Evento conjunto entre Embrapa e Unicamp expõe as várias faces da pós-verdade
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O
filósofo do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas (IFCH) da Unicamp
Roberto Romano iniciou a discussão diferenciando os conceitos de
mentira e má-fé. “Se um mentiroso mente ao seu interlocutor, o indivíduo
de má-fé mente para si mesmo. Eis o paradoxo: aquele a quem se mente e
aquele que mente são uma só, e a mesma, pessoa. O que significa que devo
saber, como enganador, a verdade que é mascarada para mim enquanto for
enganado. Devo saber essa verdade para escondê-la de mim”, explicou.
Segundo
ele, “se não encararmos a questão da má-fé individual e coletiva, é
melhor não falarmos sobre questões como pós-verdade e fake news”. O
filósofo destacou ainda que fake news são tão antigas quanto a fala
humana e apontou Platão como um grande combatente do “lugar da
não-verdade”.
Carlos
Zanotti, professor da Faculdade de Jornalismo da PUC-Campinas,
enfatizou que a circulação de informações falsas não é uma novidade. Por
outro lado, destacou o alcance atingido por elas com a internet e o
poder que tem representado essa propagação. De acordo com ele, o alerta
dado pelas eleições presidenciais norte-americanas é de que a produção e
difusão de notícias falsas coloca em perigo a própria democracia.
Zanotti
citou o exemplo de uma empresa especializada na produção de notícias
falsas na cidade de Poços de Caldas, no interior de São Paulo, que chega
a faturar 100 mil reais por mês. “É mais lucrativo produzir notícias
falsas do que verdadeiras”, lamentou. Para o jornalista, o principal
responsável por esse cenário é a estrutura de algoritmos que direciona
as publicidades conforme os cliques.
Como
forma de combate às notícias falsas e à consequente descrença no
conteúdo jornalístico em circulação da internet, Angela Pimenta,
presidente do Instituto para o Desenvolvimento do Jornalismo (Projor),
apresentou o Projeto Credibilidade. Segundo ela, o projeto visa
diferenciar o conteúdo jornalístico de qualidade do que é “ruído”, como
classificou as diversas formas de notícias falsas. Ela procurou refletir
sobre a “fragmentação da narrativa noticiosa no ambiente digital” e
sobre o “viés de confirmação”, segundo o qual tende-se a acreditar nas
informações que confirmam as próprias crenças, o que torna o jornalista
mais suscetível a inverdades.
O
projeto, braço brasileiro do The Trust Project, é desenvolvido pela
Universidade de Santa Clara, nos EUA, e busca elaborar ferramentas de
identificação e promoção do jornalismo digital confiável e de qualidade.
O
jornalista Carlos Orsi, especializado em cobertura científica,
sinalizou técnicas de combate às notícias falsas. Ressaltou, por
exemplo, que os jornalistas não devem buscar controvérsias onde elas não
existem. “Equilíbrio não é objetividade. Os jornalistas precisam
abandonar o ideal platônico do ponto de vista de lugar nenhum. É preciso
evitar tratar como controvérsia algo que não é. Você sabe que um dos
lados está errado, mas finge que há controvérsia. Precisamos assumir a
responsabilidade de contar a verdade.”
Mauricio
Tuffani, também jornalista especializado na área, argumentou que muitas
vezes as relações de poder e econômicas envolvidas na produção
científica não são abordadas pelo jornalismo científico. “A comunidade
científica não é uma instituição transparente”, sublinhou.
O
físico Peter Schulz, secretário de comunicação da Unicamp, foi além,
problematizando a pós-verdade dentro da ciência. Schulz citou o exemplo
de artigos publicados em periódicos consagrados e posteriormente
identificados como fraudes. Abordou ainda a supervalorização das
referências sem o devido embasamento, que dão uma falsa credibilidade
aos artigos científicos. Falou sobre a importância de a ciência ser
entendida como processo.
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