10 Agosto 2017
A reportagem é de Gabriel de Arruda Castro, publicada por Gazeta do Povo, 08-08-2017.
O orçamento do Ministério da Educação para 2017 era de R$ 35,7 bilhões. Mas, em março, o governo congelou R$ 4,3 bilhões (12% do total). O objetivo era reduzir o déficit nas contas públicas. A matemática é simples: o Executivo tem gastado mais do que arrecada e, para tentar equilibrar as contas, contingenciou recursos de todas as áreas. A educação não foi poupada.
O corte reduziu principalmente as despesas de custeio, que perderam 15% do orçamento inicial, e de capital (como a aquisição de equipamentos), com uma redução de 40%. Como consequência, muitas universidades federais têm sofrido para pagar despesas como água, luz, segurança e limpeza.
A situação na UFS (Universidade Federal de Sergipe) é tão séria que a reitoria teve de emitir uma nota negando que a instituição vá suspender as atividades por falta de dinheiro. Mas, no comunicado, o comando da universidade diz que só poderá encerrar o ano com as contas em dia se contingenciamento acabar.
“Caso não haja liberação integral de 100% do limite orçamentário relativo a custeio, haverá, inevitavelmente, sérios problemas de execução de despesas de energia, bolsas, pessoal terceirizado (limpeza, segurança, apoio operacional etc)”, diz o texto.
A Universidade de Brasília (UnB) já está no vermelho: tem um déficit acumulado de mais de R$ 100 milhões de reais no ano.
Cerca de 250 funcionários terceirizados já estão de aviso prévio e devem ser desligados. Segundo o sindicato da categoria, a força de trabalho terceirizada caiu quase que pela metade desde 2015.
A crise também atinge a UFSM (Universidade Federal de Santa Maria), que demitiu cerca de 70 vigilantes no início do ano e suspendeu obras em andamento.
Com o congelamento de parte dos recursos, o cenário de incerteza se repete em outras universidades federais. A regra vale para a UFPR, apesar de a instituição paranaense ter menos sinais visíveis da falta de recursos.
Estaduais
Mesmo com o corte orçamentário, as universidades federais continuam com salários de professores e servidores em dia, já que o pagamento é feito diretamente pelo Executivo federal. Em algumas instituições estaduais, entretanto, nem isso acontece.O caso mais grave é o da UERJ (Universidade Estadual do Rio de Janeiro). Uma combinação de má gestão, corrupção e redução orçamentária (em parte por causa da nova divisão dos royalties do petróleo) empurrou o governo estadual para a penúria e levou junto a universidade estadual.
O primeiro semestre de 2017 simplesmente não existiu. O reinício das aulas, marcado para o começo de agosto, foi adiado novamente por absoluta falta de condições. Os serviços terceirizados estão suspensos por falta de pagamento, o restaurante universitário não abre há meses e os docentes e funcionários ainda não sabem quando vão receber o salário de maio.
No Paraná, um bloqueio orçamentário afetou as universidade estaduais de Londrina, Maringá e do Oeste Paranaense. O governo quer que as instituições passem a integrar o sistema de gestão de pessoas do Executivo estadual, o que em tese melhoraria o controle sobre as despesas. As universidades alegam que isso fere a autonomia de que deveriam desfrutar.
CNPq
Paralelamente à crise das universidades, os 100 mil bolsistas do CNPq têm outra razão para se preocupar. Se não entrarem mais recursos, eles podem ficar sem receber já em setembro.Na semana passada, o presidente da entidade, Mario Neto Borges se reuniu com o ministro de Ciência e Tecnologia, Gilberto Kassab, para tratar do assunto. Ouviu apenas que há um “diálogo permanente” com a área econômica do governo sobre o tema.
A UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro) emitiu recentemente um alerta a seus bolsistas de iniciação científica. Se nada mudar, diz o texto, o pagamento de agosto será o último.
Já há sinais de que os recursos estão perto do fim: bolsas que deveriam ter sido pagas nesta segunda-feira atrasaram, e a promessa é que depósito seja feito até o fim da semana. O problema afeta bolsistas de Produtividade em Pesquisa (PQ) e Desenvolvimento Tecnológico e Extensão Inovadora (DT).
Crise
A crise financeira na educação pública está profundamente ligada à crise econômica que o país atravessa. A expansão acelerada das instituições federais durante o governo do PT deixou uma conta alta quando a maré da economia baixou. Já em 2015, o governo de Dilma Rousseff promoveu um forte contingenciamento de recursos. E, com o governo federal em dificuldades, os estados ficam sem ter a quem recorrer.“Era uma tragédia anunciada”, diz José Matias-Pereira, professor de finanças públicas na Universidade de Brasília. Ele diz que, além do corte repentino de recursos, as universidades sofrem com a falta de gestores preparados. Em vez de eleições diretas, sugere, talvez seja a hora de os reitores serem escolhidos levando em conta sua capacidade de gestão.
Na avaliação de Matias-Pereira, mais cedo ou mais tarde as universidades públicas terão de fechar alguns cursos. “Diante da crise que nos estamos vivendo, um número significativo delas vai entrar em colapso”, afirma ele.
Nota
O Ministério da Educação alega que, mesmo com o contingenciamento, trabalhar para liberar 100% dos recursos previstos para as universidades. “Para 2017, o limite de empenho previsto inicialmente para as universidades é de 85% do valor previsto para despesas de custeio e de 60% para despesas de capital. No entanto, o MEC está trabalhando para aumentar esse limite, assim como fez no ano passado, onde, mesmo após o contingenciamento feito pelo governo anterior, conseguiu liberar 100% de custeio para as universidades”.O MEC afirma também que, apesar do corte, “o valor disponível para estas instituições será 5,3% maior do que o disponível à época do contingenciamento em 2016 - o que corresponde a um aumento de R$ 385,7 milhões”.
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