Flores

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quinta-feira, 28 de setembro de 2017

Prof. Luiz Marques, Unicamp. Sobre os intelectuais, os cientistas, o desastre. Parte de correspondência a mim enviada pelo lúcido pesquisador da Unicamp. RR

Como reintroduzir a questão da natureza no centro das reflexões próprias da filosofia e das ciências humanas, as quais nasceram justamente a partir da afirmação de que o vínculo social era auto-inteligível (e portanto podia e devia se emancipar das condicionantes "naturais"). 

Operação por certo fecunda no século XIX e parte do século XX. E mesmo até há pouco, até, digamos, o advento do Antropoceno, se datarmos esse advento, como é a tendência atual, de ~1950. 

Essa nova época geológica, de alguma forma, "data" as ciências humanas e contribui para o declínio do filósofo e do intelectual, não apenas como tipo sociológico, mas também, e sobretudo, para usar o jargão, como "consciência reflexiva da sociedade": de Voltaire a Zola, Sartre e Chomski. Quem mais, depois desse octogenário? 

O interessante é que se os filósofos e intelectuais foram, em grande medida, destronados pelo pensamento quantitativo e, portanto, pelos cientistas, seu declínio de ontem preludia o declínio dos próprios cientistas hoje. Sou muito tentado por esse cânone (no sentido musical do termo).

De fato, o novo Estado-Corporação não precisa obviamente do intelectual, mas tampouco precisa mais do cientista (salvo o da Embrapa, o ligado ao "aperfeiçoamento" das cadeias produtivas) que fala em aquecimento global, em aniquilação biológica, em poluição, em "primavera silenciosa". Não precisa dos cientistas da Union of Concerned Scientists, do Bulletin of Atomic Scientists ou dos cientistas do IPCC, da IUCN, da NOAA etc, etc, os quais, de alguma forma, preencheram o vazio do pensamento crítico deixado pela obsolescência dos intelectuais. Não é talvez eloquente e sintomático que o Chomski fale, não a partir de Berkeley ou de Stanford, mas a partir do MIT? 

O problema é que o cientista foi idealizado e se idealizou para ser o profeta e herói de um futuro radiante para a sociedade. Jamais se concebeu como o arauto da catástrofe, que anuncia seu não-futuro. Sua forma mentis é a de um problem solver (excesso de CO2 na atmosfera? É simples: vamos fazer geoengenharia!...). 

Em suma, ele agora acusa e suas acusações têm mais dente que a dos intelectuais, porque avisam que o otimismo hegelo-marxista não é mais da nossa época, porque a história se coloca problemas, hoje e pela primeira vez, que ela NÃO pode/sabe resolver. 

Mas o cientista não se dá bem na pele do intelectual, o fulano que problematiza, que contradiz, que é o "negativo" hegeliano, que levanta problemas sem solução ou cuja resolução engaja mudanças de paradigma civilizacional, que não são a sua praia e com cujas dinâmicas histórico-filosóficas ele não tem familiaridade alguma. Problemas irredutivelmente qualitativos, i.e., não susceptíveis de uma tradução em quantidades...

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