22 Fevereiro 2018
Uma autêntica rebelião contra seu bispo, simplesmente
porque não é de sua etnia. Padres e fiéis estão há seis anos sem aceitar
a nomeação de dom Peter Ebere Okpaleke, que nem sequer pôde tomar posse de sua diocese. O Papa interveio e obrigou os padres a pedir perdão a seu bispo. Cerca de 200 aceitaram, mas relutantemente.
Para facilitar as coisas para Roma e servir melhor a Igreja, o prelado designado acaba de apresentar ao Papa sua renúncia. Mesmo assim, ficam muitas perguntas abertas. Tentamos responder a algumas delas.
A reportagem é de Cameron Doody, publicada por Religión Digital, 21-02-2018. A tradução é do Cepat.
O que aconteceu imediatamente após Okpaleke ter sido nomeado bispo de Ahiara, por Bento XVI, no dia 7 de dezembro de 2012?
“Desde o anúncio de minha nomeação, houve reações violentas e resistência por parte de um grupo de sacerdotes diocesanos de Ahiara, de leigos e de outros”, explicou o próprio dom Okpaleke. Reações que incluíram o bloqueio da catedral por fiéis do grupo étnico majoritário da diocese – os Mbaise, diferente daquele ao qual pertence Okpaleke, os Igbo –, no dia em que estava prevista a instalação do prelado.
Esta situação de tensões étnicas “não melhorou, mas, ao final, foi consagrado no dia 21 de maio de 2013, fora da diocese, no seminário maior de Ulakwo, Owerri, por causa da situação na diocese”, continuou Okpaleke. Embora, “até agora não consegui tomar posse da diocese de Ahiara... cinco anos, dois meses e uma semana desde minha nomeação pontifícia”.
Esta situação de tensões étnicas “não melhorou, mas, ao final, foi consagrado no dia 21 de maio de 2013, fora da diocese, no seminário maior de Ulakwo, Owerri, por causa da situação na diocese”, continuou Okpaleke. Embora, “até agora não consegui tomar posse da diocese de Ahiara... cinco anos, dois meses e uma semana desde minha nomeação pontifícia”.
Qual é o conflito étnico em Ahiara?
De entre os mais de duzentos grupos étnicos que convivem na Nigéria, há três principais: os Igbo, no sudeste, os Yoruba, no sudoeste, e os Hausa, no norte. A Diocese de Ahiara está em uma região Mbaise dentro de um estado – o de Imo – de maioria Igbo. Uma das principais razões que explicam a rejeição dos fiéis de Ahiara a dom Okpaleke, membro da etnia Igbo: estes fiéis sentiam que a nomeação de uma pessoa Igbo que, além disso, veio de fora da diocese – concretamente, da região de Anambra – foi um exemplo de discriminação contra os católicos Mbaise, especialmente quando seu anterior bispo, Víctor Adibe Chikwe, pertencia a esta última etnia.
O que o Vaticano fez para solucionar a situação?
Após se tornar impossível que Okpaleke tomasse posse de sua diocese, o Papa Francisco nomeou o cardeal John Onaiyekan, de Abuja, capital da Nigéria, como administrador apostólico da diocese.
A diocese continuou à deriva até o dia 8 de junho de 2017, quando o Papa Francisco recebeu no Vaticano uma delegação de Ahiara, onde ameaçou com medidas como a suspensão a divinis a todos os sacerdotes da diocese que não aceitassem o mandato de Okpaleke.
“Estou muito entristecido pelo que acontece na Igreja de Ahiara”, declarou o Papa naquele momento, destacando, por sua vez, que “os que se opuseram à tomada de posse do bispo Okpaleke querem destruir a Igreja; isto não é permitido; talvez não percebam, mas a Igreja está sofrendo e o povo de Deus com ela”.
O Bispo de Roma pediu que cada sacerdote ou religioso incardinado na diocese escrevesse “uma carta dirigida a mim pedindo perdão”, manifestando, além disso, sua “total obediência ao Papa” e sua disposição “em aceitar o bispo que o Papa enviar e ao bispo nomeado”.
Segundo comunicou, ontem, a Congregação para a Evangelização dos Povos, o Papa Francisco acabou recebendo “200 cartas individuais de sacerdotes da Diocese de Ahiara, nas quais demonstraram obediência e fidelidade”, embora alguns sacerdotes voltaram a destacar “sua dificuldade psicológica em colaborar com o bispo, após estes anos de conflito”.
A diocese continuou à deriva até o dia 8 de junho de 2017, quando o Papa Francisco recebeu no Vaticano uma delegação de Ahiara, onde ameaçou com medidas como a suspensão a divinis a todos os sacerdotes da diocese que não aceitassem o mandato de Okpaleke.
“Estou muito entristecido pelo que acontece na Igreja de Ahiara”, declarou o Papa naquele momento, destacando, por sua vez, que “os que se opuseram à tomada de posse do bispo Okpaleke querem destruir a Igreja; isto não é permitido; talvez não percebam, mas a Igreja está sofrendo e o povo de Deus com ela”.
O Bispo de Roma pediu que cada sacerdote ou religioso incardinado na diocese escrevesse “uma carta dirigida a mim pedindo perdão”, manifestando, além disso, sua “total obediência ao Papa” e sua disposição “em aceitar o bispo que o Papa enviar e ao bispo nomeado”.
Segundo comunicou, ontem, a Congregação para a Evangelização dos Povos, o Papa Francisco acabou recebendo “200 cartas individuais de sacerdotes da Diocese de Ahiara, nas quais demonstraram obediência e fidelidade”, embora alguns sacerdotes voltaram a destacar “sua dificuldade psicológica em colaborar com o bispo, após estes anos de conflito”.
Como o bispo explica a renúncia a sua sede?
“Tendo em conta o mencionado, assumi conscientemente a convicção de que continuar como bispo de Ahiara já não repercute em benefício da Igreja”, afirmou Okpaleke.
“Não acredito que meu apostolado possa ser eficaz em uma diocese onde
alguns sacerdotes e fiéis não me aceitam. Por isso, pelo bem da Igreja e da Diocese de Ahiara em particular, pedi humildemente ao Santo Padre que aceite minha renúncia ao cargo de bispo de Ahiara. Também tomou esta decisão pelo bem de todos os fiéis de Ahiara, especialmente aqueles que permaneceram fiéis em uma Igreja local controlada por alguns sacerdotes”, ressaltou.
“Considero minha renúncia como a única opção correta para facilitar a reevangelização dos fiéis e, muito mais importante e urgente, dos sacerdotes de Ahiara, especialmente agora que o Santo Padre e seus colaboradores da Cúria podem distinguir os sacerdotes que afirmam sua lealdade ao Santo Padre daqueles que decidiram se retirar, desobedecendo à Igreja católica”.
Após agradecer aqueles que lhe ofereceram apoio durante todos estes anos difíceis, Okpaleke reiterou seu amor e sua oração aos fiéis de Ahiara e convidou a todos ao arrependimento. “Convido a todos os sacerdotes dissidentes a voltar a examinar sua motivação inicial para se tornarem sacerdotes da Igreja católica. Urge o arrependimento e a reconciliação”.
“Considero minha renúncia como a única opção correta para facilitar a reevangelização dos fiéis e, muito mais importante e urgente, dos sacerdotes de Ahiara, especialmente agora que o Santo Padre e seus colaboradores da Cúria podem distinguir os sacerdotes que afirmam sua lealdade ao Santo Padre daqueles que decidiram se retirar, desobedecendo à Igreja católica”.
Após agradecer aqueles que lhe ofereceram apoio durante todos estes anos difíceis, Okpaleke reiterou seu amor e sua oração aos fiéis de Ahiara e convidou a todos ao arrependimento. “Convido a todos os sacerdotes dissidentes a voltar a examinar sua motivação inicial para se tornarem sacerdotes da Igreja católica. Urge o arrependimento e a reconciliação”.
O que acontece agora e por que o Papa Francisco cedeu?
“Tendo em consideração o arrependimento” demonstrado pelos sacerdotes de Ahiara, Propaganda Fide também comunicou que “o Santo Padre não quis proceder com sanções canônicas” contra eles. Sim, pediu aos padres díscolos, não obstante, que reflitam “sobre o grave dano infligido à Igreja
de Cristo”, com a “esperança de que nunca se repitam no futuro tais
ações tão desarrazoáveis de oposição a um bispo legitimamente designado
pelo Santo Padre”, assim como a realização, por sua parte, de “gestos de perdão e reconciliação” com o bispo Okpaleke.
Segundo a Congregação para a Evangelização dos Povos, o Papa Francisco também espera que com a nomeação de um administrador apostólico para a diocese – dom Lucius Iwejuru Ugorji, bispo de Umuahia – “se retome a vida da Igreja [de Ahiara] e nunca mais voltem a produzir ações que firam o Corpo de Cristo”. “O Santo Padre não tem a intenção de nomear um novo bispo em Ahiara, no momento, mas se reserva o direito de seguir tendo uma preocupação especial para com essa diocese ele próprio”, acrescentaram a partir da antiga Propaganda Fide.
Segundo a Congregação para a Evangelização dos Povos, o Papa Francisco também espera que com a nomeação de um administrador apostólico para a diocese – dom Lucius Iwejuru Ugorji, bispo de Umuahia – “se retome a vida da Igreja [de Ahiara] e nunca mais voltem a produzir ações que firam o Corpo de Cristo”. “O Santo Padre não tem a intenção de nomear um novo bispo em Ahiara, no momento, mas se reserva o direito de seguir tendo uma preocupação especial para com essa diocese ele próprio”, acrescentaram a partir da antiga Propaganda Fide.
É um caso isolado na África?
A conhecida crise étnica e tribal que atingiu a Diocese de Ahiara, na Nigéria, “é só a ponta do iceberg”, declarou à Agência Fides o teólogo da Costa do Marfim Donald Zagore, missionário da Sociedade de Missões Africanas (SMA). “Quando na Igreja Católica
– cuja essência significa comunhão, fraternidade e unidade – os membros
estão divididos por questões étnicas e tribais, precisamos fazer
seriamente esta pergunta profética: realmente compreendemos o
significado de nosso tempo e nossa fé?”.
“Infelizmente”, continuou Zagore, “percebemos, dia após dia, que o sangue da cultura, da etnia, da tribo segue sendo mais forte e importante que a água do batismo. O paradigma da “Igreja família de Deus” na África, muitas vezes, parece um discurso sem sentido, que às vezes toma a aparência de uma farsa. Estamos passando, cada vez mais, de uma “Igreja de Deus” a uma Igreja tribal. É necessário dizer firmemente que esta atitude é qualquer coisa menos cristã. O tribalismo não é, de forma alguma, uma característica da Igreja de Jesus Cristo”.
“Infelizmente”, continuou Zagore, “percebemos, dia após dia, que o sangue da cultura, da etnia, da tribo segue sendo mais forte e importante que a água do batismo. O paradigma da “Igreja família de Deus” na África, muitas vezes, parece um discurso sem sentido, que às vezes toma a aparência de uma farsa. Estamos passando, cada vez mais, de uma “Igreja de Deus” a uma Igreja tribal. É necessário dizer firmemente que esta atitude é qualquer coisa menos cristã. O tribalismo não é, de forma alguma, uma característica da Igreja de Jesus Cristo”.
Quais são as implicações do caso Okpaleke para a Igreja universal?
A autoridade exclusiva do Papa em nomear os bispos da Igreja universal não esteve em jogo apenas na Diocese de Ahiara. No contexto da África, concretamente, Francisco – ao insistir que os oponentes de Okpaleke
estavam provocando danos ao Corpo de Cristo – seguia a tradição de
sucessivos pontífices de não deixar que as filiações tribais determinem
as escolhas episcopais do sucessor de São Pedro.
Também há ao menos outros dois contextos no mundo atual onde o precedente estabelecido, agora, pela renúncia de Okpaleke pode ter importantes repercussões.
Um, na Diocese de Osorno, no Chile, onde o atual bispo, Juan Barros, foi objeto de rejeição, durante três anos, de seus fiéis e padres, por seu suposto acobertamento e negligência em abusos perpetrados pelo sacerdote pedófilo Fernando Karadima.
Muitos vaticanistas citaram o conflito na Nigéria quando explicaram a negativa de Francisco em destituir Barros, que foi nomeado bispo por João Paulo II e ratificado por Bento XVI, o que dificultou a possibilidade de que Francisco lhe destituísse sem uma razão convincente.
No entanto, a decisão de Francisco em aceitar a renúncia de Okpaleke, devido à oposição das pessoas, insinua que poderia ocorrer o mesmo com o caso de Barros.
Outro caso parecido – se não exatamente o mesmo – é na China, onde recentemente cresceram as especulações de que, se o Governo e a Santa Sé chegarem a um acordo que permita a retomada de laços diplomáticos, os fiéis católicos podem se ver obrigados a aceitar bispos da Igreja “patriótica”, e como tal não nomeados pelo Papa.
Também há ao menos outros dois contextos no mundo atual onde o precedente estabelecido, agora, pela renúncia de Okpaleke pode ter importantes repercussões.
Um, na Diocese de Osorno, no Chile, onde o atual bispo, Juan Barros, foi objeto de rejeição, durante três anos, de seus fiéis e padres, por seu suposto acobertamento e negligência em abusos perpetrados pelo sacerdote pedófilo Fernando Karadima.
Muitos vaticanistas citaram o conflito na Nigéria quando explicaram a negativa de Francisco em destituir Barros, que foi nomeado bispo por João Paulo II e ratificado por Bento XVI, o que dificultou a possibilidade de que Francisco lhe destituísse sem uma razão convincente.
No entanto, a decisão de Francisco em aceitar a renúncia de Okpaleke, devido à oposição das pessoas, insinua que poderia ocorrer o mesmo com o caso de Barros.
Outro caso parecido – se não exatamente o mesmo – é na China, onde recentemente cresceram as especulações de que, se o Governo e a Santa Sé chegarem a um acordo que permita a retomada de laços diplomáticos, os fiéis católicos podem se ver obrigados a aceitar bispos da Igreja “patriótica”, e como tal não nomeados pelo Papa.
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