Deputados vão ao exterior sem prestação eficiente
Casa autoriza 610 viagens internacionais desde 2015 – alta de 41% em relação à legislatura passada; falta clareza na apresentação dos resultados das missões oficiais
Adriana Ferraz,
O Estado de S.Paulo
19 Novembro 2017 | 05h00
19 Novembro 2017 | 05h00
A Câmara dos Deputados
autorizou de 2015 até este ano 610 viagens internacionais em missões
oficiais. Os deslocamentos representam uma alta de 41% se comparados ao
mesmo período da legislatura anterior – entre 2011 e 2013 – e quase se
iguala ao total de todo o mandato passado (619). O crescimento, porém,
não foi acompanhado de um aprimoramento na prestação de contas dos
parlamentares que não chegam nem sequer a relatar a programação cumprida
fora do País.
Levantamento feito pelo Estado com base
nos dados publicados pela Câmara encontrou relatórios genéricos, sem
qualquer detalhamento ou apresentação dos resultados das missões. A
falta de cuidado na forma como se presta – e se fiscaliza – as viagens
faz com que haja documentos que só listam a agenda predeterminada para o
roteiro, sem fotos dos encontros, nomes das autoridades visitadas ou a
relevância das reuniões para a atividade legislativa desenvolvida no
Brasil.
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A
assessoria da presidência da Câmara, responsável por autorizar os
deslocamentos internacionais, não explicou o motivo do aumento das
viagens e dos gastos com diárias ou as despesas com passagens aéreas. O
órgão orientou o Estado a pedir os dados pela Lei de Acesso à Informação, o que já foi solicitado.
A Câmara liberou, ao todo, a ida a 107 cidades, em 54
países diferentes. No ranking dos destinos mais visitados estão Nova
York, Genebra, Paris, Roma, Bruxelas, Londres e Washington (veja quadro
nesta página). Mas há exemplos também de roteiros realizados em Nassau,
nas Bahamas; Addis Abeba, na Etiópia; Praga, na República Checa; e Baku,
no Azerbaijão.
Para o professor de Ética e Filosofia da Universidade
Estadual de Campinas (Unicamp) Roberto Romano, a informação do que os
parlamentares fizeram em viagens deveria ser mais bem detalhada e
transparente. “Em se tratando de dinheiro público, um centavo é um
tesouro. Não há o direito de não prestar contas de tudo o que você
gastou. Do ponto de vista ético, é preciso prestar contas não apenas
formais, ‘eu gastei tanto’ e ‘fiz aquilo’, mas trazer os resultados
parciais do que foi discutido para distribuir aos seus pares e à
sociedade.”
Romano também questionou necessidade das agendas no
exterior. “Graças à tecnologia, você tem condição de estar online e não
presencialmente. O último recurso é a viagem física. Outro ponto: você
não precisa de uma comitiva de grande porte, com dez deputados”, disse o
professor da Unicamp.
Os dados mostram, por exemplo, que a comitiva de nove
deputados comandada no início do mês pelo presidente da Casa, Rodrigo
Maia (DEM-RJ), a Israel, Itália, Portugal e Palestina não é uma exceção.
Só neste ano, dos 513 deputados, 134 foram autorizados a deixar o
Brasil.
DESTINOS
Segundo os
parlamentares que já viajaram em missões oficiais, a escolha dos
destinos não é aleatória, ela tem relação com a localização de uma série
de órgãos internacionais, como a sede das Nações Unidas, que fica em
Nova York, ou o Parlamento Latino-Americano (Parlatino), localizado na
Cidade do Panamá.
Para autorizar uma viagem internacional, a presidência
da Câmara determina que o deslocamento deve seguir a regra do interesse
público: deputados podem viajar quando convidados para eventos de
Parlamentos de outros países e organismos com os quais a Casa se
relaciona. Nessa lista está o Parlatino, que tem como vice-presidente
Heráclito Fortes (PSB-PI), o atual campeão de viagens ao exterior.
Desde junho de 2015, o deputado deixou o País em 17
datas – oito delas em 2016. Na primeira vez, esteve em Le Bourget, na
região metropolitana de Paris, para participar do 51.º Salão da
Aeronáutica e do Espaço. Na última, visitou Nova York e Washington, para
tratar de reforma tributária. No cumprimento do atual mandato, ainda
passou pela Cidade do Panamá (seis vezes), Roma (duas vezes), Cartagena e
Buenos Aires.
“Não fiz turismo, são viagens de trabalho. Imagina um
País como o nosso não ter uma participação no Parlatino? Temos de acabar
com essa mania de cachorro vira-lata. O Brasil quer ou não ser
grande?”, questionou o deputado, um dos nove parlamentares que viajaram
recentemente com Maia.
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