influenciar a nossa situação, e não suportar nunca que algo mude em nossa desvantagem no interior dos limites desta influência, e não hesitar um átimo se pudermos mudar as coisas em nossa vantagem; pois devemos estar certos de que o outro fará o mesmo desde que possa, e se de nosso lado hesitarmos e deixarmos a ele a iniciativa. Quem não cresce, diminui quando os outros crescem” (Fichte ,J. G. : Machiavel et autres écrits philosophiques et politiques de 1806-1807. Paris: Payot, 1981, p. 197ss.). e em Spinoza : “Conatus sese conservandi primus et unicum virtutis est fundamentum” (Ética, IV, prop. 22, corolário. “Se a base da virtude ética reside na conservação da vida individual e coletiva, o Estado só pode ser mantido se garantir esta cláusula”. Romano, R. : “Ética e Ministério Público, uma reflexão em três momentos” in Livianu, Roberto (org. ) :  Justiça, cidadania e democracia (RJ, Scielo Books. Centro Edelstein de Pesquisas Sociais, 2009), pp. 211ss.
[26] Não tenho condições, aqui, de analisar pesquisas recentes sobre o pensamento de Spinoza, que ajudariam muito a entender a sua política e visão da ciência. Envio ao livro de Henri Atlan, Cours de philosophie biologique et cognitiviste, Spinoza e la biologie actuelle (Paris, Odile Jacob 2018).
[27] Dagognet, F. :  Philosophie de l’Image. (Paris, Vrin, 1984). O autor faz  análise minuciosa do Livro sobre o Estado das Almas, mostrando inclusive as fichas onde eram postos os dados dos indivíduos e famílias.
[28] Roberto Romano:  “Reflexões sobre Impostos e razão de Estado” Revista de Economia Mackenzie, Ano 2, número 2, 2004. http://editorarevistas.mackenzie.br/index.php/rem/article/view/766

[29] “As for the favour of the gods, we expect to have it as well as you; for we neither do nor require anything contrary to what mankind hath decreed, either concerning the worship of the gods or concerning themselves. For of the gods we think according to the common opinion; and of men, that for certain by necessity of nature they will everywhere reign over such as they be too strong for. Neither did we make this law nor are we the first that use it made; but as we found it, and shall leave it to posterity for ever, so also we use it, knowing that you likewise, and others that should have the same power which we have, would do the same. So that forasmuch as toucheth the favour of the gods, we have in reason no fear of being inferior. And as for the opinion you have of the Lacedaemonians, in that you believe they will help you for their own honour, we bless your innocent minds, but affect not your folly.  For the Lacedaemonians, though in respect of themselves and the constitutions of their own country they are wont for the most part to be generous; yet in respect of others, though much might be alleged, yet the shortest way one might say it all thus: that most apparently of all men, they hold for honourable that which pleaseth, and for just that which profiteth. And such an opinion maketh nothing for your now absurd means of safety.”,Thucydides, History of the Peloponnesian War, Livro 5, 105 tradução de Tomas Hobbes  notas e introdução de David Grene (Chicago, The University of Chicago Press, 1989), p. 368.

[30] A temática do interesse, suscitada no texto de Tucídides e na sua leitura hobbesiana, tem profundo impacto no século XVII e nas teorias da razão de Estado. Uma obra excepcional pela qualidade teórica e pelos dados históricos coletados é a publicada por Christian Lazzeri, na edição do escrito de Henri Rohan : De l'intérêt des princes et des États de la chrétienté ( Paris. PUF, 1995). Cf. Church, W.F. : Richelieu and Reason of State (NJ, Princeton, 1972), p. 352 e ss.


[31] Para a minuciosa análise dos embates entre a razão de Estado e a razão da Igreja, defendidas respetivamente por seguidores do poder laico e pelos defensores da soberania indireta do papa, cf. Bourdin, Bernard: Theological-political origins of the modern State , the controversy between James I of England & Cardinal Bellarmine  (Washington, The Catholic University of America Press, 2010).
[32] Catteuw, L. Censures et raisons d´État, une histoire de la modernité politique, xvie – xviie siècle (Paris, Albin Michel, 2013).
[33] Borreli. G. : Ragion di Stato e Leviatano, conservazione e scambio alle origini della modernità politica (Bologna, Il Mulino, 1993), p. 64.
[34] “La raison d´État antimachiavélienne” in Lazzeri, Christian e Reynié, D. : La raison d´État, Politique et Rationalité (Paris, puf, 1992)
[35] Citado por Senellart.
[36] Conferir a nota 15 abaixo.
[37] Steeg, Jules: l´Edit de Nantes et sa Révocation (Paris, Librairie Centrale des Publications Populaires, 1886).
[38] Cf.  Ana Luiza Reis Bedê: Estratégia de uma mise-en- scène 'Correspondência (1762-1765)' e 'Traité sur la tolérance (1763)' de Voltaire (doutorado, USP, 20070 in http://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8146/tde-06112007-101712/en.php

[39] Reinach, Joseph: Histoire de l ´affaire Dreyfus. Esterhazy (Paris, E. Fasquelle, 1901-1911). Cottret, Bernard: Histoire de la Reforme Protestante (Paris, Perrin, 2001).
[40] Para maiores detalhes hediondos, cf. Cointet, Jean-Paul : Histoire de Vichy (Paris, Perrin, 2003), sobretudo p. 52ss.
[41] Pétain et le régime de Vichy (PUF, Que sais-je ?, 1720, 1978).  p. 49-50.
[42] A roubalheira foi inaugurada na Alemanha. Os ricos germânicos empobrecidos pela mega inflação e por seus gastos de gente nobre, aproveitaram a guerra contra os judeus para pilhar casas, bens vários, sempre em parceria com os nazistas. Uma descrição de tal selvageria encontra-se no pungente livro de Fabrice d´Almeida : La vie mondaine sous le nazisme (Paris, Perrin, 2008).
[43] Jean-Paul Sartre : « Qu’est-ce qu’un collaborateur? », Situations, II. Septembre 1944-décembre 1945 Arlette Elkaïm-Sartre [éd.], Paris, Gallimard, 2012, p. 199

[44] Cf. Mathivon, A. : L´Église Catholique et l ´Allemagne Nazie (Paris, Stock, 1964). no livro são comentados os pontos mais fortes da Concordata que arrancou da vida política, em proveito nazista, a militância dos católicos alemães, leigos ou sacerdotes.
[45] Kertzer, D. I. O papa e Mussolini, a conexão secreta entre Pio XI e a ascensão do fascismo na Europa.(RJ, Intrinseca ed, 2017).
[46] Dias, R. :  Imagens de Ordem, A doutrina católica soe autoridade no Brasil, 1922-1933. (São Paulo, Unesp ed. 1996).
[47] Antoniazzi, A. : “Leitura Sócio-pastoral da Igreja no Brasil. (1960-2000), Igreja Católica e  atuação política.”
[48] Berstein, Carl e Politi, Marco: Sua Santidade João Paulo II e a História Oculta de Nosso Tempo (Ed. Objetiva, 1990.
[49] Boff, Clodovis; “A igreja da Esperança”, Revista Leia Livros. Republicado por Roberto Romano no seginte endereço eletrônico : https://forumdiderot.blogspot.com/2018/02/roberto-romano-memorias-da-esquerda.html

[50] E. Voegelin, Hitler und die Deutschen( wilheim Finker Verlag) em especial os capítulos seguintes;Katholischer Widerstand gegen die Entmenschlichung:Alfred Delp; Ein Vademecum für Kleriker und Theologen ; Die Spannung zwischen der Kirche als sozialer Institution und als Gemeinschaft universaler Humanität unter Christus; Fortschritte und Rückschritte in der Differenzierung des Wissens um die Präsenz unter Gott; Repräsentation universaler Menschlichkeit durch die Kirche: Aufgabe und Scheitern” ;  Romano, Brasil, Igreja contra Estado (Kayrós).  Em especial o capítulo sobre a  Igreja autocentrada.
[51] Duarte, R. : “ Integralismo e ação católica: sistematizando as propostas políticas e educacionais de Plínio Salgado, Jackson de Figueiredo e Alceu Amoroso Lima no período de 1921 a 1945”.
http://www.anped.org.br/sites/default/files/gt02-1161-intok.pdf   ; Marchette, T. D. : “os verdes que não eram verdes. O   integralismo na Ponta Grossa (PR) no início da década de 1930” in Dantas, Alexandre   e outros (Org.) À margem dos cânones (Curitiba, Ed. Universidade Federal do Paraná, 2013). Araújo, R.A. B : Totalitarismo e revolução, o integralismo de Plinio Salgado (RJ, Zahar, 1988); Trindade, H. : O integralismo, o fascismo brasileiro na década de 30 (RF, Difel, 1979).


[52] Dos Santos, C. Xavier:  “A relação da Igreja Católica com o Estado Novo través do olhar da imprensa católica gaúcha”IX Encontro Estadual de História,ANPUH-RS http://eeh2008.anpuh-rs.org.br/resources/content/anais/1211599064_ARQUIVO_ArelacaodaIgrejaCatolicacomoEstadoNovo.pdf   Em Porto Alegre, no ano de 1939, ainda vigora na mente de hierarcas a tão sonhada “soberania indireta” nos parâmetros de Bellarmino : “ As relações amistosas do governo arquidiocesano com o poder temporal do Estado e da União exprimem perfeitamente nossa orientação de sempre. Pois ambos os poderes, o temporal e o espiritual, foram instituídos por Deus para dirigir os povos, si bem que em esferas diferentes”. Dom João Becker, citado por Dos Santos, C. Xavier, op. cit. p. 7.


[53] Sobretudo no tratado muito ambiguo, pois parece católico e não o é na sua inteireza, o famoso Du Pape. Cf. Latreille, c. : Joseph de Maistre et la papauté (Paris, Hachette  et Cie. 1906). Existiu uma clara discordância quanto ao papel do soberano pontífice, especialmente entre os católicos liberais e seus próximos. Cf. Howard, Thomas Albert : The pope and the professor : Pius IX, Ignaz Von Dollinger, and the quandary of the modern age (Oxford University Press, 20170. No Brasil, a tradução e comentários de Rui Barbosa : O papa e o concílio ( RJ, Brown & Evaristo, 1877).
[54]Vale retomar a leitura daquela revista estratégica para a compreensão do catolicismo reacionário. Ela, agora, está ao alcance dos leitores comuns, pois está disponível na internet, para cópia PDF: http://www.obrascatolicas.com/index.php?option=com_docman&task=cat_view&gid=60&Itemid=29

[55] Carta de Pio XI ao cardeal De Gasparri (1929) in Utz, A.F. : La doctrine Sociale de l ´Église à travers les siècles (Paris, Beauchesne, 1973), T.III, p. 2354.
[56] A History of Public Law in Germany 1914-1945 (Oxford University Press, 2004),
[57] H.F. Augstein:  Race - the origins of an Idea: 1760-1850 (Bristol, Thoemmes, St. Augustine  Press, 1996)
[58] The Foundations of the 19th Century, 2nd edition published by John Lane, The Bodley Head, 1912, na internet o PDF : https://archive.org/details/TheFoundationsOfThe19thCentury_362

[59] Bell, R. H. :  Wagner´s Parsifal: an appreciation in the light of his theological journey (Wipf and Stock Publishers, 2013).
[60] Magee, B. : Wagner and Philosophy (London, Penguin Books, 2001). Sorlin, P. : L´antisémitisme allemand (Paris, Flammarion, 1969).

[61] Todo o pensamento romântico ligado às metáforas orgânicas formou doutrinas da sociedade e do Estado na virada do século 19 ao século 20. Mesmo hoje tal modo de imaginar o social, o jurídico e o política se apresenta, sob as capas de um aggiornamento terminológico e técnico. Quanto ao momento crucial, anterior aos totalitarismos, obras relevantes definiram a fantasmagoria do organicismo contra o pensamento mecânico ocidental (cuja fonte maior é Platão) com resultados fatídicos. Autores como Ferdinand Tönnies , Gemeinschaft und Gesellschaft (Leipzig: Fues's Verlag), tentaram exorcizar as bases do mecanismo como fundamento do mundo social e político. Não por acaso Tönnies redigiu uma rigorosa e ainda hoje útil biografia de Tomas Hobbes, o campeão no século 17 do pensamento mecânico aplicado à vida social e política. Para bem refutar, o sociólogo romântico estuda a fundo o pensamento que recusa. Cf. Tonnies, F.: Thomas Hobbes – Leben und Lehre (Profil Verlag, 2014). Tenho estudado o assunto e publiquei livros e artigos sobre ele, mas ainda julgo que um pequeno volume, de 1910, traz uma aproximação política e jurídica esclarecedora no plano da teoria do Estado : Coker, F.W. : Organismic Theories of the State, nineteenth century interpretations os the State as Organism or as Person (NY, Columbia University. 1910).



[62] Sobre a figura e as ações de Sartre, as polêmicas se repetem aos milhares. Para entender um pouco a dialética do filósofo e literato (além de péssimo teatrólogo), cito apenas um texto, mas ue abrange a carreira daquele acadêmico que não se desejou acadêmico. Michel Winock : “ Sartre s´est-il toujours trompé ?” https://www.diplomatie.gouv.fr/IMG/pdf/0203-Winock-FR-5.pdf Para uma visão mais ampliada sobre o tema, os seguintes livros importam : Guégan, Stéphane (Org.) Les Arts sous l´occupation, chroniques des années noires  (Beaux-Arts éditions, coll. "Histoire de l'art"); Riding, Alan : Et la fête continue. La vie culturelle à Paris sous l´occupation  (ed. Plon, Paris); Dorléac. L. B. : L´ art de la défaite, 1940-1944 (Paris, Seuil, 1993) Chirat, R. e Barrot, o. : La vie culturelle dans la France occupée (Paris, Gallimard, 2009).


[63]  Le Goff, Jacques : Pour un autre Moyen Age, (Paris, Gallimard, 1978).
[64] Blythe, J. M. : Le gouvernement idéal et la constitution mixte au Moyen Âge, (Fribourg, Academic Press, Ed. Du Cerf, 2005, p. 386. Ver ta,bém : Émilie Rosenblieh, « Juridiction conciliaire et juridiction pontificale au temps du concile de Bâle (1431-1449) : recours, procédures et suppliques », Archives de sciences sociales des religions [En ligne], 160 | octobre-décembre 2012, mis en ligne le 14 mars 2013, consulta  20 junho 2018. URL : http://journals.openedition.org/assr/24597

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