No século 20 ocorreram inúmeros
golpes de Estado, produzidos pelo motivos mais diversos em termos ideológicos,
religiosos, políticos. Uma parte considerável daqueles atos tinha coreografia
definida: na madrugada soldados dirigiam tanques de guerra e tomavam as ruas
das capitais. Estações de rádio e televisão transmitiam informes do governo
ameaçado. Pouco a pouco, às vezes com rapidez, o legalismo silencia e surgem
proclamações rebeldes. Música patriótica compõe o apelo emocional ao povo.
Caídos os dirigentes antigos os novos, não raro uma junta, interrompem os
direitos civis, sempre para limpar a pátria de toda corrupção, afastar os
inimigos comunistas, imperialistas norte-americanos, ou algo assim. Longos anos de arbítrio deixam irresolvidos
os problemas apontados como origem do golpe. Novo levante militar, piora a
situação do Estado. Poucos países sairam desta roda sombria aptos para a
democracia e puderam confiar em técnicas políticas ou jurídicas aptas a
produzir um Estado onde se permta o convívio entre as diferentes opiniões no
mesmo espaço social.
O modelo militarista foi demasiado comum no século 20. Ele deixou na
sombra que o golpe de Estado é algo mais amplo, mais profundo, mais sutil do
que a intervenção das casernas. Um golpe pode ser incruento e não suspender
todos os direitos civis. Ele também pode não destruir as determinações
abstratas do direito na vida política. Caso se efetivem mudanças micrológicas
na ordem legal e de governo e feito pequeno acréscimo ou subtração nas leis, o
seu efeito é tão desastroso para a democracia quanto um intervento armado.
Somadas, as micro intervenções geram rupturas no direito público e privado, o
que instala o medo e a desconfiança geral
frente às instituições.
São inúmeras as teorias sobre os golpes de Estado. Elas existem nos que
pensaram a ordem política, dos filósofos gregos a juristas como Hans Kelsen ou
Carl Schmitt. Em Gabriel Naudé encontra-se o esboço ideal dos golpes modernos,
atuais, futuros. Por ser uma leitura inventiva de Maquiavel para o mundo
francês, ([1]) na época em que o Estado absolutista era formado sob a direção de
Richelieu, as Considerações Políticas sobre os
Golpes de Estado ordenam ainda no século 17 um paradigma digno de ser
observado, discutido, aprendido e, sobretudo, temido nas terras que se
pretendem democráticas.
Gabriel Naudé, na juventude, aprendeu literatura, filosofia e
medicina. Dedicado aos livros, foi
notado por pessoas relevantes de seu tempo, como o presidente Mesme,[2] que lhe confiou a sua biblioteca. Embora
não aceite o convite, ele redige para Mesme um texto técnico, Advis
pour dresser une bibliothèque (1627. Alí, propõe a abertura de uma
biblioteca universal aos letrados, com livros úteis à comunidade dos sábios,
com a classificação dos escritos segundo uma “ordem natural”. Naude
forma o grupo Tétrade, núcleo da
chamada “libertinagem erudita”, onde qual problemas filosóficos são debatidos.
([3]) O libertino e bibliotecário
aceita o pensamento aristotélico e nele visualiza um método positivo de
pesquisa racional. Mas sua política segue Maquiavel. É próprio ao seu uso do
maquiavelismo certa frase em que ele afirma ser preciso “abolir toda idéia de
direitos que não sejam do chefe” [abolir
toute idée de droits autres que ceux du chef] e depois, “tornar a política autonoma diante da moral,
soberana diante da religião” [la politique autonome par rapport à la
morale, souveraine par rapport à la religion ]. Naude é escolhido em
1628 pelo Cardeal de Bagni (na Itália) como bibliotecário. Recebe em 1633 o
título de Médico de Luis 13 e o doutorado em Pádua. Chamado em 1642 por
Richelieu, pouco antes da morte do estadista, passou ao serviço de Mazarino. Em
dez anos, reuniu 40 mil volumes de manuscritos raros, núcleo da atual
Biblioteca Mazarino. Grande parte daqueles textos foi dispersada durante a
Fronda. Em 1652 a rainha Cristina da Suécia lhe oferece a direção de sua
biblioteca. Saúde delicada, ele morre ao retornar para a França, na idade de 53
anos. ([4])
O pensamento de Naudé entra no rol dos que, na França, assumem a defesa explícita
da razão de Estado, como é o caso de Guez de Balzac com o livro Le
Prince título que imita Maquiavel nas condições francêsas. Segundo Naudé "a
consideração do bem e da utilidades públicos passa acima da utilidade
particular”. la considération du bien et
de l'utilité publique passe ... par dessus celles du particulier." (Considerações
Políticas sobre o Golpe de Estado). Tal “interesse público” surge nas Considerações…com
o elogio da Noite de São Bartolomeu (1572). Segundo o escritor, aquele ato é “le
plus hardi coup & le plus subtilement conduit que l´on ait jamais pratiqué
en France ou en autre lieu (…) une action très juste, & très remarquable,
& dont le cause étoit plus que
légitime, quoique les effets en ayant été dangereux & extraordinaires” ([5]) Tal juízo é consentâneo com a tese inicial do tratado, onde se afirma
que “os téologos não são menos religiosos porque sabem em que consistem as
heresias; nem os médicos menos honestos porque sabem a força e a composição de
todos os venenos. Os hábitos do entendimento são distintos daqueles que têm
como origem a vontade, e os primeiros pertencem às ciências e sempre são
louváveis, os segundos ligam-se às ações morais, que podem ser boas ou más. (…)
Os soldados se exercitam para aprender a manejar a lança e atirar com o
mosquete afim de poder, com mais artifício e indústria, matar os homens e
destruir os semelhantes: mas eles usam aqueles instrumentos apenas contra os
inimigos de seu Príncipe, ou patria. Os melhores
cirurgiões estudam para poder cortar braços e pernas com destreza, e para a
saúde dos doentes (…) por que, então, seria proibido a um grande político saber
levantar ou rebaixar, produzir ou prender, condenar ou absolver, fazer viver ou
morrer, os que julga correto tratar assim, para o bem e repouso de seu
Estado?”. ([6])
Falar de política, afirma Naudé, sem discutir o golpe de Estado é
assumir o papel de apaideutos (apaideutws) a pessoa desprovida de informações necessárias para tratar de um
assunto. Na tarefa de provar seu ponto de vista, segundo o qual é preciso
conhecer os golpes de Estado, Naudé cita São Tomás de Aquino, nos comentários
sobre a Política de Aristóteles. O trecho tomista é o capítulo XII dos
comentários, onde o doutor da Igreja “ensina hipocrisia e dissimulação” : “Não
é preciso que um tirano, para se manter na tirania, pareça cruel aos
subordinados, pois se fosse assim ele se tornaria odioso, o que os pode
facilmente levantar contra ele. Mas ele deve parecer venerável pela excelência
de alguma virtude, pois é devida toda sorte de respeito à virtude; e se ele não
possui tal qualidade excelente, deve fingir que a possui”. ([7]) Comentário mordaz de Naudé: “Eis preceitos bem estranhos na boca de um
Santo e que não diferem em nada dos emitidos por Maquiavel e Cardano.” ([8]) Logo a seguir, ele adianta que os preceitos são dados por Aquino para
tornar conhecidos as técnicas tirânicas e permitir que os governados se
precavenham contra quem age de acordo com elas.
No entanto, após fazer o elogio da prudência como virtude política,
Naudé a entende segundo as palavras de Luis XI, do qual cita o mote conhecido: Qui
nescit dissimulare nescit regnare . ([9]) E continua a sua exposição com a tese de que “a maior virtude que hoje
reina na corte é desconfiar de todo mundo, e dissimular contra todos, porque os
simples e francos, não servem para o ofício de governar e traem com frequência
a si mesmos e ao seu Estado”. E segue a definição do golpe de Estado, a mesma
concedida às máximas e razões de Estado: “ut sint excessus juris communis
propter bonum commune [elas são um excesso do direito comum, por causa do bem
público]. Ou então, “ações ousadas e extraordinárias que os principes são
constrangidos a executar nos assuntos difíceis e como desesperados, contra o
direito comum, sem mesmo guardar nenhuma ordem ou forma de justiça, jogando com
o interesse do particular pelo bem do público”. ([10]) Nos golpes de Estado, o tempo é invertido, porque neles “ se enxerga
primeiro cair a tempestade e depois são ouvidos os trovões, as matinas são
ouvidas antes que o sino toque para anunciá-las, a execução precede a sentença;
tudo é feito ao modo judaico (…) fulano que pretendia dar o golpe, o recebe
antes, sicrano morre imaginando estar seguro (…) tudo é feito à noite, no
escuro, entre brumas e trevas”. ([11]) No golpe de Estado, o processo penal é feito após a execução do
acusado.
Meinecke expõe de modo sintético e acertado o pensamento de Naudé, no
clássico A Idéia de Razão de Estado na História dos Tempos Modernos. A
primeira nota a ser sublinhada por Meinecke diz respeito ao lugar de Naudé na
estrutura política, próximo aos operadores da máquina estatal. O ajudante de
Richelieu e de Mazarino é próximo dos poderosos, mas afastado o bastante para
poder refletir sobre as questões políticas. Naudé, ao contrário do duque de
Rohan e de outros auxiliares do grande cardeal francês, é o único a ser apenas
sábio e autor.
Meinecke insiste na importância de Maquiavel para Naudé, mas também
indica Montaigne como fonte estratégica em seus escritos. ([12]) É preciso, quando se planeja um golpe de Estado, ter em vista dois
elementos principais. O primeiro é a transitoriedade de todos os poderes e o
segundo reside na prudência de não abalar o mundo para conseguir o golpe.
Grandes rupturas ocorrem sem que se pense demasiado sobre elas, ou sem a
necessidade de grandes preparativos. O político consegue obter mudanças
políticas usando meios insignificantes. O estadista é definido pela síntese de
sabedoria e refinamento, calmo desapego e muita energia. O ceticismo integra a
desconfiança nos meios “normais” de poder.
Existe uma outra ruptura importante: o frio ceticismo do estadista não
se adequa ao entusiasmo da massa. De um lado Naudé despreza as multidões pois a
elas falta a razão e se torna a caça privilegiada dos retores, e se torna
expectadora passiva das piores tragédias políticas. A multidão é mar sempre
batido por ventos e tempestades. É preciso, portanto, enganar as massas com o
uso de escritores venais, milagreiros, propaganda bem arquitetada. Com
sugestiva remissão a Campanella, Meinecke recorda o dito de Naudé segundo o
qual um soberano que dispõe de doze bons oradores, faz-se obedecer melhor do
que ao usar dois exércitos. Para Naudé o cerco de La Rochele ofereceu maior
dificuldade ao rei porque a fé dos rebeldes era mantida por quarenta
pregadores, e não por capitães e soldados. E chega ao final do silogismo: a
superstição é a força mais poderosa para mover o povo, o meio mais fácil para
atingir alvos políticos e religiosos. Foi um erro deixar que Lutero assumir
importância. Ele deveria ser destruído por um golpe de Estado. Ou então, ele
deveria ter sido posto fora do jogo com uma prebenda e pensão. Richelieu
conseguiu dobrar os protestantes porque comprou os melhores capitães.
O principe deve possuir, no ideário de Naudé, três auxiliares: a força,
a justiça, a prudência. A justiça determina que ele viva segundo as leis
divinas e naturais. Se a justiça divina ou natural deixam de operar, ele
precisa recorrer à uma justiça específica, a definida pela “necessidade das
políticas e dos Estados”. Quanto à prudência, trata-se para ele de manter o
segredo pessoal e o do Estado.
Meinecke termina suas considerações sobre Naudé indicando que a razão de
Estado é um dos fatores principais que abriram a Estrada ao movimento das
Luzes, tanto porque exigiu uma formação peculiar do espírito, quanto porque
flexibilizou os valores dogmáticos. A própria filosofia das Luzes combateu,
mais tarde, a razão de Estado, porque os pensadores do século 18 defendiam o
indivíduo e não um coletivo, além de não aceitar quebras e golpes nas leis
naturais ou políticas. Finalmente, as Luzes, pelo seu pleno sentido
humanitário, se revoltava com uma situação de privilégios para os governantes,
em detrimento dos povos.
[1] “O
próprio Naudé (…) representa melhor do que ninguém a imitação da Itália e a
tendência monárquica dos francêses”. Joseph Ferrari: Histoire de la raison d´État
(Paris, Kimé, 1992, 1ª ed. 1860), p. 329
[2] Além de ser uma
personalidade importante do período, Mesme manteve tratos com importantes
pensadores, entree Michel de Montaigne. Cf. Jean Starobinski: Montaigne
em movimento (SP, Cia. Das Letras, 1993), p. 57.
[3] Os dados biográficos são
retirados da Biografia de Naudé editada on line pela Bibliothèque National de
France [ http://classes.bnf.fr/dossitsm/biograph.htm]
[4]Além
do texto diretamente dirigido ao golpe de Estado, Naudé escreveu sobre assuntos
de imediato interesse no debate político e religioso do período. Suas cartas
ilustram sua inserção na ordem do dia estatal ou eclesiástica. Cf. Wolfe, P.
(Ed.) Lettres de Gabriel Naudé à Jacques
Dupuy (1632-1652) (Edmonton, 1982). Gabriel Naudé, Instruction à la France sur la vérité de
l'histoire des Frères de la Rose-Croix (Paris, 1623) e também Apologie pur les grands hommes soupçonnés de
Magie, (Paris, 1625).
[5] “O
golpe mais ousado e de aplicação mais sutil dentre todos os empreendidos na
França ou em outro lugar (…) uma ação muito justa e notável, cuja causa era
mais do que legitima, embora seus efeitos tenham sido muito perigosos e
extraordinários”. (Considerations
politiques sur les coups d´ État, I).
[6] Considérations
politiques sur les coups d´État in Bibliothèque de Philosophie
politique et juridique. Centre de Philosophie politique et juridiqye.
ERA-CNRS, Université de Caen, 1989, página 19.
[7] “Expedit tyranno ad
salvandam tyrannidem, quod non appareat subditis saevus seu crudelis, nam si
appareat saevus reddit se odiosum; ex hoc autem facilius insurgunt in eum: sed
debet se reddere reverendum propter excelenttiam alicujus boni excellentis,
reverential enim debetur bono excellenti. Et si non habeat bonum illud
excellens, debet simulare se habere illud”.
[8] Considérations…ed. cit. Naudé… “brinca
alegremente com a austera tolice dos teólogos que faziam consistir a verdadeira
razão de Estado em amar a Deus e praticar a virtude mais pura. Discipulo
do secretário de Florença, de Botero, de Malvezzi, mesmo de Clapmar, ele exibe
os piores venenos com uma complacência satânica, ele goza quando escandaliza os
mais veneráveis tolos da época e o vemos feliz ao dizer que é amigo de
Campanella (…) ele se encanta ao demonstrar que só o crime funda as monarquias,
que Clovis era um vagabundo, Moisés um impostor e todos os herois gregos e
romanos, canalhas. Ao demolir tudo o que se adora, ele toma o mundo de trás
para diante; e nos previne que para nos preparar para o golpe de Estado é
preciso antes estar convencido de que tudo pode mudar de um instante para
outro, e que as mais antigas monarquias podem se transformar em repúblicas”. Joseph Ferrari, op.
cit. pp. 329-330. p. 27.
[10]
Para uma análise correta destes enunciados de Naudé, cf. Joël Cornette: La
monarchie entre Renaissance et Révolution, 1515-1792. (Paris, Seuil,
2000), pp. 222-223.
[11]
Sejam recordadas as magníficas frases de Jan Kott ao comentar o Ricardo 3º de
Shakespeare, uma peça toda ela edificada segundo o golpe de Estado. “Ricardo
escala rápidamente os degráus que o separam do trono. Mas o golpe de Estado ainda
não ocorreu. É preciso jogar o terror sobre a Câmara dos Lordes e sobre o
Conselho da Coroa. É preciso aterrorizar a cidade. E agora veremos os que
julgam costruir a história. Veremos, desembaraçados de toda mitologia e
desenhado em grandes pinceladas, o quadro vazio da prática política. Veremos,
transformado em drama, um capítulo do Príncipe de Maquiavel, a cena do
golpe de Estado. (…) Quatro da manhã. Pela primeira vez nesta tragédia Shakespeare
indica a hora exata. E justamente, temos quatro horas da manhã. Porque? É o
instante entre noite e alvorada, átimo em que nos altos postos as decisões já
foram tomadas e o que deveria acontecer, aconteceu; mas é o minuto no qual
ainda é possível salvar a própria cabeça, a hora em que é possível fugir. A
última hora da livre escolha. Toca o telefone, alguém bate apressadamente à
porta. Quem é? Não sabemos. Um amigo, ou já é o enviado pelo Grande Mecanismo?
(…)Lord Hastings tinha seus amigos no Conselho. E acreditava na legalidade. O
golpe de Estado, estou de acordo, mas em toda a majestade do direito. Ainda três horas antes, ele defendia a
legitimidade e recusara se ligar à evidente violação. Ele quisera salvar os
restos do pudor, os restos da honra. Ele tinha sido corajoso. Ele
tinha sido… Ricardo se compara a Maquiavel; ele é verdadeiramente o
príncipe (…) política, para ele, é prática pura, arte cujo fim é reinar. Ela é
amoral, como a arte de construir pontes ou lição de esgrima (…) Ricardo é a inteligência
do Grande Macanismo, sua vontade e sua consciência. Pela primeira vez
Shakespeare mostra o rosto do grande mecanismo. Ele é medonho devido ao seu
murmúrio e seu encarquilhamento nojento. Mas ele é fascinante”. Shakespeare,
notre contemporain.Paris, Payot, 1978), pp. 26-29. Reflexão eloquente
do kayrós grego e maquiavélico.
[12] Meinecke indica
o “honnête homme” de Montaigne como relevante para Naudé. Penso ser mais
provável que ele tenha sido mais determinado pelas noções de monstruosidade e
de exceção nos Ensaios, tendo-se em vista as Considerações políticas sobre os
golpes de Estado. Estes últimos constituem motivo de escândalo, como os
monstros, para juristas pouco afeitos à política, devido ao fato de que definem
exceções às regras. Após Naudé, foi preciso chegar aos escritos de Carl
Schmitt, para o exame da exceção. Não tenho espaço para analisar tal ponto.
Cito um trecho de Starobinski sobre Montaigne, cuja lógica se aproxima
fortemente das Considerações: “Não é impossível que Montaigne, no início da
redação dos Ensaios, tenha partido em busca de paradigmas de toda ordem
(políticos, militares, morais) e que tenha tentado escrever um manual do
perfeito fidalgo. Mas sua atenção voltou-se de imediato (…) para a exceção que
desmente o paradigma, para a discordância entre as lições implícitas dos
grandes exemplos propostos pela tradição ou para o que dizem os memorialistas
sobre os resultados ora favoráveis ora desastrosos de uma mesma conduta. (…)
Nenhum ato humano pode pretender a dignidade de modelo fixo, de regra
universal; há ocorrências singulares, acontecimentos notáveis e pessoas fora do
comum, digno de reter nossa atenção. (…) Os monstrous, os jogos da natureza
reivindicam o direito de figurar na mesma condição que as formas regulares, já
que a natureza, por toda parte igual a si mesma, não saberia distinguir entre
seus filhos uma descendência legítima e uma progenitura bastarda. O desvio é
doravante apenas uma das vias possíveis”. Montaigne em movimento, ed. cit. pp.
26-27.
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