Qual o recado que absolvição da chapa Dilma-Temer passa para a sociedade?
Aiuri Rebello
Do UOL, em São Paulo
- Daniel Teixeira/Estadão Conteúdo
Ao longo de quatro dias, o Brasil acompanhou o julgamento da chapa
Dilma-Temer no TSE (Tribunal Superior Eleitoral), que podia cassar o
mandato do presidente Michel Temer e declarar a petista como inelegível
por oito anos. O resultado terminou com a absolvição de ambos por quatro
votos a três. Qual é o recado que essa decisão histórica passa para a
sociedade brasileira?
A pedido do UOL, o
economista-chefe de uma conceituada corretora de valores, um professor
de direito constitucional e um cientista político analisam o cenário.
Confira abaixo:
"Um julgamento como esse desacredita o sistema democrático brasileiro"
Roberto Romano, professor de ética e política na Unicamp (Universidade Estadual de Campinas)
"Era
absolutamente previsível o resultado, mas mesmo assim no final fiquei
enjoado. Ele garantiu sua permanência ao indicar os dois ministros que
votaram para absolvê-lo. Foi uma espécie de salva-vidas que o TSE jogou
para o Temer, mas acredito que mesmo assim não irá ajudar muito dado o
tamanho do enrosco que ele se meteu. Ganhou uma sobrevida, mas a vida
dele está a cada semana que passa mais complicada e, sob pressão, ele
tem dado muitos passos em falso como nessa história do avião da JBS.
Enquanto isso ele vai perdendo credibilidade, fica cada vez mais sem
apoio popular que, com uma eleição no horizonte, acaba levando embora
também o apoio político e, por fim, o do dito mercado. Vai ficar
caríssimo para ele manter o apoio da base aliada, que eu chamo de base
comprada, em meio a tanta dificuldade. Temer ficará sujeito a
chantagens. É uma situação muito parecida com a de Dilma no fim do
governo: ela não governava mais, dedicava-se integralmente a manter-se
no cargo. É o que está fazendo o presidente.
Paralelamente,
nós temos um Congresso completamente desmoralizado, que foi
praticamente inteiro eleito da mesma forma e com o mesmo dinheiro sujo
da chapa Dilma-Temer. Até agora, a Justiça tem servido com um esteio de
confiança dos cidadãos no Estado Brasileiro, já que a moral do Poder
Executivo e do Legislativo está em frangalhos. Assim, uma decisão dessa
abala a imagem do Poder Judiciário. Um julgamento como esse desacredita o
sistema democrático brasileiro ainda mais, principalmente entre os mais
jovens. Isso é gravíssimo e cria as condições ideais para o nascimento
de um regime autoritário. Eu estou muito preocupado com o futuro da
nossa democracia."
"Decisão foi 80% técnica e 20% de olho nas consequências"
Floriano de Azevedo Marques, professor-titular do Largo São Francisco da USP (Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo)
"O
que prevaleceu foi uma posição extremamente formal que se ateve aos
autos da petição inicial. O que discutiu-se, basicamente, foi se a
decisão seria baseada na petição inicial ou nas delações e provas, que
não existiam quando a ação foi impetrada, da Operação Lava Jato.
Tecnicamente, juridicamente, foi uma decisão correta, em que pese que
para boa parte da população, o que o TSE fez foi fechar os olhos para a
corrupção. Apesar dessa percepção, foi uma decisão técnica e correta.
Mas
os ministros não são alheios à realidade, e nesse sentido acredito que a
decisão foi 80% técnica e 20% de olho nas consequências. Mas é
interessante, porque não sei se olharam para as consequências adequadas.
Por um lado acredito que pesou essa questão da enorme crise política e
econômica que vivemos, a ideia de que uma cassação podia atrapalhar
ainda mais a vida no país. Mas outra consequência da decisão foi passar a
impressão de que o tribunal é leniente com a corrupção. É uma situação
muito complicada a do julgador. A decisão foi correta tecnicamente, mas
passou uma impressão muito ruim para a sociedade."
"Para o mercado, tanto faz se o Temer cai ou fica"
André Perfeito, economista-chefe da Gradual Investimentos
"Essa
decisão já era esperada, já trabalhávamos com esta hipótese. Do ponto
de vista do mercado, a verdade é que hoje tanto faz se o Temer cair ou
não. O que importava era a reforma da Previdência e, desde as delações
da JBS, ninguém sério acredita mais que seja possível aprovar o pacote
proposto, mesmo com todas as concessões. E o mercado sabe que nem o
Temer nem um eventual presidente 'tampão' vai conseguir entregar a
reforma da Previdência. A tendência macroeconômica é que, com a economia
estagnada, a inflação siga em forte queda e, com isso, os juros vão
continuar caindo de forma expressiva. Neste cenário, tanto faz se
explodir uma bomba em Brasília. Então, tanto faz.
O
mercado também já sabia que o crescimento econômico vai acontecer só a
partir de 2018, que as medidas tomadas até agora não vão surtir efeito
no curto prazo. O que o mercado gosta é de previsibilidade. Por isso,
talvez, tenha havido uma pequena preferência por deixar do jeito que
está, com o Temer mesmo, do que passar pelo doloroso processo de eleição
indireta.
Agora, eu acho que isso tem um aspecto bom.
Não concordo com o projeto de reforma da Previdência do jeito que ele
foi colocado, e pelo visto muita gente no país não quer essa reforma. De
acordo com nossas previsões, em 2018 a economia vai voltar a crescer de
verdade.
Como é um ano eleitoral, os candidatos vão
se dividir em dois grandes grupos: contra e a favor das reformas (as
feitas e as futuras). Como a economia vai melhorar um pouco, o mercado
de trabalho vai reagir e tal, o projeto econômico-liberal de direita
estará fortalecido no discurso de seus políticos. Caso ganhe o candidato
que defendeu as reformas na campanha e disse que as faria, haverá toda a
legitimidade necessária para discutir isso e implantar as medidas de
forma democrática. Do jeito que está não adianta. O problema do Brasil
não é econômico, é político. Assim que recuperarmos a legitimidade
política no Brasil, a economia se resolve sozinha."
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